Acessibilidade / Reportar erro

Escolas, professores e caipiras: exercício para um descentramento histórico

Resumos

Com a intenção de constituir um cenário histórico para a formação e atuação de professores no interior do estado de São Paulo, este artigo esboça o que chamamos de Educação (Matemática) "caipira", aproveitando uma adjetivação já consagrada pela Sociologia. O termo "descentramento", emprestado de Hall (2004), serve, aqui, para intensificar uma característica deste estudo, a saber, a pretensão de dissociar-se das abordagens mais freqüentes, tanto na História da Educação quanto na História da Educação Matemática, que tomam como ponto de partida os grandes centros e as instituições formadoras "clássicas" (como as Faculdades de Filosofia), negligenciando uma pluralidade de aspectos que, segundo cremos, é essencial para se compreender, mais ampla e globalmente, certas práticas educativas. Para efetivar tal intenção, partimos de uma caracterização do sistema educacional rural para, em seguida, situar o movimento de ampliação do ensino secundário, cuja ênfase determinante ocorre na década de 1950 com a construção de escolas e a necessidade de formar professores que nelas atuassem. Embora focando, nesses dois aspectos, a região de Bauru (SP), percebe-se que as compreensões que daí surgem podem caracterizar outros contextos. Finalmente, discutimos a Nova Alta Paulista, região de colonização mais recente, com o que se configura um movimento de intercâmbio entre, de um lado, as regiões mais velhas do estado e suas instituições já bem estabelecidas e, por outro, as regiões "novas", com o que uma espécie da ampliação do conceito de colonização, agora aplicada ao contexto educacional, pode ser vislumbrada.

Formação de professores; Escola rural; Descentramento; História


With the purpose of drawing a historical picture of the education and action of teachers in the State of São Paulo countryside, this article sketches what we have called a "rustic" (Mathematical) Education, making use of an adjective already in use in Sociology. The term 'decentering', borrowed from Hall (2004), is used here to intensify a feature of the present study, namely, its intention of freeing itself from the more usual approaches, both in the History of Education and in the History of Mathematical Education, which take as their point of departure the big centers and 'classical' institutes of education (for instance, the Faculties of Philosophy), neglecting a plurality of aspects that, we believe, are essential to understand more widely and globally certain educational practices. To realize such intention we start from a characterization of the rural education system, and then situate the movement of expansion of the secondary education, whose apex takes place in the 1950s with the construction of schools and the need to train teachers to work in them. Although the region around Bauru (SP) is the focus here, it can be seen that the understanding emerged here can characterize other contexts. Finally, we discuss the Nova Alta Paulista, a region of more recent occupation, thereby configuring a movement of exchange between the State's older regions on one side, with their well-established institutions, and the 'new' regions on the other, allowing a glimpse of a kind of extended concept of colonization, now applied to the educational context.

Teacher education; Rural school; Decentering; History


EM FOCO: EDUCAÇÃO MATEMÁTICA EM PERSPECTIVA

Escolas, professores e caipiras: exercício para um descentramento histórico

Schools, teachers and rustics: exercise for a historical decentering

Antonio Vicente Marafioti Garnica

Universidade Estadual Paulista (UNESP-Bauru)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Antonio Vicente M. Garnica Departamento de Matemática Faculdade de Ciências – UNESP Avenida Luis E. C. Coube, s/n. 17033-360 – Bauru – SP e-mail: vgarnica@travelnet.com.br

RESUMO

Com a intenção de constituir um cenário histórico para a formação e atuação de professores no interior do estado de São Paulo, este artigo esboça o que chamamos de Educação (Matemática) "caipira", aproveitando uma adjetivação já consagrada pela Sociologia. O termo "descentramento", emprestado de Hall (2004), serve, aqui, para intensificar uma característica deste estudo, a saber, a pretensão de dissociar-se das abordagens mais freqüentes, tanto na História da Educação quanto na História da Educação Matemática, que tomam como ponto de partida os grandes centros e as instituições formadoras "clássicas" (como as Faculdades de Filosofia), negligenciando uma pluralidade de aspectos que, segundo cremos, é essencial para se compreender, mais ampla e globalmente, certas práticas educativas. Para efetivar tal intenção, partimos de uma caracterização do sistema educacional rural para, em seguida, situar o movimento de ampliação do ensino secundário, cuja ênfase determinante ocorre na década de 1950 com a construção de escolas e a necessidade de formar professores que nelas atuassem. Embora focando, nesses dois aspectos, a região de Bauru (SP), percebe-se que as compreensões que daí surgem podem caracterizar outros contextos. Finalmente, discutimos a Nova Alta Paulista, região de colonização mais recente, com o que se configura um movimento de intercâmbio entre, de um lado, as regiões mais velhas do estado e suas instituições já bem estabelecidas e, por outro, as regiões "novas", com o que uma espécie da ampliação do conceito de colonização, agora aplicada ao contexto educacional, pode ser vislumbrada.

Palavras-chave: Formação de professores — Escola rural — Descentramento — História.

ABSTRACT

With the purpose of drawing a historical picture of the education and action of teachers in the State of São Paulo countryside, this article sketches what we have called a "rustic" (Mathematical) Education, making use of an adjective already in use in Sociology. The term 'decentering', borrowed from Hall (2004), is used here to intensify a feature of the present study, namely, its intention of freeing itself from the more usual approaches, both in the History of Education and in the History of Mathematical Education, which take as their point of departure the big centers and 'classical' institutes of education (for instance, the Faculties of Philosophy), neglecting a plurality of aspects that, we believe, are essential to understand more widely and globally certain educational practices. To realize such intention we start from a characterization of the rural education system, and then situate the movement of expansion of the secondary education, whose apex takes place in the 1950s with the construction of schools and the need to train teachers to work in them. Although the region around Bauru (SP) is the focus here, it can be seen that the understanding emerged here can characterize other contexts. Finally, we discuss the Nova Alta Paulista, a region of more recent occupation, thereby configuring a movement of exchange between the State's older regions on one side, with their well-established institutions, and the 'new' regions on the other, allowing a glimpse of a kind of extended concept of colonization, now applied to the educational context.

Keywords: Teacher education — Rural school — Decentering — History.

Intenções, referências, método

A intenção deste artigo é iniciar uma discussão acerca da necessidade de um descen-tramento nos estudos históricos sobre a formação de professores e, especificamente, a formação de professores de matemática. Considera-se que, quando tratado do ponto de vista historicamente hegemônico, o tema tende a centrar-se nas faculdades de Filosofia, desconsiderando outras trajetórias como, por exemplo, aquelas dos professores atuantes em cidades distantes de grandes centros. Este estudo, por ser desenvolvido considerando-se o estado de São Paulo, é marcado pela figura do caipira — considerado ora como elemento sociológico de características relativamente plenas, ora como nomeação atribuída mais genericamente aos habitantes do interior paulista — e apresentado em três blocos distintos. O primeiro deles trata da formação e atuação de professores de escolas rurais; o segundo aborda mais especificamente o momento de expansão das escolas secundárias; o terceiro, as práticas dos professores da última região do estado a ser (re)colonizada pelo homem branco: o Extremo-Oeste. Embora utilizando fontes várias, as referências fundamentais para este estudo são os trabalhos de Maria Ednéia Martins (Martins, 2003), Ivani Pereira Galetti (Galetti, 2004) e Ivete Maria Baraldi (Baraldi, 2003) — respectivamente desenvolvidos como projeto de iniciação científica, mestrado e doutorado —, sem os quais este texto seria impossível. As três pesquisadoras, em seus trabalhos, optam pela metodologia da História Oral e pretendem contribuir, junto a outros trabalhos de um mesmo grupo de pesquisa, para o mapea-mento da formação de professores no Brasil, projeto de amplo espectro que se encontra em sua fase inicial.

