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Artrite reumatoide: por que tratar apenas a artrite, sabendo que comorbidades são comuns e determinam morbidade e mortalidade?

EDITORIAL

Artrite reumatoide: por que tratar apenas a artrite, sabendo que comorbidades são comuns e determinam morbidade e mortalidade?

Nos últimos anos houve muitos avanços na abordagem do paciente com artrite reumatoide (AR). Destacamos a possibilidade de diagnóstico em fase mais inicial da doença, graças aos novos critérios de classificação elaborados por um Comitê do EULAR (European League Against Rheumatism - Liga Europeia Contra o Reumatismo) e pelo American College of Rheumatology, em 2010, e os novos testes laboratoriais, como a detecção de presença de anticorpos contra proteínas citrulinadas.1,2 Outra conquista foi em relação à mudança no tratamento desses pacientes, com a utilização de combinações de drogas modificadoras do curso da doença (DMCD) sintéticas e biológicas.3

Considerando tais avanços no diagnóstico e no tratamento específico da AR, devemos ficar satisfeitos com o que já temos oferecido a esses pacientes? A resposta é não. O número de internações, as comorbidades não tratadas e a mortalidade ainda são elevados.4,5

A AR é mais que uma doença articular, e há ocorrência de inúmeras alterações inflamatórias sistêmicas. As citocinas mais expressas nas articulações dos pacientes com AR, como fator de necrose tumoral (TNF), interleucina (IL) 1, IL6 e IL17, também estão elevadas na circulação e são implicadas em inúmeros processos, como maior resistência à insulina e maior lesão endotelial vascular.6

Na população sem AR, é sabido que a inflamação tem papel chave no desenvolvimento da placa aterosclerótica, com maior infiltrado de linfócitos T e maior expressão de citocinas derivadas da ativação de linfócitos Th1. Assim, é fácil entender por que os pacientes com AR, uma doença inflamatória sistêmica, têm maior prevalência de aterosclerose e eventos cardiovasculares.7

Outras condições clínicas não articulares são também importantes e estão discutidas nesse Consenso sobre comorbidades em AR, como a ocorrência de diabetes mellitus, resistência à insulina, hipertensão arterial sistêmica, trombose venosa, osteoporose e neoplasias.8 A presença dessas comorbidades em pacientes com AR tem importante impacto na sobrevida desses pacientes e na qualidade de vida, muitas vezes justificando um tratamento individualizado da condição artrítica, diante das implicações dos diferentes efeitos das drogas antirreumáticas nessas comorbidades.

Diante da necessidade de melhor tratarmos os pacientes com AR, a Comissão de AR da Sociedade Brasileira de Reumatologia publica o terceiro de quatro artigos programados para o manejo do paciente com AR. O objetivo desse artigo aqui publicado sobre comorbidades foi elaborar recomendações para o correto manejo das comorbidades em AR e detalhar as comorbidades mais prevalentes e sua associação com a doença e seu tratamento. Entendemos que cabe ao reumatologista reconhecer precocemente essas comorbidades, muitas vezes com expressão subclínica diante da intensidade das queixas articulares e das modificações do curso clínico determinadas pela AR e seu tratamento. É fundamental entender que as comorbidades muitas vezes decorrem diretamente da presença da AR. Para exemplificar, a hipertensão aterial sistêmica em pacientes com AR está associada à inflamação sistêmica e ao uso de medicações utilizadas na AR, como anti-inflamatórios não hormonais, corticoides e DMCD, como leflunomida e ciclosporina.9

Ivânio Alves Pereira, MD, Ph.D

Professor da Disciplina de Reumatologia, Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL; Chefe do Serviço de Reumatologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina - HU-UFSC

  • 1
    da Mota LM, Cruz BA, Brenol CV, Pereira IA, Fronza LS, Bertolo MB et al; Brazilian Society of Rheumatology. 2011 Consensus of the Brazilian Society of Rheumatology for diagnosis and early assessment of rheumatoid arthritis. Rev Bras Reumatol 2011;51(3):199-219.
  • 2
    Aletaha D, Neogi T, Silman AJ, Funovits J, Felson DT, Bingham CO 3rd et al 2010 rheumatoid arthritis classification criteria: an American College of Rheumatology/European League Against Rheumatism collaborative initiative. Ann Rheum Dis 2010;69(9):1580-8.
  • 3
    da Mota LM, Cruz BA, Brenol CV, Pereira IA, Rezende-Fronza LS, Bertolo MB et al 2012 Brazilian Society of Rheumatology Consensus for the treatment of rheumatoid arthritis. Rev Bras Reumatol 2012;52(2):152-74.
  • 4
    Gonzalez A, Maradit Kremers H, Crowson CS, Nicola PJ, Davis JM 3rd, Therneau TM et al The widening mortality gap between rheumatoid arthritis patients and the general population. Arthritis Rheum 2007;56(11):3583-7.
  • 5
    Michaud K, Wolfe F. Comorbidities in rheumatoid arthritis. Best Pract Res Clin Rheumatol 2007;21(5):885-906.
  • 6
    McInnes IB, Schett G. The pathogenesis of rheumatoid arthritis. N Engl J Med 2011;365(23):2205-19.
  • 7
    Kitas GD, Gabriel SE. Cardiovascular disease in rheumatoid arthritis: state of the art and future perspectives. Ann Rheum Dis 2011;70(1):8-14.
  • 8
    Pereira IA, da Mota LM, Cruz BA, Brenol CV, Rezende-Fronza LS, Bertolo MB et al Consenso 2012 da Sociedade Brasileira de Reumatologia sobre o manejo de comorbidades em pacientes com o diagnostico de Artrite Reumatoide. Rev Bras Reumatol 2012;52(4):474-95.
  • 9
    Panoulas VF, Douglas KM, Milionis HJ, Stavropoulos-Kalinglou A, Nightingale P, Kita MD et al Prevalence and associations of hypertension and its control in patients with rheumatoid arthritis. Rheumatology (Oxford) 2007;46(9):1477-82.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Ago 2012
  • Data do Fascículo
    Ago 2012
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