Resumos
Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen, conhecida como ginseng brasileiro, é uma planta extensivamente usada na medicina popular em decorrência de possuir propriedades fitoterápicas. O objetivo deste trabalho foi verificar a presença de β-ecdisona nas raízes e partes aéreas de plantas in vivo e in vitro provenientes de dois acessos (BRA e JB-UFSM) de Pfaffia glomerata através da cromatografia em camada delgada (CCD). Nas plantas in vivo, as manchas cromatográficas demonstraram que a β-ecdisona está presente na raiz e na parte aérea. Os acessos não apresentaram diferenças em relação ao perfil de manchas cromatográficas. A análise em CCD não detectou a presença de β-ecdisona nas plantas cultivadas in vitro.
ginseng brasileiro; CCD; ecdisteróides; controle de qualidade; cultivo in vitro
Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen, known as Brazilian ginseng, is a plant extensively used in folk medicine due to its phytotherapic characteristics. The aim of this study was to evaluate the presence of β-ecdysone in the roots and shoots of in vivo and in vitro cultured plants of two sources (BRA and JB-UFSM) of Pfaffia glomerata using Thin-Layer Chromatography (TLC). For in vivo cultured plants, TLC plates showed that β-ecdysone was present in the roots and shoots. Sources showed no differences concerning TLC plates. TLC analysis did not detect β-ecdysone in the in vitro cultured plants.
Brazilian ginseng; TLC; ecdysteroids; quality control; in vitro culture
Análise de β-ecdisona em plantas in vivo e in vitro de Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen, através da Cromatografia em Camada Delgada
Analysis of β -ecdysone from in vivo and in vitro cultured plants of Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen using Thin-Layer Chromatography
Flores, R.I,* * rejane.flores@terra.com.br; ftnicoloso@yahoo.com ; Cezarotto, V.II; Brondani, D.II; Giacomelli, S.R.II; Nicoloso, F.T.I
ILaboratório de Biotecnologia Vegetal, Centro de Ciências Naturais e Exatas (CCNE), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Avenida Roraima, 1000, Cidade Universitária, Bairro Camobi, CEP: 97105-900, Santa Maria-Brasil
IILaboratório de Análises Químicas e Farmacêuticas (LAQUIFAR), Universidade Regional Integrada (URI), CEP: 98400-000, Rua Assis Brasil, 709, Frederico Westphalen-Brasil. laquifar@fw.uri.br
RESUMO
Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen, conhecida como ginseng brasileiro, é uma planta extensivamente usada na medicina popular em decorrência de possuir propriedades fitoterápicas. O objetivo deste trabalho foi verificar a presença de β-ecdisona nas raízes e partes aéreas de plantas in vivo e in vitro provenientes de dois acessos (BRA e JB-UFSM) de Pfaffia glomerata através da cromatografia em camada delgada (CCD). Nas plantas in vivo, as manchas cromatográficas demonstraram que a β-ecdisona está presente na raiz e na parte aérea. Os acessos não apresentaram diferenças em relação ao perfil de manchas cromatográficas. A análise em CCD não detectou a presença de β-ecdisona nas plantas cultivadas in vitro.
Palavras-chave: ginseng brasileiro, CCD, ecdisteróides, controle de qualidade, cultivo in vitro
ABSTRACT
Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen, known as Brazilian ginseng, is a plant extensively used in folk medicine due to its phytotherapic characteristics. The aim of this study was to evaluate the presence of β-ecdysone in the roots and shoots of in vivo and in vitro cultured plants of two sources (BRA and JB-UFSM) of Pfaffia glomerata using Thin-Layer Chromatography (TLC). For in vivo cultured plants, TLC plates showed that β-ecdysone was present in the roots and shoots. Sources showed no differences concerning TLC plates. TLC analysis did not detect β-ecdysone in the in vitro cultured plants.