Embora assumindo-se como inscrito na tendência atualmente conhecida por História da Educação Matemática, este artigo trata apenas de modo incidental do professor "de matemática", sua formação e suas práticas. Tal opção é consciente e plasmada na constatação de que, quando focada em primeiro plano, essa adjetivação específica dilui as diferenciações que pretendemos ressaltar para, a partir delas, argumentar em favor do descentramento acima aventado.

Caipiras, professores e escolas rurais

Beira-corgo, brocoió, bronco, capa-bode, casca-grossa, jeca, macaqueiro, mateiro, matuto, mandioqueiro, mocorongo, pé-no-chão, queijeiro, roceiro, sertanejo, sitiano: caipira.

No texto já clássico de Antonio Candido, "rústico" exprimirá

um tipo social e cultural indicando o que é, no Brasil, o universo das culturas tradicionais do homem do campo; as que resultaram do ajustamento do colonizador português ao Novo Mundo, seja por transferência e modificação dos traços da cultura original, seja em virtude do contato com o aborígine [...]. (2001, p. 26)

e será tomado, por aproximação, à expressão "cultura camponesa". No caso brasileiro, continua Antonio Candido, "rústico" poderia ser tomado como "caboclo", embora em sua obra fique este termo reservado para designar o mestiço, seja ele próximo ou remoto, de branco e índio. "Para designar os aspectos culturais usa-se aqui caipira, que tem a vantagem de não ser ambíguo (exprimindo desde sempre um modo de ser, um tipo de vida, nunca um tipo racial) e a desvantagem de restringir-se quase apenas, pelo uso inveterado, à área de influência histórica paulista" (p. 28).

Considerando que a história ocupa-se freqüentemente do que é documentado e que a documentação, via de regra, refere-se à vida das camadas dominantes, dois foram os recursos principais para a elaboração de Os parceiros do Rio Bonito: documentos de viajantes dos séculos XVIII e XIX que traziam indícios sobre o homem da roça, e longas conversas com "velhos caipiras de lugares isolados, a fim de alcançar por meio deles como era o ‘tempo dos antigos’" (Candido, 2001, p. 23). Combinando orientações de sociólogo, antropólogo e historiador, Antonio Candido busca compreender os problemas que afligem o caipira tomando como apoio o problema elementar da subsistência, traduzido pelo estudo dos meios de vida, do equilíbrio entre as necessidades de um grupo social e seus recursos, estejam eles disponíveis ou sejam eles possíveis:

as necessidades têm um duplo caráter natural e social, pois se sua manifestação primária são impulsos orgânicos, a satisfação destes se dá por meio de iniciativas humanas, que vão-se complicando cada vez mais, e dependem do grupo para se configurar. Daí as próprias necessidades se complicarem e perderem em parte o caráter estritamente natural, para se tornarem produtos da sociedade. De tal modo podermos dizer que as sociedades se caracterizam, antes de mais nada, pela natureza das necessidades de seus grupos, e os recursos de que dispõem para satisfazê-las. (Candido, 2001, p. 29)

Texto que visa a "descrever um processo e uma realidade humana, característicos do fenômeno geral da urbanização no estado de São Paulo" (p. 13) e cujo desejo do autor — embora ele próprio afirme que algumas de suas partes poderiam ser encorpadas e melhoradas — era de que seu tópico de conclusão servisse como introdução ao estudo da reforma agrária, Os parceiros do Rio Bonito dedica pouquíssima atenção à escolarização do caipira, ainda que o estudo já estivesse em curso desde 1947, tendo sido finalizado em 1954 e publicado em meados de 1964, o que abarca um longo período de mais de quinze anos, durante os quais, para a escola rural, transcorreu um tempo de vitalidade até um momento de relativo esgotamento.

Desde pequenos os filhos acompanham os pais, familiarizando-se de maneira informal com a experiência destes: técnicas agrícolas e artesanais, trato dos animais, conhecimentos empíricos de vária espécie, tradições, contos, código moral. No grupo estudado, eram quase todos analfabetos, homens e mulheres. Apenas um morador enviou o filho durante dois anos à escola rural, situada a cerca de meia légua; mas retirou-o, em seguida, por achar que, sabendo mais ou menos ler e escrever, já não havia razão para deixar de auxiliá-lo no trabalho. Ainda agora, portanto, a família é para todos a única instituição educativa, e certos pais vêem com desconfiança a alfabetização que os separa muito dos filhos, transformando-os em letrados. Segundo um morador, a filha que aprende rudimentos de leitura e escrita com a senhora de um fazendeiro já estava muito adiante dele, porque "sabia ver as letras". E ela própria alegava não ter necessidade de mais instrução, pois já sabia escrever o seu nome e o dos pais. (Candido, 2001, p. 314-315)

Ainda que outras fontes concordem acerca do grande número de analfabetos no campo e o baixíssimo nível de escolaridade da população rural, este único parágrafo referente à escolarização no texto de Antonio Candido vem qualificar essa situação — como fazem outros textos e outros teóricos — ao possibilitar uma leitura tendencialmente negativa em relação à importância que o caipira atribuía à educação formal, uma leitura até hoje entranhada em certas concepções que permitem à História da Educação (e diremos mais especificamente à História da Educação Matemática) centrar seu foco nos grandes centros e suas instituições formadoras. "O caipira tem pouco estudo", ideologicamente, passa a significar: "O caipira escolhe ter pouco estudo". Em uma série de artigos sobre o ensino rural em São Paulo na Primeira República, Zeila Demartini afirma que a necessidade de escolarização sentida pelo caipira sempre esteve ligada à possibilidade de superação das condições de vida, uma vez que a esta escolarização eram atribuídas possibilidades de melhoria e, fundamentalmente, "a possibilidade de superação da própria condição de agricultor". Tal luta pela escolarização antecede, "no estado de São Paulo, a expansão dos processos de urbanização e industrialização" e as aspirações dessas comunidades rurais têm sido deixadas em segundo plano pelo estado "(...) ficando à mercê dos interesses políticos e econômicos locais. Por outro lado", continua a autora, "justifica-se (mesmo entre sociólogos de renome) a baixa escolarização que esta população apresenta como resultado de seu desinteresse pelo estudo, o que nossos estudos empíricos têm desmentido" (Demartini, 1988, p. 36).

O caipira atarracado, alijado do sistema produtivo moderno, carecia de regeneração moral, de "sustância" cultural, muito embora, acompanhando a implantação do sistema da rede educacional em São Paulo no primeiro período republicano, possamos detectar que "se os ideais republicanos eram amplos e dirigidos a toda a população, a política educacional adotada naquele período foi a de atendimento restrito e preferencial às populações urbanas, em detrimento das residentes em áreas rurais as quais, embora majoritárias, eram justamente aquelas consideradas, à época, como as mais avessas à educação escolar" (Demartini, 1989, p. 5). Note-se a matriz ideológica desse discurso na documentação oficial:

A educação do caboclo e dos seus filhos é, a nosso ver, muito mais difícil e complexa do que a do imigrante. O caboclo, inteiramente avesso à escola, não comprehende a vantagem della para si nem para seus filhos (...),não tem aspirações nem conforto de espécie alguma; tira dos elementos da natureza, com grande facilidade, tudo o que é necessário à sua pouca subsistência, o que o torna desambicioso (...) As escolas que se destinarem aos caboclos e a seus filhos, afim de preencherem seus fins, precisam ter uma organização toda especial. Seu escopo não será o trato do livro, mas sua regeneração moral, o levantamento de suas forças, o desenvolvimento de qualidades latentes, que elle as tem, mas sopitadas pelo descaso e abandono em que tem vivido; devem ter uma função profundamente regeneradora. (Annuario do Ensino de São Paulo, 1917 cf. Demartini, 1989, p. 12)

Tanto quanto os trabalhos de Zeila Demartini e seu grupo em relação à Primeira República, nossos estudos sobre a escola rural apontam o modo perverso com que essa regeneração — julgada necessária devido à impermeabilidade do caipira em relação à escola — foi implementada.

