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COOPERATIVISMO EM COMUNIDADES FLORESTAIS NA AMAZÔNIA: O QUE DIZEM OS NÃO-MEMBROS?1 1 . Os autores agradecem aos moradores que contribuíram com este trabalho; ao ICMBio; e ao PIBIC/FAPESPA/UFOPA, pela concessão da bolsa de iniciação científica da primeira autora.

Resumo

A Floresta Nacional do Tapajós é uma reserva na região oeste do estado do Pará e, em 2005, foi fundada a Cooperativa Mista da Floresta Nacional do Tapajós, com objetivo principal de aplicar o manejo florestal por meio de atividades comunitárias. Este trabalho teve como objetivo identificar e avaliar o ponto de vista de moradores não-membros sobre essa cooperativa, bem como encontrar formas de produção alternativas. Utilizou-se uma matriz de Forças, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças, entrevistas semi-estruturadas, Matriz de Prioridades e um Plano de Ação. Os benefícios mais importantes citados foram: doação de madeira, manutenção de estradas e empregos para os membros. Problemas no processo de admissão relacionados à burocracia e falta de transparência no processo de seleção de novos membros devem ser superados. Plantio de mandioca e produção de farinha; artesanato; turismo; estabelecimento de sistemas agroflorestais; produção de mel foram as principais atividades produtivas indicadas no Plano de Ação.

Palavras-chave:
Organização social; Unidade de Conservação; Desenvolvimento Rural; Amazônia

Abstract

The National Forest of Tapajós is a reserve in the western region of the state of Pará and in 2005 the Cooperativa Mista da Floresta Nacional do Tapajós was founded, with the main objective of applying forest management through community activities. This paper aimed to identify and evaluate the viewpoint of non-member residents about this cooperative, as well as to find alternative production forms. It was used a matrix of Strengths, Opportunities, Weaknesses, and Threats, semi-structured interviews, a Priority Matrix, and a Plan of Action. The most important benefits cited were the donation of wood, road maintenance and jobs for the members. Problems in the admission process related to red tape and lack of transparency in the selection process of new members should be overcome. Cassava planting and flour production; handicrafts; tourism; establishment of agroforestry systems; honey production were the main productive activities indicated in the Plan of Action.

Keywords:
Social organization; Conservation Unit; Rural Development; Amazonia

Resumen

Floresta Nacional do Tapajós es una reserva en la región oeste del Pará y en 2005 fue fundada la Cooperativa Mista da Floresta Nacional do Tapajós, con objetivo principal de aplicar el manejo forestal a través de actividades comunitarias. Este trabajo tuvo como objetivo identificar y evaluar el punto de vista de moradores no miembros sobre esa cooperativa, así como encontrar formas de proponer alternativas. Se utilizó Matriz de Fuerzas, Oportunidades, Flaquezas y Amenazas, entrevistas semiestructuradas, Matriz de Prioridades y Plan de Acción. Beneficios más importantes citados fueron: donación de madera, mantenimiento de carreteras y empleos para miembros. Problemas en el proceso de admisión relacionados con la burocracia y falta de transparencia en el proceso de selección de nuevos miembros deben ser superados. Plantas de mandioca y producción de harina; artesanía; turismo; establecimiento de sistemas agroforestales; producción de miel fueron las principales actividades productivas indicadas en el Plan de Acción.

Palabras claves:
Organización social; Unidad de Conservación; Desarrollo Rural; Amazonía

Introdução

O grande potencial da Amazônia, considerando sua diversidade biológica, étnica e cultural, vem sendo aproveitado de forma desordenada por agentes externos e que pouco beneficiam as populações locais (TONINI, 2006TONINI, H. Kamukaia: pesquisa da Embrapa em manejo de produtos florestais não madeireiros na Amazônia. 2006. Available at: https://www.embrapa.br/.../noticias?_...pesquisa...produtos-florestais-nao-madeireiros. Accessed: 10 May 2016.
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; ARAÚJO, BRITO; PROFICE, 2018ARAÚJO, W. A.; BRITO, G. N. S.; PROFICE, C. C. “A selva” de Ferreira de Castro: cenário, dimensão e sustentabilidade. Ambiente & Sociedade, São Paulo, v. 21, e01821, 2018. ). O manejo Florestal Comunitário surge como alternativa de empoderamento das populações da floresta e melhoria da qualidade de vida (AMARAL; AMARAL NETO, 2005AMARAL, P.; AMARAL NETO, M. Manejo florestal comunitário: processos e aprendizagens na Amazônia brasileira e na América Latina. 1. ed. Brasília: IEB/Imazon, 2005. 84p.). As primeiras iniciativas do Manejo Florestal Comunitário permeiam a década de 1990 e, dentre os incentivos que impulsionaram essa modalidade, encontra-se o apoio de Projetos como o ProManejo, que auxiliou na geração de experiências e lições passíveis de serem replicadas, como o caso da Floresta Nacional do Tapajós - Flona Tapajós (SFB, 2007).

A participação popular na gestão dos recursos florestais madeireiros e não madeireiros auxilia na determinação de indicadores de monitoramento da realização do manejo florestal, sendo solicitada inclusive por instituições certificadoras como princípio de promoção do bem-estar econômico e social dos envolvidos e das comunidades locais (IMAFLORA, 2016).

