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Impacto da irrigação suplementar com água salina em um Neossolo do semi-árido1 1 1 Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo, UFRPE. Bolsista CT-Hidro/CNPq

Impact of supplementary irrigation with saline water in a Neossol of the semi-arid

Resumo

Desenvolveu-se estudo em lote de vale aluvial irrigado por microaspersão e cultivado com cenoura (Daucus carota L.), no início da estação chuvosa, onde existe risco de salinização, associado à qualidade das águas subterrâneas utilizadas para irrigação. O desempenho do manejo de irrigação com água salina (CE = 1,38 dS m-1) foi avaliado com base em lavagem parcial de sais, na manutenção de níveis adequados de umidade e de salinidade no perfil. Verificou-se redução da condutividade elétrica no perfil 0-100 cm durante o cultivo, principalmente na zona radicular. Simulação numérica de fluxo e transporte de sais foi, então, realizada, tendo-se reproduzido adequadamente as medições de campo, com relação às tensões do perfil e ao conteúdo de sais. Verificou-se, através de modelagem, que a alternativa de lixiviação incompleta apresentou desempenho adequado, quando comparada com a lixiviação completa, baseada na salinidade da água de irrigação e na tolerância da cultura.

Palavras-chave:
lixiviação incompleta; modelagem numérica; salinidade

Abstract

The present study was conducted in an alluvial valley with potential risk of salinization associated to quality of the available groundwater. The study was carrided out in a plot planted with carrots (Daucus carota L.) using trickle irrigation in the beginning of the rainy season. The performance of the irrigation management using saline water (EC = 1.38 dS m-1) was evaluated based on partial leaching of salts and maintenance of adequate moisture and salt contents in the soil profile. A decrease in the electrical conductivity of soil water was observed in the 0-100 cm depth after irrigation application, especially in the root zone. Numerical simulations of water flow and salt transport in the unsaturated zone were performed. The simulation results reproduced well field measured pressure heads and salt concentrations. It was verified, through modeling, that the alternative of incomplete leaching is adequate when compared with complete leaching, considering both salinity of the irrigation water and crop tolerance to salinity.

Key words:
incomplete leaching; numerical modeling; salinity

INTRODUÇÃO

A região semi-árida nordestina, embora possua alto potencial para agricultura, apresenta regime irregular de chuvas e elevada taxa de evaporação, com vales aluviais, via de regra, apresentando salinidade elevada. O desenvolvimento da irrigação nesses vales, particularmente da agricultura familiar, em geral carente de suporte técnico e grau de capacitação, está associado a um elevado risco de salinização.

A lavagem dos sais do perfil é essencial para o sucesso de culturas sensíveis em áreas com águas marginais, particularmente no semi-árido. Medeiros & Gheyi (1997Medeiros, J.F.; Gheyi, H.R. Manejo do Sistema Solo-água-planta em solos afetados por sais. In: Manejo e controle da salinidade na agricultura irrigada. Congresso Brasileiro de Engenharia Agrícola, 26, 1997, Campina Grande. Anais... Campina Grande: SBEA, 1997. 383p.) recomendam o modelo de Rhoades (1974Rhoades, J.D. Drainage for salinity control. In: van Schilfgaardde, J. (ed.) Drainage for agriculture. Madison: American Society of Agronomy, 1974. p.433-462.) para estimativa da necessidade de lavagem. Tomando-se por referência tais valores, verificações experimentais devem ser conduzidas, ou alternativamente simulações numéricas, que considerem a resposta da cultura à salinidade. Por exemplo, o modelo WAVE (Vanclooster et al.,1994Vanclooster, M.; Viaene, P.; Diels, J.; Christiaens, K. WAVE- a mathematical model for simulating water and agrochemicals in the soil and vadose environment. Reference and user’s manual (release 2.0), Leuven, 1994. 154p.), utilizado por Montenegro et al. (2002Montenegro, S.M.G.L.; Montenegro, A.A. de A.; Mackay, R. Análise estocástica de fluxo e transporte em solos não-saturados para avaliação de salinização. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, Porto Alegre, v.7, n.2, p.17-34, 2002.), permite análise de risco de salinização em solo com lençol freático raso. Neste caso, as águas subterrâneas recebem aportes da drenagem do perfil e a lavagem excessiva pode comprometer a qualidade desses mananciais (Causapé et al., 2004Causapé, J; Quílez, D.; Aragüés, R. Assessment of irrigation and environmental quality at the hydrological basin level II. Salt and nitrate loads in irrigation return flows. Agricultural Water Management, Amsterdam, v.70, p.211-228, 2004.).