O estudo de Martins (2003), focando a formação e atuação dos professores e alunos de escolas rurais entre as décadas de 1950 e 1960 (décadas que antecedem o êxodo rural que no estado de São Paulo começa a ocorrer mais intensamente a partir dos anos 1970), mostra que pouca coisa alterou-se nesse quadro. Malgrado o grande interesse e atenção com que as comunidades rurais viam a possibilidade e a necessidade de educação formal, as escolas rurais seguiam o critério de manter o oferecimento de classes até o "terceiro ano", impedindo as crianças da roça de terminarem o curso primário. Somente os grupos escolares, geralmente instalados nas cidades, ofereciam ensino até o "quarto ano". Obrigadas a trabalhar para auxiliar no orçamento familiar, era comum, nessa fase, que as crianças abandonassem os estudos. Ao discurso da igualdade de oportunidades — intensamente proclamado por professores e pela política educacional como uma totalidade — não se articulavam, como se pode claramente perceber, esforços para a igualdade de condições:

O projeto social daqueles que denunciam as desigualdades é um projeto de moralização da sociedade capitalista: é um projeto reformista que se apresenta como um projeto progressista mas está, desde o início, condenado à impotência. (...) A idéia de desigualdade de oportunidades escolares é a expressão direta da ideologia meritocrática que assim se pode resumir: uma sociedade justa é uma sociedade que dá, a todos os seus filhos, oportunidades iguais — desde o ponto de partida. No ponto de chegada, pois bem, que ganhem os melhores! (E azar dos vencidos). Essa forma ideológica está profundamente enraizada no aparelho escolar e no "igualitarismo pequeno-burguês". (...) Ao enfatizar a desigualdade de oportunidades, a idéia meritocrática desvia a atenção do que é essencial: as diferenças estruturais de condição, tais como resultam da estrutura de classe. (...) Ou a igualdade de oportunidades traz consigo a igualdade de condições; ou então — o que é muito mais provável — a desigualdade de condições, a curto prazo, leva à desigualdade de oportunidades. (Bertaux, 1979, p. 44-45)

O professor que atuava nas escolas rurais era formado em Escolas Normais e nenhum tratamento específico — relativo aos hábitos, experiências, clientela da zona rural — lhe era facultado durante essa formação. Aliadas a essa formação lacunar devem ser consideradas as dificuldades naturais enfrentadas por esses professores. Habituados à vida urbana — ainda que em cidades pequenas — eram precocemente levados a morar em sítios e fazendas, muitas vezes necessitando do amparo dos proprietários rurais,1 1 . Essa disposiçào dos fazendeiros, muitas vezes divulgada como "de boa vontade", escamoteava interesses políticos variados como a necessidade de fixar os colonos para a formação de currais eleitorais e a valorização da propriedade, práticas também comuns ao coronelismo da Primeira República (Demartini, 1989a). convivendo com as dificuldades de locomoção e falta de materiais didáticos. Além dessas dificuldades, a extrema vigilância dos inspetores de ensino (que, restringindo-se a uma posição de controle técnico, aplicavam as provas finais aos alunos e faziam visitas-surpresa para verificação dos diários de classe) e a falta de apoio pedagógico eram suportadas visando a uma posição futura num grupo escolar. Trazendo em seus depoimentos uma visão idílica do camponês dócil, com seus hábitos saudáveis e seu modo de ser autêntico e natural — um bom selvagem — o professor da escola rural, saudoso e ávido pela urbanidade, fazia do campo uma "terra de passagem" (Martins, 2003), deixando gravados, nessa sua curta permanência, rastros que apontavam vivamente para a distinção entre a posição de conforto das cidades em relação à vida difícil do campo. Seus depoimentos nos permitem compreender que o discurso da modernização, do bem-estar e do acesso aos bens de consumo, por eles tão árdua e amplamente divulgado, atuava no sentido de favorecer o desligamento do caipira de suas raízes, sendo um dos elementos propulsores do êxodo rural. O que se ensinava no sítio — dizem com orgulho os antigos professores — era tal e qual o que se ensinava na cidade, julgando fundamental essa educação para que o caboclo pudesse ingressar na vida urbana quando abandonasse o campo; um abandono que ocorreria mais cedo ou mais tarde devido às precárias condições da vida campesina, condições essas sempre ressaltadas, direta ou indiretamente, pelos professores aos seus alunos. Fincando a redenção de uma vida de negatividades na possibilidade de abandonar o campo, os professores — tanto quanto alguns discursos oficiais da época — confundem urbanização e êxodo rural: "O caipira é condenado à urbanização, e todo esforço de uma política rural baseada cientificamente (...) deve ser justamente no sentido de urbanizá-lo, o que, note-se bem, é diferente de trazê-lo para a cidade" (Candido, 2001, p. 282).

Essas reflexões vêm do trabalho de Maria Ednéia Martins (Martins, 2003) e foram possíveis a partir da coleta e análise de depoimentos orais de onze professores, cinco alunos e um inspetor de ensino, abarcando um cenário geográfico de amplo espectro por onde circularam esses atores, envolvendo os municípios de Álvaro de Carvalho, Agudos, Arara-quara, Arealva, Areiópolis, Avaí, Bauru, Bernar-dino de Campos, Cafelândia, Duartina, Cabrália Paulista, Echaporã, Gália, Iacanga, Lins, Martinópolis, Mineiros do Tietê, Nova Guataporanga, Ouro Verde, Pederneiras, Piratininga, Pompéia, Presidente Alves, Presidente Prudente, Reginópolis, Ribeirão Grande, Rinópolis, Santa Cruz do Rio Pardo, Santo Anastácio, Tibiriçá, Timburí e Uru, todos municípios do estado de São Paulo. Coincidem — e sob certos aspectos ampliam e aprofundam — com considerações de estudos anteriores acerca dessa formação do caipira em suas escolas rurais e permitem, ainda, compreender aspectos que transcendem a escolaridade no campo, que nos possibilita lançar olhares para certos estrangulamentos do sistema educacional — em específico aqueles relativos à formação de professores — como um todo.

Quanto à relação entre escola, família e comunidade, o estudo de Martins mostra que não raro a própria comunidade tomava para si a responsabilidade de construir as escolas, não se submetendo simplesmente às condições dadas, mas desenvolvendo certas estratégias para garantir acesso ao saber escolar, tentando ultrapassar a precariedade do sistema oferecido pelo Estado, embora tais iniciativas, como efeito colateral indesejado, colaborassem para a isenção de responsabilidade, pelos poderes públicos, no que diz respeito à manutenção e desenvolvimento dos núcleos escolares rurais e seus entornos. Ressalte-se, também, a decisiva participação da família na educação formal dos filhos. Nesse sentido, Martins detecta, em relação ao ensino de matemática, que os processos iniciais de contagem e rudimentos das operações fundamentais eram, muitas vezes, desenvolvidos em casa. Esse interesse manifestado tanto pela comunidade rural quanto pela família do aluno contribui para reconfigurar aquele quadro de aversão do caipira pela educação formal.

