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Critérios para escalonamento de ultrassonificadores em tecnologia mineral

Resumos

Nesse trabalho, propõe-se uma metodologia de escalonamento de operação de ultrassonificação de polpas minerais. Tal escalonamento ainda não é claramente discutido na literatura técnica. A potência necessária para se efetuar a limpeza ultrassônica de partículas em suspensão, em escala industrial, é calculada, em função dos dados básicos de processo obteníveis em escala de laboratório ou usina-piloto.

ultra-som; escalonamento; dispersão sônica


In this work is presented a proposal in order to scale up ultrasonic cleaning operations. So far the project criteria for this scale up are not clearly discussed in the literature. The power to perform the ultrasonic cleaning of solid particles in suspension is calculated from laboratory data, which are easily gathered.

ultrasonic treatment; scale up; sonic dispersion


Mineração

Critérios para escalonamento de ultrassonificadores em tecnologia mineral

José Aurélio Medeiros da Luz

Engenheiro de Minas, Dr.

Departamento de Engenharia de Minas - EM/UFOP

E-mail: jaurelioluz@em.ufop.br

Resumo

Nesse trabalho, propõe-se uma metodologia de escalonamento de operação de ultrassonificação de polpas minerais. Tal escalonamento ainda não é claramente discutido na literatura técnica. A potência necessária para se efetuar a limpeza ultrassônica de partículas em suspensão, em escala industrial, é calculada, em função dos dados básicos de processo obteníveis em escala de laboratório ou usina-piloto.

Palavras-chave: ultra-som, escalonamento, dispersão sônica.

Abstract

In this work is presented a proposal in order to scale up ultrasonic cleaning operations. So far the project criteria for this scale up are not clearly discussed in the literature. The power to perform the ultrasonic cleaning of solid particles in suspension is calculated from laboratory data, which are easily gathered.

Keywords: ultrasonic treatment, scale up, sonic dispersion.

1. Introdução

Em algumas aplicações da tecnologia mineral, surge o problema de garantir uma dispersão adequada de suspensões de particulados submetidos a dada operação unitária. O estado de dispersão pode ser entendido como uma gradação da metaestabilidade termodinâmica a que pode se sujeitar um sistema particulado, no sentido de se evitar a segregação de suas fases constituintes (e, com tal segregação, minimizar a energia interfacial do sistema).

Usualmente há a conveniência da dispersão de suas diversas fases constituintes, quando polpas minerais são submetidas à separação por espécie (concentração). Além do uso de reagentes dispersantes químicos (de uso nem sempre desejável, sob o ponto de vista de química de polpa adequada ao processo, ou do ponto de vista da qualidade dos efluentes da atividade industrial), a sonificação tem sido usada, menos comumente, para se obter um sistema convenientemente disperso (Stoev & Kintisheva, 1977). Similarmente, utiliza-se também ultra-som para emulsificação de fases líquidas imiscíveis (Becher, 1972).

Um exemplo específico foi a sonificação anterior à etapa de floculação seletiva, ultra-som com freqüência de 22,0 kHz e densidade de irradiação de 17,3 kW/m2 (durante 7 minutos), em polpa de quartzo heterocoagulada com finos de carbonato de cálcio, que semostrou eficaz, limpando a superfície do quartzo, o que resultou na melhoria da floculação seletiva subseqüente (Stoev & Kintisheva, 1977).

A metodologia proposta nesse artigo para dimensionamento de equipamento de ultrassonificação de porte industrial surgiu da necessidade de desenvolver método de escalonamento de operações de ultrassonificação de uma lama de aciaria, a ser submetida à separação por métodos densitários (concentrador helicoidal de Humphreys e mesas oscilatórias).

As lamas resultantes do sistema de limpeza de gases são um resíduo problemático das operações siderúrgicas e vários processos alternativos têm sido tentados pelas indústrias.

Um processo de tratamento de lamas de aciarias foi desenvolvido pela equipe de pesquisa da Fundação Gorceix, sob a coordenação do prof. José Emmanuel, no ano de 2000. A introdução de uma etapa de ultrassonificação antes da operação de concentração foi responsável pelo êxito da nova rota de processo de beneficiamento, em nível de escala-piloto. A escolha do método de ultrassonificação para desagregação do material deveu-se ao fato de uma ponderável fração das partículas compor-se de esferóides ocos.

A razão da existência de partículas ocas é devida à própria gênese do material, o qual é formado pela injeção de oxigênio (por meio de lanças) nos conversores de aço, o que promove a expulsão de partículas líquidas, ou mesmo bolhas, as quais se solidificam ao serem arrastadas para os coletores de pó.

