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Os jovens desafiam a comunidade: entre a esperança e a estigmatizaçãoI

Resumo

Este artigo apresenta conclusões resultantes de dois projetos de pesquisa: Assets Coming Together for Youth (ACT for Youth) [Reunindo os valores e recursos dos jovens]; e Engaging Girls, Changing Communities (EGCC) [Envolvendo as jovens, e transformando as comunidades]. O ACT for Youth consiste num projeto universitário de pesquisa colaborativa cuja finalidade é compreender as perspectivas dos jovens em relação ao bem-estar, e estimular o desenvolvimento positivo da juventude na comunidade de Jane-Finch, uma região historicamente estigmatizada, situada no noroeste de Toronto, no Canadá. O projeto EGCC examinou o modo pelo qual as jovens se envolvem em atividades cívicas e de liderança, em novos meios urbanos; além disso, tentou identificar, em particular, aspectos que estimulam a participação comunitária das jovens, bem como os obstáculos com os quais elas se deparam em tal participação. Ademais, estes projetos são a demonstração de que métodos inovadores de participação dos jovens nos permitem uma melhor compreensão sobre a vida deles, a partir do conhecimento de suas perspectivas e habilidades. Este artigo baseia-se em dados coletados pelos jovens, e examina de que modo as narrativas sobre violência e bem-estar criam, problematizam e desestruturam conceitos como a criminalidade e a desesperança juvenis. Os dados também ilustram a maneira como os jovens são capazes de envolver-se com iniciativas voltadas a questões da comunidade. Além disso, o artigo oferece reflexões metodológicas sobre a importância de envolver os jovens em pesquisas, além de ideias sobre como estas iniciativas podem promover ou impedir a produção de um capital social na forma de vínculos [bonding social capital].

Etnografia baseada nos jovens; Photo voice; Desenvolvimento positivo dos jovens; Envolvimento na comunidade; Autonomia de gênero

Abstract

This paper presents findings from two research studies: Assets Coming Together for Youth (ACT for Youth); and, Engaging Girls Changing Communities (EGCC). ACT for Youth was a collaborative university-community research study designed to understand youth perspectives on well-being and encourage positive youth development in the historically stigmatized Jane-Finch community, located in North-Western Toronto, Canada. EGCC investigated how young women engage in leadership and civic activities in new urban environments; further, it specifically sought to identify enhancers and barriers to community participation that girls face in their everyday lives. Both ACT for Youth and EGCC legitimize the framework in which youth are presented as assets with possibilities, as sources of knowledge and power, as well as agents of social change with competencies to critically examine the world around them and their participation in it. Further, these projects illustrate that innovative youth participatory methods can provide an opportunity to gain insight into the lives of young people that is grounded in their perspectives and their capabilities. This paper draws on data collected by and from youth and it explores how narratives of violence and well-being produce, trouble, and disrupt the notion of youth criminality and hopelessness. Data also illustrates how youth can engage in initiatives that help address community issues. Additionally, the paper offers methodological insights on the value of engaging youth through research as well as ideas on how such undertakings can foster or hinder the production of bridging social capital.

Youth based ethnography; Photovoice; Positive youth development; Community engagement; Gender empowerment

Introdução e histórico

Este artigo apresenta o posicionamento identitário de jovens de ascendência africana, e suas formas de participação cívica na política canadense. O paradigma aqui apresentado ilustra o modo como os jovens constroem e negociam suas identidades, como são identificados pelas demais pessoas, como se inter-relacionam com elas, bem como a sua forma de negociar métodos e níveis de participação em suas comunidades. A essência deste paradigma é o desenvolvimento do capital social, da parte destes jovens, o que é relevante para o processo de transformação em cidadãos atuantes e engajados. Neste artigo, também apresento estudos de caso de envolvimento dos jovens na comunidade, com cidadãos do Canadá. Tais estudos demonstram as dificuldades enfrentadas por jovens de ascendência africana em Toronto (e em outros locais), que, ao longo de suas vidas, convivem com estereótipos e a estigmatização.

Estudos sobre a identidade dos jovens e sua participação cívica indicam que, em vários países, o status dos jovens oscila entre as categorias de “encrenqueiros transviados”, ativistas políticos e agentes de transformação. O fato de eles caberem em todas ou qualquer uma destas categorias representa o principal desafio para etnógrafos críticos interessados na análise da ambígua representação da identidade dos jovens, e de sua participação na comunidade.

Podem servir de exemplo, a fim de analisar este status ambíguo dos jovens e sua participação comunitária, tanto no Sul quanto no Norte do planeta, os estudos que realizei na África do Sul e no Canadá, respectivamente. No Sul, um estudo que relaciona juventude, identidade e política trouxe à tona o papel fundamental desempenhado pelos jovens na luta contra o apartheid na África do Sul; contudo, estes jovens foram estranhamente considerados como praticantes de atos violentos, por alguns; e agentes de transformação social, por outros (DLAMINI, 2008DLAMINI, S. N. Beyond vulnerability: examining the educational experiences of vulnerable children in Tanzania. Windsor: University of Windsor, 2008.). É evidente que as atividades realizadas pelos jovens, dentre outras, foram responsáveis pelos alicerces da África do Sul que hoje conhecemos; e, conforme indicado por relatos e registros, os jovens continuam desempenhando um papel essencial no enfrentamento e transformação de práticas repressivas do Estado, na África do Sul pós-apartheid1 1 - Exemplo admirável disso é o papel desempenhado pelos jovens, com sua rejeição às posturas e atitudes do segundo presidente sul-africano, Thabo Mbheki, no que diz respeito à extrema urgência de importação de remédios para o tratamento da Aids. . Dlamini (2008)DLAMINI, S. N. Beyond vulnerability: examining the educational experiences of vulnerable children in Tanzania. Windsor: University of Windsor, 2008.começou a formular perguntas sobre os processos que permitiriam a estes jovens fazer a transição entre um status de “pessoas que lutam pela liberdade” (caracterizados, sobretudo, por uma atividade violenta) e o de responsáveis pela construção de uma nação sul-africana pós-apartheid. O capital social acumulado pelos jovens, além de lhes permitir sobreviver à turbulência política que assolou o país naquela época, lhes possibilitou superar as dificuldades de ordem econômica e cultural que marcaram esta época, além do sofrimento inerente a tais lutas2 2 - Dlamini (2008) explica em detalhes a importância do capital social na forma de vínculos, que permitiu aos jovens encontrar empregos de meio-período, por exemplo, numa época em que o modelo tradicional de familia, formado por pai e mãe (ambos empregados), estava sendo abandonado. . Na “nova” África do Sul, os jovens, mal preparados para competir numa economia em retração, acabaram se deparando com o desemprego, e foram rotulados pela mídia com o questionável epíteto de “geração perdida” (ver, por exemplo, o curto – e necessário – artigo de Eleanor Swartz, de 2012, intitulado “Youth Caught between Reality and Promise” [Jovens cercados entre realidade e promessas]).

Como resultado do estudo de Dlamini (2008)DLAMINI, S. N. Beyond vulnerability: examining the educational experiences of vulnerable children in Tanzania. Windsor: University of Windsor, 2008., as questões relacionadas a processos de transição entre períodos de violência e de democracia pacífica levaram a uma investigação que buscava examinar o modo pelo qual os jovens que migraram para o Canadá, vindos de países africanos devastados pelas guerras, aprenderam a participar e tornar-se cidadãos participativos em sua nova pátria, a também a “tornar-se” canadenses3 3 - Num artigo sobre identidade racializada, Dei (1997) faz uma distinção entre “ser negro” (isto é, ter uma identidade racial) e “tornar-se negro” (isto é, relacionar-se com a identidade racializada com uma conotação política). Esta última permite o desenvolvimento de “uma identidade “resistente”, e a possível associação entre identidade politizada e prática social” (DEI; JAMES, 1998, p. 93). . (DLAMINI et al., 2009). O interesse deste estudo foi investigar de que forma a participação cívica está associada ao desenvolvimento e a distribuição do capital social (BOURDIEU, 1982; PUTMAN, 1993, 2000PUTNAM, R. Bowling alone: the collapse and revival of American community. New York: Simon and Schuster, 2000.), e à identidade dos jovens. Embora limitada no que diz respeito às suas categorias de participantes – já que incluiu apenas os jovens que haviam enfrentado a guerra ou situações de violência –, esta investigação revelou que o capital social na forma de vínculos (cujo conceito será mais elaborado, adiante), ou seja, as redes formadas por pessoas racial e culturalmente semelhantes a eles, foi o que permitiu a estes jovens estabelecerem-se e se transformarem em cidadãos engajados. Além disso, Dlamini et al. (2009) constataram que a excessiva dependência do capital social na forma de vínculos, que deriva sobretudo dos recursos de seus países de origem, impunha limitações aos jovens de comunidades africanas, quanto à realização de seu sonho em terras canadenses – por mais nítido que tal sonho pudesse ser. Considerando os parâmetros – por vezes, restritos – do capital social na forma de vínculos, estudos subsequentes centraram o foco na investigação de obstáculos e de estímulos à participação da comunidade; da mesma forma, por meio de sua contribuição para a consolidação do capital social, estes estudos envolveram os jovens em todo tipo de atividades, e traçaram um mapa dos sucessos metodológicos e das limitações de sua abordagem. Nas seções seguintes, apresentaremos uma documentação de tais estudos, e destacamos lições relacionadas à metodologia, além de analisarmos a produção e a distribuição do capital social, e sua relação com o comprometimento do jovem com a comunidade.

Engajamento cívico e o capital social

O engajamento cívico, do modo como a expressão é usada no contexto deste artigo, refere-se à transformação das diversas populações do Canadá em cidadãos ativos, que têm a capacidade e também a oportunidade de participar da construção do futuro de suas comunidades e de seu país. Para a compreensão da participação e do engajamento cívicos, é fundamental entender o conceito de capital social, que conecta diversos conceitos sociológicos (reciprocidade, cooperação, comunidade, rede de contatos, autorizações oficiais, veículos de informação, confiança etc) a fim de explicar inúmeras questões sociais de um modo interdisciplinar. A grande expansão das pesquisas sobre o capital social, e particularmente do conceito tal qual empregado por Putnam (1993aPUTNAM, R. The prosperous community: social capital and public life. The American Prospect, n. 13, p. 35-42, 1993a., 1993bPUTNAM, R. Making democracy work: civic traditions in modern Italy. Princeton: Princeton University Press, 1993b., 1995PUTNAM, R. Bowling alone: America’s declining social capital. Journal of Democracy, v. 6, n.1, p. 65-78, 1995., 2000PUTNAM, R. Bowling alone: the collapse and revival of American community. New York: Simon and Schuster, 2000.), gerou uma quantidade impressionante de elementos que confirmam sua relação com (e suas influências em) variados âmbitos, tais como economia, política, estrutura social, educação, controle social, crime, relações intergrupais, mobilidade social, estilos de vida e saúde. Este interessante conceito nos permite conectar e compreender aspectos do comportamento humano que são inter-relacionados e complementares, nos níveis individual, familiar, grupal, organizacional, comunitário e social (SCHRIVER, 2001SCHRIVER, J. M. Human behaviour and the social environment: shifting paradigms in essential knowledge for social work practice. 3. ed. Boston: Allyn and Bacon, 2001.).