Diante da importância da contribuição da população tradicional, relacionada à compreensão de suas expectativas, anseios, satisfações e sugestões de melhorias, vários estudos relacionados à percepção de atores locais são desenvolvidos atualmente (GONÇALVES; GOMES, 2014GONÇALVES, B. V.; GOMES, L. J. Percepção ambiental de produtores rurais na recuperação florestal da sub-bacia hidrográfica do rio Poxim - Sergipe. Desenvolvimento e Meio Ambiente, Curitiba, v. 29, p. 127-138, 2014. ), inclusive envolvendo unidades de conservação (ZILLMER-OLIVEIRA; MANFRINATO, 2011ZILLMER-OLIVEIRA, T.; MANFRINATO, M. H. V. Percepção ambiental sobre “meio ambiente” e “educação ambiental” de seringueiros no sudoeste da Amazônia, Mato Grosso, Brasil. Biotemas, Florianópolis, v. 24, n. 3, p. 119-128, 2011. ). De acordo com Pinheiro et al. (2011PINHEIRO, I. F. S.; LIMA, V. L. A.; FREIRE, E. M. X.; MELO, A. A. A percepção ambiental de uma comunidade da Caatinga sobre o turismo: visões e perspectivas para o planejamento turístico com vistas a sustentabilidade. Sociedade & Natureza, Uberlândia, v. 3, p. 467-482, 2011. ), os estudos perceptivos são instrumentos que estimulam a participação popular, considerando e valorizando o conhecimento dos diferentes agentes sociais. Para Meijaard et al. (2013MEIJAARD, E. et al. People’s Perceptions about the Importance of Forests on Borneo. PLoS ONE, San Francisco, v. 8, n. 9, e73008, 2013.), o conhecimento sobre o uso e as percepções das pessoas sobre as florestas pode levar a um melhor planejamento nas escalas de paisagem e regional.

Neste trabalho, será estudado o caso da Cooperativa Mista da Flona Tapajós (Coomflona), localizada na Floresta Nacional do Tapajós (Flona Tapajós). A cooperativa foi criada em 2005 e realiza o Manejo Florestal Comunitário na unidade, gerando renda e emprego para a população local. Contudo, por ser este território de origem de terra pública, a madeira vendida pela cooperativa não pode apenas beneficiar os moradores diretamente envolvidos na realização do manejo e sim todas as comunidades da Flona Tapajós. Assim, a cooperativa criou diversos fundos para apoiar as iniciativas dos não cooperados (ESPADA; ANDRADE; VASCONCELLOS SOBRINHO, 2014ESPADA, A. L. V.; ANDRADE, D.; VASCONCELLOS SOBRINHO, M. A cooperação para o desenvolvimento local: inovação no Manejo Florestal Comunitário. CODS - Coloquio Organizações, Desenvolvimento e Sustentabilidade, Belém, v. 5, n. 1, p.101-117, 2014.).

Partindo do princípio de que existe o Fundo de Apoio Comunitário, correspondente a 15% da divisão da venda da madeira, que visa apoiar iniciativas das comunidades da unidade, espera-se que a percepção dos não cooperados seja a base para definir quais as ações a serem priorizadas. Sob a ótica institucional, o estudo responde a seguinte questão: como a Cooperativa pode contribuir para a realidade dos não cooperados?

Considerando a importância do Manejo florestal comunitário realizado por esta cooperativa ao longo de mais de 10 anos de existência, o presente trabalho realizado em seis comunidades da Flona Tapajós, visa identificar e analisar as percepções de moradores não cooperados acerca da Cooperativa, no sentido de fortalecer a busca de alternativas para produção, melhoria na qualidade de vida e na relação dos não cooperados junto à organização.

Material e Métodos

Área de estudo

A Flona Tapajós é uma Unidade de Conservação Federal criada pelo Decreto n° 73.684/1974, com área de 527.319 hectares, localizada na região Amazônica, no oeste do estado do Pará. Tem como limites, a oeste, o rio Tapajós, a leste, a Rodovia Cuiabá-Santarém (BR163), ao norte, uma reta que passa pelo marco 50 da rodovia Cuiabá-Santarém e, ao sul, o Rio Cupari e seu afluente Santa Cruz. Abrange parte dos municípios de Aveiro, Belterra, Placas e Rurópolis (ICMBio, 2016). Esta unidade de conservação possui 21 comunidades e este estudo foi realizado em seis delas (São Domingos, Maguari, Jamaraquá, Jaguarari, Acaratinga e Pedreira) (Figura 1).

Figura 1
Floresta Nacional do Tapajós (Brasil) - localização das comunidades envolvidas no estudo.

No final da década de 1990, as comunidades da Flona Tapajós iniciaram uma discussão sobre a possibilidade dos próprios comunitários realizarem o manejo florestal, que teve maior ênfase a partir de 2001 com o Projeto de Apoio ao Manejo Florestal Sustentável na Amazônia (PROMANEJO), que foi implementado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), por meio do Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG7). O projeto objetivou o manejo sustentável dos espaços para melhoria das rendas diretas das populações locais, através do monitoramento e do apoio de experiências pioneiras.