Key words: Brazilian ginseng, TLC, ecdysteroids, quality control, in vitro culture
INTRODUÇÃO
Várias indústrias farmacêuticas brasileiras produzem fitoterápicos e suplementos alimentares contendo em sua formulação raízes de Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen (Brasil, 2004). Esta espécie, conhecida popularmente como ginseng brasileiro, apresenta várias propriedades medicinais, destacando-se os efeitos antidepressivos, tônicos e afrodisíacos, além de ser utilizada para o tratamento de diabetes, reumatismo, esgotamento físico e mental, falta de memória e estresse (Magalhães, 2000; Zimmer et al., 2006). Vários compostos foram isolados e identificados a partir das raízes de P. glomerata, como o ácido glomérico, ácido oleanólico, ácido famérico, além de vários ecdisteróides (Shiobara et al., 1993). Nos dias atuais, o ecdisteróide β- ecdisona é utilizado como marcador químico no controle de qualidade da matéria-prima e dos medicamentos produzidos com P. glomerata (Magalhães, 2000; Zimmer et al., 2006).
Em função dos critérios de eficácia, segurança e qualidade exigida para a obtenção do registro de medicamentos fitoterápicos no Ministério da Saúde (Brasil, 2004), diversos ensaios farmacológicos foram conduzidos com P. glomerata, tendo em vista o desenvolvimento e a validação de técnicas necessárias para o controle da qualidade da matéria-prima (Zimmer et al., 2006).
A cromatografia em camada delgada (CCD) é uma das técnicas mais empregadas no controle da qualidade de plantas medicinais devidoà simplicidade, rapidez, praticidade e baixo custo; a grande variedade de combinações entre fases móveis e estacionárias torna a CCD uma técnica extremamente versátil e de grande aplicação (Gil et al., 2005).
Em P. glomerata, a obtenção de perfil cromatográfico de amostras de raízes mostra-se ferramenta valiosa para a identificação, quantificação e avaliação da estabilidade da matéria-prima e ou extratos derivados. Recentemente, Vigo et al. (2004) salientaram a importância da CCD para a padronização farmacognóstica e correta identificação de P. glomerata, possibilitando o controle de qualidade.
Apesar de, nos dias atuais, o metabólito β-ecdisona ser utilizado como produto de referência no controle de qualidade das raízes de P. glomerata, há poucas pesquisas referentes à presença deste composto em outros órgãos da planta, tampouco em relação à presença do mesmo em plantas in vitro. Estes estudos fornecerão novas informações à indústria farmacêutica, além de contribuir para um melhor entendimento do papel fisiológico dos ecdisteróides nas plantas. Neste contexto, o objetivo deste estudo foi verificar a presença de β-ecdisona nas raízes e partes aéreas de plantas in vivo e in vitro, oriundas de dois acessos de P. glomerata, através da cromatografia em camada delgada.
MATERIAL E MÉTODO
Utilizaram-se dois acessos (BRA e JB-UFSM) de P. glomerata (Spreng.) Pedersen, sendo o acesso BRA coletado no município de Querência do Norte, PR e o acesso JB-UFSM coletado no Jardim Botânico da UFSM, Santa Maria, RS. Uma exsicata desta espécie encontra-se depositada no Herbário do Departamento de Biologia da UFSM (SMDB 7606).
Segmentos nodais (1 cm) de ambos os acessos foram desinfestados e cultivados em meio MS (Murashige & Skoog, 1962), suplementado com sacarose (30 g L-1), mio-inositol (100 mg L-1) e ágar (6 g L-1) (Nicoloso et al., 2001). O pH foi ajustado para 5,9. As plantas foram cultivadas em sala de crescimento com temperatura de 25 ± 2ºC, 16 horas de fotoperíodo e 35 mM m-2 s-1 de luminosidade. Após 30 dias de cultivo, as plantas foram aclimatizadas e transferidas para condições de cultivo em solo, no município de São Pedro do Sul, RS, Brasil.