Não obstante os resultados positivos e impressionantes associados a este conceito (COLEMAN, 1988COLEMAN, J. S. Social capital in the creation of human capital. American Journal of Sociology, n. 94: p. 95-121, 1988.; SAEGERT; WINKEL; SWARTZ, 2002SAEGERT, S.; WINKEL, G.; SWARTS, C. Social capital and crime in New York’s low-income housing. Housing Policy Debate, v. 13, n. 1, 2002.), tem havido uma crescente identificação de desvantagens nos processos de elaboração e sustentação deste conceito. Isto ocorre, por exemplo, quando grupos valem-se de seu capital social para a exclusão de outros, e negam-lhes oportunidades, limitando sua mobilidade social – deste modo, aprofundam as desigualdades intergeracionais; ou no caso da presença de um capital social negativo em certas redes sociais, tais como as gangues de jovens urbanas e as famílias mafiosas (PORTES; LANDOLT, 1996PORTES, A.; LANDOLT, P. The downside of social capital. The American Prospect, n. 26, p. 18-21, May/June, 1996.). Faz-se também necessário um questionamento crítico do pressuposto – geralmente aceito sem discussão – de que o capital social traz benefícios às comunidades e aos lares, independentemente do vínculo étnico ou com o grupo racial. Se o capital social é definido como “redes de contato com normas, valores e pontos de vista compartilhados, que facilitam a cooperação dentro e entre os grupos” (OCDE, 2001), ele não está imune às desigualdades que emergem de diferenças de poder estruturais na sociedade, que contribuem para intensificar as várias desvantagens enfrentadas por certos grupos, em diferentes aspectos de sua vida, pelo fato de as “relações de poder estarem enraizadas no sistema das relações sociais” (FOUCAULT, 1982FOUCAULT, M. Afterword: the subject and power. In: DREYFUS, H.; RAINBOW, P. (Eds.). Michel Foucault: beyond structuralism and hermeneutics. Chicago: University of Chicago Press, 1982. p. 208-226.).

Tendo em vista a polêmica utilização coletiva do capital social, é importante examinar mais detalhadamente um dos fatores que influenciam a formação identitária e a participação cívica dos jovens de ascendência africana no Canadá, a saber: o histórico de marginalização racial, e de formas sociais e culturais de discriminação. Ou seja, a despeito das políticas multiculturais – e outras, baseadas na diversidade – pelas quais o Canadá é reconhecido mundialmente, os grupos de jovens minoritários (de modo geral), e os de ascendência africana (em particular), ainda enfrentam inúmeros obstáculos, incluindo a discriminação racial, que limitam seu acesso a oportunidades sociais e econômicas, e influenciam as formas de engajamento cívico. Em outras palavras, independentemente da política federal de multiculturalismo, que legitima o empenho dos membros das chamadas minorias visíveis, de preservar sua cultura e, ao mesmo temo, integrar-se à “cultura canadense”, Isin e Siemiatycki (1999)ISIN, E. F.; SIEMIATYCKI, M. Fate and faith: claiming urban citizenship in immigrant Toronto. Toronto: Joint Centre of Excellence in Research on Immigration and Settlement, 1999. (Working paper; 8).destacam a existência de uma realidade mais problemática em Toronto, onde vários grupos de imigrantes ocupam uma posição marginal no espaço social. Estes autores enfatizam que a participação e a influência, no que diz respeito às esferas econômica, social, cultural e política da cidade, não estão ao alcance de vários grupos de imigrantes. A pesquisa de diversidade étnica por estatísticas do Canadá (2003) mostra que os imigrantes da primeira geração têm um menor envolvimento com a participação cívica em grupos ou instituições canadenses. Taylor (1992)TAYLOR, C. Multiculturalism and ‘the politics of recognition. Princeton: Princeton University Press, 1992. p 26-35. sustenta que o principal problema enfrentado pelas minorias é a ausência de reconhecimento político das identidades minoritárias etnoculturais.

Outro fator mediador de engajamento cívico alimenta-se de dados sobre as condições em que, nas duas últimas décadas, muitos dos emigrantes africanos chegaram ao Canadá, enfrentando uma série de experiências de privação, advindas de guerras, pobreza e outros problemas sociais. Em razão de tais experiências, o país que os acolheu tem uma compreensão limitada em relação à sua identidade enquanto povo, e sobre a forma e o momento de participar em suas novas comunidades; e o conhecimento destes imigrantes sobre as formas de governo é influenciado pelas experiências negativas que tiveram sob o regime opressor de seus países de origem. Várias famílias originárias de países como Sudão, Serra Leoa e Ruanda trazem consigo um passado de guerras, pobreza, doenças, e muitas outras dificuldades sociopolíticas. Um estudo realizado em Windsor, Ontário (DLAMINI, 2004; DLAMINI et al., 2009), constatou que grande parte dos jovens – e seus pais – que chegaram ao Canadá depois de ter passado por experiências traumáticas em países de regimes opressivos, mostrava-se cética ou desconfiada em relação a iniciativas governamentais; além disso, sua compreensão sobre o conceito de participação cívica e do que significa ser um cidadão engajado, que trabalha em prol do desenvolvimento de sua comunidade, era bastante distinta da compreensão mostrada por um cidadão canadense. Heller (1987)HELLER, M. The role of language in the formation of ethnic identity. In: PHINNEY, J.; ROTHERAM, M. (Eds.). Children’s ethnic socialisation: identity, attitude and interactions. London: Sage, 1987. sustenta, e com razão, que a injustiça social implica não somente na distribuição desigual dos bens e recursos, mas inclui todo tipo de norma, condição social, processo social ou prática social capaz de interferir ou de impor limites à total participação na sociedade. Com base em tal compreensão sobre a injustiça social, Dlamini, Anucha & George (2006-2008DLAMINI, S. N.; ANUCHA, U.; GEORGE, U. Immigrant women negotiating Canadian work cultures. Windsor: Canadian Race Relations Foundation, 2006-2008.)4 4 - Mais detalhes sobre as conclusões obtidas neste estudo estão disponíveis no artigo de Dlamini, Anucha e Wolfe (2012), intitulado Negotiated Challenges in the Workplace, in Affilia: Journal of Women in Social Work. Particularmente interessante, neste estudo, é a descrição das maneiras pelas quais as mulheres imigrantes beneficiaram-se do capital social de vínculos para encontrar empregos, num período de até cinco anos após sua migração para o Canadá. , Anucha et al (2009-2014), Dlamini et al (2010-2014) e Daniel & Dlamini (2014 até o momento) deram início a pesquisas visando compreender melhor o desenvolvimento de redes de contato sociais inter e intra-grupos que derivem da participação cívica, e mostrar seus benefícios socioeconômicos. Desta maneira, os estudos de caso aqui apresentados levam em consideração o papel do capital social, bem como o dos dois fatores de mediação para a participação dos jovens na comunidade.

Promovendo o engajamento dos jovens de Toronto

Os jovens, cujas ideias apresentamos neste artigo, participaram de variados estudos, nos quais o autor deste texto desempenhou o papel de investigador principal, ou de co-participante, sendo responsável por uma parte significativa de um projeto de pesquisa mais amplo dentro da comunidade universitária. Desenvolvidos simultaneamente, estes projetos de pesquisas e suas conclusões são aqui apresentados de acordo com a ordem cronológica de financiamento.

Assets Coming Together for Youth (ACT for Youth) [Reunindo os Valores e Recursos dos Jovens]: 2009-2014

Criado em 2009, o ACT for Youth estabeleceu como objetivo principal a análise das maneiras pelas quais os valores e recursos da comunidade (pessoas, riquezas etc), podem ser reunidos visando o aperfeiçoamento das vidas dos jovens, e usados para criar perspectivas de futuro significativas. Este projeto abrangeu cinco grupos de trabalho interconectados, cabendo a cada um deles a investigação de um tema específico5 5 - Os grupos de trabalho são: (a) Youth Voices, cuja função é a análise das perspectivas dos jovens em relação à violência, bem-estar e questões de disputa de territórios; (b) Youth Survey, que elaborou uma pesquisa com a finalidade de criar um perfil de atributos dos jovens de Jane-Finch; (c) Youth Education and Employment Strategies, voltada à exploração dos caminhos direcionados ao aperfeiçoamento da economia; (d) Reframing Discourse through a Strategic Frame Analysis of Media and Documents, cujo objetivo é buscar os meios para transformar o discurso público negativo sobre a juventude em um discurso público que sirva de base para o desenvolvimento de políticas positivas para os jovens; (e) Evaluation and Monitoring Theme, cuja função é desenvolver um modelo de avaliações com vistas à emancipação, para apontar meios pelos quais os pesquisadores possam estabelecer uma parceria igualitária e sustentável para as pesquisas dentro da comunidade universitária. . Os dados aqui apresentados são extraídos da pesquisa do grupo Youth Voices Working Group (YVWG), realizada no ano de 2010. O YVWG elaborou mini-projetos a fim de promover o engajamento dos jovens, e revelar seus pontos de vista sobre três temas: bem-estar, violência e questões relacionadas à disputa de territórios6 6 - No verão de 2010, o YVWG trabalhou em dois projetos: o Mobile Speakers’ Corner (Espaço dos Usuários de Celulares) e o Projeto PhotoVoice. O primeiro deles consistia num dispositivo de áudio móvel, instalado em dois shopping centers em Jane-Finch. Jovens frequentadores destes shoppings foram escolhidos para gravar um clip de 5 minutos, no qual responderiam a uma dentre três perguntas da pesquisa da YVWG. . As perguntas específicas feitas pelo YVWG são as seguintes: 1) Quais são as perspectivas dos jovens em relação às suas necessidades e seu bem-estar?; 2) De que maneira os jovens encaram as “disputas de território” em suas comunidades?7 7 - Esta pergunta pode ser formulada de diferentes maneiras: De que modo os jovens definem a comunidade que representam? Eles circulam livremente pelas comunidades de negros? Parceiros da comunidade que trabalham para a instalação de centros comunitários propícios aos jovens foram essenciais na elaboração das questões, e para tornar a linguagem acessível a eles. ; 3) De que modo a violência se faz presente em suas vidas?