Em 2004, o IBAMA publicou a Portaria nº 40, de 22 de agosto, autorizando as Associações Intercomunitárias a implantar um Projeto Piloto de Manejo Florestal Comunitário na área destinada ao uso intensivo da Flona Tapajós. Com isso, surgiram novas discussões sobre como executar o manejo florestal, tratou-se da primeira concessão de uso em larga escala em uma Flona na Amazônia. Em 2005, as Associações Intercomunitárias criaram a Coomflona, que passaria a ser organização executora (VERÍSSIMO, 2005VERÍSSIMO, A. Influência do Promanejo sobre políticas públicas de manejo florestal sustentável na Amazônia. 2005. Available at: http://www.mma.gov.br/estruturas/168/_publicacao/168_publicacao30012009112141.pdf . Accessed: 20 Feb. 2016.
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).

O Manejo Florestal Comunitário, realizado pelas populações tradicionais da Flona Tapajós é uma importante referência de uso sustentável da floresta e conservação da biodiversidade. Sob a gestão da cooperativa, a atividade florestal gerou aproximadamente R$ 4 milhões e mais de 100 empregos diretos, e, ainda, considerando os benefícios oriundos do manejo, anualmente, 15% das sobras do lucro da cooperativa são destinados às Associações Comunitárias (ESPADA; ANDRADE; VASCONCELLOS SOBRINHO, 2014ESPADA, A. L. V.; ANDRADE, D.; VASCONCELLOS SOBRINHO, M. A cooperação para o desenvolvimento local: inovação no Manejo Florestal Comunitário. CODS - Coloquio Organizações, Desenvolvimento e Sustentabilidade, Belém, v. 5, n. 1, p.101-117, 2014.).

A cooperativa desenvolve o manejo florestal de impacto reduzido e envolve atualmente 206 cooperados. A Flona Tapajós possui cerca de 3.438 moradores, segundo o levantamento de famílias realizado em 2014 na unidade (SILVA et al., 2014SILVA, M. J. S.; SOUSA, A. M. P.; SILVA, A. C. F.; RODRIGUES, D. S. Levantamento de Famílias da Floresta Nacional do Tapajós, Pará. In: SEMINÁRIO DE PESQUISA CIENTÍFICA DA FLORESTA NACIONAL DO TAPAJÓS, 2., 2014. Santarém. Anais [...] Santarém: ICMBIO/MMA, 2014. p. 235-242. ), portanto, a cooperativa agrega cerca de 16,7% da população total desta unidade de conservação como cooperados, restando 3.232 moradores não cooperados.

Coleta de dados

O estudo foi de natureza qualitativa exploratória, descrita por Neves (1996NEVES, J. L. Pesquisa qualitativa: características, usos e possibilidades. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v.1, n.3, 1996. ) como metodologia que almeja o entendimento de situações segundo perspectiva dos participantes da pesquisa, mediante contato direto e interativo com o pesquisador. De acordo com Pinheiro et al. (2011PINHEIRO, I. F. S.; LIMA, V. L. A.; FREIRE, E. M. X.; MELO, A. A. A percepção ambiental de uma comunidade da Caatinga sobre o turismo: visões e perspectivas para o planejamento turístico com vistas a sustentabilidade. Sociedade & Natureza, Uberlândia, v. 3, p. 467-482, 2011. ), as pesquisas perceptivas são uma forma de entendimento das ideias, modo de ver e sentir o ambiente, bem como as relações do entorno. Esta forma de pesquisa contribui para o surgimento de proposições e ações, sejam de cunho social, econômico ou ambiental.

Desenvolvimento Organizacional Participativo -DOP

Foi realizada uma reunião em cada comunidade alvo deste estudo, iniciando pela mobilização dos moradores não cooperados, feita em conjunto com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio, por meio de ofício circular endereçado aos representantes comunitários para ampla divulgação na comunidade. Na etapa de logística e execução, a equipe da Flona Tapajós do ICMBio também empenhou todos os esforços necessários, auxiliando no acesso às comunidades, realização das reuniões e aplicação das entrevistas.

A avaliação da percepção dos moradores não cooperados foi realizada com auxílio de uma ferramenta do método “Desenvolvimento Organizacional Participativo - Dop”, denominada Matriz FOFA (objetiva descrever quais as fortalezas, oportunidades, fraquezas e ameaças em relação à cooperativa alvo deste estudo) aplicada em reuniões comunitárias realizadas em fevereiro de 2015. A matriz Fofa é uma ferramenta de percepção empregada para empreendimentos com o intuito de identificar oportunidades e contribuir para melhoria contínua (ANDRADE et al., 2012ANDRADE, C. S.; CHIMENES, M. M.; OLIVEIRA, R. C.; LENIS, J. N. R. Percepção da gestão ambiental em um ambiente microempresarial: abordando um novo conceito de ecodesenvolvimento. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GESTÃO AMBIENTAL, 3. 2012, Goiânia. Anais [...] Goiânia: UFG/IBEAS, 2012. Available at: https://www.ibeas.org.br/congresso/Trabalhos2012/XI-056.pdf, accessed: 03 Apr. 2016.
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). Durante as reuniões, os moradores não cooperados foram separados em grupos para discutirem e apontarem os itens da matriz, ao final, as informações eram apresentadas e os demais grupos podiam acrescentar algum item que julgassem ausente.

