Acessibilidade / Reportar erro

Práticas de letramento, antropologia linguística e desigualdade social: casos etnográficos e compromissos teóricos

Resumo

Este artigo discute meus esforços durante várias décadas de pesquisa para compreender a interação entre letramento escolarizado, diversidade linguística e desigualdade social. Inspira-se em tradições semióticas e marxistas para investigar a diversidade linguística e a desigualdade social em contextos europeus e norte-americanos contemporâneos. Enfocando especialmente as práticas de racialização e a dinâmica das aulas, os argumentos apresentam estudos iniciais sobre línguas de minorias e escolaridade que contribuem para e contextualizam um estudo recente sobre a política federal de educação, experiências de escolarização de imigrantes e hierarquia linguística. Esse estudo baseia-se em pesquisa sociolinguística e etnográfica com famílias e comunidades migrantes multilíngues e comunidades no norte do estado de Nova Iorque, com foco específico na experiência de crianças com repertórios multilíngues e políticas linguísticas monolíngues na escolarização (COLLINS, 2012). Examinando a política e os debates federais sobre educação e comparando os processos de interação em sala de aula, que envolvem diferentes grupos etnolinguísticos, identifico dois “efeitos de Estado” (TROUILLOT, 2001), conforme eles operam em diferentes locais institucionais. Defendo que tais efeitos são maneiras como os Estados contemporâneos tentam regular aulas globalizadas e dinâmicas raciais. Ao moldar sujeitos educacionais cujas características sociais e linguísticas – e especialmente as suas características de classe – são obscurecidas e empregadas em categorizações relacionadas à escola e em processos de comunicação centrados na escola, tais efeitos contribuem para a reprodução hegemônica das desigualdades sociais, linguísticas e educacionais (HYMES, 1996; MENKEN, 2008).

Etnografia; Hegemonia; Indicialidade; Letramento; Migração; Multilinguismo; Efeitos de Estado

Abstract

This paper discusses my efforts during several decades of research to understand the interaction of schooled literacy, language diversity, and social inequality. It draws on semiotic and Marxian traditions to investigate language diversity and social inequality in contemporary European and North American settings. Focusing especially on racialization practices and class dynamics, the arguments present early studies of minority language and schooling, which build toward and frame a recent study of federal education policy and immigrant experiences of schooling and language hierarchy. That study draws from sociolinguistic and ethnographic research among multilingual migrant families and communities in upstate New York, with particular focus on children’s experience with multilingual repertoires and monolingual language polices in schooling (COLLINS, 2012). Examining federal education policy and debates and comparing classroom interaction processes involving different ethnolinguistic groups, I identify two “state effects” (TROUILLOT, 2001) as they operate across different institutional sites. I argue that such effects are ways in which contemporary states attempt to regulate globalized class and racial dynamics. By shaping educational subjects whose social and linguistic characteristics, and especially their class characteristics, are both obscured and employed in school-related categorizations and school-based communicative processes, such effects contribute to the hegemonic reproduction of social, linguistic and educational inequalities (HYMES, 1996; MENKEN, 2008).

Ethnography; Hegemony; Indexicality; Literacy; Migration; Multilingualism; State effects

Introdução

Vivemos numa época de crescente consciência da desigualdade social, incluindo um preocupante reconhecimento de que as escolas devem envolver as divisões de desigualdades de classe, estratificação étnico-racial e da cidadania fracionada, e, ao mesmo tempo tentar extrair recursos linguísticos e sociais dos alunos em um projeto comum de aprendizagem. Os estudos discutidos abaixo examinam diferenças de língua, práticas de escolarização, e dinâmicas sociais. Eles proveem de investigações sobre o uso da língua e temas como o letramento escolarizado, a interação de raça e classe na condição de minoria, e a reprodução social. Meus compromissos duradouros de investigação têm sido com a língua e as práticas de letramento (uma arena educacional e campo de estudo), a antropologia linguística (uma tradição de pesquisa) e a desigualdade social (um projeto ético-político, bem como área de pesquisa).

No meu trabalho, antes do advento do referencial de práticas de letramento1 1 - Começou com o compromisso teórico e metodológico de estudar o letramento como um evento e não como um texto (HEATH, 1983), que também foi um ponto de partida para o influente trabalho inicial com a teoria e o estudo do que veio a ser chamado de práticas de letramento (por exemplo, BAYNHAM, 1995). , o estudo de eventos de letramento era parte de um esforço para compreender os processos institucionais conducentes à reprodução social. Neste trabalho inicial, eu encontrei ideias de prática através do trabalho de Bourdieu sobre a reprodução como prática (BOURDIEU; PASSERON, 1977BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. Reproduction in education, society, and culture. Beverly Hills: Sage, 1977.) e sempre vi o estudo da prática como o compromisso de investigar a dialética do subjetivo e objetivo na vida social e nas estruturas sociais. Esse duplo foco em eventos e estruturas foi moldado por referenciais conceituais e compromissos de conhecimento originários da antropologia linguística, bem como do que veio a ser chamado de Novos Estudos do Letramento. Em particular, minha pesquisa foi influenciada pela insistência de Gumperz nas bases interativas de significado (1982; 1996), pelo trabalho de Silverstein (1976SILVERSTEIN, Michael. Shifters, linguistic categories, and cultural description. In: BASSO, K. SELBY, H. (Eds.). Meaning in Anthropology. Albuquerque: University of New Mexico Press, 1976. p. 11-55., 2003SILVERSTEIN, Michael. Indexical order and the dialectics of social life. Language & Communication, v. 23, p. 193-229, 2003.) com semiótica e indicialidade e pela visão de Hymes (1996)HYMES, Dell. Ethnography, linguistics, narrative inequality: Towards an understanding of voice. Philadelphia: Taylor & Francis, 1996. da etnografia como um modo crítico e democrático de conhecimento, bem como pela formulação original de Street (1984)STREET, Brian. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984. de um modelo ideológico de letramento, que impulsionou tanto uma metodologia centrada nos eventos quanto um conjunto de questões produtivas não resolvidas sobre o poder. Meus estudos sobre letramento foram motivados por um desejo de compreender sua relação com a desigualdade social.

Meu horizonte intelectual para a compreensão da desigualdade – como ela acontece, que formas ela assume na vida cotidiana, como ela é reproduzida, o que se opõe a ela ou a diminui – tem sido uma tradição marxista abrangendo estudos de economia (HENWOOD, 2003HENWOOD, Doug. After the new economy. New York: The New Press, 2003.; MARX, 1906MARX, Karl. Capital: A critique of political economy. New York: The Modern Library, 1906.), política (GRAMSCI, 1971GRAMSCI, Antonio. The prison notebooks. New York: International Publishers, 1971.), língua (OHMANN, 1987OHMANN, Richard. Reflections on language and class. In: OHMANN, Richard. Politics of letters. Middletown: Wesleyan University Press, 1987. p. 275-313.), sistemas globais (ARRIGHI, 2011ARRIGHI, Giovanni. The winding paths of capital. New Left Review, n. 56, p.61-94, 2011.; WALLERSTEIN, 1983WALLERSTEIN, Immanuel. Historical capitalism. London: Verso, 1983.), e interseções de classe, raça e gênero (FOLEY 1990FOLEY, Douglas. Learning capitalist culture: deep in the heart of tejas. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1990.; WEIS 1990WEIS, Lois. Working class without work. New York: Routledge, 1990.). Entre os sujeitos que estudei como antropólogo linguístico, a espoliação de recursos linguísticos sempre acompanhou a precariedade econômica e a escassez material, fossem as pessoas em questão indígenas2 2 - Nota da tradutora: o termo indígenas é utilizado ao longo do texto como tradução de Native Americans. (COLLINS, 1998COLLINS, James. Understanding Tolowa histories: Western hegemonies and native American responses. New York: Routledge, 1998.), afro-americanos e brancos da classe trabalhadora enfrentando dificuldades com a escola nos Estados Unidos (BRANDAU; COLLINS, 1994; COLLINS, 1999a), ou migrantes na Bélgica e nos Estados Unidos (COLLINS, 2012COLLINS, James. Migration, sociolinguistic scale and educational reproduction. Anthropology & Education Quarterly, n. 43, p. 192-213, 2012.; COLLINS; SLEMBROUCK, 2006COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. ‘You don’t know what they translate’: language contact, institutional procedure, and literacy practices in neighborhood health centers in urban Flanders. Journal of Linguistic Anthropology, v. 16, n. 2, p. 249-268, 2006.).

Na argumentação a seguir, discuto brevemente vários estudos sobre letramento e práticas de letramento, conceitualizados a partir de perspectivas em evolução dentro da antropologia linguística que ilustram aspectos tanto de práticas sociais quanto dos processos reprodutivos. Esses estudos empregam conceitos semióticos de indicialidade e ideologia para examinar como a comunicação situada está ligada a diferentes escalas socioinstitucionais em contextos de sala de aula, debates mais amplos sobre língua e educação, e práticas de letramento multilíngues em bairros urbanos de migrantes. Um estudo final, apresentado em maior extensão, analisa a política de língua e educação como prática social. Ele examina as implicações da legislação federal e a implementação de No Child left behind[Nenhuma criança deixada para trás] para English Language Learners [Alunos de Inglês] (ELLs)3 3 - Nota da tradutora: ao longo do texto, optei por manter o termo English Language Learners ou sua abreviação (ELL) em inglês para enfatizar a especificidade dessa categoria de estudantes, já que, em possíveis traduções para o português, tais como Alunos de Inglês, por exemplo, o leitor poderia ter a impressão de que se falava de todos os alunos, uma vez a disciplina Língua Inglesa é componente do currículo em vários anos. , uma grande categoria de alunos bilíngues nos Estados Unidos, muitos dos quais são imigrantes. Ele analisa “efeitos de Estado” (TROUILLOT, 2001TROUILLOT, Michel-Rolph. The anthropology of the state in an age of globalization: Close encounters of a deceptive kind. Current Anthropology, v. 42, n. 1, p. 125-138, 2001.), conforme eles operam em e através de diferentes locais institucionais. Concluo defendendo a interação entre teoria e etnografia no estudo de como os processos políticos e institucionais mais amplos interatuam com a diversidade linguística dentro e fora das escolas.