Além disso, neste período de 2012, o YVWG também centrou o foco em questões como o engajamento dos jovens, o desenvolvimento de habilidades e a realidade econômica. Ou seja, embora nosso objetivo fosse revelar as opiniões dos jovens sobre estas questões, também tínhamos interesse em aspectos como o engajamento, estímulo e emancipação dos jovens. Por meio do PhotoVoice (PV) e do Mobile Speakers’ Corner8 8 - O MSC é composto por uma unidade móvel de áudio, instalada em dois shopping centers da região de Jane-Finch. Após um treinamento com pesquisadores e assistentes da York University, a fim de saber mais sobre o projeto, sobre práticas éticas a ele associadas, e sobre técnicas de gravação, os jovens pesquisadores (JP) se dispersaram pela área dos shoppings, para recrutar outros jovens, e lhes pedir que fizessem suas próprias gravações, respondendo a uma das três questões temáticas acima mencionadas. Resumidamente, o método de coleta de dados obedeceu a esta sequência: (i) os JPs colocaram mesas em locais estratégicos, nos shoppings, munidos de instrumentos de pesquisa e de cartazes com os dizeres “ACT for Youth”, em letras que chamassem a atenção; (ii) assim que uma pessoa entrava no shopping, era abordada por um JP, que lhe passava informações sobre o estudo, mencionando procedimentos éticos de pesquisa, e convidando-a a participar; (iii) caso se interessasse, o participante recebia um gravador e uma folha com as perguntas da pesquisa. A seguir, o JP explicava o procedimento de gravação, ressaltando que o entrevistado deveria responder a apenas uma das três questões propostas. Para cada uma das três questões, havia sub-questões, visando levar o participante a uma reflexão mais aprofundada sobre a questão (ver apêndice i); (iv) Por fim, gravador e questões à mão, o participante selecionado se distanciaria, indo para um lugar dentro do campo de visão – mas não de audição – do JP, gravaria sua fala na fita por cerca de 5 minutos, devolveria a fita, e receberia seu pagamento (10 dólares). No final, foram criteriosamente selecionados 50 participantes/moradores de Jane-Finch, de modo a serem classificados na faixa etária entre 16 e 26 anos. , estimulamos a participação dos jovens na construção do conhecimento, na coleta de dados, e a desenvolverem uma maior sintonia com sua realidade econômica. A construção do conhecimento envolvia, dentre outras coisas, aprender a envolver-se com as pesquisas e, ao mesmo tempo, ser contratado pelo projeto para produzir conhecimento, e aprender a criar espaços para si mesmo na sociedade. Os jovens que participaram do projeto eram moradores da região de Jane-Finch, onde moram cerca de 80 mil pessoas, de raça, etnia, religião e geração variadas (Statistics Canada, 2005), uma área de alta concentração de minorias raciais e étnicas, de moradias para cidadãos de baixa renda, de gangues e problemas associados a drogas. Consequentemente, esta região com frequência é considerada como o equivalente canadense de um gueto americano (O’GRADY; PARNABY; SCHIKSCHNEIT, 2010O’GRADY, W.; PARNABY, P. F.; SCHIKSCHNEIT, J. Guns, gangs, and the underclass: a constructionist analysis of gun violence in a Toronto high school. Canadian Journal of Criminology and Criminal Justice/La Revue Canadienne de Criminologie et de Justice Pénale, v. 52, n. 1, p. 55-77, 2010.; JAMES, 2012JAMES, C. Life at the intersection: community, class, and schooling. New Scotia: Fernwood, 2012.).

Engajamento e desenvolvimento positivo dos jovens

O estudo sobre jovens de áreas urbanas evoluiu, de um modelo centrado na psicologia dos jovens e na oportunidade de fazer intervenções com o intuito de aperfeiçoar comportamentos – tais como a redução da gravidez entre as adolescentes, o abuso de drogas, e outras atividades de risco (MORROW, 2001MORROW, V. Using qualitative methods to elicit young people’s perspectives on their environments: some ideas for community health initiatives. Health Education Research, v. 16, n. 3, p. 255-268, 2001.) –, para um modelo centrado nos desafios e deficiências dos jovens moradores em áreas de baixa renda, e numa visão do jovem não como um problema a ser estudado e administrado, mas como uma pessoa valiosa, repleta de possibilidades (GINWRIGHT; CAMMAROTTA, 2002GINWRIGHT, S.; CAMMAROTA, J. New terrain in youth development: the promise of a social justice approach. Social Justice, v. 29, n. 4, p. 82-95, 2002.; FORMAN, 2004FORMAN, J. J. Community policing and youth as assets. The Journal of Criminal Law and Criminology, v. 95, n. 1, p. 1-48, 2004.), e como fonte de conhecimento e poder (FOX et al., 2010FOX, M.; MEDIRATTA, K.; RUGLIS, J. Critical youth engagement: participatory action research and organizing. In: SHERROD, L.; TORNEY-PUTA, J.; FLANAGAN, C. (Eds.). Handbook of research and policy on civic engagement with youth. Hoboken: Wiley Press, 2010. p. 621-650.). Pereira (2007)PEREIRA, N. Ready, set, engage: building effective youth-adult partnerships for a stronger child and youth mental health system. Ontário: Children’s Mental Health Ontario, 2007. Available at: <www.kidsmentalhealth.ca/about_us/new_mentality.php>. Access: Oct. 23, 2011.
www.kidsmentalhealth.ca/about_us/new_men...
define o engajamento dos jovens como tentativas de estimular sua autonomia, que consistem em envolvê-los ativamente com as questões que os afetam pessoalmente, ou que eles considerem relevantes. O engajamento dos jovens implica no fortalecimento da voz destes cidadãos, e na criação de espaços seguros, onde eles possam debater e tomar decisões sobre questões que afetam suas vidas.

Estudos que caracterizam a juventude como pessoas valiosas e transmissoras de conhecimento recorrem a modelos que incluem o engajamento deles em vários aspectos da vida. Tais estudos demonstram diferentes locais e modos onde e pelos quais os jovens podem se envolver, e servir de fontes de inspiração, valiosos que são. Por exemplo, os jovens são apresentados como pessoas capazes de promover e envolver-se em pesquisas de ação participativa (GIBSON, 2011GIBSON, J. When youth take the lead: youth participatory research as bullying prevention. 2011. (PhD Thesis) - Miami University, Department of Psychology, Miami, 2011.; HIRSHNER et al., 2011; LANGHOUT; THOMAS, 2010LANGHOUT, R.D.; THOMAS, E. Imagining participatory action research in collaboration with children: an introduction. American Journal of Community Psychology, n. 46, p. 60-66, 2010.; MATHEWS et al.; e, tal como demonstrado em nosso estudo ACT for Youth – ANUCHA et al., 2009-2014). Eles também são vistos como pessoas seriamente envolvidas em organização e/ou no desenvolvimento de programas (KRASNEY; DOYLE, 2002KRASNEY, M.; DOYLE, R. Participatory approaches to program development and engaging youth in research: the case of an inter-generational urban community gardening program. Journal of Extension, v. 40, n. 5, 2002. Available at: <http://www.joe.org/joe/2002october/a3.php>. Access: Sep. 30, 2011.
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); no planejamento comunitário (CAMPBELL et al., 2010CAMPBELL, D.; ERBSTEIN, N.; FABIONAR, J. Engaging youth in community change: outcomes and lessons learned from sierra health foundation’s REACH youth program. 2010. Available at: <www.sierrahealth.org/doc.aspx?203>. Access: Set. 21, 2011.
www.sierrahealth.org/doc.aspx?203>...
; CHECKOWAY et al., 1995CHECKOWAY, B.; POTHUKUCHI, K.; FINN, J. Youth participation in community planning: what are the benefits? Journal of Planning Education and Research, v. 14, n. 2, p. 134-139, 1995.); e na avaliação da comunidade (CHECKOWAY; RICHARDS-SCHUSTER, 2003CHECKOWAY, B.; RICHARDS-SCHUSTER, K. Youth participation in community evaluation research. American Journal of Evaluation, v. 24, n. 1, p. 21-33, 2003.; FOX; CARTER, 2011FOX, M.; MEDIRATTA, K.; RUGLIS, J. Critical youth engagement: participatory action research and organizing. In: SHERROD, L.; TORNEY-PUTA, J.; FLANAGAN, C. (Eds.). Handbook of research and policy on civic engagement with youth. Hoboken: Wiley Press, 2010. p. 621-650.; LONDON et al., 2003LONDON, J. K.; ZIMMERMAN, K.; ERBSTEIN, N. Youth-led research and evaluation: tools for youth, organizational, and community development. New Directions for Evaluation, n. 98, p. 33-45, 2003.). Na verdade, pode-se afirmar com segurança que, enquanto no passado os jovens eram considerados obstáculos ao desenvolvimento da comunidade, tal desenvolvimento é considerado, hoje, sinônimo de desenvolvimento dos jovens (LONDON et al., 2003LONDON, J. K.; ZIMMERMAN, K.; ERBSTEIN, N. Youth-led research and evaluation: tools for youth, organizational, and community development. New Directions for Evaluation, n. 98, p. 33-45, 2003.).

Hoje em dia, as práticas de engajamento positivo dos jovens estão disseminadas a tal ponto, que os processos de engajamento começam a fazer parte de um trabalho comunitário “padronizado”. Na cidade de Toronto, por exemplo, há uma série de iniciativas nas quais os jovens se envolvem com pesquisas, desenvolvimento das comunidades e serviços de saúde. Algumas destas iniciativas partem dos próprios jovens, tais como uma ferramenta de pesquisas que cobre toda a área municipal, a fim de avaliar os serviços na área de saúde sexual oferecidos aos jovens da região urbana (FLICKER et al., 2010FLICKER, S. et al. Survey design from the ground up: collaboratively creating the Toronto teen survey. Health Promotion Practice, v. 11, n. 1, p. 112-122, 2010.).