Ao mesmo tempo em que atribuem certa "inadequação" à formação dada pela Escola Normal para a atuação que, necessariamente, teriam em escolas rurais, os professores assumem a sua própria formação como alunos do ensino primário como o principal ingrediente para sua prática docente: assumiam posturas e reproduziam as abordagens dos antigos mestres. Essa desvinculação entre atuação e formação específica, uma formação "prática", fundada nas próprias experiências pelas quais passaram como alunos e alimentada pela própria experiência que vivenciavam como professores, verifica-se em outros tempos e outros espaços. Isso mostra claramente a impermeabilidade do sistema educacional real às intenções e prescrições das instâncias formais de formação e mesmo das políticas educacionais "obrigatórias".

Ainda em relação ao professor que atuou em núcleos rurais, Martins detecta o discurso dos muitos sacrifícios necessários para o exercício do magistério. Esse discurso é fundado na falta de material didático, na inadequação — ou inexistência — de apoio pedagógico, no despreparo dos docentes para atuar em classes multisseriadas, na dificuldade de acesso à escola, no despreparo para viver distante da família e dos confortos da urbanidade e no acúmulo de funções. Mas se, por um lado, revelam-se essas dificuldades, por outro lado esse mesmo discurso revela que os sacrifícios não eram vividos desinteressadamente: eram como que exigências — tidas até como "naturais" — para o ingresso no magistério público, profissão almejada em virtude da falta de opções, pelo status social ou pelos bons salários; serviam, portanto, às aspirações individuais.

Embora os professores fossem responsáveis por toda a parte administrativa da escola e da docência, por muito tempo não participaram dos processos de avaliação final e de promoção de seus alunos: inspetores de ensino e diretores escolares desempenhavam essas funções. Aprendizagem, avaliação, reprovação e promoção são, aqui, tidos quase como sinônimos, uma "estratégia" que deve ser considerada à luz de um contexto que privilegiava, com pontos para a classificação em concursos de remoção, os professores com maior número de alunos promovidos. Havia vigilância constante sobre os professores, o que se pode notar nas declarações sobre as visitas dos inspetores de ensino,2 2 . É interessante ressaltar que a figura do inspetor de ensino surge com maior ênfase na Primeira República. "A criação das delegacias de ensino e o aumento do número de inspetores pelo interior pode ter sido uim fato importante para romper, em parte, a dominação da política local sobre as escolas", numa época em que "a carreira do professor, que dependia legalmente de seu trabalho com os alunos, ficava de fato na dependência de autoridades não escolares" (...) "Evidentemente, os inspetores nem sempre estavam ‘imunes’ ao jogo das forças políticas, e tentavam muitas vezes fazer pressão em favor de um determinado grupo" (Demartini, 1989a, p. 68-69). que não eram anunciadas previamente, obrigando os professores a, em contínuo estado de alerta, manter o "bom funcionamento" da escola, e a se conservarem em constante estado de vigilância em relação aos outros e a eles próprios.

Aventa-se a possibilidade de, devido às particularidades das escolas rurais e, especificamente devido ao seu regime de classes multisseriadas, os alunos desenvolverem certa autonomia, que pode ser concebida como potencialmente produtiva. Se, por um lado, as escolas urbanas — sem salas multisseriadas — eram, para muitos, um "modelo", as escolas rurais, por outro lado, permitiam ao aluno uma experiência, ainda que forçada dadas as circunstâncias, de compartilhar conhecimentos para que todos, em seus ritmos, pudessem ser atendidos. O trabalho com classes multisse-riadas não foi caracterizado como elemento negativo por nenhum depoente. Estratégias de ensino que motivam a autonomia do aluno rural, porém, segundo os relatos, sempre foram aplicadas num contexto que fortalecia modelos urbanos. Os alunos, convivendo com um ensino "igual" ao ensino urbano, por seguirem o mesmo programa de conteúdos, acabam por ter um ensino apoucado e superficial, levando-se em consideração que as condições da escola rural não permitiam que os mesmos resultados fossem obtidos.

A formação dos professores que ensinavam matemática nas escolas primárias apresenta-se como bastante lacunar, mas os conteúdos a serem ensinados eram bastante variados, embora nem sempre fossem cumpridos plenamente. Poucos docentes conseguem atingir um aprofundamento maior nos temas de matemática e chegar, por exemplo, ao estudo das frações e porcentagens. Há muita ênfase em relação ao sistema decimal — praticamente restrito à contagem —, às quatro operações fundamentais, à "resolução de problemas" (na verdade "problemas de aplicação"), e às tabuadas do dois à do nove, decoradas. As grandes dificuldades em relação ao ensino e aprendizagem dos "problemas" não estavam nas operações que deviam ser resolvidas, mas na compreensão de seu conteúdo tanto pelos professores quanto pelos estudantes (talvez por isso uma grande preocupação com a linguagem) e de qual estratégia utilizar em sua resolução. Maiores dificuldades, entretanto, são encontradas quando tratando da operação de divisão (principalmente por três algarismos) e à falta de habilidade para decorar tabelas de multiplicação, uma vez que até o terceiro ano os estudantes já deviam "saber" as tabuadas, o que possibilitaria agilidade nas operações e no encaminhamento dos "problemas".

Mesmo diante dessas várias dificuldades e lacunas, os alunos rurais que continuaram seus estudos avaliam, em seus depoimentos, sua formação como adequada. Mas o fato de alguns terem superado, ao menos em termos, as desigualdades de condições oculta o que, para a maioria, foi fator determinante para o abandono dos estudos.

Devido a uma conhecida e divulgada tendência de "queda nos padrões de ensino", o que se ensinou e se aprendeu na escola rural parece ter ficado como um mito de qualidade (de boa qualidade) na memória daqueles que vivenciaram o ensino no campo, principalmente como alunos, inviabilizando, para esses estudantes, a possibilidade de um posicionamento mais crítico quanto ao papel desempenhado pela escola na perda da identidade do homem rural (Martins, 2003, p. 165).

Outros professores, escolas secundárias, CADES

Quase que imunes ao que ocorria em seus entornos, as cidades tinham os grupos escolares3 3 . Criados em 1984, seguindo o ideário positivista republicano e representando a vitória do progresso contra o atraso, da ciência contra a especulação infundada, já em 1904, por força de lei, os grupos escolares transformam-se em escolas urbanas. aos quais aspiravam as normalistas. À década de 1950, quando o sistema educa-cional rural nem bem começava a dar sinais de esgotamento (hoje as escolas rurais estão em pleno processo de extinção no interior do estado) e servia como provação para o início da carreira,4 4 . É significativo registrar que os professores-depoentes na pesquisa de Martins (2003) consideram como início da carreira o momento em que assumem aulas em áreas urbanas. quando o êxodo rural e o fenômeno geral de urbanização do estado de São Paulo causavam ainda poucas preocupações e quando, portanto, a reforma agrária — "que de lá para cá se tornou assunto banal", no dizer de Antonio Candido — era um discurso político ou tema de "investigações especializadamente econômicas e agronômicas", um fantasma sorrateiro — mas desejado — começa a invadir o espaço: a expansão do ensino secundário para o interior, para o que uma onda febril de construção de novos prédios escolares implantou-se. "O número de escolas estaduais existentes era pequeno em todo estado", nos lembra Gilda Lúcia Delgado de Souza. "A construção dos prédios escolares ocorreu a partir dos governos de Jânio Quadros e Carvalho Pinto. Este foi secretário das Finanças de Jânio Quadros na prefeitura e no governo do estado de São Paulo em 1953 e 1954, tornando-se governador do estado de São Paulo em 1958. (...) o plano de governo priorizou construções de prédios escolares" (Souza, 1998, p. 260). Não se trata mais, portanto, das escolas primárias: era a expansão do ensino secundário. Como, porém, prover de professores essas escolas construídas em cidades do interior, distantes da capital e de outras áreas paulistas (onde havia cursos de formação de professores, alguns, já à época, com alguma tradição e renome)? Era preciso intensificar a formação de professores para o ensino secundário, do que as faculdades de Filosofia não davam conta. Surge, dessa necessidade, a CADES, Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário, criada durante o governo de Getúlio Vargas, em 1953. Embora dando tratamento emergencial ao problema, a falta de professores para preencher os quadros das escolas continuava flagrante quase uma década depois:

De dezembro de 1942 até outubro de 1960, cerca de 29.184 diplomas de professôres secundários foram registrados no Ministério da Educação e Cultura.5 5 . No panorama nacional, a década de 1950 surge com a novidade da criação do Ministério da Saúde. Com isso, o Ministério da Educação e Saúde Pública passa a se chamar Ministério da Educação e Cultura (MEC). (...) Mais eloqüente que a linguagem dêsses números, porém, (...) fala a Campanha de Aperfeiçoamento à Difusão do Ensino Secundário — CADES — que, anualmente, organiza cursos de emergência, depois dos quais os candidatos se habilitam ao registro definitivo do professor, em grupos de matérias. Resta a realidade: precisamos de sessenta mil professoras (sic) neste ano para o ensino secundário e possuímos habilitados em Faculdades de Filosofia menos de um quinto, ou sejam (sic), 9.750. (Revista EBSA, n. 154, jan./1961, cf. Baraldi, 2003)

A literatura especializada em Educação e em História da Educação guarda um silêncio atordoante e injustificado quanto a essa campanha de formação de professores. Para o interior do estado de São Paulo, a CADES desempenhou papel extremamente mais importante que as faculdades de Filosofia no que diz respeito à formação de seus quadros docentes, importância também manifesta em outros estados do país.6 6 . O trabalho de Rosinéte Gaertner (2004, p. 217), focando as escolas "alemãs" de Blumenau, p. ex., aponta claramente para a influência da CADES naquela região, cujo único centro de formação universitária para professores de matemática encontrava-se em Florianópolis.

Espalhadas pelo Brasil, as Inspetorias do Ensino Secundário, subordinadas às secretarias estaduais de Educação, cuidaram da implemen-tação dos cursos CADES a partir de 1956, conforme nos relata Baraldi (2003). Esses cursos intensivos de preparação aos exames de suficiência conferiam aos aprovados o registro de professor secundário e o direito de lecionar onde não houvesse licenciados por faculdades de Filosofia. De modo geral, tinham duração de um mês (janeiro ou julho) e eram elaborados a fim de suprir as deficiências dos professores, até então leigos ou com formação muito distante da pretendida, referentes aos aspectos pedagógicos e aos conteúdos específicos das disciplinas que lecionariam ou até mesmo já lecionavam. O pouco material estudado sobre a CADES nos permite perceber a forte carga humanista da campanha, não raras vezes indicando uma intervenção radical e explícita da ideologia da Igreja Católica na condução de suas atividades.

Nessa configuração de formação lacunar e apressada para suprir as escolas secundárias no interior do estado, a CADES mostrou-se exemplar. Não existiam — nas que então eram as cidades de médio porte — centros de formação próximos (considerando que a "proximidade" da qual falamos é, também, relativa, numa época em que os transportes e a rede viária eram deficitários). A CADES, embora fundamental para preencher as vagas de docência em todas as disciplinas escolares, era um complexo de cursos de formação que ocorriam em períodos de férias e, como vimos, dava ao professor — muitos deles já em exercício efetivo — um registro provisório que permitia a atuação nas escolas secundárias nas quais não havia professores com graduação específica nas faculdades de Filosofia. O registro provisório valeria, ainda, até o momento em que essas instituições fossem implantadas.

No final da década de 1960 surgem as primeiras faculdades no interior, tornando os cursos e o exame de suficiência promovidos pela CADES desnecessários, já sua função de agilizar a formação de quadros não foi suficiente para torná-la uma interventora para a formação continuada, do que pouco se falava à época.7 7 . Projetos sistemáticos de formação continuada visando a ministrar cursos de treinamento a professores em serviço surgem, com enorme ênfase, ao final da década de 1970, "notadamente no governo Paulo Maluf. Suas funções (...) parecem ser mais um paliativo à crise financeira que começava a atingir com bastante clareza a profissão docente do que, realmente, um processo formativo. A oferta dessa formação continuada parecia ter, ao fim e ao cabo, uma funçào ideológica de responsabilizar o professor pelas precariedades do sistema de ensino, o que acabava por justificar seus baixos salários"(Nota do autor). Em 1971, com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o exame de suficiência perde sua validade. (Baraldi, 2003)

Sendo inviável uma formação nas faculdades de Filosofia restou, para grande parte dos professores do interior, a formação apoucada da CADES. Os depoimentos desses professores são claros, porém, quando endereçam às suas próprias experiências como alunos a responsabilidade efetiva por sua formação para atuar em salas de aula como docentes. Aprenderam com seus professores, na prática cotidiana dos bancos escolares, como o fizeram aqueles professores das escolas rurais. Não houve, portanto, um processo contínuo de formação, mas uma série de momentos retalhados e de curta duração, a partir dos quais constituíram suas estratégias de ensino. Basicamente, a formação para esses professores deu-se como uma rearticulação de suas vivências como alunos.

No início da década de 1970 começam a ser difundidos, tornando-se muito comuns, os cursos de Licenciatura Curta em Ciências dos quais surgem, um pouco mais tarde, habilitações que os complementariam e dariam direito legal para o exercício da docência no ensino secundário. Concomitantemente, surgem os chamados "cursos vagos", oferecidos por instituições privadas como contra-opção aos cursos de Licenciatura em Ciências com Habilitação em Matemática que tinham duração de quatro anos e aulas presenciais no correr da semana. Verifica-se facilmente que a lei da sobrevivência do professor secundário esteve pautada na obtenção desse título universitário. A prática docente de muitos professores, baseada nos livros didáticos, nos poucos cursos oferecidos pelos órgãos oficiais, no "perguntando aqui e ali" sobre métodos e conteúdos, deveria ser, agora, formalizada para que continuasse ocorrendo. A obrigatoriedade e urgência dessa "formação", obviamente, tornou-se a necessidade de mera formalização, o que mesmo cursos duvidosos de finais de semana poderiam oferecer. De toda essa trajetória de formações e formalizações, restava o modelo da Escola Normal, instância a que a maioria dos professores, então na ativa, tiveram acesso. Não causa espanto, portanto, a afirmação de que, mais do que as faculdades de Filosofia, a grande inspiração para os cursos de formação de professores foi a estrutura das Escolas Normais que, no Brasil, foram criadas em meados do século XIX (Cf. Bernardo, 1986).

O trabalho de Baraldi, que aqui nos serve de referência fundamental, constitui-se a partir de oito depoentes que, embora tenham iniciado suas experiências docentes em períodos diferentes, permitem compreender uma trajetória de formação e atuação que abarca um período de pelo menos trinta anos (de 1950 a 1970). Seus relatos deixam bem marcadas as diferenças de formação até aqui pontuadas, ressaltando a importância da CADES e destacando que professores com formação em faculdades de Filosofia em exercício no interior do estado eram poucos, não raras vezes provenientes de famílias tradicionais ou financeiramente bem situadas. Em relação à matemática, propriamente dita, os depoimentos coletados permitem perceber certas influências comuns. Dentre elas destacamos especificamente Cid Guelli, cuja atuação centrada em Botucatu e irradiada para grande parte do estado, é marcante; e Júlio César de Mello e Souza, professor dos cursos da CADES e autor de manuais para a campanha. Dos livros didáticos há, entre outras, referências àqueles de autoria de Ary Quintella e Osvaldo Sangiorgi. Este é apontado também quando surge em cena a matemática moderna, a que os professores dedicam grande atenção em seus relatos, via de regra, qualificando negativamente o movimento.