Perspectivas sobre práticas de letramento; ou um quadro conceitual em evolução

Minha pesquisa acadêmica mais antiga sobre o letramento surgiu de um contexto em que o foco empírico e analítico primário foi a interação social que acompanhava atos de leitura ou escrita. O estudo completo foi o Projeto Etnografia Escola-Casa, que envolveu análises de interação em sala de aula ao longo de um ano de eventos de letramento em sala de aula, bem como a investigação sobre as redes sociais dos alunos e seu uso da língua em casa (COOK-GUMPERZ, 2006COOK-GUMPERZ, Jenny (Ed.). The social construction of literacy. 2. ed. New York: Cambridge University Press, 2006. [1986]).

Eventos de letramento e índices de identidade

Meu estudo investigou o tratamento diferenciado4 4 - Resumidamente, o tratamento diferenciado referiu-se aos relatórios de pesquisa sobre a escola da era dos direitos civis, que apontavam que os alunos da classe trabalhadora e de minorias recebiam ensino diferente daquele dos estudantes brancos de classe média, quer nas mesmas escolas ou, como era geralmente o caso, em distritos escolares urbanos versus suburbanos. em aulas de alfabetização em sala de aula, com base em um estudo de um ano e análise de grupos de leitura elementar acompanhados ou gravados. Como eu tinha conversas regulares com os educadores e sociolinguistas Sarah Michaels, Jenny Cook-Gumperz e John Gumperz, a natureza dos eventos de letramento – que discutimos como tipos de atividade – e a construção interacional de significado em tais eventos – que discutimos como inferência situada – estivera entre as preocupações descritivas e conceituais primárias. Também me preocupei com a socialização, com ver o ensino e a aprendizagem como uma troca, na qual todas as partes configuram mutuamente o sentido — em evolução — que o outro fazia a respeito do que era a leitura, já que ao longo do tempo, os alunos aprendiam e os professores ensinavam modos particulares de ler em eventos de leitura (COLLINS, 2006COLLINS, James. Differential treatment in reading groups. In: COOK-GUMPERZ, Jenny (Ed.). The social construction of literacy. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. p. 138-164. [1986];COOK-GUMPERZ, 2006COOK-GUMPERZ, Jenny (Ed.). The social construction of literacy. 2. ed. New York: Cambridge University Press, 2006. [1986]).

Os resultados preliminares dessa pesquisa foram que os alunos classificados como “baixa capacidade” e “alta capacidade” tinham diferentes abordagens para o texto. Essas abordagens se assemelhavam ao que foi relatado na literatura de pesquisa da psicologia da educação sobre os estilos de leitura de bons e maus leitores como um perfil para toda a vida: leitores com dificuldades concebiam e realizavam a leitura como decodificação baseada em palavras, e a velocidade e a fluência eram marcas de bom desempenho; leitores bons ou qualificados concebiam a leitura em termos de significado, e a compreensão do conteúdo do texto era a marca da leitura bem-sucedida. Uma pergunta – não respondida na literatura psicológica sobre este assunto – foi como essas diferenças surgiam e persistiam. Meu estudo foi com grupos de leitura de primeira série, conforme eles se desenvolveram ao longo de um ano escolar. Houve evidências de que as diferentes orientações iniciais para leitura emergiam muito cedo e persistiam durante o ano letivo. Minha análise final foi que os professores e alunos socializaram uns aos outros para diferentes estilos de leitura. Isso aconteceu em parte porque tivemos evidências de que a utilização da língua pelos alunos, tanto seu uso de entonação para segmentar unidades sintáticas e retóricas quanto seus modos de pronunciar palavras em inglês diferiram entre os grupos. Isso pareceu influenciar a sua interação com a professora nas aulas de leitura, durante as quais eles liam o texto em voz alta, bem como respondiam perguntas sobre o significado.

Em 1a e 1b, vemos exemplos de interação no grupo de leitura em que a resposta para o dialeto é proeminente. Aqui, o esforço é para corrigir “gahbage can” para “garbage can”, com foco na presença ou ausência do R pós-vocálico. Na publicação mais completa, analiso em detalhes o que podemos ver a partir do documento abaixo: a preocupação em regular a pronúncia pode distrair da atividade de leitura (COLLINS 2006COLLINS, James. Differential treatment in reading groups. In: COOK-GUMPERZ, Jenny (Ed.). The social construction of literacy. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. p. 138-164. [1986], p. 158).

Figuras 1 e 2
: Exemplos de interação no grupo de leitura

Foram várias as implicações do estudo. Em primeiro lugar, ver as aulas de leitura como eventos de letramento orienta os analistas para as diversas fontes de construção de significado, no texto, nas expectativas dos participantes e nas suas respostas interativas para o outro. Em segundo lugar, os processos baseados em eventos são coerentes ao longo do tempo; como diríamos hoje, eles viajam através dos locais discursivos. Nessa coerência, nessa trajetória interdiscursiva, há evidências de socialização de identidades escolares como leitores “bons” ou leitores “ruins”, assim, como “bons” alunos ou “maus” alunos. Em outras palavras, encontramos evidências de um percurso de como o tratamento diferenciado surge e persiste, ajudando a produzir identidades de letramento distintas. Essas implicações, por sua vez, levantam questões sobre a reprodução social, ou seja, sobre como a escolarização perpetua desigualdades sociais entre os alunos; e elas levantam questões sobre a prática, ou seja, sobre como as atividades cotidianas mundanas estão ligadas a entidades, processos e resultados de escala mais ampla. No caso em apreço, a questão notória é como as primeiras experiências com alfabetização na escola primária podem reforçar hierarquias de raça e classe no resultado escolar.

Vou me concentrar em um aspecto desta questão multifacetada, o tratamento do inglês não padrão, ou seja, a correção ou rejeição do inglês não padrão em sala de aula. Eu examinei esse aspecto de uma perspectiva histórica e comparativa (COLLINS, 1988COLLINS, James. Language and class in minority education. Anthropology and Education Quarterly, v. 19, n. 4, p. 299-326, 1988.); explorei-o numa reanálise das respostas do ensino primário a dialetos, aos modelos de leitura e à interação em grupo, usando o novo material empírico de Chicago (COLLINS, 1996COLLINS, James. Socialization to text: structure and contradiction in schooled literacy. In SILVERSTEIN, M; URBAN, G. (Eds.). Natural histories of discourse. Chicago: University of Chicago Press, 1996. p. 203-228.); e discuti-o como parte de uma argumentação geral sobre a educação e a reprodução social (COLLINS, 2009COLLINS, James. Social reproduction in classrooms and schools. Annual Review of Anthropology, v. 38, p. 33-48, 2009.). Todos esses estudos exploram a interação entre categorias sociais, o uso da língua, e a avaliação da língua. Uma questão principal foi como respostas a diferenças de classe no uso da língua, imbricadas com ideias sobre identidades étnico-raciais e formas associadas de falar, influenciam o projeto da escola de promover o letramento universal em inglês padrão (COLLINS; BLOT, 2003COLLINS, James; BLOT, Richard. Literacy and literacies: Texts, power, and identity. New York: Cambridge University Press, 2003.).

Debates ideológico-linguísticos racializados: a controvérsia sobre a Ebonics

Uma ilustração dramática e pública de conflito linguístico sobre as variedades aceitáveis de inglês para a educação pública surgiu nos Estados Unidos, no inverno de 1996-1997, quando o Distrito Escolar de Oakland, Califórnia, propôs que a Ebonics, ou inglês vernacular afro-americano, fosse ensinado nas escolas públicas, juntamente com o inglês padrão. Um furor da mídia nacional logo se seguiu à ação da Diretoria de Educação de Oakland, e, no debate nacional que se seguiu, ficou claro que a elite da mídia branca era decididamente contra a proposta de o inglês negro ser ensinado numa escola pública e que a classe média afro-americana também se opunha, embora de modo mais conflitante quanto à questão.

No final do inverno de 1997, participei de diversos fóruns públicos sobre a controvérsia da Ebonics na minha universidade e na comunidade em geral. Um deles foi realizado na principal biblioteca pública da cidade de Albany. Foi organizado por uma organização comunitária afro-americana, e contou com palestrantes da comunidade, da Secretaria Estadual de Educação, e comigo como acadêmico da universidade. Deixe-me primeiro dar o título do evento e, em seguida, brevemente comentar as declarações feitas, antes de me debruçar sobre o que vejo como o significado mais amplo das observações e do título. Este é o referido título do fórum (COLLINS, 1999b, p. 208-209):

(2) “Ebonics: legitimate language or Gibberish5? [Ebonics: língua legítima ou nonsense?]”

Durante o fórum, naquela noite, vários oradores afro-americanos comentaram sobre a polêmica e falaram de sua afeição pela Fala Negra. Uma pessoa da plateia descreveu-a como a língua que ela aprendeu com a mãe e a família, mas ela e outros na mesa e na plateia argumentaram também que o vernáculo, a Ebonics, deveria ser banido de qualquer contexto de sala de aula. O conflito entre a intimidade e a língua i-legítima era doloroso e revelador.

O que eu tirei de um estudo desse evento e da controvérsia mais ampla sobre a Ebonics (COLLINS, 1999b) foram vários pontos relevantes para a forma como pensamos sobre as práticas de letramento e a desigualdade social. Primeiro, as ideologias linguísticas são muitas vezes sobre tipos de língua e tipos de pessoas, e essas ideologias moldam subjetividades sociais, incluindo domínios íntimos, como o orgulho e a vergonha. Em segundo lugar, os debates linguístico-ideológicos são conflitos sobre o que Bourdieu chamou de “o campo linguístico” (1991, p. 57, passim). Todos os campos dizem respeito a valor, muitas vezes dependente de contrastes culturais fundamentais entre bom e mau, que estão eles próprios enraizados nas desigualdades materiais na sociedade. Com a pergunta “Ebonics: Língua legítima ou nonsense?” nós fazemos uma dura pergunta de valor: se um importante dialeto social do inglês americano, a primeira variedade de língua para dezenas de milhões de afro-americanos da classe trabalhadora (MUFWENE et al., 1998MUFWENE, Salikoko S. et al. The structure of the noun phrase in African-American vernacular English. In: MUFWENE, Salikoko S. et al. (Eds.). The structure of African-American English: Structure, history and use. London: Routledge.1998. p. 69-81.) pode ser um veículo legítimo para atos de aprendizagem, para práticas de leitura ou escrita; ou se, ao contrário, a Ebonics énonsense – ou seja, um ruído ininteligível ou sem sentido.