Com relação à cultura da cenoura, é grande a carência de estudos sobre os efeitos de estresse salino no seu rendimento, aceitando-se, comumente, a condutividade de 1,00 dS m-1, como salinidade limiar, e o percentual de 14% para a perda de rendimento por aumento unitário de salinidade acima do valor limiar, propostos por Maas & Hoffman (1977Maas, E.V.; Hoffman, G.J. Crop salt tolerance: current assessment. Journal of Irrigation and Drainage Division, New York, v.103, n.1, p.115-134, 1977.).

Ayers & Westcot (1999Ayers, R.S.; Westcot, D.W. A qualidade da água na agricultura. Campina Grande: UFPB, 1999. 153p. Estudos FAO, Irrigação e Drenagem, 29) ressaltam que nos cálculos das necessidades de lixiviação faz-se necessário considerar as precipitações no período, capazes de suprir parte dessas lavagens, permitindo a adoção de lâminas de irrigação inferiores às recomendadas para os períodos de estiagem.

O presente estudo tem por objetivo avaliar o potencial da irrigação suplementar e de frações de lixiviação reduzidas sobre a salinidade do perfil de solo com cultura sensível à salinidade, e sobre a distribuição das tensões e fluxos resultantes, em período correspondente ao início da estação chuvosa.

MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa foi desenvolvida em um lote de área de assentamento em vale aluvial do Riacho Mimoso, pertencente à bacia do Rio Ipanema, em Pernambuco, com coordenadas geográficas 08º 10’ 25" S e 35º 11’ 25" W, e 650 m de altitude. O clima do local é classificado, segundo Köeppen, como BShw’ semi-árido quente, com valores médios anuais de temperatura e umidade relativa do ar de 27 ºC e de 73%, respectivamente, e de precipitação total anual média de 730 mm (CISAGRO, 1990CISAGRO (Companhia Integrada de Serviços Agropecuários). Projeto de Irrigação da Fazenda Nossa Senhora do Rosário, Pesqueira. Recife: CISAGRO, 1990. 120p.). O solo é classificado como Neossolo Flúvico, textura média/ arenosa, moderadamente drenado, em relevo plano (Bastos, 2004Bastos, D.C. de O. Manejo da salinidade em irrigação localizada: análise da alternativa de lixiviação incompleta. Recife: UFRPE, 2004. 92p. Dissertação Mestrado). A área é dotada de estação climatológica automática, pluviômetros manuais e Tanque Classe “A”. Monitorou-se lote de 2235 m2, cultivado com cenoura (Daucus carota L.) irrigada por microaspersão; a fonte de água é de poço Amazonas, vazão de 4,50 m3 h-1, condutividade elétrica média de 1,38 dS m-1, e desvio-padrão de 0,25 dS m-1, com base em registros mensais de janeiro de 2000 a dezembro de 2002. A razão de adsorção de sódio (RAS) da água é inferior a 6 (mmolc L-1)1/2. A vazão do microaspersor era de 43 L h-1, para uma pressão de operação de 150 kPa, gerando intensidade de aplicação média de 3,58 mm h-1, conforme Santiago et al. (2004Santiago, F.S; Montenegro, A.A.de A.; Montenegro, S.M G L. Avaliação de parâmetros hidráulicos e manejo da irrigação por microaspersão em área de assentamento. Engenharia Agrícola, Jaboticabal, v.24, n.3, p.632-643, 2004.).

Segundo Maas & Hoffman (1977Maas, E.V.; Hoffman, G.J. Crop salt tolerance: current assessment. Journal of Irrigation and Drainage Division, New York, v.103, n.1, p.115-134, 1977.), a salinidade limiar da cultura da cenoura é de 1,0 dS m-1. A necessidade de lavagem pode ser estimada aplicando-se o modelo de Rhoades (1974Rhoades, J.D. Drainage for salinity control. In: van Schilfgaardde, J. (ed.) Drainage for agriculture. Madison: American Society of Agronomy, 1974. p.433-462.), dado por:

onde:

CEa - condutividade elétrica da água de irrigação

CEes - condutividade elétrica do extrato saturado, equivalente ao limiar da cultura.