A história da educação escolar caipira,8 8 . Continuamos a nos valer aqui, ainda que não estejamos nos referindo mais às escolas rurais, do termo "caipira" para adjetivar os habitantes do interior do estado de São Paulo, ainda que haja algumas indicações que estendam o termo para as comunidades do sul de Minas Gerais e parte da região centro-oeste brasileira. constituída nos vãos da história oficial da educação brasileira, vai, pois, trilhando caminhos distintos daqueles trilhados pelos alunos e professores dos grandes centros. Citadinos, cosmopolitas, elegantes, finos e sofisticados, segundo os dicionários, servem de antônimos à "caipira".

Professores, colonizadores, Nova Alta Paulista

E não é estranho estender a expressão "escolarização caipira" ao interior do estado de São Paulo e não endereçá-la, apenas, às áreas rurais. Grande parte do interior do estado — notadamente a região oeste, na qual temos concentrado mais nossas investigações acerca da História da Educação e da Educação Matemática do interior paulista — é de colonização relativamente recente. Vejamos, por exemplo, como caracterizar, nesse mapeamento da escolaridade caipira, uma região nova do processo colonizador paulista.

A Nova Alta Paulista, no extremo oeste do estado, foi a última região paulista a ser colonizada pelo homem branco. As regiões denominadas de "sertões paulistas" ocorrem como espaços a serem desbravados como conseqüência dos interesses econômicos ligados ao café. É graças à cultura do café, a partir de meados do século XVIII, que o estado de São Paulo conquista liderança no cenário político e econômico brasileiro. A trajetória dos cafezais no estado parte do Vale do Paraíba e avança em direção às regiões mais interiores, trazendo consigo duas principais conseqüências: a imigração e a implantação do sistema de transporte, isto é, a construção de ferrovias e rodovias, uma vez que é sobre o tripé "café, ferrovia/rodovia, imigrante" que se assenta a colonização do estado de São Paulo e, conseqüentemente, a da Nova Alta Paulista. No final do século XIX, momento em que a marcha pioneira avança para o sertão, os imigrantes subsidiados pelo governo chegam em larga escala a São Paulo. Todavia, os fazendeiros do café não se satisfazem com o auxílio governamental e os mesmos homens que fundaram as companhias de estradas de ferro associam-se para participar diretamente da organização da imigração. Com a iniciativa e o capital dos plantadores de café, constituem-se em São Paulo várias empresas destinadas a recrutar imigrantes, principalmente italianos, para trabalharem nos cafezais. Da região de Campinas, as frentes de expansão avançam e novas áreas são ocupadas pelo café. Agora, os solos de terra-roxa que se sucedem em manchas próximas umas às outras passam a orientar a marcha para o interior. Assim, o estado de São Paulo com suas gigantescas plantações abriga a terceira grande aristocracia do país — os fazendeiros do café, sucessores dos senhores de engenho e dos grandes mineradores — e conquista a liderança no cenário econômico e político. Para este estado deslocam-se migrantes — particularmente do Norte — aos quais se somam imigrantes europeus. O trinômio "rodovia-caminhão-estrada de ferro", possibilitando o transporte, faz avançar cada vez mais a colonização.

Segundo Alfredo Bosi (2002), as palavras "colonização" e "cultura", derivam do mesmo verbo latino (colo), que para os romanos significou "eu moro, eu ocupo a terra". Ele define "colonização" como um projeto que visa a ocupar um novo chão, explorar seus bens e submeter seus nativos. "Cultura" é termo definido como "o conjunto das práticas, das técnicas, dos símbolos e dos valores que se devem transmitir às novas gerações para garantir a reprodução de um estado de coexistência social", complementando que a "educação" é um "momento institucional marcado deste processo".

Em pesquisa recente (Galetti, 2004), foram coletados e analisados depoimentos de cinco professores de matemática que atuaram na Nova Alta Paulista no período de 1950 a 1970. À exceção de um deles — que nasceu e sempre viveu na região —, esses professores são pioneiros, oriundos de "regiões mais velhas" do estado de São Paulo, que, ao assumirem suas funções no magistério da Nova Alta Paulista, integram-se ao projeto expansionista instalado nessa região a partir das primeiras décadas do século XX, tornando-se "atores" não só do processo educacional e cultural, mas também do processo colonizador de uma região distante dos grandes centros. À época, essa região contava com um sistema precário de transportes e de comunicação, onde predominava a cultura do café em pequenas e médias propriedades, e cuja força de trabalho constituía-se, basicamente, de imigrantes italianos e japoneses que não dominavam a língua portuguesa. Esses professores que chegam à região têm formações diferenciadas e seus depoimentos permitem perceber isso com clareza. Dois deles — que foram entrevistados exatamente por serem exceção à regra, num universo constituído por professores primários e "cadesianos" — cursaram universidades na capital do estado (PUC e Mackenzie). Um outro depoente, assim que terminou o "científico", foi aprovado em concurso de ingresso ao magistério oficial e, em 1957, mudou-se para a Nova Alta Paulista, licenciando-se em matemática, anos mais tarde, em um "curso vago" na cidade de Guaxupé,9 9 . Notamos que três dos depoentes em Baraldi (2003) freqüentam cursos de mesma natureza, dois deles na mesma cidade, em Guaxupé (MG). em Minas Gerais. Os outros dois colaboradores — tanto quanto o anteriormente citado, mais próximos à regra que à exceção — começam a ensinar matemática logo após iniciarem seus cursos de Licenciatura em faculdades da Nova Alta Paulista, tendo sido uma delas criada por um dos depoentes com formação na capital. Os poucos professores que tiveram sua formação em universidades da cidade de São Paulo conviviam com professores experientes, dentre os quais havia estrangeiros e professores de renome no campo da matemática; utilizavam uma bibliografia variada e tinham acesso a bibliotecas com bons acervos. Ao chegarem à Nova Alta Paulista, encontram uma nova "paisagem", que deles exige uma "transposição" da cultura que dominam. Precisam ser criativos, uma vez que "um novo público" requer práticas para o ensino da matemática, que não podem ser aquelas usadas nas regiões "mais velhas". Assim, o ensino de matemática que se desenvolve na região é peculiar, surpreendentemente semelhante e diferente daquele das regiões mais "antigas" do estado, pois mantendo os conteúdos matemáticos que são tradicionalmente trabalhados nas escolas, criam-se novas práticas visando à transposição para um novo chão. A colonização dota de "novas tonalidades" as práticas cotidianas dos professores que, nessa época, ensinam matemática: os professores provenientes dos grandes centros elaboram e mantêm um "projeto" para transpor para os filhos de migrantes e imigrantes a matemática apreendida ou nas universidades ou com renomados professores. "A colonização dá ares de recomeço e de arranque a culturas seculares", afirma Alfredo Bosi (2002) e esses professores-depoentes comprovam essa asserção. Os agentes do processo de colonização não se reduzem àqueles que trabalham e cultivam o solo. Um grande rol de trabalhadores, dentre eles os da educação, são também colonizadores. Para os professores de matemática, o verbo colo assume o seu sentido básico: o de tomar conta, com o significado de "cuidar", cuidar do ensino da matemática.