Eu sugiro que a dinâmica de hierarquia linguística que abrange toda a sociedade que acabo de descrever – em que a variedade de inglês conhecida como Ebonics é proibida a partir dos campos da educação e da língua legítima – deve ser parte da análise das práticas de letramento. Aqui estou argumentando que a análise das práticas de letramento implica o estudo etnográfico situado de eventos de letramento em conjunto com a análise dos princípios estruturantes interevento, como a hierarquização linguística (ROGERS, 2003ROGERS, Rebecca. A critical discourse analysis of family literacy practices: Power in and out of print. Mahwah: Lawrence Erlbaum Associates, 2003.; WORTHAM, 2005WORTHAM, Stanton. Learning identities. New York: Cambridge University Press, 2005.). Nos dois casos discutidos até agora, tais princípios estruturantes interevento são (a) investigados como os processos que se desenvolvem durante o ciclo normal de um ano de escola regular, no estudo de leitura em sala de aula, ou eles são (b) revelados na análise de debates nacionais excepcionais e conflitos sobre a língua legítima, em que uma hierarquia duradoura de língua nacional é desafiada e poderosamente reafirmada, como na polêmica sobre a Ebonics na escola, que envolveu toda a sociedade. Observemos que a hierarquia envolve questões evidentes de classe e raça em relação à língua e à educação.

O campo da antropologia linguística, por causa de sua ênfase no significado interacional situado e seu estudo intensivo de eventos comunicativos e princípios estruturantes interevento, tem contribuições específicas para dar à pesquisa educacional sobre práticas de letramento. O conceito semiótico de indicialidade é central para o campo, assim como o são os conceitos relacionados de ideologia linguística e ordenação indicial. A indicialidade assenta-se em um princípio de que a comunicação de significados sociais não referenciais, não literais depende do conhecimento de “relações regulares entre o uso da língua e a estrutura social” (GUMPERZ, 1968, p. 45). O estudo de tais “relações normais” tem sido o alicerce da antropologia linguística, pois sustenta tanto a normatividade quanto a performatividade do uso da língua (GUMPERZ, 1982GUMPERZ, John J. Discourse strategies. New York: Cambridge University Press, 1982.; SILVERSTEIN, 1976SILVERSTEIN, Michael. Shifters, linguistic categories, and cultural description. In: BASSO, K. SELBY, H. (Eds.). Meaning in Anthropology. Albuquerque: University of New Mexico Press, 1976. p. 11-55.). A ideologia de língua, em sua forma mais simples, consiste de afirmações que ligam ideias sobre a diferença de língua a ideias sobre a diferença social, e tais ideias são sempre impregnadas de julgamentos morais, bem como de interesses políticos (IRVINE; GAL, 2000). A polêmica da Ebonics é um desses casos. Nas últimas décadas, assim como muitos pesquisadores em ciências sociais, os antropólogos linguísticos têm se debatido com o desafio de conciliar micro e macroanálise. A pesquisa semiótica-funcional beneficiou-se da argumentação conceitual clara de Silverstein (2003)SILVERSTEIN, Michael. Indexical order and the dialectics of social life. Language & Communication, v. 23, p. 193-229, 2003. de que devemos entender a interação para ir além dos processos face a face, envolvendo as relações dialéticas entre processos microanalíticos situados e fenômenos de escala macro que, em seu desdobramento em tempo real, normalmente produzem múltiplas ordens indiciais em camadas (ver também BLOMMAERT, 2005BLOMMAERT, Jan. Discourse: a critical introduction. New York: Cambridge University Press, 2005.). Essas ordens podem ir, por exemplo, de (a) camadas indiciais envolvidas no “sentido social” sinalizado pela correção habitual em sala de aula da leitura de uma criança em voz alta em um dialeto não padrão, como no estudo em sala de aula mencionado acima, até (b) as camadas indiciais envolvidas no significado social de tipos de língua e tipos de pessoas que está em jogo nos debates de âmbito nacional sobre a língua legítima e ilegítima, como na polêmica sobre a Ebonics. Se somamos a esse foco semiótico a visão Hymes da etnografia como um modo crítico e democrático de conhecimento (1996), então nós temos uma tradição de antropologia linguística que tem contribuído muito para o estudo de eventos comunicativos em relação às mais amplas ordens culturais, estruturas sociais, e quadros históricos. Trata-se de uma tradição que tem — em comum com o estudo das práticas de letramento — pressupostos sobre os fundamentos comunicativos de ordens sociais e o desejo de investigar criticamente para construir um mundo melhor (COLLINS, 2008).

Embora tenha raízes na antropologia norte-americana, a antropologia linguística foi enriquecida por trocas internacionais. No meu trabalho pessoal, isso incluiu colaborar em um compromisso envolvendo tanto a antropologia linguística quanto a análise crítica do discurso (BLOMMAERT et al., 2001). Além disso, durante vários anos na última década, tive a felicidade de colaborar com Jan Blommaert e Stef Slembrouck em estudos de multilinguismo e práticas de letramento em bairros de imigrantes na Bélgica, estudos esses que nós apresentamos e debatemos em fóruns e conferências na Bélgica, Países Baixos, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos. (BLOMMAERT; COLLINS; SLEMBROUCK 2005a, b; COLLINS; SLEMBROUCK 2005COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. (Eds.). Multilingualism and diasporic populations: Spatializing practices, institutional processes, and social hierarchies. Language & Communication, v. 25, n. 3, 2005. Special issue., 2006COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. ‘You don’t know what they translate’: language contact, institutional procedure, and literacy practices in neighborhood health centers in urban Flanders. Journal of Linguistic Anthropology, v. 16, n. 2, p. 249-268, 2006., 2007COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. Reading shop windows: multilingual literacy practices and indexicality. Journal of Literacy Research, v. 39, n. 3, p. 335-356, 2007., 2009COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. Goffman and globalization: Frame, footing and scale in migration-connected multilingualism. In: COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef; BAYNHAM, M. (Eds.). Globalization and languages in contact: Scale, migration, and communicative Practice London: Continuum, 2009. p. 19-41.).

Práticas de letramento e ordens indiciais

Um estudo que resultou do trabalho na Bélgica disse respeito a placas multilíngues de loja, um fenômeno que Slembrouck e eu tínhamos encontrado pela primeira vez, sobre o qual observamos variações, e com o qual tínhamos ficado intrigados, durante incursões etnográficas iniciais aos bairros de imigrantes da classe trabalhadora que circundam a cidade flamenga de Ghent. “Reading shop windows: Multilingual literacy practices and indexicality” [Leitura de vitrines: práticas de letramento multilíngues e indicialidade] (COLLINS; SLEMBROUCK, p. 2007) analisou como diferentes leitores compreendiam as placas multilíngues de loja encontradas nos bairros de imigrantes que estudamos. Tendo decidido nos concentrar em placas que apresentavam as línguas turca e holandesa, obtivemos traduções de um conjunto de placas bilíngues turcas e holandesas de um professor visitante turco, e, em seguida, traduções das mesmas placas de um ativista da comunidade belgo-turca que vivia num dos bairros de nosso estudo. Ficamos intrigados com as maneiras como os nossos dois intérpretes de língua turca lidavam simultaneamente com características de ortografia, escolha de palavras e gramática nas placas turcas e holandesas, bem como para os sinais textuais da origem social e das intenções dos fabricantes de placas. Tivemos a sorte, conforme a pesquisa progrediu, de literalmente usar o método da triangulação: criamos uma sessão de interpretação adicional com um homem flamengo que conhecíamos do nosso trabalho de campo. Suas traduções e comentários combinavam de forma semelhante a atenção à escolha de palavras, ortografia e designda placa com pressupostos sobre a origem social e a intenção comunicativa, que ele expressava em termos de um discurso sobre relações étnicas nativo/migrante na Bélgica. Ele chegou a interpretações diferentes daquelas dos outros dois, cujas interpretações, por sua vez, diferiram uma da outra.

O que esta variação em resposta aos mesmos conjuntos de placas de loja turcas e holandesas nos levou a investigar foram os significados indiciais associados com variedades de turco, variedades de holandês, e a justaposição de turco e holandês. Resumidamente, o acadêmico turco, Meryem6 6 - Todos os nomes dos consultores de pesquisa são pseudônimos. , leu o turco das placas em termos de um padrão escolarizado de Istambul, vendo evidências na forma linguística das placas de que os autores das placas eram de origem rural, anatoliana e não escolarizada. Nosso consultor turco-belga, Nežat, examinou características do holandês, bem como do turco nas mesmas placas, interpretando as variações nas placas como uma indicação de variações no repertório multilíngue dos fabricantes de placas, o qual, por sua vez, dava indícios do tempo de residência dos fabricantes de placas na Bélgica, e de sua participação em diferentes redes de imigrantes. Nosso consultor flamengo, Herman, interpretou as características ortográficas, lexicais e de designdas placas como índices tanto dos tipos de imigrantes que operavam uma determinada loja ou empresa quanto do estado das relações étnicas entre nativos e imigrantes numa determinada cidade flamenga.

Por razões de espaço, não vou continuar a discutir exemplos particulares e análises (ver COLLINS; SLEMBROUCK, 2007COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. Reading shop windows: multilingual literacy practices and indexicality. Journal of Literacy Research, v. 39, n. 3, p. 335-356, 2007.), mas a lição que tirei das interpretações alternativas de Meryem, Nežat e Herman é que toda leitura é uma prática contextualizada, que utiliza diversos referenciais de interpretação. Esses referenciais podem ser organizados, entre outros aspectos, por: pressupostos sobre a escala geográfica, como no contraste de Meryem entre variedades rurais e urbanas; relações sociais e históricas, como na evocação das histórias de migração de Nežat para explicar as variedades de turco e holandês; ou normas linguístico-gramaticais combinadas e tipificações sociolinguísticas, como Jef em particular utilizou. Além disso, e isso fornecerá uma ponte para o nosso último estudo, o contato linguístico é visto em termos de conflito e de diferenças de classe e étnico-raciais.