Assets Coming Together for Youth (ACT for Youth): um projeto ilustrativo das formas de engajamento dos jovens, baseadas na arte

Com a finalidade de estimular a participação dos jovens, pesquisas qualitativas têm recorrido, cada vez mais, a meios de investigação e de intervenção baseados na arte (por ex., dramatização, narração de histórias e, no caso do ACT for Youth, no PhotoVoice), que, por sua vez, resultam em maneiras alternativas de expressar ou de buscar novas ideias (HEATH; SOEP, 1998HEATH, S. B.; SOEP, E. Youth development and the arts in non-school hours. Grantmakers in the Arts, v. 9, n. 1, p. 9-32, 1998.). Além disso, métodos visuais de pesquisa têm sido usados como uma forma de contar histórias distintas sobre as experiências dos jovens. A visualização é considerada um método criativo que permite ao jovem escolher e controlar o conteúdo que ele deseja “narrar” (MORROW, 2001MORROW, V. Using qualitative methods to elicit young people’s perspectives on their environments: some ideas for community health initiatives. Health Education Research, v. 16, n. 3, p. 255-268, 2001.); a narração de histórias, ademais, é vista como uma oportunidade para que os grupos tradicionalmente silenciados “adquiram voz” (BELL HOOKS, citada em WRIGHT et al., 2010WRIGHT, C. Y. et al. Visual research methods: using cameras to empower socially excluded black youth. Sociology: the Journal of the British Sociological Association, v. 45, n. 3, p. 531-531, 2011. Retraction of v. 44, p. 541, 2010., p. 542).

O grupo Youth Voices Working Group usou um método participativo baseado nas artes, o PhotoVoice (PV), com a finalidade de envolver os jovens e revelar sua visão sobre os temas já mencionados (bem-estar, disputa de territórios e violência). Usando a metodologia de pesquisa “snowball”, por meio de panfletos e jovens parceiros na comunidade, o projeto PV recrutou participantes da comunidade de Jane-FInch, com idade entre 16 e 24 anos. Para certificar-se que tais membros pertenciam à comunidade, lhes era perguntado o código postal de suas residências. No total, 79 jovens foram recrutados e classificados conforme quesitos como gênero, etnia, raça, país de origem e idade. Os dados utilizados neste artigo referem-se ao tema “bem-estar” do projeto PV, e contêm informações fornecidas por 11 participantes de ascendências sul-asiática, negra (Caribe e África), latino-americana e leste-asiática. Estes dados se encaixam em três categorias: 41 fotografias com comentários, 11 entrevistas individuais, e 3 transcrições de entrevistas em grupos de foco9 9 - É importante observar que o grupo ACT for Youth aproveitou outros dados que também contribuíram para dar consistência à análise das fotografias. Por exemplo, dados das pesquisas com os estudantes foram coletados em todas as escolas de Ensino Médio da região de Jane-Finch. Ver também a nota ix, acima. .

Como metodologia, o projeto PV é o produto da interação entre os “diálogos críticos” de Paulo Freire (1972)FREIRE, P. Pedagogy of the oppressed. New York: Seabury, 1972. e entrevistas etnográficas. Em seu trabalho com camponeses no Brasil, Freire ganhou fama pelo viés dialógico e direcionado à solução de problemas em sua abordagem à educação, abordagem que inclui três passos metodológicos: ouvir a comunidade para compreender seus problemas; valer-se de um diálogo que expõe um determinado problema, a fim de investigar os problemas; e explorar potenciais de ação, ou maneiras concretas para mudar as circunstâncias de vida das pessoas (WALLERSTEIN; BERNSTEIN, 1988WALLERSTEIN, N.; BERNSTEIN, E. Empowerment education: Freire’s ideas adapted to health education. Health Education & Behaviour, v. 15, n. 4, p. 379-394, 1988.). No segundo estágio de seu trabalho, Freire incluiu o uso de “códigos”, para criar o engajamento no diálogo voltado à solução de problemas. Ao usar o termo “códigos”, ele se referia à utilização de desencadeadores, tais como dramatizações e fotografias, a fim de representar as reações emocionais e sociais dos participantes, e centrar o debate nestas questões.

De modo semelhante ao foco que Freire centra na emancipação dos camponeses, o PhotoVoice foi desenvolvido por Wang e Burris (1997)WANG, C.; BURRIS, M. A. Photovoice: concept, methodology, and use for participatory needs assessment. Health Education & Behaviour, v. 24, n. 3, p. 369-387, 1997., de início, como uma técnica a ser usada com populações “com poder limitado, ou que tenham acesso limitado às pessoas que exercem poder sobre suas vidas”. Assim sendo, a câmera “torna-se, para estas pessoas, sua ferramenta e seu porta-voz” (ROYCE et al., 2006ROYCE, S. W.; PARRA-MEDIAN, D.; MESSIAS, D. H. Using photo voice to examine and initiate youth empowerment in community-based programs: a picture of process and lessons learned. Californian Journal of Health Promotion, v. 4, n. 3, p. 80-91, 2006., p. 81). Além disso, assim como os códigos de Freire, no projeto PV pede-se aos participantes que tirem fotografias representativas de questões importantes em suas vidas; a seguir, os participantes iniciam uma análise (diálogo) crítica, usando o modelo SHOWeD para construir uma narrativa por meio da qual possam explicar suas fotos. Suas conclusões são então compartilhadas com a comunidade, através de uma atividade previamente combinada entre os participantes. No PV, a ação ocorre sob formas variadas: pode ser usada para conectar os jovens entre si, para servir de base de dados para governos locais, ou para envolver os jovens em suas comunidades. Enquanto método de ação participativa, o PV centra o foco nas habilidades dos jovens participantes na condição de especialistas nas suas próprias experiências, e visa fomentar o engajamento cívico dentro das comunidades. O papel do pesquisador é “servir de fonte de informações para as pessoas que estão sendo estudadas... como uma oportunidade que elas têm de agir, efetivamente, em seu próprio interesse” (RUBBIN; BABBIE, 2005, p. 439). A seguir, apresentamos uma descrição do modo como o PV foi utilizado para que os participantes registrassem sua opinião sobre o bem-estar na comunidade Jane-Finch.

O Projeto PhotoVoice sobre o Bem-Estar

Do ponto de vista metodológico, o Projeto PhotoVoice sobre o Bem-Estar seguiu o típico protocolo de pesquisa por meio do qual os acadêmicos solicitam e recebem a aprovação do Conselho de Ética de Pesquisa relacionado ao assunto em questão. Tão logo recebemos os certificados de ética, começamos a recrutar participantes para todos os projetos temáticos do ACT for Youth, no verão de 2010. O Projeto PhotoVoice sobre o Bem-Estar foi realizado num período de três semanas, com atividades que poderiam ser classificadas em três focos temáticos-qualitativos: construção do conhecimento; conceitualização; e ação. Primeiramente, durante reuniões dos grupos de foco, os participantes trabalharam juntamente com assistentes de pesquisa10 10 - Dois dos facilitadores eram Assistentes de Pesquisa (AP): um deles, aluno de Mestrado com foco no uso da metodologia PV; e outro, um doutorando em Estudos Sociais e de Igualdade, que também era fotógrafo profissional. O terceiro facilitador era um jovem voluntário numa organização comunitária local. a fim de saber mais sobre pesquisas e práticas éticas a ela associadas (consentimento, coleta de dados), e para aperfeiçoar suas habilidades com a fotografia. Após os dois encontros centrados na construção de conhecimento, os jovens se reuniram para conceitualizar as perguntas da pesquisa. Mais precisamente, tais perguntas foram apresentadas aos jovens, que se envolveram num debate crítico sobre suas perspectivas em relação às necessidades e o bem-estar da comunidade. A discussão foi norteada pelas seguintes perguntas, que também serviram de referência para os jovens em seu trabalho de tirar fotografias em sua comunidade: Qual é, para você, o significado de comunidade? Qual é o ponto forte de sua comunidade? Que carências você tem em sua comunidade? Como você definiria bem-estar? Para você, quais os sintomas de que sua comunidade está bem? Os jovens eram estimulados a examinar estas perguntas, prestando especial atenção aos seguintes aspectos: relacionamentos sociais, moradia, saúde, educação, emprego, e organizações comunitárias.

Munidos de câmeras e de “instruções operacionais”, os jovens iniciaram seu trabalho de campo, a fim de tirar fotografias. Feito isso, eles foram entrevistados individualmente a respeito das fotos que tiraram; em outras palavras, durante a entrevista, puderam elaborar melhor sua compreensão de bem-estar tal como a representaram em duas imagens por eles escolhidas. Também lhes foi pedido que criassem uma narrativa para cada foto, que poderiam ser usadas para compartilhar seus pontos de vista, e também para consumo e ações públicas. Concluídas as entrevistas individuais, os jovens se reuniram num outro grupo de foco, e neste encontro as fotografias foram compartilhadas (e comentadas) de modo anônimo – ou seja, sem que a identidade do fotógrafo fosse revelada.

As entrevistas individuais e as reuniões dos grupos de foco foram gravadas em áudio, com o consentimento de todos, e transcritas, para uma posterior análise detalhada. Dados da pesquisa, incluindo fotografias e transcrições das conversas das reuniões foram primeiramente analisadas pelos co-dirigentes do YVWG, juntamente com os assistentes de pesquisa, para que se pudesse ter uma visão geral das conclusões11 11 - Cada um dos grupos do ACT for Youth é coordenado conjuntamente por uma comunidade, e um co-participante do projeto acadêmico. Na análise de dados, o YVWG valorizava a combinação do conhecimento acadêmico e aquele com base na comunidade, pois isto lhes proporcionava autenticidade e uma interpretação matizada das representações dos jovens. . Após tal análise, todos os membros do YVWG (membros de organizações comunitárias e da academia), juntamente com os jovens, eram convidados a analisar os dados, e a contribuir com suas interpretações. Em todas as etapas da análise, os assistentes de graduação do YVWG estavam presentes, documentando tais interpretações, que posteriormente foram incorporadas e alinhadas aos temas previamente organizados pelos participantes do PV, em sua última reunião do grupo de foco. No final, os dados foram identificados com códigos, extraídos do texto. Estes códigos foram então classificados segundo conceitos e categorias, que compuseram os temas finais. A codificação foi feita linha por linha, sem a utilização de nenhum software.