Após a aplicação da matriz Fofa, foram levantadas informações referentes às atividades produtivas dos moradores por meio da construção da Matriz de Prioridades (principais atividades produtivas desempenhadas pelos moradores), em que cada comunidade identificava até cinco atividades e atribuia pontos para cada item, de 1 a 10 pontos, sendo 1 menos importante e 10 mais importante, como forma de identificar quais eram mais ocorrentes e importantes.

Posteriormente, as informações prioritárias foram repassadas para um Plano de Ação Participativo. Nesta fase, os moradores complementavam com respostas às seguintes questões: Qual atividade? Quais as dificuldades? Como fazer? Quem fará (comunidade e parceiros)?

Participaram das reuniões 104 moradores não cooperados. Todos os itens da Matriz Fofa, Matriz de Prioridades e Plano de Ação foram indicados exclusivamente por moradores não cooperados.

Entrevistas Semi-estruturadas

Foram aplicadas entrevistas semi-estruturadas nas seis comunidades. A identificação das famílias não cooperadas foi realizada pela análise das listas de pessoas cooperadas fornecida pela Cooperativa e a lista de moradores do levantamento de famílias da Flona Tapajós, executado em 2014, fornecida pelo ICMBio. O resultado desta análise auxiliou na localização e quantificação dos entrevistados. Foram identificadas 184 famílias não cooperadas nas seis comunidades; a aplicação do questionário objetivou alcançar 100% delas, porém, na época da aplicação, algumas famílias não estavam em suas residências. Das 184 famílias, 125 tiveram um representante entrevistado.

Uma segunda entrevista foi aplicada, composta por 19 questões sobre as atividades produtivas dos moradores; pontos positivos e negativos da cooperativa e comunidade; percepção sobre o processo de ingresso; benefícios comunitários oriundos das atividades da cooperativa e projetos desenvolvidos; avaliação de desempenho e sugestão de melhorias.

As atividades de coleta de dados abordaram as seguintes informações: percepção dos não cooperados sobre a cooperativa, levantamento de atividades produtivas realizadas pelos moradores e construção do Plano de Ação participativo.

Sistematização e análise de dados

A análise dos dados foi de natureza descritiva considerada por Vieira (2002VIEIRA, V. As tipologias, variações e características da pesquisa de marketing. Revista de FAE, Curitiba, v. 5, n. 1, p. 61-70, 2002. ), amplamente utilizada devido à possibilidade de conhecer e interpretar a realidade estudada sem influenciá-la, permitindo ainda a obtenção de informações acerca das crenças, visões, desejos, explicações e opiniões sobre diferentes temas.

Os dados obtidos foram organizados em tabelas no programa Microsoft Excel ® 2010 com intuito de facilitar sua interpretação, assim como a confecção de gráficos que ilustram os resultados quantitativos. Para a sistematização das informações da matriz Fofa, calculou-se a frequência das respostas nas seis comunidades, sendo possível identificar as mais ocorrentes. Esta análise se deu por meio da estatística descritiva.

Resultados e discussão

O número total de 125 entrevistas foram realizadas, atingindo 68% das famílias não cooperadas, considerando as seis comunidades do estudo (Tabela 1).

Tabela 1
Número de famílias entrevistadas não cooperadas por comunidade, na Floresta Nacional do Tapajós, Brasil.

Quanto ao perfil dos participantes da pesquisa, verificou-se que 44% são do sexo masculino e 56% do sexo feminino e a maioria (59%) dos entrevistados está em plena capacidade produtiva.

Com relação ao tempo de permanência na unidade, notou-se que 92% dos moradores residem no local há pelo menos 13 anos. Considerando que a cooperativa está em funcionamento desde 2005, constata-se que grande parte dos moradores entrevistados já residiam na Flona Tapajós quando a cooperativa foi criada e iniciou as atividades de Manejo Florestal Comunitário e Familiar.

Segundo o Plano de Manejo da Flona Tapajós, em levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Florestal (IBDF), em 1975, residiam cerca de 620 famílias, destas, 381 estavam estabelecidas ao longo do Rio Tapajós; 62 assentadas pelo INCRA; 8 famílias ocupantes com direito de permanecer; e 75 recém-chegadas apenas no periodo do levantamento (IBAMA, 2004).

Quanto à origem dos habitantes da unidade, os estudos sócio-antropológicos e o Diagnóstico Rural Participativo constataram que o processo inicial de ocupação foi composto por indígenas, ribeirinhos, migrantes, posseiros, garimpeiros e extrativistas, alguns originários dos estados do Maranhão e Ceará, outros incentivados pela política de ocupação que atigiu a Amazônia. Em 1993, cerca de 71,1% dos chefes de famílias das comunidades ribeirinhas haviam nascido dentro da flona (IBAMA, 2004).