Em suas leituras das placas multilíngues de loja, nossos consultores foram se baseando em visões amplamente compartilhadas do mundo contemporâneo, em que as migrações em grande escala da classe trabalhadora e práticas de língua multilíngues são vistas alternada e simultaneamente através de lentes de classe e raça. Para Meryem, os imigrantes eram vistos como os pobres não escolarizados do meio rural; para Herman, os imigrantes turcos eram uma ameaça étnico-racial para a subsistência e os modos de vida flamengos, assim como a língua turca era uma rival para a holandesa. Apesar da propalada reputação da Bélgica como uma sociedade multilíngue, as regiões francófona e de língua holandesa insistem em um monolinguismo oficial, especialmente na educação (BLOMMAERT, 2005BLOMMAERT, Jan. Discourse: a critical introduction. New York: Cambridge University Press, 2005.). Embora ainda não tenhamos discutido isso, normalmente é necessário o trabalho de um Estado para preservar o domínio dos registos de língua padrão monolíngues em face da diversidade sociolinguística forjada por histórias regionais, migrações transnacionais, divisões de classe e hierarquias étnico-raciais.

Em Literacy & literacies, Collins e Blot (2003)COLLINS, James; BLOT, Richard. Literacy and literacies: Texts, power, and identity. New York: Cambridge University Press, 2003. oferecem um relato histórico de como as práticas de Estado de classificação influenciam as práticas de letramento, debruçando-se sobre a dinâmica das hierarquias de classe, raça e gênero na história da educação pública nos Estados Unidos. No último caso, apresentado a seguir, eu argumento que os esforços contemporâneos para preservar o domínio do inglês padrão monolíngue na educação pública nos Estados Unidos emergem de uma política de diferença linguística racializada (CRAWFORD, 2000CRAWFORD, James. At war with diversity: U.S. language policy in an age of anxiety. Buffalo: Multilingual Matters, 2000.; ZENTELLA, 1997)ZENTELLA, Ana-Celia. The hispanophobia of the official english movement in the U.S. International Journal of the Sociology of Language, v. 127, p 71-86, 1997. com efeitos que operam em diferentes escalas sociais, privando seletivamente falantes cujas primeiras línguas são diferentes do inglês de seus recursos linguísticos relevantes para a aprendizagem e o letramento. Vamos examinar como a política educacional explicitamente apresentada como uma maneira de combater a desigualdade da educação contribui, no entanto, para tal desigualdade.

Como indicado nas observações introdutórias, eu defendo que o horizonte intelectual para pensar sobre a desigualdade permanece sendo o legado marxista. Ele oferece duas lições pertinentes para pensar as práticas de letramento no século atual:

Lição um: o capitalismo histórico, em toda a sua variedade, é organizado em sistemas globais que, por sua vez, geram um ranking multicamadas de regiões e nações. Parte do seu dinamismo inquieto é a construção e transformação de escalas espaço-temporais. Estas têm sido proveitosamente exploradas por sociólogos (WALLERSTEIN, 1983WALLERSTEIN, Immanuel. Historical capitalism. London: Verso, 1983.), economistas (ARRIGHI, 2011ARRIGHI, Giovanni. The winding paths of capital. New Left Review, n. 56, p.61-94, 2011.) e antropólogos (FRIEDMAN, 2003FRIEDMAN, Jonathan. Globalizing languages: ideologies and realities of the contemporary global system. American Anthropologist, n. 105, p. 744-752, 2003.). Os sociolinguistas têm investigado como escalas de tempo-espaço compreendem relações altamente diferenciadas de verticalidade, ou seja, hierarquias ou desigualdades, que se refletem em campos sociolinguísticos nacionais e globais (BLOMMAERT, 2010BLOMMAERT, Jan. The sociolinguistics of globalization. New York: Cambridge University Press, 2010.; COLLINS; SLEMBROUCK; BAYNHAM 2009).

Lição dois: A língua desempenha um papel vital em formas de consciência e estruturas de percepção em sociedades de classe. Esse papel foi definido e analisado: como estruturas de sentimento, na formulação de Williams (1977)WILLIAMS, Raymond. Marxism and literature. Oxford: Oxford University Press, 1977.; como habitus, na terminologia de Bourdieu (1977);7 7 - Sobre a análise de estruturas de sentimento fundamentadas em detalhes linguísticos impressionantes, incluindo dados longitudinais, consulte Rampton (2006; 2011); para análises de habitus em práticas de letramento em famílias migrantes, consulte Pahl (2008). e como hegemonia, na importante concepção da inextricabilidade do Estado e da sociedade civil em Gramsci (1971)GRAMSCI, Antonio. The prison notebooks. New York: International Publishers, 1971..

A diversidade linguística e a política educacional: uma análise contextualizada dos efeitos de Estado como práticas de letramento

No ensaio “Report from an underdeveloped country: towards linguistic competence in the U.S.” [Relatório de um país subdesenvolvido: rumo à a competência linguística nos Estados Unidos], Hymes fornece uma discussão franca sobre o que ele chamou de “hegemonia cultural” através da língua:

O cerne da questão, sugeri, é que a língua tem sido um meio central de hegemonia cultural nos Estados Unidos. A estratificação de classes e pressupostos culturais sobre a língua convergem na escola para reproduzir a ordem social. Uma função latente do sistema educacional é incutir insegurança linguística, discriminar linguisticamente, dirigir as crianças em formas que têm uma componente linguística integral, embora pareça abertos e justo para todos (HYMES, 1996HYMES, Dell. Ethnography, linguistics, narrative inequality: Towards an understanding of voice. Philadelphia: Taylor & Francis, 1996. [1975], p. 84).

Esta é uma afirmação contundente de reprodução social e escolarização, e ainda parece exata muitos anos depois que foi apresentada pela primeira vez. No entanto, ela precisa de retrabalho conceitual e empírico se quisermos investigar como “a estratificação de classes e os pressupostos culturais convergem nas escolas” no século XXI ou se quisermos analisar “função[ões] latente[s] do sistema educacional” após várias décadas de reestruturação econômica, redução do financiamento para a educação pública e controvérsias recorrentes sobre cultura, identidade, língua e direitos dos cidadãos.

Em um ensaio sobre a antropologia do Estado, Trouillot (2001)TROUILLOT, Michel-Rolph. The anthropology of the state in an age of globalization: Close encounters of a deceptive kind. Current Anthropology, v. 42, n. 1, p. 125-138, 2001. levanta duas questões relevantes para fazer tal retrabalho conceitual e empírico. A primeira diz respeito à conceitualização original de Gramsci de hegemonia e à necessidade de pensar sobre o Estado, assim como sobre a cultura e a sociedade:

Gramsci insiste em pensar Estado e sociedade civil em conjunto por meio de conceitos como hegemonia e bloco histórico [...]. Eu creio que Gramsci diz que, no contexto do capitalismo, as teorias de Estado devem abranger toda a formação social e articular a relação entre Estado e sociedade civil (TROUILLOT, 2011, p. 127).

Em segundo lugar, Trouillot argumenta que, em nossa era da globalização, não podemos pressupor que nação e Estado são simplesmente equivalentes, e essa não equivalência tem implicações para como nós conceituamos e estudamos os processos e poderes de Estado:

Se suspendemos a homologia Estado-nação, como sugiro que devemos, nós alcançamos uma visão mais poderosa do Estado, contudo mais aberta à etnografia, uma vez que descobrimos que, teoricamente, não há local necessário para o Estado, institucional ou geográfico. Portanto, dentro dessa visão, o Estado aparece como um campo aberto com múltiplas fronteiras e sem fixidez institucional, o que quer dizer que ele precisa ser conceituado em mais de um nível (TROUILLOT, 2001TROUILLOT, Michel-Rolph. The anthropology of the state in an age of globalization: Close encounters of a deceptive kind. Current Anthropology, v. 42, n. 1, p. 125-138, 2001., p. 127).

A seguir, examinarei materiais empíricos, com foco na legislação federal No Child Left Behind (NCLB) e em suas consequências operacionais “em mais de um nível” no sistema educacional. Inspirando-me no excelente estudo de Menken (2008)MENKEN, Kate. English language learners left behind. Buffalo: Multilingual Matters, 2008. sobre os múltiplos efeitos da NCLB sobre alunos English Language Learners (ELLs) em escolas da cidade de Nova Iorque, argumentarei que a legislação federal, seus regimes de provas, e sua realização em práticas de sala de aula consistem numa política linguística de fato. Tais práticas de Estado dirigem as crianças, desvalorizando e excluindo aquelas que apresentam a diversidade linguística, servindo, assim, ao que Hymes denominou uma “função latente do sistema educativo”, mas fazem isso através de múltiplas escalas sociolinguísticas e através do que Trouillot denominou efeitos de Estado.

Por efeitos de Estado Trouillot quer dizer as práticas descentralizadas através das quais subjetividades políticas e culturais são moldadas em relação a agudizar as desigualdades nacionais e transnacionais, especialmente as de raça e classe. Dois efeitos discutidos por Trouillot são relevantes para os dados e temas deste artigo. Em primeiro lugar, existe um efeito de isolamento, a “produção de sujeitos individuais atomizados moldados e modelados para a governança como parte de um ‘público’ indiferenciado, mas específico...” (TROUILLOT, 2001, p. 126). Defendo a seguir que a categoria English Language Learner (ELL) na legislação e implementação do No Child Left Behind produz exatamente esse efeito de isolamento. Em segundo lugar, existe um efeito de identificação, os processos que alinham indivíduos dentro de coletividades, quaisquer que sejam as complexidades de suas reais vidas e histórias. Consideraremos abaixo como modelos de sucesso e insucesso escolar sensíveis a classe e raça, em funcionamento em salas de aula, ajudam a produzir exatamente esses efeitos de identificação.