O "bandeirante" e o professor — de modo diverso do que aconteceu no século XVIII, quando o bandeirante de São Paulo e os jesuítas travaram uma luta de morte — conciliam suas práticas, atuando, cada um ao seu modo, no projeto de colonização. Enquanto uns plantam e comercializam, outros constroem estradas e ferrovias, outros, ainda, contribuem para um projeto de formação escolar e cultural. Esses professores não se dedicam apenas ao ensino da matemática escolar, mas também desenvolvem um projeto expansionista no que diz respeito ao ensino da matemática. Eles direcionam a trajetória escolar dos filhos dos colonizadores buscando dar-lhes acesso a tradicionais escolas de "segundo grau" e universidades da capital. Repete-se, portanto, um ciclo de exclusões similar àquele já apontado quando tratávamos da escola rural: a desigualdade de condições — no caso, a inexistência de determinadas escolas ou universidades na região — remete os filhos dos colonizadores à formação nos grandes centros, uma distorção que, de certa forma, pode também ser explicada pela necessidade de diferenciação de um determinado grupo em relação a outros. Para facilitar a freqüência de alunos da zona rural às atividades escolares, os professores-colonizadores da Nova Alta Paulista chegam a acolhê-los em suas próprias residências, estabelecendo vínculos que, extrapolando o período escolar, perduram até os dias atuais. Eles também cuidaram da capacitação e aperfeiçoamento dos demais professores da região, uma vez que, sendo amigos pessoais de acadêmicos conhecidos, os recebem em visita à região, ocasiões em que estabeleciam fóruns — dos quais participam professores de matemática da Nova Alta Paulista, formados ou não — nos quais se instaura um outro tipo de cruzamento, aquele entre a matemática acadêmica conhecida e produzida por esses professores e a ensinada nas escolas pelos professores da região. A colonização dá outros "ares de recomeço e de arranque" à cultura matemática escolar. Esses professores também "plantam" novas faculdades, com cursos de matemática, na Nova Alta Paulista, nas quais lecionam e para as quais escrevem livros. Embora inicialmente essas faculdades não tenham um corpo docente com formação acadêmica nem bibliotecas com bons acervos, elas cumprem o papel de terem possibilitado uma formação específica tanto aos professores não habilitados que já atuam nos cursos ginasial e colegial, ensinando matemática, como àqueles que iriam atender à crescente demanda que se instaura na região em decorrência do processo de colonização. Atualmente, a grande maioria dos professores que atuam no ensino de matemática na Nova Alta Paulista é formada por essas faculdades, cujos primeiros embriões foram lançados por esses professores. Entretanto, "os ares de recomeço e arranque" não se restringiram à Nova Alta Paulista. O professor-colonizador sai à procura de "diplomas acadêmicos", uma formalização que a legislação, como já discutimos anteriormente, passa a exigir. Na década de 1970, passam a fazer parte do cenário de formação docente os cursos mantidos e divulgados pela CENP (Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas), dos quais os professores participam, integrando-se a projetos da Secretaria da Educação do estado de São Paulo.

Ainda que maciçamente a prática e a formação dos professores do interior do estado de São Paulo sigam à revelia dos parâmetros ditados pelas faculdades de Filosofia tradicionais, instaladas em grandes centros, é possível perceber, nesse recorte relativo à colonização da Nova Alta Paulista, alguns elementos a partir dos quais uma vinculação entre essas duas realidades começa a se estabelecer com maior ênfase, embora não possamos nos esquecer de que esses já são novos tempos, em que as leis que regem os sistemas de produção tendem a se articular mais explicitamente a partir de uma grande matriz ditada pela economia capitalista, marcante a respeito — e em detrimento — das formas de organização mais primitivas e comunais dos núcleos rurais. O processo de urbanização se intensifica e hoje as cidades são semelhantes com seus shoppings e suas luzes feéricas, com sistemas de transporte e comunicação que encurtam distâncias e tornam — ao menos aparentemente — homogêneas regiões que, num passado recente, eram extremamente distintas e apartadas.

Ora, encarando o passado da sociedade caipira, vemos que os bens para ela incompreensíveis permitiam definir tipos humanos mais ou menos plenos, dentro dos seus padrões e das suas possibilidades de vida econômica, social, religiosa, artística. No entanto, como hoje o homem rústico se incorpora cada vez mais à esfera das cidades, à medida que isto se dá aqueles usos, práticas, costumes se tornam, em boa parte, sobrevivências, a que os grupos se apegam como defesa. (Candido, 2001, p. 283)

Arremates (ainda que provisórios)

Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cincoenta,

As sensações renascem de si mesmas sem repouso,

Ôh espelhos, ôh Pireneus! ôh caiçaras!

Si um deus morrer, irei no Piauí buscar outro!

Mário de Andrade, "Eu sou trezentos..."

O termo "descentramento", que serve de mote para este artigo, foi utilizado por Stuart Hall em seu livro Identidade cultural na pós-modernidade. Com ele o autor quer referir-se ao modo como o sujeito vem sendo conceptualizado no pensamento moderno:

Meu objetivo é traçar os estágios através dos quais uma versão particular do "sujeito humano" — com certas capacidades humanas fixas e um sentimento estável de sua própria identidade e lugar na ordem das coisas — emergiu pela primeira vez na idade moderna; como ele se tornou "centrado", nos discursos e nas práticas que moldaram as sociedades modernas; como adquiriu uma definição mais sociológica ou interativa; e como ele está sendo "descentrado" na modernidade tardia. (Hall, 2004, p. 23)

O sujeito uno, racional, cartesiano, iluminista, vai sendo descentrado e mostra-se, na contemporaneidade, fragmentado, concebido de forma mutante pelas diversas teorias e abordagens para compreendê-lo. "Descentramento", portanto, é termo do qual nos valemos como inspiração com um sentido similar e distinto daquele de que Hall nos fala. Distinto pois nossa intenção é elaborar um exercício que indique a possibilidade — diríamos até a necessidade — de estudos que tomem como ponto de partida não o centro histórico hegemônico (as "grandes" cidades, as instituições formadoras "tradicionais", os "conhecidos" catedráticos, os textos didáticos "clássicos"), mas sua periferia e seus atores anônimos. Periferia e centro participam, nesse exercício, como pólos que interagem necessariamente. Não há centro sem periferia nem periferia sem centro. Nossa intenção, portanto, não é negar esses centros e sua importância mas, focando a periferia, possibilitar uma perspectiva que tem sido sistematicamente negligenciada pelos estudos históricos sobre a Educação e, especificamente, sobre a Educação Matemática. De similar às intenções de Hall temos a proposta de assumir o sujeito como essencialmente fragmentado, negando a possibilidade de vermos, por exemplo, "o" professor, "o" caipira, "o" aluno, "a" periferia, "o" centro a partir de definições estáticas e bem estabelecidas. Mais adequado, se nos permitisse a gramática, seria "uns" professor, "uns" caipira, "uns" aluno; dado que cada sujeito comporta várias identidades e coloca-se no mundo como "um que é vários" — assumida nisso a fragmentação que lhe é própria. O caipira, como exemplo possível, não assume apenas uma identidade campesina de bom selvagem, mas transita por identidades outras, sendo habitante de pequenas cidades, participante tímida ou esclarecidamente das hordas urbanas, caubói de shopping center, professor(a), aluno(a), inspetor(a) de ensino, coronel, pai, mãe... e cada realidade (paisagem) na qual as potencialidades dos sujeitos se efetivam é formada a partir dos vários olhos que a percebem, sendo por isso, também ela, multifocada, dinamicamente concebida em perspectiva.