Algumas dificuldades relacionadas à metodologia, que implicaram na alteração de alguns processos metodológicos, são dignas de nota. Uma das alterações tem a ver com o tempo: no planejamento original, o projeto duraria seis semanas; contudo, devido à rotatividade do pessoal envolvido no projeto, o tempo total foi reduzido para três semanas. Durante este período, trabalhou-se com praticamente o mesmo volume de material – o que pode ter debilitado alguns dos objetivos iniciais da pesquisa, tais como oferecer um know-how etnográfico aos jovens. Já foi comprovado em estudos que, quanto mais tempo os jovens estiverem envolvidos num projeto, mais desenvolvida tende a ser a sua capacidade de análise, e mais alta, a sua autoconfiança (STACK et al., 2004; WRIGHT et al., 2010WRIGHT, C. Y. et al. Visual research methods: using cameras to empower socially excluded black youth. Sociology: the Journal of the British Sociological Association, v. 45, n. 3, p. 531-531, 2011. Retraction of v. 44, p. 541, 2010.). O curto prazo estabelecido talvez tenha afetado a qualidade das fotografias dos jovens; as imagens por eles capturadas podem ter sido influenciadas pelo prazo apertado, afetando sua inspiração. O curto prazo também dificultou para que se determinasse, sistematicamente, em que medida os jovens foram capazes de desenvolver capacidades críticas significativas; contudo, informações contidas em seus relatos apontam para um nível de autoconfiança crescente.

Por fim, o componente mais ativo do projeto ficou comprometido em razão das dificuldades encontradas no momento de reunir os jovens, a fim de divulgar suas fotos, num evento de gala organizado pela ACT for Youth. Consequentemente, a YVWG planejou a organização de outros fóruns. Esta alteração produziu resultados positivos, já que manteve parte dos jovens envolvida para além da iniciativa do PV, e estimulou-os a participar no trabalho de organização das conclusões do projeto PhotoVoice. Assim, de um modo geral, o envolvimento dos jovens nos projetos YVWG no verão de 2010 possibilitou que as investigações continuassem fazendo parte do vernáculo da comunidade Jane-Finch, e deu aos jovens a valiosa oportunidade de desenvolver habilidades, de ter acesso a empregos significativos, e à universidade.

Conclusões e discussão

A análise dos dados revelou que as fotografias tiradas pelos jovens podem ser classificadas em três grandes vertentes. A primeira inclui fotos que retratam o senso de coletividade da comunidade, sua resiliência e suas realizações. Tais fotos tematizam atividades da vida social na comunidade, e foram identificadas como elementos que contribuem para o bem-estar. A segunda consiste em fotos que indicavam a ausência de bem-estar; retratam ambientes decadentes na comunidade, e a elas se refere como obstáculos para o alcance do bem-estar. A terceira categoria de fotos inclui as que menosprezam o bem-estar, e eram vistas como símbolos que reduziam a sensação de bem-estar. É importante observar que os símbolos considerados como passíveis de reduzir ou solapar o bem-estar, tais como racismo e discriminação, foram justamente os que os jovens tiveram maior dificuldade em capturar, em suas fotografias.

Por meio de relatos de suas experiências com o bem-estar, comunidade e violência, os jovens e demais moradores de Jane-Finch questionam e contestam narrativas que explicam o sucesso dos jovens como mero resultado do esforço individual, e fazem um retrato negativo da comunidade à qual eles pertencem. Pode-se apresentar uma interação dinâmica destas narrativas, por meio da metáfora de rosas que crescem em meio a um ambiente hostil. À procura de imagens que pudessem ilustrar suas experiências de bem-estar, uma jovem fotografou rosas mal-cuidadas crescendo no meio de um arbusto. Quando lhe foi pedido para descrever a foto, e que disse por que a tirou, ela disse:

“A foto mostra uma imagem de rosas em contraste com uma área devastada, cheia de ervas daninhas. Coloridas, as rosas estão em plena florescência, pois isto demonstra esperança. Esperança é uma coisa importante para que os humanos possam viver felizes. Do mesmo modo, as rosas desta foto encontram obstáculos que impedem sua sobrevivência. Embora descuidadas, as rosas continuam a florescer lindamente, e continuam vivendo”.

Fotografia 1
: Canteiro de rosas

Embora possa ser considerada uma bela ilustração da resiliência dos jovens, esta fotografia também pode contribuir para perpetuar a imagem negativa da comunidade à qual estes jovens pertencem. Tal imagem negativa está presente em inúmeras narrativas dos jovens, e de outros moradores de Jane-Finch. Por exemplo, dois jovens compartilharam as seguintes impressões, em suas breves entrevistas:

“Em Jane-Finch, você é vítima de roubos, você é assassinado. Um monte de coisas ruins pode acontecer para você, ali”.

“[Os pais] simplesmente não ligam [...] se seus filhos estão ou não envolvidos com crimes, gangues ou violência. Tudo o que importa para eles é ter um filho, e eles não têm a oportunidade de voltar para casa e [...] cuidar dos filhos. Dia após dia, eles vão para o trabalho e voltam para casa, não têm contato com os filhos em casa, e os deixam livres, para fazer o que bem entendem [...] Às vezes, eles roubam produtos nas lojas, outras vezes vendem maconha, ou então brigam para proteger seus amigos e acabam sendo presos por isso. Basicamente, esta região é uma concentração de pessoas recém-chegadas, e poucas pessoas receberam uma educação na escola, os pais não ligam para eles”.

Contudo, as narrativas que retratam Jane-Finch como uma comunidade “problemática” existem paralelamente a contra-narrativas, que chamam a atenção para aspectos geralmente ignorados por uma imagem predominante em relação aos jovens urbanos e as comunidades às quais pertencem. Estas narrativas alternativas chamam a atenção para o “quadro mais amplo”. Os aspectos positivos e negativos de Jane-Finch enfatizam a importância da família e da comunidade para o bem-estar dos jovens urbanos, e indicam as limitações estruturais ao bem-estar, na experiência da vida cotidiana dos jovens.

Uma narrativa que chama atenção para o “quadro mais amplo” de Jane-Finch está sintetizada na imagem capturada pela foto de uma árvore semi-morta. Sobre ela, diz o fotógrafo:

“Isto simboliza os altos e baixos da vida [...]. Muita gente tem a imagem estereotipada de Jane-Finch, de um lugar ruim, mas Jane-Finch tem uma porção de coisas positivas acontecendo, para as pessoas que moram nesta região”.

Relatos sobre confiança, comunidade, família, diversidade e espírito de solidariedade estão presentes em vários relatos feitos por jovens de Jane-Finch, constituindo uma contra-narrativa às imagens negativas que se impõem sobre a percepção que o público tem desta região. Esta contra-narrativa é ilustrada por um excerto de uma breve entrevista:

“Eu adoro a comunidade Jane-Finch, de verdade. Para mim, ela é minha casa, e tenho orgulho de dizer isto. Acho que viver aqui traz uma porção de benefícios. Adoro a diversidade e todas as diferentes culturas, esse tipo de coisa. Sinto que tenho sorte em fazer parte desta comunidade. [...] Há uma quantidade enorme de pessoas ótimas na comunidade. Sinto que tenho bastante segurança, e muito à vontade ao lado destas pessoas, e nos lugares em que já estive, nestes 17 anos que moro aqui [...] Aqui, encontrei inúmeras pessoas incríveis, e chega um ponto que a proximidade com uma porção de gente é tão grande, que é como se fosse minha família”.

Fotografia 2
: Árvore

Uma foto que retrata um churrasco comunitário, organizado num parque público, transmite a imagem da comunidade de Jane-Finch como protetora de seus filhos. O jovem que tirou esta foto explica:

“A fotografia mostra o que a minha comunidade faz pelas crianças, oferecendo a elas segurança, na comunidade [...]. Mostra as crianças se divertindo, e se alimentando com comida saudável”.

A maioria dos entrevistados está ciente dos modos pelos quais as macro-estruturas socioeconômicas limitam as oportunidades dos jovens. Eles mencionam a precária manutenção das construções e prédios públicos, e as carências relacionadas a educação, emprego e oportunidades de lazer, como situações que criam estresse e conduzem à violência doméstica e nas ruas. O relato a seguir faz menção à ausência de espaços adequados para o lazer, e os efeitos disso para a juventude:

“Reparei que em Jane-Finch não há muitos recursos, já que, como vocês sabem, esta comunidade não é um lugar tão grande. Tudo o que temos é uma piscina pública... tipo, eu não vejo muitas iniciativas de acampamentos ou programas para as crianças e adolescentes... tipo, atividades para elas. É por isso que elas não têm nada mais pra fazer, além de se envolver com drogas, álcool, violência... porque não têm um centro de lazer, onde possam passar seu tempo com os amigos, conseguir ajuda dos outros para as lições de casa, conversar sobre seus problemas, ter um lugar para ficar, e algo pra fazer”.

O depoimento de um jovem faz uma boa síntese da necessidade de criar e expandir espaços para lazer, e oportunidades para a educação, emprego e o engajamento dos jovens em Jane-Finch:

“Precisamos de mais recursos, temos que parar de cancelar os programas que existem. Nossos programas, nossa programação de música para os jovens, na cidade inteira, cozinhas comunitárias, alimentação, bancos, precisamos ter mais acesso... [...] O que precisamos é uma destinação apropriada para as verbas. Os jovens precisam saber que têm um futuro para além das ruas, e se você não contribuir, a gente vai continuar, sabe, se destruindo, é isso o que acontece, isso vai continuar acontecendo, e isso precisa ter um fim. As pessoas precisam chegar às comunidades, e doar, dar sua retribuição às comunidades, nos dar mais tempo para demonstrarmos nossa criatividade, nos dar acesso, nos dar recursos, nos dar lugares para eventos, nos dar financiamento, nos dar empréstimos, nos informar sobre nossos direitos quanto à educação. Esta é uma necessidade humana, e um direito humano. Acredito que isso é muito importante, e é uma carência nossa”.