A irrigação foi conduzida em nível diário, considerando-se as leituras de evaporação do Tanque Classe A, e observada a ocorrência de precipitação no período; o coeficiente de tanque (Kp) adotado foi igual a 0,75, conforme Doorembos & Kassam (1979Doorembos, J.; Kassam, A.H. Yield response to water. Rome: FAO , 1979. 197p. FAO Irrigation and Drainage Paper, 33), para as condições locais. Nos dias de chuva, a evapotranspiração do tanque foi posteriormente ajustada ao valor calculado pelo modelo de Penman-Monteith (Allen et al., 1998Allen, R.G.; Pereira, L.S.; Raes, D.; Smith, M. Crop evapotranspiration: Guidelines for computing crop water requirements. Rome: FAO, 1998. 300p. FAO Irrigation and Drainage Paper, 56).

Quatro estágios de desenvolvimento da cultura foram considerados, conforme Doorembos & Kassam (1979Doorembos, J.; Kassam, A.H. Yield response to water. Rome: FAO , 1979. 197p. FAO Irrigation and Drainage Paper, 33), correspondendo o primeiro ao intervalo 10 a 28/02/2003 (Kc = 0,45); o segundo estágio, entre 01 a 30/03/2003 (Kc = 0,75); o terceiro ao intervalo 31/03 a 29/04/2003 (Kc = 1,05); e, finalmente, o quarto estágio, entre 30/04 a 15/05/2003 (Kc = 0,90). Devido à ocorrência de chuvas durante o estágio 1 (69,0 mm), que superaram a demanda hídrica da cultura (42,6 mm), a irrigação teve início apenas a partir do 2º estágio de cultivo.

Tendo em vista que os agricultores locais tendem a aplicar lâminas mais elevadas nos estágios iniciais das culturas e depois reduzi-las, visando economia de energia elétrica, propôsse necessidade (ou fração) de lavagem calculada a partir da Eq. (1) (e igual a 0,38) apenas para os 15 primeiros dias do 2º estágio, deixando-se a cargo do agricultor conduzir o manejo a partir das leituras evaporimétricas. Para os períodos subseqüentes, sugeriu-se suspender as lavagens com a água de irrigação, de modo a considerar o potencial das chuvas em promover as lixiviações.

Visando a se estimar as lâminas drenadas do perfil, utilizouse a equação do balanço hídrico aplicada a um bloco de solo de altura igual à profundidade da zona radicular efetiva, desprezando-se o escoamento superficial, e com a variação de umidade na zona radicular limitada ao teor de capacidade de campo do solo.

Estabeleceu-se uma malha com 12 pontos na área em estudo, de modo a monitorar a salinidade do solo no decorrer do experimento, nas profundidades de 0 - 20 cm, 20 - 40 cm, 40 - 60 cm, 60 - 80 cm e 80 - 100 cm. Em quatro desses pontos, instalaram-se tensiômetros nas mesmas profundidades e cápsulas, para extração de solução do solo. Avaliou-se a densidade global e a curva característica do solo a partir de amostras indeformadas. Os resultados de laboratório foram ajustados ao modelo de van Genuchten (1980van Genuchten, M. Th. A closed form equation for predicting the hydraulic conductivity of unsaturated soils. Soil Science Society of America Journal, Madison, v.44, p.892-898, 1980.), dado por:

onde:

qs e qr são as umidades de saturação e residual, respectivamente, e a e ‘n’ parâmetros. Em uma das estações foram realizados testes com permeâmetro de Guelph, para avaliar os parâmetros da função de Gardner (1958Gardner, W.R. Some steady state solutions of the unsaturated moisture flow equation with application to evaporation from water table. Soil Science, Baltimore, v.85, n.2, p.228-232, 1958.), especificamente a condutividade hidráulica saturada K0 e o parâmetro exponencial ‘a’.