A entrada de novos moradores torna-se um entrave na gestão do território quando se traduz em modificação das práticas produtivas e incentivo das atividades de cunho extensivo (criação de gado, plantio de monocultura em larga escala) em desacordo com as normas do Plano de Manejo e Plano de Utilização. Segundo Diegues (1996DIEGUES, A. C. As populações humanas em áreas naturais protegidas da Mata Atlântica. São Paulo: NUPAUB, 1996. Available at: http://nupaub.fflch.usp.br/biblioteca. Accessed: 02 Jun. 2016.
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), a fragilidade da política nacional, associada ao abandono da população nativa, ocasiona o desaparecimento de conhecimentos seculares sobre os ecossistemas e manejo dos recursos naturais, associado a esse triste cenário, o vazio deixado pelos antigos moradores passa a ter grandes chances de ser ocupado por especuladores, madeireiros e outros agentes degradadores.

Anteriormente a 2012, existiam duas áreas internas à unidade que foram desmembradas, a primeira localizada no Km 92 da BR 163, denominada São Jorge, e a segunda o Município de Aveiro localizado mais ao sul da Flona Tapajós. A cultura pecuarista da Comunidade São Jorge fez crescer a intenção dos moradores em investir na exclusão, o que de fato acabou ocorrendo após inúmeras reuniões. Quase cinco anos após a exclusão, o que se observa nesse local é a crescente compra de lotes pelos grandes produtores de soja, a derrubada da floresta remanescente e a criação de gado. Quanto ao município de Aveiro, muitos alegam o retrocesso no desenvolvimento do município devido ao isolamento e a falta de recurso.

A respeito do conhecimento dos moradores em relação à cooperativa estudada, 74% dos entrevistados afirmaram conhecer a cooperativa, dentre as respostas das atividades desenvolvidas pela entidade, as mais ocorrentes foram: Manejo Florestal Comunitário; Fabricação de móveis; Extrativismo e artesanato (couro ecológico). A percepção dos não cooperados em relação a ela encontra-se na Tabela 2.

Tabela 2
Percepção de não cooperados sobre a Cooperativa Mista da Floresta Nacional do Tapajós, Brasil.

As respostas evidenciaram que, referente aos pontos positivos relacionados à cooperativa (Tabela 2), a geração de emprego para os cooperados (100%), manutenção da estrada de acesso às comunidades (100%) e doação de madeira (100%) foram as mais ocorrentes. Estes resultados corroboram com os benefícios encontrados pelo CIFOR (2007), em estudo do projeto piloto de Manejo Florestal Comunitário PAE Chico Mendes, localizado no município de Xapurí-AC, onde foram elencados como benefícios oriundos da atividade a oferta de emprego e consequente geração de renda, infraestrutura local gerada pelo projeto como aberturas de estrada e sua manutenção, ressaltando-se porém, como objetivo não alcançado, a expansão do número de famílias beneficiadas.

Além disso, Franco e Esteves (2008FRANCO, C. A.; ESTEVES, L. T. Impactos econômicos e ambientais do Manejo Florestal Comunitário no Acre: duas experiências, resultados distintos. In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E SOCIEDADE RURAL, 46. 2008, Rio Branco. Anais [...] Rio Branco: SOBER, 2008. ) relatam que as famílias que praticam o manejo no projeto em Xapurí têm renda média 150,04% superior às famílias que não participam. Para Mohammed e Lee (2015MOHAMMED, H.; LEE, B. W. Role of Cooperatives in Rural Development, the Case of South Nations Nationalities and People Region, Ethiopia. Science Journal of Business and Management, New York, v.3, n.4, p. 102-108, 2015.), em regiões agrícolas, as cooperativas são vistas como uma solução para promover a distribuição de renda, reduzir a pobreza e a vulnerabilidade, e melhorar a qualidade de vida e o bem-estar social.

No nosso estudo, 79% dos entrevistados afirmam ter algum parente ou conhecido cooperado, e observaram melhorias na qualidade de vida destes após o ingresso na cooperativa, envolvendo desde a obtenção de bens como carro, moto, reforma de residência até o apoio na formação dos filhos.

Do total de entrevistados, 67% declararam que suas comunidades já receberam algum benefício da cooperativa, por exemplo, a instalação da movelaria na comunidade Pedreira e atividade de machetaria, doação de combustível, apoio no sistema de abastecimento de água, material para reforma em escolas, barracões, residências e manutenção da estrada. Observa-se que, em alguns casos, a cooperativa cumpre funções do poder público, nesse sentido, ela se torna uma importante instituição no contexto local.

Algumas das oportunidades destacadas pelos entrevistados indicam alternativas e incentivo à participação de famílias não-cooperadas, tais como: oferta de trabalho para os não cooperados (100%); a inclusão de novos membros à cooperativa (100%); capacitação (16%); estabelecimento de parcerias (16%); e o fortalecimento dos não madeireiros (16%) (Quadro 1). Para Põllumäe et al. (2014PÔLLUMÄE, P; KORJUS, H.; KAIMRE, P.; VAHTER, T. Motives and Incentives for Joining Forest Owner Associations in Estonia. Small-scale Forestry, Zurich, v. 13, p. 19-33, 2014.), a cooperação pode ser uma possibilidade para aumentar a provisão de vários benefícios e bens relacionados à floresta. Ferreira e Braga (2004FERREIRA, M. A. M.; BRAGA, M. J. Diversificação e competitividade nas Cooperativas Agropecuárias. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro v.8, p. 33-55, 2004. ) reforçam que as estratégias de diversificação nas cooperativas melhoram o ajuste competitivo, uma vez que a monoatividade pode representar risco dependendo das condições de mercado. Afirmam também que, dentre os fatores externos incentivadores da diversificação, está a satisfação das necessidades expressas pela comunidade de influência da cooperativa.