A presença da β-ecdisona (Figura 1) foi analisada nas raízes e partes aéreas das plantas in vitro(30 dias de idade), bem como, nas plantas transferidas para o campo (in vivo), as quais foram coletadas, durante a primavera, dois anos após o plantio no solo. O material vegetal foi seco em estufa a 50ºC (Simões et al., 2001) e triturado em gral. As amostras (200 mg) foram extraídas com metanol (2 vezes, 5 mL) em banho ultra-sônico, durante 20 minutos. O sobrenadante foi removido após centrifugação a 1000 g durante 10 minutos e os extratos obtidos das duas extrações foram combinados (10 mL) (Flores, 2006).
Foram aplicados 15 L das amostras e do padrão da β-ecdisona, com auxílio de capilar graduado, em cromatofolhas de alumínio (AL TLC Silicagel 60 F254, Merck, 20 x 20 cm). O sistema foi mantido em câmara de saturação com os eluentes: n-butanol, acetato de etila, ácido fórmico e água (4:1:0,6:0,5). A visualização das manchas foi efetuada por exposição à luz UV a 254 nm e a revelação com vanilina sulfúrica, em capela, com posterior aquecimento em estufa até o aparecimento de cores na placa. O método cromatográfico utilizado seguiu a metodologia proposta por Vigo et al. (2004) para esta espécie.
As placas foram confeccionadas em triplicata e documentadas por fotografia digital. A presença de β-ecdisona na placa cromatográfica foi realizada pela comparação dos Fatores de Retenção (Rfs) das manchas das amostras com o do padrão β-ecdisona adquirido da ChromaDex Inc. (Califórnia, U.S.A.). A solução de β-ecdisona foi preparada em metanol a 25 mg mL-1. Realizou-se a co-cromatografia para confirmar a identificação da β-ecdisona.
RESULTADO E DISCUSSÃO
As análises cromatográficas das amostras das plantas in vivo dos acessos de P. glomerata (Spreng) Pedersen mostraram a presença de β-ecdisona tanto nas raízes como na parte aérea das plantas. A mancha correspondente à β-ecdisona apresentou Rf=0,7 e coloração esverdeada, o que a diferenciou das demais manchas observadas na placa cromatográfica.
Recentemente, devido à importância das raízes do ginseng brasileiro para a fabricação de fitoterápicos, a presença e o doseamento de β-ecdisona vêm sendo muito estudados (Flores, 2006), porém as pesquisas estão limitadas ao sistema radicular da planta (Magalhães, 2000; Vigo et al., 2004). Contudo, os resultados obtidos neste estudo mostraram que a parte aérea de P. glomerata também contém β-ecdisona, além de vários outros metabólitos, cujas manchas não foram detectadas nas raízes (Figuras 2A, 1B, 1E e 1F). De fato, várias pesquisas vêm demonstrando que os fitoecdisteróides podem ser biossintetizados e/ou acumulados em diferentes órgãos das plantas. Em Pfaffia iresinoides, estudos sobre o teor órgão-específico de ecdisteróides mostraram que a β-ecdisona estava presente tanto nas raízes como no caule e folhas desta espécie (Nishimoto et al., 1987), o que concorda com os resultados obtidos neste estudo.
Por outro lado, manchas correspondentes à β-ecdisona não foram detectadas nos extratos metanólicos das raízes e partes aéreas das plantas in vitro, em ambos os acessos estudados (Figuras 2C, 1D, 1G e 1H). Apesar de estas amostras apresentarem manchas com Rf muito similar àquele do padrão de β-ecdisona (Figura 2P), a co-cromatografia mostrou que as manchas detectadas nas plantas in vitro não se tratavam da β-ecdisona, pois aquelas apresentavam coloração diferente quando comparada à mancha da β-ecdisona. Ao contrário, estudos conduzidos com plantas in vitro Ajuga evidenciaram um alto teor de fitoecdisteróides (Tomás et al., 1993). Contudo, é importante salientar que é muito difícil comparar a produção de determinado metabólito produzido a partir de células e/ou tecidos in vitro, com aqueles produzidos nos tecidos de plantas completas, cultivadas a campo. Neste estudo, a não detecção da β-ecdisona nas plantas in vitro pode ser devido a pouca diferenciação dos tecidos e órgãos, além do reduzido tempo de cultivo in vitro (30 dias), quando comparado às plantas cultivadas a campo, as quais apresentavam dois anos de idade. A diferenciação dos tecidos, a idade da planta e as condições do meio ambiente são importantes fatores que afetam a produção de metabólitos secundários.