Assim sendo, tornou-se inviável a utilização de métodos de cominuição convencionais para permitir a separação entre a fração útil e a ganga. O fato de essas partículas serem ocas ocasiona eventualmente a apreensão (engaiolamento) das partículas de ganga dentro do seio dessas partículas, de tal forma que, com o uso de ultrassonificadores, consegue-se total liberação das partículas úteis, com alto teor de ferro metálico. Não é necessário o uso de quaisquer reagentes químicos ou condicionadores de polpa.

Durante a fase de projeto básico para a aplicação industrial desse processo, coube ao autor dimensionar os equipamentos, tendo como critérios de projeto os dados básicos e os resultados da usina-piloto.

2. Desenvolvimento do método proposto

Embora desenvolvida sob um contexto particular, a metodologia desenvolvida é aqui preconizada para o escalonamento de tanques de sonificação para aplicações genéricas, já que, em algumas instâncias específicas, o uso de ondas mecânicas ou de choque, geradas pela propagação de ultra-som em fluido de baixa compressibilidade (isto é: líquidos), é de vital importância para o desempenho do processo a jusante.

O aspecto fundamental no dimensionamento dos desagregadores ultrassônicos é a potência dos ultrassonificadores em função dos volumes dos tanques de desagregação e do tempo de residência da polpa nesses tanques.

Em princípio, com padrão mais comum, pode se considerar o uso de ultrassonificadores com voltagem de 120 V e amperagem de 20A, num regime trifásico de corrente (como , por exemplo, os de Lewis Corporation, dos EUA).

Em se tratando de sólidos com alta massa específica, é necessário um sistema eficiente de agitação para o mantenimento das partículas em suspensão. Para isso, devem ser utilizados agitadores mecânicos, com impelidores e com velocidade angular adequados a cada caso. A potência de regime (em watt) dada é dada por:

(01)

Onde:

dag = diâmetro do agitador (impelidor) [m];

n = velocidade angular [r.p.s.];

Np = número de potência [-];

rp = massa específica da polpa [kgxm-3].

Para fazer face à posta-em-marcha e às flutuações de processo, costuma-se adotar a potência instalada igual a: P = 2xPreg.

O valor de Np depende do desenho do impelidor, da configuração do tanque e das aletas defletoras do seu costado, além do número de Reynolds vigente na operação. Como exemplo, tem-se para impelidor de quatro lâminas com ângulo de inserção de 45º em tanque cilíndrico com quatro defletores, o número de potência pode ser assumido, em regime totalmente turbulento, como Np= 1,5. Valores de Np para outras configurações podem ser vistos na literatura (Pavlov e colaboradores, 1979). O nível de turbulência necessário deve ser calculado em função das massas específicas do sólido e líquido e da granulometria das partículas. Pode-se utilizar para esse cálculo, por exemplo, as equações de Mersmann-Werner-Maurer-Bartosch (Mersmann e colaboradores, 1998).

A absorção real de energia ultra-sônica pela água é pequena. Deve-se notar, como se vê na literatura (Landau & Kitaigorodsky, 1963), que a atenuação espacial de ondas mecânicas geradas por fontes puntiformes é uma absorção aparente (a menos de uma fração realmente assimilada, descrita pela clássica lei de Lambert-Beer), isto é: uma frente (idealmente esférica em meio isotrópico) mantém sua energia total invariável, mas não sua superfície total. Matematicamente, sendo a intensidade, I, definida como a potência por unidade de área, tem-se, para uma frente em dois instantes, t1 e t2, a seguinte igualdade energética:

(02)

Onde ri é o raio da frente esférica no tempo ti.

Assim, a relação entre as duas intensidades resulta igual a:

(03)

Desse modo, um sensor de área constante (como, por exemplo, tímpano do ouvido, no caso de som) irá absorver menos potência na medida em que ele se afaste da fonte, segundo a lei expressa pela Equação (03).

Naturalmente, a freqüência da irradiação deve ser tal que se aproxime ao máximo da freqüência fundamental dos agregados de partículas que se deseja destruir. Como tais agregados são geralmente animados de movimento induzido pelo impelidor do sistema de agitação, seria, em princípio, necessário considerar as mudanças de eficiência devidas ao efeito Doppler-Fizeau, no qual a freqüência efetiva muda segundo a relação:

(04)

Onde:

fonda = freqüência da onda mecânica [Hz];

vonda = velocidade de propagação da onda mecânica [mxs-1];

v = velocidade do agregado [mxs-1];

Kfl = módulo de compressibilidade do meio fluido [Pa];

rfl = massa específica do meio fluido [kgxm-3].

Para água: Kfl»1980 MPa (a 20º C), resultando: vfl »1408 mxs-1. No entanto, a velocidade dos grânulos, a qual é uma função da posição espacial e do tempo (v = f(x,y,z,t)), é muito menor que a velocidade de propagação da perturbação mecânica (ultra-som). Portanto vê-se que não é necessário levar em conta tal correção.