Fotografia 3
: Refeição gratuita (Churrasco comunitário)

Usando a metáfora das rosas que crescem em meio ao concreto, como referência aos jovens urbanos que prosperam, apesar de todos os pesares (DUNCAN-ANDRADE, 2009)12 12 - Embora esta seja uma metáfora academicamente associada a Duncan-Andrade, é importante lembrar que ela foi criada pelo rapster Tupac Shakur, nos versos a seguir (aqui traduzidos): “A rosa que nasceu no meio do concreto – Você ouviu falar na rosa que nasceu no meio de uma fenda no concreto? Contrariando as leis da natureza, ela aprendeu a andar sem ter pernas. Engraçado, ela parece fazer isso alimentando seus sonhos; aprendeu a respirar ar fresco. Longa vida à rosa que cresceu no meio do concreto, quando ninguém ligava para ela”. Acessado emhttps://www.goodreads.com/work/quotes/181246-the-rose-that-grew-from-concrete. , este projeto aponta as limitações das narrativas predominantes, que idealizam algumas rosas em particular, ao mesmo tempo em que estigmatizam o ambiente no qual elas cresceram, negligenciando as macroestruturas socioeconômicas que limitam as oportunidades dos jovens (enxergando apenas comunidades, e não as limitações das macroestruturas, tais como o concreto). Os relatos dos jovens e de outros moradores de Jane-Finch contêm uma contra-narrativa que enfatiza o importante papel desempenhado pelas famílias e pelas comunidades, a fim de garantir o desenvolvimento e o bem-estar dos jovens (enxergando as comunidades como as raízes que permitem às rosas crescer em meio ao concreto), e apontam para a necessidade de lidar com as limitações estruturais que reduzem as oportunidades para os jovens urbanos (“amaciando” o concreto e, talvez de um modo mais corajoso, trabalhando para transformar Jane-Finch num canteiro de rosas).

Engaging Girls, Changing Communities (EGCC) [Envolvendo as Jovens, e Transformando as Comunidades]: 2011-2014

Engaging Girls, Changing Communities (EGCC): Examinando Processos de Engajamento Cívico e Liderança é um projeto de pesquisa da comunidade universitária, com duração de três anos, que buscou examinar os pontos de vista e as experiências das jovens com liderança e o engajamento cívico em novos ambientes urbanos. Este estudo de ação participativa foi uma tentativa de resposta a inquietações de que o potencial das jovens para as atividades cívicas e para assumir posições de liderança continuará sendo inexplorado caso não sejam buscadas novas formas de incentivar o potencial de liderança delas. O EGCC promoveu o desenvolvimento das jovens como futuras líderes e estimulou-as à desconstrução e à reconceitualização do termo “liderança”, tal como elas a concebiam.

A metodologia do EGCC foi estruturada pelo Community Dialogue Approach [Abordagem de Diálogo Comunitário] (ANUCHA, 2007; ANUCHA et al., 2006, 2007), que consiste num modelo utilizado em projetos anteriores, que serviram de base para a sua formação (ANUCHA, 2009-2014; DLAMINI, 2005-2008DLAMINI, S. N.; ANUCHA, U. Intergenerational links and community engagement of youth from African communities. Windsor: CESC-SSHRC; University of Windsor, 2005-2008.). Munido de elementos da tradicional pesquisa-ação, o Community Dialogue Approach caracteriza o engajamento comunitário como uma prática metodológica, e a pesquisa como um diálogo comunitário que deve implicar no pleno envolvimento dos membros da comunidade. Tais membros estão plenamente envolvidos na definição do foco, e na implementação da pesquisa. O Community Dialogue Approach enfatiza a importância do uso de métodos variados, e estimula uma pesquisa aplicada que seja significativa para a comunidade e, ao mesmo tempo, preserve seu mérito científico.

De modo semelhante ao Act for Youth, do ponto de vista metodológico, o projeto EGCC seguiu o típico protocolo de pesquisa no qual os acadêmicos solicitam e recebem a aprovação do Conselho de Ética de Pesquisa relacionado ao assunto em questão. A partir de então, o EGCC deu início a atividades que foram divididas em três etapas. A primeira foi um fórum comunitário que reuniu os membros da comunidade e os representantes dos jovens. Neste fórum, uma vez apresentado o projeto, discutiram-se as questões de investigação e os métodos propostos, sendo modificados sempre que necessário, e foram apresentadas várias formas de participação. A segunda etapa consistiu na contratação de jovens pesquisadoras, a fim de realizar entrevistas com outras jovens. Um pesquisador da faculdade ficou responsável por este treinamento, juntamente com um estudante de doutorado, também pesquisador neste projeto. Após o treinamento, as jovens pesquisadoras fizeram as entrevistas, e as transcreveram. Na sequência, um fórum de celebração de final de ano reuniu, assim como o primeiro fórum, membros da comunidade universitária para discutir as etapas seguintes dos projetos, e também para permitir às jovens pesquisadoras compartilharem suas experiências com as entrevistas. A terceira fase do EGCC consistia em facilitar iniciativas das jovens da comunidade, cujo objetivo mais amplo era apresentar novos caminhos para o engajamento das jovens em atividades de liderança e comunitárias. Além disso, as parcerias com as organizações comunitárias tinham por objetivo a conciliação das reais aspirações de liderança das jovens com os programas de liderança já existentes, oferecidos pelas organizações comunitárias. De modo geral, portanto, o EGCC foi concebido para neutralizar o desequilíbrio de gêneros, tanto na comunidade canadense quanto no ambiente político. Ademais, o projeto EGCC teve um papel decisivo ao facilitar a sistematização do conhecimento sobre lideranças e engajamento civil.

Conclusões: Jovens Pesquisadoras no Engaging Girls, Changing Communities (EGCC)

Fase de entrevistas: benefícios e limitações

O projeto EGCC recrutou oito jovens pesquisadoras (JP), num processo de seleção (GALL, BORG & GALL, 1996; RISTOCKR & GRIEGER, 1996), com um foco preciso: jovens entre 16 e 22 anos matriculadas em estabelecimentos de ensino (escolas secundárias, faculdades ou universidades). Este grupo de jovens incluía 5 afro-canadenses, 2 canadenses-caribenhas e uma turca-canadense; no total, elas realizaram 51 entrevistas com jovens de idade semelhante à delas, a maioria das quais (39) com minorias étnicas. Além disso, o EGCC alocou recursos para 12 iniciativas comunitárias lideradas por jovens; a primeira delas foi proposta e tornou-se o piloto das jovens pesquisadoras (JP). A discussão se encontra nas páginas que seguem.

Em todas as etapas, as jovens pesquisadoras (JP) eram estimuladas a registrar as informações em diários, para que pudessem usá-los como reflexão para cada atividade. A primeira atividade que desenvolveram foi aprender a entrevistar. Nesta fase, as JPs trabalhavam ao lado de um membro da faculdade, num período de mais de 15 horas, durante o qual aprendiam sobre a realização de pesquisas qualitativas. Este treinamento previa que, quando chegassem para os encontros, as JPs já tivessem feito leituras preliminares, e estivessem prontas para discutir sobre as perguntas, trazendo mais elementos para a sessão de treinamento.

Este treinamento incluiu discussões sobre ética nas pesquisas, sobre estratégias de entrevistas, como produzir questões investigativas, e como transcrever entrevistas gravadas em áudio. As JPs também realizavam simulações de entrevistas entre si, e na sequência preenchiam um “formulário de reflexão”, no qual relatavam sua experiência no treinamento. Na segunda parte do treinamento, as JPs deveriam fazer uma entrevista entre 15 e 20 minutos com uma jovem que teria algo de interessante a dizer sobre jovens e liderança. As transcrições e os formulários preenchidos a partir destas entrevistas eram usados como um modo de oferecer feedback às JPs, para aperfeiçoarem suas habilidades. Tais formulários indicam que, por um lado, as JPs se beneficiaram com o treinamento, já que este lhes permitiu o desenvolvimento de um olhar ético, lhes ensinou habilidades críticas que elas usariam posteriormente em sua percepção dos seus ambientes, e no contexto de suas entrevistas, além de lhes dar subsídios para trabalhar ao lado de seus pares. Por outro lado, contudo, as JPs revelaram sua frustração com o material usado no treinamento, considerando-o de difícil compreensão, além de ter consumido um tempo demasiadamente longo. Ao mesmo tempo, as JPs tiveram a sensação de que os pesquisadores não estavam preparados para ajudá-las a analisar este material, ou sequer a reconhecer seu nível de dificuldade.

Logo após o treinamento, começou a etapa das entrevistas e, para cada uma delas, as JPs deveriam imediatamente registrar suas reflexões sobre este material, em seus diários. Os registros contidos nos diários indicam que as JPs passaram por momentos de nervosismo, e baixa autoconfiança no que se refere às próprias habilidades de pesquisa na fase inicial do processo. Nas palavras de uma jovem:

“O maior desafio que eu enfrentei foi ter de assumir o papel de entrevistadora, já que normalmente eu sou subordinada”.

Outra jovem registrou:

“Esta foi minha primeira entrevista, e eu estava extremamente nervosa”.

Registros feitos nos diários, logo após as primeiras entrevistas, indicam que as JPs se depararam com mais benefícios do que desafios. Um dos benefícios evidentes, que se pôde notar por meio da análise dos diários de todas as JPs, foi que todas elas apresentavam pontos de convergência em relação a determinadas respostas dadas por alguns participantes das pesquisas. Deste modo, as JPs se revelaram capazes de compreender e de mostrar empatia com os valores pessoais dos participantes, o que, em última instância, proporcionou algum tipo de “conexão”. Conforme explicou uma JP:

“Dentre todos que entrevistei até agora, ela é quem mais se aproxima de meus valores e meus pontos de vista. Concordei 100% com todas as respostas que ela me deu”.

Ou ainda, nas palavras de outra JP:

“Consigo entender perfeitamente os sentimentos dela, de querer ter a família, como um todo, mais perto”.

Talvez em razão deste clima de união, houve momentos em que as JP sentiam a necessidade de “dar proteção” às entrevistadas; isto é, eram capazes de “sentir” a dor das entrevistadas. Além disso, esta conexão com as entrevistadas criou um desafio, no sentido de que as JPs tiveram dificuldade em abster-se de expressar suas próprias opiniões, a fim de não influenciar as respostas. As duas frases abaixo, extraídas de entrevistas, são ilustrativas disso:

“Enquanto eu a ouvia, minha sensação mais forte era a de que eu tinha de ajudá-la e protegê-la, e senti, em alguns momentos, que estava me desviando do foco de meu trabalho”.

Outra JP escreveu:

“Minha preocupação maior era evitar fazer objeções aos comentários que ela fazia”.