A NCLB e o apagamento discursivo da classe em nível nacional: um efeito de isolamento

O carro-chefe do presidente George W. Bush em relação à reforma escolar foi aNo Child Left Behind, uma intervenção federal sem precedentes na escolarização e na educação. Desde 2010, o alcance da legislação foi reduzido, pois a administração Obama apresentou seu próprio programa federal para a reforma da escola, Race to the Top. Quando da escrita deste artigo, a NCLBenfrentava forte pressão do Congresso para limitar ainda mais o seu alcance (NYT EDITORIAL BOARD, 2015NYT Editorial Board. Don’t give up the gains in education. New York Times, Feb. 21, 2015, SR 10, 2015.). No entanto, a ênfase inicial em avaliações padronizadas e a responsabilização impulsionada por pressões orçamentárias continua em vigor nas concorrências por financiamento do Race to the Top, assim como continua o modo de definir minorias etnolinguísticas (BAILEY; CARROLL, 2015BAILEY, Alison; CARROLL, Patricia. Assessment of English language learners in the era of new academic content standards. Review of Research in Education. n. 39, p. 253-294, 2015.; RAVITCH, 2010).

A NCLB lida com a diversidade linguística na educação nos Estados Unidos, concentrando-se numa categoria – English Language Learners –, pela qual se compreende todos os alunos de escola pública cuja primeira língua não seja o inglês e que são avaliados como precisando do ensino da língua ou de apoio. Os alunos English Language Learners, ou ELLs, são de fato uma categoria muito heterogênea, que inclui aqueles que têm alta proficiência em inglês e aqueles que não; os alfabetizados e os não alfabetizados nas suas primeiras línguas; os imigrantes e os nascidos nos Estados Unidos; aqueles que vivem na riqueza da classe média ou na pobreza. Esse apagamento da definição da heterogeneidade importa porque ele retira a questão das condições sociais da aprendizagem escolar do debate oficial sobre políticas.

Esse deslocamento pode ser visto numa sessão do Congresso sobre a reautorização do NCLB (U.S. CONGRESS, 2007). Intitulado “The impact of no Child Left Behind on English Language Learners”, [O Impacto do No Child Left Behind sobre os Alunos ELLs] o relatório dessa sessão de 2007 apresenta uma série de relatos de especialistas: do Federal Government Accountability Office [Secretaria Federal de Responsabilização] sobre como os estados individualmente definem e avaliam os alunos ELLs; de sistemas universitários estatais sobre a melhor forma de preparar os professores para trabalhar com alunos ELLs; e de organizações hispânicas de luta em torno da validade e confiabilidade das provas na avaliação de ELLS sob aNCLB. O que se menciona apenas uma vez no longo relatório, e nunca se retoma para questionamento ou comentário posterior, são os seguintes fatos demográficos: que três quartos dos estudantes ELL são falantes de espanhol, e que mais de dois terços, ou 66%, são de famílias de baixa renda (U.S. CONGRESS, 2007, p. 29).

Tais dados demográficos parecem dignos de nota. Após três décadas de campanhasEnglish Only [Inglês Somente] em todos os Estados Unidos, muitas vezes dirigidas a programas de educação bilíngue espanhol, o fato de que três quartos dos alunos ELL são hispânicos dá à categoria um valor social forte (CRAWFORD, 2000CRAWFORD, James. At war with diversity: U.S. language policy in an age of anxiety. Buffalo: Multilingual Matters, 2000.). Da mesma forma, depois de décadas de pesquisas que mostram que a situação econômica familiar é a variável mais forte na predição de mau desempenho escolar (HENWOOD, 2011HENWOOD, Doug. Explaining test scores. Left Business Observer, v. 131, n. 3, p. 7, 2011.; ROTHSTEIN, 2004ROTHSTEIN, Richard. Class and schools. New York: Teachers College Press, 2004.), o fato de que dois terços de alunos ELL vivem em famílias de baixa renda parece relevante para a compreensão de seu desempenho em avaliações de letramento e matemática.

Há evidências de que os fatos demográficos sobre os ELLs são significativos para o desempenho escolar. Um estudo do Pew Hispanic Resource Center (FRY, 2008FRY, Richard. The role of schools in the English Language Learner achievement gap. Washington: Pew Hispanic Research Center, 2008. p. 34.) descreve uma interação entre a condição de ELL e a classe social, que, por sua vez, cria um dilema interpretativo. Está amplamente documentado que os alunos ELL têm desempenho pior em avaliações de letramento e matemática em comparação com estudantes não ELL. O relatório mostra, no entanto, que esses alunos estão também concentrados em escolas onde, em média, todos os alunos têm um desempenho pior em avaliações padronizadas. Portanto, o problema interpretativo está em determinar se há uma “Lacuna de Desempenho entre os Alunos ELL” ou uma “Lacuna de desempenho das crianças pobres e das minorias em escolas municipais”?

O relatório documenta as seguintes desvantagens educacionais relacionados com a classe social nas escolas com relatórios ELL8 8 - Nota do tradutor: 0 termo Escolas com relatórios ELL (ELL reporting schools) designa aquelas em que uma proporção significativa dos estudantes são ELLs. :

  • Os alunos ELL têm maior probabilidade de estar concentrados em cidades centrais, e não em zonas suburbanas ou rurais; por exemplo, entre as escolas primárias da Califórnia, 48% das escolas com relatórios ELL estavam no centro da cidade contra 30% das escolas sem relatórios ELL.

  • Os alunos ELL têm maior probabilidade de estar concentrados nas grandes escolas, por exemplo, em escolas primárias de Nova Iorque, o tamanho médio das escolas com relatórios ELL era de 691 alunos contra 456 para as escolas sem relatórios ELL.

  • Os alunos ELL têm maior probabilidade de estar em escolas com uma elevada proporção de alunos pobres, medida pela proporção do corpo discente elegível para almoços grátis; por exemplo, nas escolas primárias do Arizona, 80% dos alunos das escolas com relatórios ELL eram elegíveis para almoços grátis, contra 45% dos alunos de escolas sem relatórios ELL.

Tais achados documentam o entrelaçamento da condição etnolinguística minoritária e locais, escolas e pobreza da classe trabalhadora. Eles levantam uma questão óbvia: quanto é que a pobreza conta no desempenho escolar? Essa pergunta não foi feita por nenhum dos especialistas que apresentaram relatórios perante o Painel de Revisão do Congresso sobre o impacto da NCLB em alunos ELL. No entanto, numa análise de rankings de desempenho por estado com base no National Assessment of Education Progress (NAEP [Avaliação Nacional do Progresso da Educação]) de 2010, Henwood (2011)HENWOOD, Doug. Explaining test scores. Left Business Observer, v. 131, n. 3, p. 7, 2011. argumenta que a taxa de pobreza do estudante é o mais poderoso preditor estatístico do desempenho individual de uma escola no ranking de avaliações NAEP (2011, p. 3-5):

[...] quase 60% das posições dos estados nos rankings podem ser explicadas estatisticamente pela parcela da população estudantil em almoços gratuitos ou subsidiados… [A respeito dos estudantes cuja primeira língua não é o inglês] …a percentagem de estudantes com proficiência limitada em inglês... produz apenas um coeficiente de correlação modesto (r = .17)… e adicioná-lo ao modelo de almoço [na escola] não acrescenta nada ao seu poder explicativo.

Em suma, há fortes evidências de que as desigualdades de classe estão implicadas no desempenho dos alunos ELL em avaliações padronizadas, mas essas desigualdades não fazem parte da definição da categoria ou dos critérios de avaliação. Henwood também comenta que a condição de ELL por si só apenas modestamente explica a variação por estado nas avaliações NAEP, comentário em relação ao qual eu gostaria simplesmente de observar que a ideia principal do relatório de Fry (2008)FRY, Richard. The role of schools in the English Language Learner achievement gap. Washington: Pew Hispanic Research Center, 2008. p. 34., mencionado acima, é que o status ELL e as condições de classe são frequentemente compostos, embora não necessariamente de modos refletidos nas categorias do NAEP. Eu sugiro que a categoria de ELL e seu uso em práticas de avaliação impostas pelo NCLB realizam o que Trouillot denominou um efeito de isolamento. Ou seja, a categoria e a sua utilização representam os alunos como indivíduos atomizados, agregando-os em distribuições normalizadas de desempenho, e obscurecendo as conexões de qualquer relação cultural ou histórica, incluindo aquelas de classe social. Ela os torna, ao invés disso, indivíduos diante de um processo de Estado, em particular, uma intervenção federal sobre o que conta como letramento e educação matemática e sua avaliação.

A seção seguinte examina um segundo efeito de Estado, analisando como modelos culturais em escala macro e dinâmicas de uso da língua em escala micro implementam a política de educação de diferentes maneiras. Os dados etnográficos são extraídos de estudos de casos de crianças imigrantes coreanas e mexicanas no norte do estado de Nova Iorque.

A classe social e a hierarquia étnico-racial no tratamento diferenciado de estudantes ELL coreanos e mexicanos: um efeito de identificação

Em um estudo de coreanos do ensino primário de uma escola no subúrbio ao norte do estado de Nova Iorque, Hong (2006)HONG, Carrie. Learning other cultures’ ways of knowing: Literacy and subjectivity among Korean students learning English. (Dissertation) - Department of Reading, University at Albany, Albany, 2006. descreve como a professora da sala de Inglês como Segunda Língua (ISL) que ela estudou se adaptava à primeira língua das crianças de várias maneiras. A professora nessa escola, que chamaremos Farmer Elementary, permitiu momentos especiais, em que os alunos podiam falar coreano entre si; trouxe livros e imagens coreanas para a sala de aula; incorporou inúmeras referências a práticas culturais coreanas em seu ensino; e esforçou-se para aprender algumas palavras e frases coreanas.

Essa situação de relativa acomodação linguística diferiu contundentemente daquela descoberta por mim e um assistente de pesquisa quando estudamos como crianças imigrantes falantes de espanhol se saíram na mesma região (COLLINS, 2012COLLINS, James. Migration, sociolinguistic scale and educational reproduction. Anthropology & Education Quarterly, n. 43, p. 192-213, 2012.; COLLINS; LA SANTA, 2006). Um dos nossos locais era uma escola no subúrbio similar àquela estudada por Hong – ambas as escolas atendiam predominantemente um público de classe média e profissional, e eram escolas com resultados altos. Na escola primária que estudamos, que chamaremos Sanderson Elementary, vários professores cujas salas de aula observamos disseram que falavam espanhol. Mas também foram rápidos em apontar que sentiam que o espanhol não deveria ser usado com seus alunos imigrantes mexicanos, e que eles se esforçavam para manter o espanhol fora das atividades escolares. Na classe de ISL não havia lugar para a primeira língua das crianças.9 9 - Embora a aula da Sanderson fosse dada por uma professora experiente, ela própria uma imigrante e solidária com os desafios linguísticos enfrentados por seus alunos.