Espada e Vasconcellos Sobrinho (2015ESPADA, A. L. V.; VASCONCELLOS SOBRINHO, M. Manejo comunitário e governança ambiental para o desenvolvimento local: análise de uma experiência de uso sustentável de floresta na Amazônia. Administração Pública e Gestão Social, Viçosa, v. 7, n. 4, p. 169-177, 2015. ) realizaram estudo de caso envolvendo a cooperativa da Flona Tapajós e afirmam que o manejo madeireiro comunitário não suporta, operacionalmente, envolver todos os moradores, beneficiando-os diretamente. Relacionam essa fragilidade ao dilema de proporcionar aos moradores tradicionais a melhoria de qualidade de vida por meio da promoção de atividades produtivas dos não cooperados, esse incentivo é fomentado com apoio de parte do lucro obtido com a venda de madeira.

Põllumäe et al. (2014PÔLLUMÄE, P; KORJUS, H.; KAIMRE, P.; VAHTER, T. Motives and Incentives for Joining Forest Owner Associations in Estonia. Small-scale Forestry, Zurich, v. 13, p. 19-33, 2014.) afirmam que os membros tendem a ser mais ativos e consistentes nas atividades de manejo florestal do que os não membros, mas alertam para o potencial de cooperação entre os não membros, pois seus planos para o futuro são muito mais direcionados.

O processo de diversificação ainda precisa se fortalecer, sobretudo se considerado que apenas 10% dos entrevistados participam de algum projeto apoiado pela cooperativa; inclui-se nesse âmbito o turismo, encauxados, movelaria e extração de óleos vegetais.

A oficialização de parcerias é considerada por Souza e Vasconcellos Sobrinho (2011SOUZA, U. R.; BRAGA, M. J.; FERREIRA, M. A. M. Fatores Associados à Eficiência Técnica e de Escaladas Cooperativas Agropecuárias Paranaenses. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 49, n. 3, p. 573-598, 2011.) como imprescindível para o bom desempenho de cooperativas, esta articulação político-institucional se daria com diferentes atores regionais, nacionais e internacionais, sem essas iniciativas as cooperativas chegariam à estagnação e ao retrocesso. Medina (2012MEDINA, G. Governança local para Manejo Florestal na Amazônia. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 27, n. 78, p. 68-79, 2012. ) realizou estudo de caso em comunidades na Bolívia, Xapurí - AC, Porto de Moz - PA e no Perú e analisou o sistema de governança de uso dos recursos naturais desenvolvidos pelas comunidades, constatando que as relações estabelecidas com atores externos não devem ser de dependência total, pois estas organizações comunitárias precisam liderar e fortalecer seu desenvolvimento. Entretanto, não nega a contribuição de parcerias, mas prega o equilíbrio das intervenções externas, bem como o protagonismo das comunidades.

As fraquezas indicadas pelos moradores (Tabela 2) referem-se em maior ocorrência à pouca rotatividade dos membros da cooperativa, considerando que, na percepção dos moradores não cooperados, na época de sua criação havia discussões que determinavam a participação de apenas um membro por família como cooperado, além da realização de rodízio entre os participantes. Essas práticas contribuiriam para uma integração maior de moradores tradicionais, além de beneficiar mais famílias.

Os moradores alegam que há burocracia no processo de cooperação e sugerem que o processo tenha mais transparência. Dentre os entrevistados, 45% confirmaram já ter se candidatado a ser cooperado, almejando aumento da geração de renda familiar, não obtendo êxito. Como impedimentos, eles mencionaram a necessidade de participação nas associações, reuniões comunitárias, pagamento de taxas ou mesmo por desinteresse pessoal e não comparecimento na avaliação. Outro item indicado foi a deficiente formação para os cargos da cooperativa e, sobre este tema, Ferreira e Braga (2007FERREIRA, M. A. M.; BRAGA, M. J. Eficiência das Sociedades Cooperativas e de Capital na Indústria de Laticínios. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v. 61, p. 231-244, 2007. ) verificaram em estudo que as cooperativas de laticínios no Brasil apresentam ganhos quanto a sua eficiência técnica em virtude de investimento em capacitações e qualificação de seus gestores. Hansen (2013) pontua que a demanda de madeira e os impactos das mudanças climáticas também afetarão o desenvolvimento das cooperativas florestais, resultando em um maior investimento em novos conhecimentos e habilidades para o manejo florestal.