O benefício mais frequentemente relatado pelas JPs durante a fase de entrevistas foi o aprendizado – o que incluiu o aprendizado sobre o objeto da investigação, ou seja, liderança e participação comunitária, bem como o aprendizado sobre como realizar pesquisas, e também sobre si mesmas. Ao comentar sobre como aprendeu a articular pensamentos que alimentava há muito tempo, uma jovem afirmou:

“Aprendi muito ao entrar em contato com o ponto de vista da garota, quando ela disse que os rapazes não levam as garotas a sério, nem mesmo quando elas são líderes. Eu já tinha sentido algo parecido, mas nunca tinha realmente assimilado esta ideia”.

Outra JP revelou algo semelhante:

“Gostei de ouvir, particularmente, as opiniões dela sobre alguns dos principais obstáculos enfrentados pelas mulheres. A crítica que ela fez sobre a maneira como as mulheres são retratadas na mídia, e como isso as afeta de uma forma holística (autoestima, autoimagem, relacionamento entre homem e mulher, e entre mulheres) trazia uma porção de insights”.

Benefícios e limitações relacionados à atividade das JPs, de intervenção na comunidade

Terminada a fase de entrevistas, as JPs tiveram a oportunidade de trabalhar em conjunto com os pesquisadores, e compartilhar com eles sua experiência com as entrevistas, analisar os dados através da interpretação e da criação de temas relacionados às transcrições das entrevistas, bem como compartilhar as conclusões delas emergentes, num fórum que reunia membros da comunidade e demais pessoas envolvidas neste trabalho. No simpósio, as JPs compartilharam suas experiências por meio de apresentações criativas13 13 - Enquanto a maioria das jovens usou o PowerPoint como principal ferramenta de apoio, algumas delas criaram vídeos ou apresentaram fotografias, como um modo de enriquecer suas apresentações. , às quais se seguiram sessões de debates sobre os desafios e obstáculos à liderança das jovens, e sobre estratégias para superar tais dificuldades (incluindo estratégias às quais as próprias jovens podem recorrer).

Logo após o fórum, foi pedido às JPs que identificassem uma questão premente em suas comunidades, e a elaboração de uma iniciativa de intervenção diante de tal questão. Contando com o apoio de um Coordenador de Projetos, além do suporte financeiro, as JPs conceberam uma iniciativa chamada Naturalidade: a força de uma jovem. O intuito de tal iniciativa era conscientizar as jovens sobre a importância da alimentação saudável e da atividade física. Além disso, buscava aguçar o senso crítico das jovens sobre os ideais noviços e irrealistas relacionados à imagem de seus corpos, e estimular as mulheres no que diz respeito ao engajamento em atividades cívicas e à promoção de uma vida saudável. Com base em suas observações e experiências pessoais, e também no relatório da Public Health Canada, de 2011, sobre questões de saúde entre os jovens canadenses, as JPs promoveram um retiro – com duração de 1 dia –, no qual eram oferecidos workshops sobre atividades físicas, que reuniram um total de 20 jovens entre 16 e 20 anos, de Toronto.

No final do retiro, as participantes responderam a uma pesquisa, que continha as seguintes questões: De que maneira este encontro influenciou as suas opiniões e percepção sobre atividade física e alimentação saudável? Em que medida houve mudanças na sua postura em relação a envolver-se com a promoção de uma vida mais saudável? De que modo esta experiência ampliou, mudou ou aprofundou a sua compreensão sobre as influências negativas relacionadas à imagem do corpo? Com o objetivo de divulgação dos resultados do projeto, e para manter o contato entre as jovens participantes do retiro, foi criado um blog. Basicamente, o blog acabou servindo de plataforma para as jovens pesquisadoras, as que participaram do evento, e outras jovens da comunidade, para que pudessem compartilhar experiências, lições aprendidas e outras ideias sobre a vida saudável e a atividade física no meio urbano.

Com base no feedback que lhes foi dado pelas participantes do retiro, as JPs consideraram a atividade de intervenção na comunidade como um componente inestimável do processo de pesquisa, sobretudo pelo fato de isso lhes dar a chance de criar um projeto que correspondesse diretamente ao seu interesse, bem como a oportunidade de envolver-se no desenvolvimento da comunidade, na condição de “intervencionistas” primários. Esta concepção de pesquisa coincide com a estrutura ideológica do Community Dialogue Approach, na qual a pesquisa é vista como um grande empenho acadêmico – e com foco na comunidade – voltado a práticas significativas, e com implicações na formulação de políticas. Além de contribuir para o desenvolvimento da comunidade, a participação na atividade de intervenção na comunidade também criou vagas de trabalho, e oportunidades para o aperfeiçoamento de habilidades das JPs. Estas mostraram satisfação com o nível de autonomia, e a sensação de cidadãos atuantes, proporcionada pela atividade de intervenção na comunidade. Dentre os desafios importantes que tiveram de enfrentar estão o montante de recursos à disposição do grupo e a longevidade do projeto. Por exemplo, algumas das JPs se desligaram do projeto logo após o retiro, e não participaram da interação que ocorria no blog, ao passo que outras jovens mantiveram seu envolvimento e sua ligação com o EGCC. Além disso, algumas ideias e sugestões relacionadas à expansão do projeto Naturalidade, apresentadas pelas JPs e pelas jovens participantes, não puderam ser colocadas em prática, uma vez que os recursos financeiros disponíveis permitiam apenas o desenvolvimento de uma iniciativa em pequena escala.

Entretanto, o Naturalidade revelou-se um sucesso como projeto-piloto, e foi muito oportuno pelo fato de criar pontos de referência em relação à abordagem, o processo e os métodos que seriam empregados em nove iniciativas posteriores, levadas a cabo por um grupo de jovens líderes do sexo feminino, e membros de suas equipes. No fim das contas, a intervenção na comunidade deixou claro que, se devidamente munidas de recursos, as jovens são capazes de assumir papeis de liderança, participar da vida comunitária, e atuar como agentes de transformação social em suas comunidades.

Reflexões metodológicas sobre o Engaging Girls, Changing Communities (EGCC)

O estímulo da expressão e da ativa participação dos jovens nas pesquisas é veementemente defendido na literatura relacionada a este assunto; e o EGCC está em sintonia com esta literatura. Ademais, este projeto contribui com importantes informações sobre os processos de envolvimento dos jovens nas pesquisas, e sobre as complexidades que fazem parte deste compromisso. Em primeiro lugar, o EGCC está em sintonia com a literatura que considera as pesquisas como uma ferramenta de aprendizagem para os jovens. Assim sendo, está claro, a partir da própria documentação apresentada pelas JPs, que o engajamento no EGCC ofereceu às jovens uma preciosa oportunidade de aprender com a comunidade, com os pares e os pesquisadores do universo acadêmico. Contudo, as JPs não atribuíam o mesmo valor a todas as diferentes mídias, na transmissão dos conhecimentos: tendiam a evitar livros e outras ferramentas associadas à “escola formal”. Por exemplo, o treinamento inicial das JPs foi considerado desafiador pelo simples fato de incluir a necessidade de leitura de textos, ou seja, uma “lição de casa”. Do mesmo modo, atividades tais como a preparação a fim de compartilhar conclusões preliminares, logo depois da fase de entrevistas, e o processo de fornecer detalhes, por escrito, sobre a iniciativa comunitária das JPs, pelo fato de assumirem uma característica mais no estilo “acadêmico”, acabaram tornando-se um desafio para os participantes, e levaram mais tempo do que o originalmente previsto. Assim, o desafio a ser enfrentado por futuras iniciativas de pesquisa, tais como a nossa, será o de considerar modos alternativos de ensino e aprendizagem que possam ser mais atraentes para os jovens.

Em segundo lugar, o EGCC está em sintonia com a literatura que mostra como a pesquisa permite aos jovens tornarem-se agentes de transformação em suas comunidades, sobretudo quando eles dispõem de ferramentas para analisar e atribuir um significado ao meio onde vivem (FLANAGAN; GALLAY, 1995). Assim sendo, como já foi mostrado acima, o comprometimento com o projeto Naturalidade, que exigiu uma dedicação de cinco horas semanais, durante oito semanas consecutivas, para a sua organização, é um claro indicador da capacidade das JPs para analisar, debater e planejar a transformação dos pontos de vista e atitudes das jovens, tanto no plano sociopsicológico quanto no da saúde. O projeto Naturalidade foi capaz de expandir o conhecimento e a conscientização sobre a vida saudável e a atividade física das jovens residentes em Toronto. Além disso, a habilidade e familiaridade das JPs com a tecnologia permitiu a criação de uma página no Facebook e outros canais de comunicação – uma prova de que as jovens foram capazes de criar e manter uma rede que, embora limitada em extensão, transcendeu os limites da atividade originalmente planejada.

Em terceiro lugar, nunca será demais, para nós pesquisadores, enfatizar a importância de ter alguém de dentro da comunidade trabalhando com seus pares. O envolvimento de jovens como pesquisadoras primárias fez com que os participantes mostrassem uma maior disposição para revelar experiências pessoais, que, por natureza, tocavam em assuntos delicados. Mediante a criação de um clima de descontração e a conquista da confiança de seus pares, as jovens pesquisadoras conseguiram obter dados de grande valia. Esta conclusão ratifica os pontos de vista de Powers e Tiffany (2006)POWERS, J. L.; TIFFANY, J. S. Engaging youth in participatory research and evaluation. Journal of Public Health Management and Practice, n. 12, p. S79- S87, 2006., para quem a participação dos jovens em pesquisas leva à produção de dados mais confiáveis e significativos, que talvez não pudessem ter sido obtidos por meio dos métodos tradicionais, utilizados pelos adultos.