O modelo escolhido para a análise numérica foi o WAVE (Vanclooster et al., 1994Vanclooster, M.; Viaene, P.; Diels, J.; Christiaens, K. WAVE- a mathematical model for simulating water and agrochemicals in the soil and vadose environment. Reference and user’s manual (release 2.0), Leuven, 1994. 154p.), que se baseia na equação de Richards e na equação de convecção-dispersão para a simulação do fluxo de água e transporte de soluto na direção vertical. O modelo considera a extração de água pelas raízes, integrada ao longo da zona radicular, com mais detalhes em Montenegro et al. (2002Montenegro, S.M.G.L.; Montenegro, A.A. de A.; Mackay, R. Análise estocástica de fluxo e transporte em solos não-saturados para avaliação de salinização. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, Porto Alegre, v.7, n.2, p.17-34, 2002.).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os solos são de classe franco a franco-argilo-arenosa, com teores de areia aumentando de 37,05% na superfície, até 55,60% na camada de 60 - 80 cm. Na Tabela 1 estão os parâmetros para os modelos de van Genuchten (1980van Genuchten, M. Th. A closed form equation for predicting the hydraulic conductivity of unsaturated soils. Soil Science Society of America Journal, Madison, v.44, p.892-898, 1980.) e Gardner (1958Gardner, W.R. Some steady state solutions of the unsaturated moisture flow equation with application to evaporation from water table. Soil Science, Baltimore, v.85, n.2, p.228-232, 1958.). As camadas apresentam condutividade hidráulica saturada de alta a muito alta, o que facilita os processos de lixiviação de sais, sendo levemente superiores ao valor encontrado por Santiago et al. (2004Santiago, F.S; Montenegro, A.A.de A.; Montenegro, S.M G L. Avaliação de parâmetros hidráulicos e manejo da irrigação por microaspersão em área de assentamento. Engenharia Agrícola, Jaboticabal, v.24, n.3, p.632-643, 2004.), em perfil aberto em local próximo. Os valores do parâmetro ‘a’ se situam na faixa indicada por Reynolds et al. (1985Reynolds, W.D.; Elrick, A.; Clothier, B.E. The constant head well permeameter: effect of unsaturated flow. Soil Science, Baltimore, v.139, n.2, p.172-180, 1985.) para solos francos. Assumiu-se que a salinidade da água não alterou as propriedades hidráulicas durante o experimento, com base nas faixas de CE e RAS verificadas por Silva et al. (2005Silva, E.F.; Assis Jr., R.N.; Sousa, J.I.G. Efeito da qualidade da água de irrigação sobre atributos hídricos de um Neossolo. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, v.29, n.3, p.389-396, 2005.), em Neossolo no Ceará.

Tabela 1
Parâmetros para a curva característica e função de condutividade hidráulica

Na Figura 1 estão as lâminas de precipitação (P) e irrigação (I) ocorridas na cultura e a de evapotranspiração (ET) pela cenoura, em nível diário. As lâminas de drenagem (LD) foram acumuladas no tempo, resultantes da precipitação e da irrigação. Quando se compara a drenagem real com aquela prevista pelo modelo de Rhoades (1974Rhoades, J.D. Drainage for salinity control. In: van Schilfgaardde, J. (ed.) Drainage for agriculture. Madison: American Society of Agronomy, 1974. p.433-462.), pode-se notar que as lavagens devidas à irrigação foram praticamente suspensas decorridos cerca de 15 dias de iniciada a irrigação. As lavagens subseqüentes deveram-se às chuvas.

Figura 1
Lâminas de precipitação (P), irrigação (I), evapotranspiração (ET) e de drenagem (LD) no experimento com cenoura

Para o manejo adotado, as lavagens promovidas pelas irrigações corresponderam a apenas 24% do total previsto pelo modelo. A condutividade elétrica da água de irrigação esteve abaixo da média histórica, com valor de 1,29 dS m-1. Utilizando-se deste último valor, a necessidade de lavagem seria inferior à previamente calculada, conforme mostrado na Figura 1.

Avaliaram-se os potenciais através de tensiômetros, entre 20/03 e 15/05, não se verificando estresses matriciais significativos, capazes de reduzir a transpiração da cultura ou inibir o seu crescimento. Leituras anteriores a 20/03 não foram analisadas, devido a incertezas no funcionamento dos tensiômetros; entretanto, tendo em vista que se promoveu lavagem por irrigação entre 02 e 15/03, pode-se considerar que não ocorreram estresses hídricos neste intervalo.

Examinando-se os dados de gradiente de potencial total do experimento, o valor médio entre as camadas 60 - 80 cm foi de +1,13, com valores entre +0,77 e +1,38, indicando drenagem aproximadamente gravitacional. Valores de gradiente próximos à unidade tendem a se estabelecer abaixo da zona radicular em solos homogêneos e na ausência de lençol raso, conforme Libardi (2000Libardi, P.L. Propriedades físico-hídricas do solo no estudo do manejo e da conservação do solo e da água. In: Oliveira, T.S.; Assis, R.N.; Romero, R.E.; Silva, J.R.C. Agricultura, sustentabilidade e o semi-árido. Fortaleza: UFC, 2000. p.214-223.). Não se detectou fluxo ascendente na camada de 80 - 100 cm podendo-se descartar, assim, qualquer influência de ascensão capilar.