Dentre as ameaças que podem prejudicar a continuidade da cooperativa, encontram-se a má administração (33%), venda prioritária da madeira (33%) e falta de planejamento conjunto com as comunidades (33%). Segundo Souza, Braga e Ferreira (2011SOUZA, U. R.; BRAGA, M. J.; FERREIRA, M. A. M. Fatores Associados à Eficiência Técnica e de Escaladas Cooperativas Agropecuárias Paranaenses. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 49, n. 3, p. 573-598, 2011.), perdas na eficiência das cooperativas estão relacionadas ao problema do “controle”, ou seja, práticas administrativas inadequadas, estratégias financeiras ineficientes e restrita resposta às oscilações de mercado. Outro fator determinante é em relação às ações da cooperativa; um modelo de avaliação cooperativista, não somente com base em parâmetros econômicos, mas também por indicadores de eficiência político-social que contemplam a participação em assembleias da entidade (PEIXE; PROTIL, 2007PEIXE, J. B.; PROTIL, R. M. Eficiência Econômica e Social das Cooperativas Agroindustriais Paranaenses: Proposta De Um Modelo De Avaliação. Informe GEPEC, Toledo, v. 12, n. 2, p.1-11, 2007. ). Englobar os moradores não cooperados nas discussões, ou mesmo convidando as representações comunitárias, resultaria em processo significativamente mais participativo e amplamente divulgado.

Impactos relacionados à floresta são indicados pelos moradores como ameaça, uma vez que existe receio principalmente em decorrência do desconhecimento das práticas do manejo de impacto reduzido aplicados pela cooperativa. Diante disto, foi relatado que, no segundo semestre de 2015, a cooperativa realizou diversas reuniões nas comunidades da Flona Tapajós explicando o que é o manejo florestal, as técnicas, princípios, unidades de trabalho, recuperação da área explorada, divisão dos lucros, etc.

Em 2009, com a aprovação e publicação dos estudos de identificação e delimitação das Terras Indígenas Munduruku-Takuara e Bragança-Marituba, sobrepostas aos limites da Flona Tapajós, a preocupação com área para manejo florestal comunitário ganhou destaque, pois o Ministério Público Federal recomendou que a atividade não seja realizada no território reivindicado pelos indígenas (PARECER TÉCNICO nº 12/2015/FNT/ICMBio). Desde 2014, as discussões se acirraram em relação à revisão do Plano de Manejo da Unidade de Conservação - UC, pois a reavaliação do zoneamento da Flona poderá disponibilizar outras áreas para o manejo. Atualmente, a cooperativa possui área suficiente para exploração de dois anos, tais fatos explicam porque os moradores indicaram a limitação de área como uma ameaça.

Quando indagados sobre o desempenho da cooperativa, a maioria dos entrevistados (55%) classificou o desempenho dela como bom (Figura 2), no entanto, observa-se a ocorrência de parcela considerável de moradores que não informaram a classificação, e que, segundo esses entrevistados, a justificativa para essa abstenção era em virtude do pouco embasamento em relação à cooperativa. Alguns alegaram que ainda não haviam visitado as instalações, nem acompanhado o processo de exploração, recebendo informações por meio de conversas com vizinhos e parentes, ou ainda, por meio do representante comunitário.

Figura 2
Desempenho da Coomflona segundo os moradores não cooperados na Flona Tapajós, Brasil.

A partir da matriz de prioridade, as atividades foram unificadas e sistematizadas em um Plano de Ação Geral (Quadro 1).

Quadro 1
Atividades produtivas e Plano de Ação Geral de não cooperados da Floresta Nacional do Tapajós, Brasil.

Parte dos moradores recebe recurso de programas sociais de transferência condicionada de renda, como o “Bolsa Família” e “Bolsa Verde”. Além desse recurso, a produção para consumo e venda do excedente tem origem das “roças” (cultivos agrícolas), contribuindo com a renda familiar. Segundo Castro et al. (2009CASTRO, A. P.; FRAXE, T. J. P.; SANTIAGO, J. L.; MATOS, R. B.; PINTO, I. C. Os sistemas agroflorestais como alternativa de sustentabilidade em ecossistemas de várzea no Amazonas. Acta Amazônica, Manaus, v. 39, p. 279-288, 2009.), as “roças” são locais onde, geralmente, são cultivadas espécies anuais durante períodos específicos. No caso das comunidades da Flona Tapajós, a espécie comumente encontrada é a Manihot esculenta Crantz (mandioca), devido ao seu fácil manejo e adaptação em qualquer tipo de ambiente, representando uma cultura alimentar e comercial (HENKEL; AMARAL, 2008HENKEL, K.; AMARAL, I. G. Análise agrossocial da percepção de agricultores familiares sobre sistemas agroflorestais no nordeste do estado do Pará, Brasil. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 3, n. 3, p. 311-327, 2008. ).

Apesar do Brasil ter produzido, em 2007, cerca de 26,0 milhões de toneladas de mandioca principalmente nos Estados do Pará, Bahia, Paraná e Maranhão, um dos principais problemas é a falta de informação sobre os sistemas de produção e acesso aos mercados pelos produtores, desconhecimento que dificulta a concretização da atividade como rentável e geradora de emprego (EMBRAPA, 2009).