Ambos os grupos de estudantes trouxeram seus repertórios linguísticos para o ambiente escolar. Como relata Hong, os alunos coreanos na Farmer Elementary frequentemente falavam coreano entre si. Embora a professora de ISL desencorajasse a prática durante as aulas formais, ela também estabeleceu horários especiais – hora de brincar e hora do lanche – em que eles ficavam livres para utilizar as suas primeiras línguas. Além disso, o coreano entrou também nas aulas de ISL regulares de diversas maneiras, como podemos ver a partir do exemplo 3:

(4) Exemplo 3: Usando inglês e coreano no Inglês como Segunda Língua (ISL) na Farmer

1P: (lendo o livro) “Aekying foi para a escola pelo resto da semana e tentou ignorar as provocações das outras crianças. No domingo, a tia de Aekyung, Kim, veio fazer uma visita. Ela tinha acabado de voltar da Coreia com muitos presentes para a família, um vestido de festa para Aekyung.

“Como estão as coisas na Coreia?” perguntou o pai.

2P: Como se chama isso? (apontando para a foto no livro, que inclui uma menina vestindo um traje tradicional coreano).

3Dan: Ah…

4Mina: Hanbok

5Kim: Hanbok

6P: Hanbok, lembram que nós tivemos isso na peça do ano passado?

7Mina: Como… como você… sabe… em inglês? Como… isso inglês?

8P: Como eu sei isso?

9Mina: Sim.

10P: Porque você me ensinou quando você trouxe para mim aquele vestido, você me ensinou que se chamava Hanbok.

11Mina: Não… (falando em coreano e caminhando até sua irmã, Hana, que está sentada do outro lado da mesa e sussurrando em coreano para ela).

12Hana: Como você sabe, como, como dizer Hanbok em inglês?

13P: Eu acho que é a mesma palavra, mesma palavra. Não há nenhuma palavra em inglês, a menos que você queira dizer vestido de festaHanbok.

14Mina: Oh. É a mesma coisa?

15P: Eu acho que significa vestido de festa. (HONG, 2006HONG, Carrie. Learning other cultures’ ways of knowing: Literacy and subjectivity among Korean students learning English. (Dissertation) - Department of Reading, University at Albany, Albany, 2006., p. 90-91).

Várias coisas merecem destaque nesse trecho. Primeiro, a professora lê para os alunos de ISL uma história sobre a Coreia (ver 1). Além disso, quando ela lhes pergunta o nome de um vestido, e eles respondem em coreano, em seguida, ela incorpora a palavra coreana, Hanbok, em suas questões subsequentes (ver 6). Quando uma das alunas, Ming, se frustra com o questionamento feito à professora (por causa de um aparente mal-entendido10 10 - Ming quer saber o termo em inglês; a professora pensa que Ming está perguntando como a professora sabe a palavra coreana. ) ela recorre à sua irmã, Hana, (na vez 11) e pede a Hana em coreano para interpretar a pergunta para a professora. Hana faz isso e a professora fornece uma resposta (nas vezes 12 e 13). Como Hong comenta sobre essa troca, os alunos não estão apenas lendo sobre a Coreia, e discutindo palavras coreanas, eles estão usando sua primeira língua para organizar tarefas de interpretação entre si, a serviço da discussão da lição.

Quando possível, os estudantes imigrantes mexicanos na Sanderson Elementary também usavam seus repertórios linguísticos completos. Não houve, no entanto, momentos especiais, como hora de brincar ou hora do lanche, em que eles fossem autorizados a fazê-lo. Em vez disso, eles foram repetidamente intimados a falar apenas inglês no ambiente escolar. No entanto, eles tenderam a usar tanto espanhol quanto inglês quando houve número suficiente de falantes de língua espanhola presentes para constituir um subgrupo dentro da sala de aula. Uma dessas ocasiões ocorreu durante uma aula de ISL no final de nosso período de pesquisa. Durante essa aula, havia quatro falantes de espanhol na sala: três meninas mais nossa assistente de projeto de pesquisa. Durante todo o período de aula, a professora de ISL interagiu com os estudantes exclusivamente em inglês.

Assim, no exemplo 4a, uma estudante, MV, pergunta à professora sobre uma atividade de construção de vocabulário com imagens e palavras em que eles identificam palavras e circulam animais. Como vemos, todo o processo é conduzido em inglês: MV pergunta “Isto é elefante?”; a professora reconhece a pergunta, mas corrige o trabalho de MV e a manda voltar para a carteira para terminar a folha.

(4a) Exemplo 4a: Recebendo instruções em inglês em aulas de Inglês como Segunda Língua (ISL) na Sanderson

(MV se aproxima da professora, P).

P: Claro que pode, traga-o para cá (para MV).

MV: Isto é elefante?

P: Ah, não… TERMINE e aí venha me ver.

MV: Ok.

Durante esta mesma lição a assistente de projeto de pesquisa, (AL), uma bilíngue fluente, tinha trabalhado com outro aluno numa atividade de vocabulário semelhante. Ela fazia suas perguntas em inglês, mas permitia que o aluno as respondesse com respostas ou perguntas em espanhol ou inglês. Em um ponto, mostrado no exemplo a seguir (4b), MV e uma nova menina se aproximam de (AL), para MV apresentar a nova menina:

(4b) Exemplo 4b: Apresentações em espanhol na Sanderson

1 MV: Ella es mi prima (Ela é minha prima.).

2 AL: Si? Como se llama? (É? Como se chama?)

3 MV: Ella? (Ela?).

4 AL: Uh huh

5 MV: LAURA [lawra]... Pero se dice “Laura” [lorә] en ingles.

(LAURA [lawra]… mas se diz “Laura” [lorә] em inglês).

Podemos ver nessa troca que os alunos da Sanderson – assim como os alunos da Farmer – têm conhecimento metapragmático e metalinguístico em suas primeiras línguas, que eles usam na organização da interação durante as tarefas de classe. MV apresenta sua nova colega e também comenta sobre as diferenças de pronúncia em espanhol e inglês do nome Laura ([lawra]/[lorә]). A troca lembra o exemplo 3, que descreve como o coreano é usado na Farmer Elementary, a esse respeito: quando o uso da primeira língua foi interacionalmente possibilitado pela demografia dos falantes, as crianças usaram ambas as línguas, para a interação social e para as tarefas pedagógicas.

Normativamente, no entanto, o espanhol nunca foi algo permitido em sala de aula na Sanderson. O padrão predominante na Sanderson foi como mostrado no exemplo 4a, com interação restrita a inglês. O padrão foi consistente na meia dúzia de aulas de ISL por nós observadas. Além disso, o diretor da escola, bem como duas das professoras cujas classes nós estudamos, articularam de forma muito clara o seu compromisso com o Ensino Somente em Inglês. Sob esse regime linguístico, isto é, nessas circunstâncias linguísticas, os alunos falantes de espanhol ficavam muito mais calados e limitavam-se a breves trocas em inglês.

Uma primeira questão é por que a diferença etnolinguística dos estudantes coreanos na Farmer era vista como um recurso a ser utilizado na aprendizagem de inglês, enquanto que a diferença etnolinguística dos estudantes mexicanos na Sanderson era vista como um obstáculo para aprender a mesma língua. Ao examinar esse quebra-cabeça, também devemos lembrar que na Farmer os professores, incluindo a professora de ISL, não sabiam coreano, enquanto que na Sanderson alguns dos professores afirmaram conhecer espanhol, apesar de não usar a língua em atividades de sala de aula. Parece que não estamos lidando com diferenças linguísticas ou culturais objetivas, mas sim com a forma como as diferenças são percebidas. A literatura sobre os imigrantes asiáticos como minorias modelo mostra que existe um estereótipo cultural amplamente difundido segundo o qual se presume que os imigrantes asiáticos são de classe média, destinados ao sucesso escolar, e propensos a adquirir “bom” inglês (PARK, 1996PARK, Kyeyoung. The use and abuse of race and culture: black-Korean tension in America. American Anthropologist, v. 89, n. 3, p. 492-499, 1996.; SHANKAR, 2008SHANKAR, Shalini. Desi land: Teen culture, class and success in Silicon Valley. Durham: Duke University Press, 2008.). Por outro lado, presume-se que as minorias não modelo – afro-americanos, latinos e indígenas – são da classe trabalhadora ou pobres, em risco de fracasso escolar, não propensas a (ou não desejosas de) adquirir um bom inglês. Esses estereótipos muitas vezes têm alguma base em realidades sociais, embora como tipificações eles inevitavelmente simplifiquem e distorçam as realidades que expressam. Os estudantes coreanos na Farmer vinham de famílias de classe média profissionais, enquanto os estudantes mexicanos na Sanderson eram de famílias da classe trabalhadora, mas esses contrastes socioeconômicos foram agrupados com pressuposições sobre língua segura e problemática e tipos de estudante.

De acordo com as descrições de Hong das relações entre a escola e a casa, os estudantes de classe média migrantes coreanos em aulas de ISL na Farmer parecem ter sido vistos como minorias-modelo. A equipe escolar valorizava a língua e cultura das crianças: “A herança cultural e linguística dos estudantes [foram] consideradas recursos valiosos para facilitar a aquisição de inglês pelos alunos, bem como para conectar a casa e a escola ao longo do ano letivo” (HONG, 2006, p. 60). A professora de ISL encorajou os pais dos alunos a ser voluntários na sala de aula das crianças, e o programa ISL organizou várias comemorações para reconhecer as conquistas dos estudantes coreanos na aprendizagem (HONG, 2006HONG, Carrie. Learning other cultures’ ways of knowing: Literacy and subjectivity among Korean students learning English. (Dissertation) - Department of Reading, University at Albany, Albany, 2006., p. 61). Em resumo, a sua diferença de língua foi vista como um recurso para a aprendizagem e, portanto, foi permitida em alguns contextos escolares. Em contraste, os alunos de ISL migrantes mexicanos da classe trabalhadora na Sanderson não foram vistos como minorias modelo. A diretora da escola calorosamente endossou o etos do trabalho duro e coesão familiar que ela e os membros do corpo docente percebiam como características das famílias migrantes mexicanas, mas ela e os membros da equipe também disseram que, devido a diferenças linguísticas, os pais não conseguiram ajudar os seus alunos com as tarefas escolares. Ao longo de nossas visitas à sala de aula e durante as entrevistas com os professores, ouvimos o discurso de “problemas de língua” da diretora, de vários professores regulares de sala de aula, e de um especialista em leitura.