Finalmente, além dessas nossas disposições, ressaltamos que talvez fique no leitor deste artigo a impressão de que a especificidade em relação à matemática não foi convenientemente traçada, esboçando-se apenas de quando em vez, de maneira apoucada e vaga. Foi opção intencional do autor apontar essa que poderia ser tida como uma segunda forma de descentramento: um artigo em Educação Matemática que não toma as questões matemáticas como eixo principal. Centrar o texto no professor de "matemática", nas salas de aula de "matemática", no ensino de "matemática" — embora tarefa importante e bem elaborada nos três trabalhos que nos servem de referência básica —, desfocaria o que nos pareceu, no momento, mais importante, uma vez que visávamos a perceber como, na História da Educação Escolar, tem sido negligenciada uma diversidade de temas, com o que pende o pêndulo sempre em favor do ponto de vista clássico que toma a exceção por regra. Talvez se este estudo tivesse transitado mais na órbita da Educação Matemática, propriamente dita, esses elementos dissonantes que se pretendeu aqui abordar — os processos tortuosos pelos quais passaram os professores do interior em suas atuações e formações — ficassem tão escamoteados e diluídos que, como ocorre nos tratamentos históricos usuais, pareceriam sem importância, incidentais e anedóticos.

Recebido em 20.01.05

Aprovado em 03.03.05

Antonio Vicente Maradioti Garnica é professor do Departamento de Matemática da UNESP de Bauru e da Pós-graduação em Educação Matemática da UNESP de Rio Claro. Bacharel em Matemática, mestre e doutor em Educação Matemática pela UNESP de Rio Claro e pós-doutorado nos Estados Unidos. Atualmente é pesquisador pelo CNPq e coordena o Grupo "História Oral e Educação Matemática" (www.ghoem.com).

  • BARALDI, I. M. Retraços da Educação Matemática na região de Bauru (SP): uma história em construção. 2003. Tese (Doutorado em Educação Matemática) IGCE, Universidade Estadual de São Paulo, Rio Claro, 2003.
  • BERNARDO, M. V. C. Revendo a formação do professor secundário nas universidades públicas do Estado de São Paulo. 1986. Tese (Doutorado em Psicologia da Educação) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 1986.
  • BERTAUX, D. Destinos pessoais e estrutura de classe Rio de Janeiro: Zahar, 1979.
  • BOSI, A. Dialética da colonização São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
  • CANDIDO, A. Os parceiros do Rio Bonito. São Paulo: Duas Cidades/Editora 34, 2001.
  • CORREIA, M. E. P.; NEVES, H. M. V.; MELLO, M. G. Arquitetura escolar paulista: 1890-1920. São Paulo: FDE, 1991.
  • CUNHA, E. da Os sertões Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1923.
  • DEMARTINI, Z. Desigualdade, trabalho e educação: a população rural em questão. Cadernos de Pesquisa, n. 64, pp. 24-37, 1988.
  • ______. Cidadãos analphabetos: propostas e realidade do ensino rural em São Paulo na Primeira República. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 71, pp. 05-19. Fundação Carlos Chagas, 1989.
  • ______. O coronelismo e a educação na Primeira República. Educação e Sociedade. Campinas, pp. 44-74, dez./1989a.
  • DEMARTINI, Z.; TENCA, S. C.; TENCA, A. Os alunos e o ensino na República Velha através das memórias de velhos professores. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 52, pp. 61-71, 1985.
  • GAERTNER, R. A matemática escolar em Blumenau (SC) no período de 1889 a 1968: da Neue Deutsche Schule à Fundação Universidade Regional de Blumenau. 2004. Tese (Doutorado em Educação Matemática) IGCE, Universidade Estadual de São Paulo, Rio Claro, 2004.
  • GALETTI, I. P. Educação Matemática e Nova Alta Paulista: orientação para tecer paisagens. 2004. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) IGCE, Universidade Estadual de São Paulo, Rio Claro, 2004.
  • HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP& A, 2004.
  • MARTINS, M. E. Resgate histórico da formação e atuação de professores de escolas rurais da região de Bauru (SP). Relatório de Iniciação Científica FAPESP/Departamento de Matemática, Universidade Estadual de São Paulo, Bauru, 2003.
  • SOUZA, G. L. D. de. Três décadas de Educação Matemática: um estudo de caso da Baixada Santista no período de 1953 a 1980. 1998. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) IGCE, Universidade Estadual de São Paulo, Rio Claro, 1998.
  • Endereço para correspondência
    Antonio Vicente M. Garnica
    Departamento de Matemática
    Faculdade de Ciências – UNESP
    Avenida Luis E. C. Coube, s/n.
    17033-360 – Bauru – SP
    e-mail:
  • 1
    . Essa disposiçào dos fazendeiros, muitas vezes divulgada como "de boa vontade", escamoteava interesses políticos variados como a necessidade de fixar os colonos para a formação de currais eleitorais e a valorização da propriedade, práticas também comuns ao coronelismo da Primeira República (Demartini, 1989a).
  • 2
    . É interessante ressaltar que a figura do inspetor de ensino surge com maior ênfase na Primeira República. "A criação das delegacias de ensino e o aumento do número de inspetores pelo interior pode ter sido uim fato importante para romper, em parte, a dominação da política local sobre as escolas", numa época em que "a carreira do professor, que dependia legalmente de seu trabalho com os alunos, ficava de fato na dependência de autoridades não escolares" (...) "Evidentemente, os inspetores nem sempre estavam ‘imunes’ ao jogo das forças políticas, e tentavam muitas vezes fazer pressão em favor de um determinado grupo" (Demartini, 1989a, p. 68-69).
  • 3
    . Criados em 1984, seguindo o ideário positivista republicano e representando a vitória do progresso contra o atraso, da ciência contra a especulação infundada, já em 1904, por força de lei, os grupos escolares transformam-se em escolas urbanas.
  • 4
    . É significativo registrar que os professores-depoentes na pesquisa de Martins (2003) consideram como início da carreira o momento em que assumem aulas em áreas urbanas.
  • 5
    . No panorama nacional, a década de 1950 surge com a novidade da criação do Ministério da Saúde. Com isso, o Ministério da Educação e Saúde Pública passa a se chamar Ministério da Educação e Cultura (MEC).
  • 6
    . O trabalho de Rosinéte Gaertner (2004, p. 217), focando as escolas "alemãs" de Blumenau, p. ex., aponta claramente para a influência da CADES naquela região, cujo único centro de formação universitária para professores de matemática encontrava-se em Florianópolis.
  • 7
    . Projetos sistemáticos de formação continuada visando a ministrar cursos de treinamento a professores em serviço surgem, com enorme ênfase, ao final da década de 1970, "notadamente no governo Paulo Maluf. Suas funções (...) parecem ser mais um paliativo à crise financeira que começava a atingir com bastante clareza a profissão docente do que, realmente, um processo formativo. A oferta dessa formação continuada parecia ter, ao fim e ao cabo, uma funçào ideológica de responsabilizar o professor pelas precariedades do sistema de ensino, o que acabava por justificar seus baixos salários"(Nota do autor).
  • 8
    . Continuamos a nos valer aqui, ainda que não estejamos nos referindo mais às escolas rurais, do termo "caipira" para adjetivar os habitantes do interior do estado de São Paulo, ainda que haja algumas indicações que estendam o termo para as comunidades do sul de Minas Gerais e parte da região centro-oeste brasileira.
  • 9
    . Notamos que três dos depoentes em Baraldi (2003) freqüentam cursos de mesma natureza, dois deles na mesma cidade, em Guaxupé (MG).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Ago 2005
    • Data do Fascículo
      Mar 2005

    Histórico

    • Aceito
      03 Mar 2005
    • Recebido
      20 Jan 2005
    Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo Av. da Universidade, 308 - Biblioteca, 1º andar 05508-040 - São Paulo SP Brasil, Tel./Fax.: (55 11) 30913520 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revedu@usp.br