A concentração mássica de minerais mais comumente utilizada em operação de desagregação é de 30% de sólidos (cm = 0,3). Entretanto, em função da resposta ao material e das vazões, essa concentração pode variar, para o cumprimento do tempo de residência adequado (a rigor, é mais justificável trabalhar com concentração volumétrica em vez de mássica).

É comum que os ultrassonificadores estejam dispostos em linha vertical, de modo a cobrirem todo o comprimento longitudinal do costado dos tanques (altura), podendo haver mais de uma fileira deles no mesmo tanque. Quando o caso for esse, as fileiras devem estar dispostas de forma que não haja interferência destrutiva entre suas frentes de onda (para tal, deve-se evitar a disposição com oposição frontal das ondas).

Com base nas considerações anteriores e levando em conta os padrões complexos de reflexões múltiplas no costado do tanque, o critério de escalonamento (scale up) preconizado nesse trabalho é a invariância da energia administrada às partículas sólidas durante seu processamento.

Seja, portanto, J a densidade de potência de irradiação (em watts por metro cúbico de polpa) e Js a densidade de irradiação por massa de sólido. Tem-se:

(05)

(06)

Onde:

h = altura efetiva do tanque [m];

J = densidade de irradiação da polpa [Wxm-3];

Js = densidade de irradiação por massa de sólido [Wxkg-1];

P = potência do sistema de sonificação [W];

D = diâmetro efetivo do tanque [m];

cm = concentração mássica de sólidos na polpa [-];

rp = massa específica real da polpa [kgxm-3].

A massa específica da polpa é dada pela expressão:

(07)

Onde:

rfl = massa específica real do fluido [kgxm-3];

rs = massa específica real do sólido [kgxm-3];

Como (para potência constante) a energia aplicada é a potência vezes o tempo de irradiação, o critério de escalonamento fica: Js1 xt1 = Js2 x t2 = constante, ou seja, considerando a Equação (06):

(08)

Onde t1 e t2 são os tempos de residência nas duas escalas. Convenciona-se, aqui, que o primeiro membro da equação precedente refere-se a condições de laboratório ou usina-piloto (conhecidas), enquanto que o segundo refere-se à escala industrial. Substituindo Ji e rpi por suas expressões dadas pelas Equações (05) e (07) e fazendo os devidos cancelamentos e simplificações, resulta a seguinte equação de escalonamento:

(09)

Pela baixa absorção da energia pelo fluido, pode-se adotar o tempo de residência como se não houvesse dispersão axial nem radial das linhas de fluxo (o que equivale a regime de fluxo pistonar). Assim, vale a seguinte relação, para um tanque cilíndrico:

(10)

Onde Qs2 é a vazão mássica de sólidos na escala 2 (industrial).

Substituindo a Equação (10) na (09) e explicitando a potência da escala industrial, tem-se, finalmente:

(11)

Onde:

D1 = diâmetro efetivo do tanque da escala 1 [m];

Qs2 = vazão de sólidos na escala 2 [kgxs-1];

rs = massa específica real do sólido [ kgxm-3];

rfl = massa específica do fluido [kgxm-3];

t1 = tempo médio de residência do tanque da escala 1 [s].

3. Conclusão

Pelas razões expostas, na falta de dados exaustivos de sistemas de ultrassonificação em várias escalas, o critério simplificado para o escalonamento desse tipo de operação, aqui preconizado, apresenta conveniência.

A potência na escala industrial, calculada, deve ser distribuída em conformidade com a potência de cada ultrassonificador, com seu número em cada tanque e com o número de tanques. O número de unidades em cada alinhamento deve ser tal que resulte altura total igual à altura efetiva do tanque.

Naturalmente, a seleção dos tamanhos dos tanques deve ser feita buscando o máximo de padronização, tendo em vista seu impacto positivo na simplificação do projeto, na otimização da operação, bem como na maior flexibilidade do circuito resultante quanto à manutenção e à gestão de itens de estoque.

4. Referências Bibliográficas

Artigo recebido em 18/09/2001 e aprovado em 13/11/2001.

  • BECHER, P. Emulsiones - teoría y práctica Madrid: Blume, 1972.
  • LANDAU, L., KITAIGORODSKY, A. Física para todos Moscú: Mir., 1963.
  • MERSMANN, A. et alii. Theoretical prediction of the minimum stirrer speed in mechanically agitated suspensions. Chemical Engineering and Processing v. 37, p. 503-510, 1998.
  • PAVLOV, K. F. et alii. Examples and problems to the course of unit operations of chemical engineering Moscow: Mir., 1979.
  • STOEV, S., KINTISHEVA, R. Vibroacoustical methods for improving selective flocculation In: International Mineral Processing Congress, 22. São Paulo: 1977.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jun 2002
  • Data do Fascículo
    Dez 2001

Histórico

  • Aceito
    13 Nov 2001
  • Recebido
    18 Set 2001
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