As respostas diferentes para a diversidade linguística nas lições de ISL em sala de aula, e as percepções da equipe sobre as línguas e os antecedentes familiares dos alunos como recursos ou como barreiras à aprendizagem indicam que está em funcionamento um estereótipo de minoria modelo. Sugiro que ele contribui para as vantagens que os alunos de língua coreana em aulas de ISL encontram numa escola, por meio do uso de seus recursos linguísticos e sociais, e para as desvantagens que alunos de língua espanhola em aulas de ISL encontram na outra escola, por meio da exclusão de sua diversidade linguística e de seus recursos sociais. Defendo ainda que cenas cotidianas recorrentes desse modelo cultural proporcionam às crianças da escola um encontro íntimo com um segundo efeito de Estado, o qual Trouillot denomina um efeito de identificação. Estes são processos que alinham em coletividades indivíduos atomizados; no caso em apreço, eles alinham os alunos em categorias etnolinguísticas etnicizadas versus racializadas (URCIUOLI, 1996URCIUOLI, Bonnie. Exposing prejudice: Puerto Rican experiences of language, race, and class. Boulder: Westview, 1996.).

Para não parecer forçada a conexão entre estereótipos culturais de ampla circulação e processos de Estado, nós devemos ter em mente que o estereótipo de minoria modelo surgiu em reação às exigências dos movimentos dos direitos civis dos anos 1960. Esses movimentos agregaram demandas coletivas de reparação pelos governos estaduais e nacional, com base principalmente em organizações de afro-americanos/as, latinos/as e indígenas, mobilizações e desobediência civil. Em resposta a esse processo, a partir do início da década de 1970, surgiram os discursos populares, acadêmicos, e governamentais nos quais os imigrantes asiáticos foram representados como uma minoria “modelo” alternativa (LEE, 2009LEE, Stacey. Unraveling the ‘model minority’ stereotype: Listening to Asian American youth, 2. ed. New York: Teachers College Press, 2009.; SHANKAR, 2008SHANKAR, Shalini. Desi land: Teen culture, class and success in Silicon Valley. Durham: Duke University Press, 2008.), uma minoria étnico-racial, claro, mas destinada ao sucesso.

Conclusão

No caso anterior, vimos que, a fim de entender a política de letramento ou de língua como uma prática social, é necessário examinar como a política funciona em múltiplos níveis, da legislação nacional à interação face a face em sala de aula. Para realizar tal análise multinivelada, é necessário um enfoque conceitual, e eu argumentei em favor do foco na hegemonia e nos efeitos de Estado. A hegemonia nos encoraja a examinar, como observou Hymes, como a estratificação de classes e os pressupostos culturais sobre a língua convergem na escola. A rejeição gramsciana da dicotomia entre Estado e sociedade civil, entre as esferas públicas e privadas, coloca novos desafios para o estudo dos processos e poderes de Estado e possibilita concepções mais flexíveis das relações entre o oficial e o popular, tais como aquelas entre as definições oficiais de problemas de língua e estereótipos de ampla circulação sobre tipos de minorias.

O conceito de efeitos de Estado deriva de uma visão do Estado “como um campo aberto com múltiplas fronteiras e sem fixidez institucional” (TROUILLOT, 2001TROUILLOT, Michel-Rolph. The anthropology of the state in an age of globalization: Close encounters of a deceptive kind. Current Anthropology, v. 42, n. 1, p. 125-138, 2001., p. 127), que precisa ser conceitualizado em mais de um nível, e que necessita de estudo etnográfico, a fim de documentar e analisar os diversos contextos em que os efeitos de Estado atuam, como formas de poder que moldam sujeitos sociais, quer em contextos civis ou de Estado, privados ou públicos. Todas as análises anteriores mostraram que manter-se alerta para o significado indicial no uso da língua e sua estratificação em ideologias de língua e pessoais – de escala local e mais ampla – são maneiras de explorar o social e o linguístico. Os conceitos de índice e ideologia nos ajudam a investigar e entender como quadros histórico-culturais de diferentes graus de generalidade – nacional, institucional, organizacional, pessoal – são evocados e “tornados práticos” em circunstâncias imediatas de comunicação.

No excelente estudo sociolinguístico e comparativo de Menken (2008)MENKEN, Kate. English language learners left behind. Buffalo: Multilingual Matters, 2008. sobre a implementação da NCLB nas escolas de Nova Iorque, ela argumenta que a NCLB representa de fato uma política de língua e de educação. Analisando as complexidades linguísticas de perguntas de provas, a hierarquia das línguas criadas por protocolos de tradução, os comentários dos alunos sobre o estigma de ser classificados como ELLs, e relatórios de professores sobre o seu planejamento curricular em resposta à NCLB, Menken conclui o seguinte:

[…] No Child Left Behind é uma política de língua, mesmo que ela não seja apresentada como tal e raramente seja vista dessa perspectiva. Em todos os níveis do sistema educacional, as políticas legais de provas padronizadas são interpretadas e negociadas, de tal modo que todos os indivíduos envolvidos tornam-se formuladores de políticas linguísticas, com os professores atuando como árbitros finais da política. As provas são política linguística de fato nas escolas, e, essencialmente, tornam-se política de ensino de língua quando o currículo e o ensino são alinhados com as provas. A aplicação de provas e a responsabilização nos termos da lei, em última análise, refletem uma orientação de “língua-como-problema” ou “modelo de déficit” na política linguística recente nos Estados Unidos, em que a língua se tornou uma deficiência para os ELLs. (MENKEN, 2008MENKEN, Kate. English language learners left behind. Buffalo: Multilingual Matters, 2008., p. 160; grifo meu).

As conclusões de Menken oferecem uma ilustração perfeita da contribuição de Hymes’ (1996HYMES, Dell. Ethnography, linguistics, narrative inequality: Towards an understanding of voice. Philadelphia: Taylor & Francis, 1996. [1975], p. 84) de que “uma função latente do sistema de ensino é incutir insegurança linguística, para discriminar linguisticamente..., aparentando ser aberto e justo para todos”, o que permite que a língua funcione “como um meio central da hegemonia cultural”.

Eu parti dessa contribuição para analisar vários efeitos de Estado, dispersos por uma variedade de lugares e escalas sociais, em que os processos semióticos de formação de categorias e os processos indicial-inferenciais ligando o uso da língua a regularidades sociais tanto criam quanto refletem as realidades sociais. Essa dialética entre criatividade e pressuposição, performatividade e normatividade é um movimento social-semiótico mais amplo em qualquer escala em que opere, quer se trate de tratamento de diferenças de dialeto em grupos de leitura, ou do tratamento de diferentes línguas em salas de aula de ISL. Tanto a controvérsia de âmbito nacional sobre a Ebonics na escola quanto a implementação nacional de uma categoria política – English Language Learners (ELLs) – evocam e pressupõem ideologias linguísticas que vinculam variedades de língua a tipos de pessoa. Ao fazê-lo, elas evocam e obscurecem significativas relações culturais e históricas com a desigualdade. A desigualdade é uma característica de todas as sociedades humanas conhecidas (FOLEY, 1997FOLEY, William A. Anthropological linguistics: an introduction New York: Basil Blackwell, 1997.), mas as desigualdades econômicas são fundamentais nas sociedades capitalistas. Compreender as complexas relações das desigualdades econômicas com as capacidades cotidianas de comunicação e pensamento, incluindo formas escolarizadas de letramento, continua sendo um desafio premente para a antropologia da educação.

Agradecimentos

versões preliminares deste manuscrito foram apresentadas em Literacy Practices in the 21st Century, no Kings College, em Londres, entre 27 e 30 de maio de 2012, no Inter-American Symposium on Ethnographic Research in Education XIII, na University of California – Los Angeles (UCLA), entre 18 e 20 de septembro de 2013, e num seminário do Departamento de Linguística, na University of the Western Cape, em 14 de abril de 2014. Agradeço ao público de todos os eventos pelas perguntas e comentários e a todos os participantes dos projetos de pesquisa discutidos neste artigo. Tais projetos receberam apoio do National Institute of Education, do Flemish Academic Centre for Science and the Arts, e da Spencer Foundation. Por último, agradeço a Elsie Rockwell, Katie Anderson-Levitt, e ao parecerista anônimo de Educação e Pesquisa pelas sugestões editoriais que aperfeiçoaram a argumentação.