Constatou-se que os perfis cromatográficos das amostras in vivo e in vitro do acesso JB-UFSM (Figuras 2A, 1B, 1C, 1D) foram similares as do acesso BRA (Figuras 2E, 1F, 1G, 1H). Estes resultados demonstram que, apesar da P. glomerata apresentar grande variabilidade genética e morfológica (Magalhães, 2000), os acessos estudados neste trabalho não apresentaram diferenças marcantes em relação à composição química. O padrão geral das manchas, bem como o Rf e a coloração da mancha correspondente à β-ecdisona obtidos neste estudo, com as plantas in vivo, foram similares aos encontrados por Vigo et al. (2004), em amostras de raízes de P. glomerata.
Apesar de a β-ecdisona não ter sido detectada nas amostras in vitro, a comparação dos perfis cromatográficos das partes aéreas das plantas in vivo e in vitro, mostrou que as últimas apresentam um maior número de manchas (Figuras 2D, 2H) quando comparado às plantas coletadas a campo (in vivo) (Figuras 2B, 2F). Várias pesquisas têm mostrado que as condições impostas durante o cultivo in vitro podem influenciar na biossíntese e/ou acúmulo de diferentes metabólitos, inclusive de ecdisteróides (Tomás et al., 1993).
O sistema cromatográfico adotado neste estudo mostrou-se como uma alternativa viável para a detecção rápida de â-ecdisona em amostras de ginseng brasileiro. A obtenção de um perfil cromatográfico de amostras de raízes de diferentes acessos de P. glomerata mostra-se útil para o controle da qualidade da matéria-prima, principalmente na avaliação da estabilidade das drogas ou extratos derivados. Além disso, Vigo et al. (2004) ressaltaram a importância da CCD na avaliação da pureza e da autenticidade de diferentes drogas comercializadas como sendo provenientes de raízes P. glomerata.
Apesar de a CCD ser uma ferramenta muito útil para a identificação rápida de compostos de interesse em uma amostra, neste estudo, esta técnica mostrou-se pouco sensível para a análise de β-ecdisona em amostras de plantas cultivadas in vitro. A metodologia de CCD adotada mostrou-se adequada apenas para a detecção de β-ecdisona quando em concentração igual ou superior a 25 mg mL-1. Desta forma, a não visualização da mancha referente à β-ecdisona nas plantas in vitro pode ser devido a ausência do composto no material, pela presença da Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo auxílio financeiro e a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Brasília, DF, Brasil) pelo fornecimento do acesso BRA de Pfaffia glomerata.
CONCLUSÃO
Os resultados permitiram concluir que: a) a CCD é técnica viável para a detecção de β-ecdisona nas raízes e partes aéreas de plantas in vivo de P. glomerata; b) os acessos BRA e JB-UFSM não apresentam diferenças marcantes em relação ao perfil de bandas cromatográficas e c) a análise em CCD não detecta β-ecdisona em plantas in vitro.
AGRADECIMENTO
Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo auxílio financeiro e a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Brasília, DF, Brasil) pelo fornecimento do acesso BRA de Pfaffia glomerata.
Recebido para publicação em 07/08/2008
Aceito para publicação em 09/03/2009
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
02 Mar 2011 -
Data do Fascículo
2009
Histórico
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Aceito
09 Mar 2009 -
Recebido
07 Ago 2008