É preciso entender os diferentes tipos de vegetação florestal e sua integração com os sistemas agrícolas, porque, se gerenciados ativamente, também são componentes importantes que podem proteger as florestas (MARQUARDT et al., 2018MARQUARDT, K.; PAIN, A.; BARTHOLDSON, O.; RENGIFO, L. R. Forest Dynamics in the Peruvian Amazon: Understanding Processes of Change. Small-scale Forestry, Zurich, v. 18, p. 81-104, 2018. ). Sears et al. (2018SEARS, R. R.; CRONKLETON, P.; VILLANUEVA, F. P.; RUIZ, M. M.; ARCO, M. P. O. Farm-forestry in the Peruvian Amazon and the feasibility of its regulation through forest policy reform. Forest Policy and Economics, v. 87, p. 49-58, 2018.) mostram que os agricultores, incluídos na amostra de seu estudo, concordaram que as espécies madeireiras em seus roçados agrícolas são um recurso valioso para seus meios de subsistência.

Buscando amenizar o gargalo envolvendo a assistência técnica aos moradores da Flona Tapajós, o ICMBio formalizou, em 2016, o Termo de Reciprocidade com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER-Pará), visando apoiar inciativas como a implantação de Sistemas Agroflorestais, práticas para o plantio da mandioca, fruticultura, criação de galinha caipira, ou seja, atividades de acordo com as normas previstas pela legislação ambiental e monitoradas pelo órgão gestor (ICMBio). O apoio às referidas atividades reafirmam o compromisso com o desenvolvido socioambiental e garantem a produção dos comunitários respeitando os acordos e normas vigentes.

O Plantio de frutíferas (muruci, açaí, côco, taperebá, maracujá, goiaba, acerola, banana, cajú, laranja, cupuaçú), a criação de galinha caipira, a produção de mel, a criação de peixe e a produção de farinha foram indicados como atividades que precisam de assistência técnica. Grande parte dessas atividades já é desenvolvida pelos moradores e mostra a relação dos moradores com a produção a partir da terra e dos recursos naturais.

Especificamente em relação à criação de peixe, está em execução o projeto piloto de piscicultura em duas outras comunidades, Pini e Tauarí, visando a instalação de tanques-rede para criação de espécies locais, a fim de se gerar renda e substituir práticas em desacordo com os princípios da unidade de conservação. A expectativa é que a prática poderá servir de unidade demonstrativa para outras comunidades.

Outra iniciativa é o projeto da Agroindústria, idealizado pela cooperativa e aprovado pelo Fundo Dema em 2014. O projeto dispôs de recurso obtido a fundo pedido para reforma de uma antiga casa do mel construída em 2004 localizada na comunidade São Domingos. Este empreendimento contribuirá para geração de emprego e renda, fortalecimento das organizações comunitárias e beneficiará cerca de 70 famílias que produzem a polpa de forma manual.

Os não cooperados destacaram ainda a necessidade de capacitação envolvendo o turismo, artesanato e produção de doces. Além disso, nos últimos anos, a extração do látex, oriundo da Seringueira (Hevea brasiliensis (Willd. ex A. Juss.) Müll. Arg.), entrou em declínio, o que, segundo os moradores, ocorreu principalmente pelo baixo preço pago à borracha. Aliado a isso, a falta de Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) dificulta mais ainda a comercialização da borracha e outros produtos, pois os moradores não conseguem acessar as políticas públicas, principalmente aquelas que tratam de apoio financeiro.

Ressalta-se que as atividades produtivas identificadas nessa pesquisa foram consideradas na elaboração do Plano de Trabalho, anexado ao Termo de Reciprocidade celebrado entre Emater, ICMBio, Coomflona e Federação das Organizações Comunitárias da Flona, que prevê a emissão de 180 DAPs e assistência técnica para as famílias da Flona Tapajós.

Por fim, verificou-se, no Plano de Ação, que os não cooperados reafirmam a importância da cooperativa para este território, sendo esta organização citada em quase todas as atividades como potencial parceira.

Conclusão

O papel da cooperativa para o desenvolvimento das comunidades da unidade de conservação estudada na Floresta Amazônica é de grande importância. A cooperativa é reconhecida pelos moradores não cooperados como uma solução para educação, oportunidade de trabalho, sistema de financiamento e melhoria das atividades produtivas.

Os moradores não cooperados das seis comunidades estudadas reconhecem o apoio que a cooperativa empenha na manutenção de estradas e atendimento de solicitações de apoio pra reformas de escolas e barracões. Alguns moradores sabem da existência do Fundo Comunitário, recurso repassado anualmente pela cooperativa para as comunidades. Porém, muitos desconhecem o funcionamento dela e declaram achar burocrático o processo de seleção, e desaprovam o fato de várias pessoas da mesma famílias serem cooperadas, em detrimento de várias famílias não terem pelo menos um cooperado.

Referente às atividades produtivas, o cultivo da mandioca foi citado em todas as comunidades como ação a ser priorizada, visto que os moradores utilizam a farinha na alimentação e vendem o excedente. A falta de assistência técnica foi bastante ressaltada, o turismo, o látex, o plantio de frutíferas, o artesanato e a criação de galinha caipira encontram-se entre as atividades de destaque, sendo que a cooperativa é vista como potencial parceiro na promoção das atividades produtivas.

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  • 1
    . Os autores agradecem aos moradores que contribuíram com este trabalho; ao ICMBio; e ao PIBIC/FAPESPA/UFOPA, pela concessão da bolsa de iniciação científica da primeira autora.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2018
  • Aceito
    15 Ago 2019
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
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