As lavagens ao longo do perfil reduziram a condutividade elétrica, quando comparados os dias 12/02 (início do cultivo) e 14/05 (final do experimento). A Figura 2 mostra as condutividades elétricas medidas a partir de extratos de pasta, com valores corrigidos para a umidade do solo coletado, e avaliadas em amostras de água coletadas em cápsulas de extração instaladas nas profundidades desejadas. Os desviospadrão estão apresentados em conjunto com os valores médios para a pasta. A Figura 2 também inclui as condutividades elétricas simuladas com o WAVE. Pode-se constatar o adequado desempenho das cápsulas de extração ou extratores, conforme já verificado por Dias et al. (2004Dias, N.S.; Medeiros, J.F.; Gheyi, H.R.; Silva, F.V.; Barros, A.D. Evolução da salinidade em um Argissolo sob cultivo de melão irrigado por gotejamento. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, Campina Grande, v.8, n.2/3, p.240-246, 2004.), em experimento com Argissolo. Nota-se uma tendência de acúmulo de sais na camada 0 -30 cm, provavelmente por efeito da evaporação na superfície do solo.

Figura 2
Condutividades elétricas do perfil medidas e simuladas com o WAVE, no lote experimental

As simulações com o modelo WAVE foram verificadas mediante a comparação entre as tensões matriciais e as condutividades elétricas simuladas e medidas, para um período de 95 dias, ao longo do perfil e se considerando uma discretização numérica vertical de 10 cm. Os parâmetros de solo de maior relevância utilizados são aqueles presentes na Tabela 1, e coeficiente de dispersividade hidrodinâmica de 2 cm s-1, conforme Montenegro et al. (2002Montenegro, S.M.G.L.; Montenegro, A.A. de A.; Mackay, R. Análise estocástica de fluxo e transporte em solos não-saturados para avaliação de salinização. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, Porto Alegre, v.7, n.2, p.17-34, 2002.). Os dados da cultura de índice de área foliar e profundidade das raízes foram de 5 e 40 cm, respectivamente, obtidos da literatura (Hoogland et al., 1981Hoogland, J.C.; Feddes, R.A.; Belmans, C. Root water uptake model depending on soil water pressure head and maximum extraction rate. Acta Horticulturae, Wageningen, v.119, n.1, p.123-131, 1981.; CISAGRO, 1990CISAGRO (Companhia Integrada de Serviços Agropecuários). Projeto de Irrigação da Fazenda Nossa Senhora do Rosário, Pesqueira. Recife: CISAGRO, 1990. 120p.).

Segundo a Figura 2, os valores de condutividade elétrica simulados estão consistentes com os medidos, no início e no final do experimento. Para os potenciais matriciais, entre os compartimentos 1-3, que equivalem às profundidades de 10 - 30 cm, ocorreram algumas discrepâncias devido à maior interferência da superfície e à evaporação do solo e transpiração da cultura. Mesmo assim, observou-se coerência de valores e a manutenção de tendências de umedecimento e secamento. As simulações para os compartimentos 4-6 também exibiram tendência similar às de campo. A Figura 3 apresenta as comparações, para a camada de 10 - 30 cm.

O modelo WAVE foi então utilizado para simular a condição de lixiviação completa, adotando-se o critério de Rhoades (1974Rhoades, J.D. Drainage for salinity control. In: van Schilfgaardde, J. (ed.) Drainage for agriculture. Madison: American Society of Agronomy, 1974. p.433-462.). A distribuição de freqüência de condutividades elétricas, no perfil 0 - 100 cm, é similar àquela referente à lavagem incompleta (Figura 4) porém, na lâmina completa o volume de sais adicionado é maior, incrementando a carga de sais ao lençol freático e, a longo prazo, produzindo aumento na salinidade da água do poço.

CONCLUSÕES

  1. O manejo adotado no início da estação chuvosa, com lâminas de lavagem inferiores a 24% da teórica, promoveu uma lavagem adequada do perfil.

  2. O modelo WAVE, parametrizado a partir de levantamentos físicos e hidráulicos de campo, simulou, adequadamente, a distribuição das tensões e da salinidade do solo.

  3. A lixiviação incompleta gerou distribuição de sais similares à lixiviação teórica, tendo reduzido o consumo hídrico na irrigação, diminuído o transporte de sais para o lençol freático subjacente.

LITERATURA CITADA

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    1 Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo, UFRPE. Bolsista CT-Hidro/CNPq

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    Dez 2005
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