Referências

  • ARRIGHI, Giovanni. The winding paths of capital. New Left Review, n. 56, p.61-94, 2011.
  • BAILEY, Alison; CARROLL, Patricia. Assessment of English language learners in the era of new academic content standards. Review of Research in Education. n. 39, p. 253-294, 2015.
  • BAYNHAM, Mike. Literacy practices: investigating literacy in social contexts. New York: Longman, 1995.
  • BLOMMAERT, Jan. Discourse: a critical introduction. New York: Cambridge University Press, 2005.
  • BLOMMAERT, Jan. The sociolinguistics of globalization. New York: Cambridge University Press, 2010.
  • BLOMMAERT, Jan.; COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. Polycentricities and interactional regimes in “globalized” neighborhoods. Ethnography, v. 6, n. 2, p. 205-235, 2005b.
  • BLOMMAERT, Jan.; COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. Spaces of multilingualism. Language and Communication, v. 25, n. 3, p. 197-216, 2005a.
  • BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. Reproduction in education, society, and culture. Beverly Hills: Sage, 1977.
  • COLLINS, James. Differential treatment in reading groups. In: COOK-GUMPERZ, Jenny (Ed.). The social construction of literacy. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. p. 138-164.
  • COLLINS, James. Language and class in minority education. Anthropology and Education Quarterly, v. 19, n. 4, p. 299-326, 1988.
  • COLLINS, James. Migration, sociolinguistic scale and educational reproduction. Anthropology & Education Quarterly, n. 43, p. 192-213, 2012.
  • COLLINS, James. Social reproduction in classrooms and schools. Annual Review of Anthropology, v. 38, p. 33-48, 2009.
  • COLLINS, James. Socialization to text: structure and contradiction in schooled literacy. In SILVERSTEIN, M; URBAN, G. (Eds.). Natural histories of discourse. Chicago: University of Chicago Press, 1996. p. 203-228.
  • COLLINS, James. The culture wars and shifts in linguistic capital: for combining political economy and cultural analysis. International Journal of Qualitative Studies in Education, v. 12, n. 3, p; 269-286, 1999a.
  • COLLINS, James. The ebonics controversy in context: literacies, subjectivities and language ideologies in the United States. In: BLOMMAERT, Jan (Ed.). Language-ideological debates: Studies in linguistic historiography. Berlin: Mouton de Gruyter, 1999b. p. 201-233.
  • COLLINS, James. Understanding Tolowa histories: Western hegemonies and native American responses. New York: Routledge, 1998.
  • COLLINS, James; BLOT, Richard. Literacy and literacies: Texts, power, and identity. New York: Cambridge University Press, 2003.
  • COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. Goffman and globalization: Frame, footing and scale in migration-connected multilingualism. In: COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef; BAYNHAM, M. (Eds.). Globalization and languages in contact: Scale, migration, and communicative Practice London: Continuum, 2009. p. 19-41.
  • COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. (Eds.). Multilingualism and diasporic populations: Spatializing practices, institutional processes, and social hierarchies. Language & Communication, v. 25, n. 3, 2005. Special issue.
  • COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. Reading shop windows: multilingual literacy practices and indexicality. Journal of Literacy Research, v. 39, n. 3, p. 335-356, 2007.
  • COLLINS, James; SLEMBROUCK, Stef. ‘You don’t know what they translate’: language contact, institutional procedure, and literacy practices in neighborhood health centers in urban Flanders. Journal of Linguistic Anthropology, v. 16, n. 2, p. 249-268, 2006.
  • COOK-GUMPERZ, Jenny (Ed.). The social construction of literacy. 2. ed. New York: Cambridge University Press, 2006.
  • CRAWFORD, James. At war with diversity: U.S. language policy in an age of anxiety. Buffalo: Multilingual Matters, 2000.
  • FOLEY, Douglas. Learning capitalist culture: deep in the heart of tejas. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1990.
  • FOLEY, William A. Anthropological linguistics: an introduction New York: Basil Blackwell, 1997.
  • FRIEDMAN, Jonathan. Globalizing languages: ideologies and realities of the contemporary global system. American Anthropologist, n. 105, p. 744-752, 2003.
  • FRY, Richard. The role of schools in the English Language Learner achievement gap. Washington: Pew Hispanic Research Center, 2008. p. 34.
  • GRAMSCI, Antonio. The prison notebooks. New York: International Publishers, 1971.
  • GUMPERZ, John J. Discourse strategies. New York: Cambridge University Press, 1982.
  • GUMPERZ, John J. Introduction to part IV. In: GUMPERZ, John J.; LEVINSON, S. (Eds.). Rethinking linguistic relativity. New York: Cambridge University Press, 1996. p. 359-373.
  • GUMPERZ, John J. The speech community. In A. Duranti (Ed.). Linguistic anthropology: a reader. Oxford: Blackwell. 2001. p. 43-52.
  • HEATH, Shirley. Ways with words. New York: Cambridge University Press, 1983.
  • HENWOOD, Doug. After the new economy. New York: The New Press, 2003.
  • HENWOOD, Doug. Explaining test scores. Left Business Observer, v. 131, n. 3, p. 7, 2011.
  • HONG, Carrie. Learning other cultures’ ways of knowing: Literacy and subjectivity among Korean students learning English. (Dissertation) - Department of Reading, University at Albany, Albany, 2006.
  • HYMES, Dell. Ethnography, linguistics, narrative inequality: Towards an understanding of voice. Philadelphia: Taylor & Francis, 1996.
  • LEACOCK, Eleanor. Teaching and learning in city schools: A comparative study. New York: Basic Books, 1969.
  • LEE, Stacey. Unraveling the ‘model minority’ stereotype: Listening to Asian American youth, 2. ed. New York: Teachers College Press, 2009.
  • MARX, Karl. Capital: A critique of political economy. New York: The Modern Library, 1906.
  • MENKEN, Kate. English language learners left behind. Buffalo: Multilingual Matters, 2008.
  • MUFWENE, Salikoko S. et al. The structure of the noun phrase in African-American vernacular English. In: MUFWENE, Salikoko S. et al. (Eds.). The structure of African-American English: Structure, history and use. London: Routledge.1998. p. 69-81.
  • NYT Editorial Board. Don’t give up the gains in education. New York Times, Feb. 21, 2015, SR 10, 2015.
  • OHMANN, Richard. Reflections on language and class. In: OHMANN, Richard. Politics of letters. Middletown: Wesleyan University Press, 1987. p. 275-313.
  • PARK, Kyeyoung. The use and abuse of race and culture: black-Korean tension in America. American Anthropologist, v. 89, n. 3, p. 492-499, 1996.
  • RAMPTON, Ben. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.
  • RAMPTON, Ben. Style contrasts, migration and social class. Journal of Pragmatics, v. 43, n. 5, p. 1236-1250, 2011.
  • ROGERS, Rebecca. A critical discourse analysis of family literacy practices: Power in and out of print. Mahwah: Lawrence Erlbaum Associates, 2003.
  • ROTHSTEIN, Richard. Class and schools. New York: Teachers College Press, 2004.
  • SHANKAR, Shalini. Desi land: Teen culture, class and success in Silicon Valley. Durham: Duke University Press, 2008.
  • SILVERSTEIN, Michael. Indexical order and the dialectics of social life. Language & Communication, v. 23, p. 193-229, 2003.
  • SILVERSTEIN, Michael. Shifters, linguistic categories, and cultural description. In: BASSO, K. SELBY, H. (Eds.). Meaning in Anthropology. Albuquerque: University of New Mexico Press, 1976. p. 11-55.
  • STREET, Brian. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.
  • TROUILLOT, Michel-Rolph. The anthropology of the state in an age of globalization: Close encounters of a deceptive kind. Current Anthropology, v. 42, n. 1, p. 125-138, 2001.
  • U.S. CONGRESS 2007. Impact of No Child Left Behind on English Language Learners: Hearing before the subcommittee on early childhood, elementary, and secondary education, Committee on Education and Labor, U.S. House of Representatives, v. 110, n. 110-14, 2007. 110th Congress.
  • URCIUOLI, Bonnie. Exposing prejudice: Puerto Rican experiences of language, race, and class. Boulder: Westview, 1996.
  • WALLERSTEIN, Immanuel. Historical capitalism. London: Verso, 1983.
  • WEIS, Lois. Working class without work. New York: Routledge, 1990.
  • WILLIAMS, Raymond. Marxism and literature. Oxford: Oxford University Press, 1977.
  • WORTHAM, Stanton. Learning identities. New York: Cambridge University Press, 2005.
  • ZENTELLA, Ana-Celia. The hispanophobia of the official english movement in the U.S. International Journal of the Sociology of Language, v. 127, p 71-86, 1997.
  • 1
    - Começou com o compromisso teórico e metodológico de estudar o letramento como um evento e não como um texto (HEATH, 1983HEATH, Shirley. Ways with words. New York: Cambridge University Press, 1983.), que também foi um ponto de partida para o influente trabalho inicial com a teoria e o estudo do que veio a ser chamado de práticas de letramento (por exemplo, BAYNHAM, 1995BAYNHAM, Mike. Literacy practices: investigating literacy in social contexts. New York: Longman, 1995.).
  • 2
    - Nota da tradutora: o termo indígenas é utilizado ao longo do texto como tradução de Native Americans.
  • 3
    - Nota da tradutora: ao longo do texto, optei por manter o termo English Language Learners ou sua abreviação (ELL) em inglês para enfatizar a especificidade dessa categoria de estudantes, já que, em possíveis traduções para o português, tais como Alunos de Inglês, por exemplo, o leitor poderia ter a impressão de que se falava de todos os alunos, uma vez a disciplina Língua Inglesa é componente do currículo em vários anos.
  • 4
    - Resumidamente, o tratamento diferenciado referiu-se aos relatórios de pesquisa sobre a escola da era dos direitos civis, que apontavam que os alunos da classe trabalhadora e de minorias recebiam ensino diferente daquele dos estudantes brancos de classe média, quer nas mesmas escolas ou, como era geralmente o caso, em distritos escolares urbanos versus suburbanos.
  • 5
    - Nota da tradutora: há variações entre os significados elencados por diferentes dicionários para a palavra gibberish. No entanto, um significado comum em todos eles é fala ou escrita ininteligível ou nonsense. Fontes: American Heritage® Dictionary of the English language (2011), Collins English Dictionary – Complete and unabridged (1991, 1994, 1998, 2000, 2003), Random House Kernerman Webster’s College dictionary. (2010). Disponível em: http://www.thefreedictionary.com/gibberish Acesso em 19.junho.2015.
  • 6
    - Todos os nomes dos consultores de pesquisa são pseudônimos.
  • 7
    - Sobre a análise de estruturas de sentimento fundamentadas em detalhes linguísticos impressionantes, incluindo dados longitudinais, consulte Rampton (2006RAMPTON, Ben. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.; 2011); para análises de habitus em práticas de letramento em famílias migrantes, consulte Pahl (2008).
  • 8
    - Nota do tradutor: 0 termo Escolas com relatórios ELL (ELL reporting schools) designa aquelas em que uma proporção significativa dos estudantes são ELLs.
  • 9
    - Embora a aula da Sanderson fosse dada por uma professora experiente, ela própria uma imigrante e solidária com os desafios linguísticos enfrentados por seus alunos.
  • 10
    - Ming quer saber o termo em inglês; a professora pensa que Ming está perguntando como a professora sabe a palavra coreana.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    14 Jan 2015
  • Aceito
    26 Mar 2015
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo Av. da Universidade, 308 - Biblioteca, 1º andar 05508-040 - São Paulo SP Brasil, Tel./Fax.: (55 11) 30913520 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revedu@usp.br