Embora as pesquisadoras da própria comunidade tivessem maior acesso aos membros do grupo, e pudessem obter relatos mais autênticos, também houve uma percepção negativa, de que elas se mostraram intrinsecamente subjetivas em seu trabalho, e demasiadamente próximas à comunidade – sob o ponto de vista pessoal e cultural – para poder capturar as nuances do grupo (MERRIAM et al., 2001MERRIAM, S. B. et al. Power and positionality: negotiating insider/outsider status within and across cultures. International Journal of Lifelong Education, v. 20, n. 5, p. 405-416, 2001.). O fato de a pesquisadora do EGCC pertencer à própria comunidade que foi objeto da pesquisa gerou um impacto positivo; porém, alguns dados sugerem uma necessária cautela quanto aos limites de proximidade junto à comunidade. No EGCC, a “perda” de dados em relação aos jovens não ocorreu devido à impossibilidade de captar nuances da comunidade; antes, isso se deu devido a situações em que a jovem pesquisadora e a jovem entrevistada compartilharam experiências. Durante tais momentos, a JP e as participantes acabaram criando um relacionamento baseado em sentimentos, observações e circunstâncias compartilhadas, numa linguagem e num jargão com o qual o universo acadêmico não está familiarizado. Além disso, é importante observar que as situações que envolvem o compartilhamento de experiências podem ou não gerar dados que estejam alinhados com o tema de pesquisa mais amplo. Em alguns casos, o pesquisador acadêmico acaba assumindo a tarefa de lidar com a desarmonia entre alguns dados significativos obtidos pelo pesquisador, mas que não estão diretamente relacionados às questões originais da pesquisa. Powers e Tiffany (2006)POWERS, J. L.; TIFFANY, J. S. Engaging youth in participatory research and evaluation. Journal of Public Health Management and Practice, n. 12, p. S79- S87, 2006. chamam a atenção para a potencial tensão entre as expectativas do pesquisador universitário e as do jovem pesquisador. Nestas circunstâncias, “o tratamento sério das opiniões emitidas pelos jovens em pesquisas participativas implica no equilíbrio das prioridades conflitantes, entre as necessidades dos jovens e as necessidades do processo de pesquisa” (p. 85). Conforme explicado por estes autores, a decisão de adaptar-se às necessidades dos jovens pesquisadores pode resultar, em certos casos, na incompletude dos dados.

Por fim, houve situações em que dinâmicas de poder estiveram em jogo, no EGCC, impactando o processo de coleta de dados e criando relações conturbadas entre a JP e os pesquisadores universitários. Em várias circunstâncias, o coordenador do projeto, responsável pela supervisão das entrevistas e das transcrições, enfrentou problemas no recebimento das transcrições realizadas pelas JPs, e nestes casos solicitava a ajuda dos pesquisadores para chamar a atenção das JPs ao cumprimento das normas. Neste sentido, em vez de atuar como mentores ou líderes colaborativos, os pesquisadores universitários tinham, por vezes, de assumir o papel de “policiais da pesquisa”. No fim das contas, os dados eram entregues, mas as relações entre pesquisadores, algumas JPs e o coordenador acabaram se deteriorando. Embora episódios como este não tenham sido recorrentes no EGCC, tal fato coloca em dúvida em que medida pode-se confiar nos jovens para a coleta de dados junto a outros jovens, e sobre a confiabilidade dos dados coletados e transcritos. Isso traz também questionamentos sobre a validade do trabalho de jovens junto a pessoas de sua faixa etária, em situações em que existem canais de autoridade estabelecidos, mas não necessariamente respeitados, a um ponto em que o “adulto” torna-se detentor da última palavra, na resolução de problemas.

Iniciamos a pesquisa do EGCC com a seguinte pergunta: “Vale a pena envolver os jovens, fazendo-os atuar como pesquisadores?”. Concluímos que o envolvimento dos jovens em nossa pesquisa foi inestimável, e que o aprendizado nela contido supera, em grande medida, os seus riscos e dificuldades. Jovens pesquisadoras encontraram meios de criar um espaço para elas mesmas nas comunidades em que trabalham, desenvolveram habilidades de pesquisa e interpessoais, e adquiriram um capital social que lhes permitiu avançar rumo a seus objetivos educacionais e profissionais14 14 - Por exemplo, uma das JPs, estudante do Ensino Médio, conseguiu ingressar na universidade, e começou seu curso superior. Outra ex-JP do EGCC trabalha hoje como Assistente de Pesquisa, numa universidade. .

Alinhados com teóricas feministas de peso, Merriam et al. (2001)MERRIAM, S. B. et al. Power and positionality: negotiating insider/outsider status within and across cultures. International Journal of Lifelong Education, v. 20, n. 5, p. 405-416, 2001. observam que pesquisadores têm adotado abordagens mais matizadas em relação à identidade, que levam em conta a inter-relação entre raça, cultura, gênero, sexualidade, classe e habilidades pessoais. Deste modo, tem se tornado prática comum, entre os pesquisadores de várias áreas, adotar uma posição clara no que se refere à sua relação com as comunidades em que estão trabalhando (BRIDGES, 2001). A posição adotada por todos os pesquisadores é complexa e, quer isso seja ou não explorado de modo explícito, este status serve de base para todos os aspectos de nossa pesquisa, incluindo a coleta de dados e a relação com os participantes, além das abordagens metodológica e teórica. No EGCC, a definição do status das JPs – jovens mulheres trabalhando em conjunto com outras jovens – permitiu o aprendizado e a construção de uma rede de contatos, que se tornaram a base para a validação da construção do conhecimento, fundamental para o estudo. Além disso, como o estudo investigou questões de liderança ligada ao gênero e o engajamento dos jovens, os dados revelaram conhecimento não apenas para os pesquisadores, mas também para as jovens pesquisadoras.

De fato, o engajamento dos jovens em pesquisas é valioso; contudo, é preciso encontrar melhores métodos de ensino e aprendizagem capazes de envolvê-los de uma forma que isso não se assemelhe às práticas escolares, e que usem como fontes a cultura popular, e sistemas de aprendizado contemporâneos a ela relacionados. Do mesmo modo, estudos futuros deverão levar em conta a interação entre a autoridade jovem e a autoridade do adulto, a fim de identificar as formas pelas quais os adultos podem dar apoio e orientação, em vez de desempenhar o papel de policiais, e fontes de poder e autoridade independentes.

Lições sobre o capital social aprendidas com o Assets Coming Together for Youth (ACT for Youth) e o Engaging Girls, Changing Communities (EGCC)

No plano conceitual, os projetos ACT for Youth e o EGCC legitimam o modelo no qual os jovens são apresentados como dotados de valores e recursos, e possibilidades (FORMAN, 2004FORMAN, J. J. Community policing and youth as assets. The Journal of Criminal Law and Criminology, v. 95, n. 1, p. 1-48, 2004.; GINWRIGHT; CAMMAROTTA, 2002), como fontes de conhecimento e poder (FOX et al., 2010FOX, M.; MEDIRATTA, K.; RUGLIS, J. Critical youth engagement: participatory action research and organizing. In: SHERROD, L.; TORNEY-PUTA, J.; FLANAGAN, C. (Eds.). Handbook of research and policy on civic engagement with youth. Hoboken: Wiley Press, 2010. p. 621-650.) e como agentes de transformação social (PUTMAN, 2002), com a capacidade de examinar criticamente o mundo que os cerca, e sua participação nele (GIDDENS, 1989). Em particular, ambos os projetos confirmam a afirmação de Shah (2006SHAH, S. Sharing the world: the researcher and the researched. Qualitative Research, n. 6, p. 207-219, 2006., p. 2013):

Cada vez mais, os jovens têm sido vistos como agentes sociais atuantes, capazes de articular suas próprias experiências, e expressar seus pontos de vista. Esta mudança na maneira de pensar tem oferecido, e continuará oferecendo novos desafios metodológicos e oportunidades para os pesquisadores.

A adoção de inovadores métodos participativos, como o PhotoVoice, permite uma melhor compreensão das vidas dos jovens, com base em suas atitudes, pontos de vista e capacidades.

No plano metodológico, em sua condição de estudos etnográficos participativos, tanto o Act for Youth quanto o EGCC desenvolveram as capacidades de pesquisa dos jovens, dando-lhes oportunidades para aprender em grupo, coletar e analisar dados, envolver-se numa ação comunitária que traz impacto na vida de outros jovens e, sobretudo, construir redes de contato com pesquisadores, jovens que trabalham na comunidade, e outros jovens. Cabem aqui dois alertas.

Em primeiro lugar, uma vez que o ACT for Youth se localiza dentro da região de Jane-Finch, não se sabe ao certo em que medida os jovens puderam acumular um capital social na forma de vínculo para além desta fronteira. Isto é, a partir de nosso status de pesquisadores, valorizamos o conceito de “pessoas de dentro da comunidade trabalhando junto com outras pessoas também de dentro”, a fim de investigar questões e problemas da comunidade. Contudo, este status de “pessoa de dentro” traz consigo limitações, no sentido de que não sabemos se, do ponto de vista metodológico, isto permitiu ao jovem um contato mais próximo, e o estabelecimento de relações com pessoas que se encontram fora e além dos limites de suas relações já existentes e áreas já definidas. O trabalho e o foco em jovens desta região contribuíram para atenuar obstáculos de natureza econômica, pois o projeto forneceu apoio financeiro aos jovens; também lhes proporcionou orientação educacional, e estimulou uma cultura de busca de auto-realização, cujo resultado foi o fato de todos os jovens terem dado continuidade a seu processo de escolarização, com intenção de prosseguir estudos na universidade – um projeto anteriormente tido por eles como algo fora de seu alcance.

Em segundo lugar, os jovens demonstraram uma excessiva confiança mútua (tanto no projeto, quanto em outros lugares), e na comunidade – ou seja, formas de capital social na forma de vínculo –, e talvez tenham afetado nosso objetivo, de trabalhar com os jovens de maneira a lhes oferecer uma visão estrutural por meio da qual possam examinar suas comunidades. Como já foi discutido anteriormente, na ausência de recursos e de instituições de excelência, os jovens negociam as deficiências relacionadas a recursos recorrendo a pontos fortes, seja deles próprios, seja das comunidades. Conforme demonstrado pela fotografia de uma rosa crescendo em meio ao arbusto, os jovens olhavam para seu próprio bairro como um local que foi capaz de suprir suas próprias necessidades, independentemente de seu status, de região de baixa renda; além disso, eles contam com uma forte percepção de resiliência, que lhes dá a sensação de orgulho pela capacidade de superar obstáculos, visando o sucesso. Com o excesso de cautela demonstrado para estimular os jovens de Jane-Finch por meio do envolvimento com pesquisas, e reforçando a importância deles, como valores e recursos da comunidade, o Act for Youth talvez tenha deixado de apontar as limitações ao bem-estar, com as quais os jovens se deparam em sua vida cotidiana.

O conceito de resiliência e de pontos fortes da comunidade está associado à inter-relação entre histórias familiares dos jovens e as circunstâncias atuais, e ao modo como isto contribuiu para moldar a percepção dos jovens sobre o bem-estar e o engajamento comunitário. Como já foi dito, a região de Jane-Finch é habitada predominantemente por imigrantes de países em desenvolvimento, cujas experiências do passado são caracterizadas por forças opostas: episódios negativos (por ex., dificuldades econômicas, guerras, genocídios, instabilidade política), ou positivos (convívio comunitário, estrutura de uma família estendida), elementos que se interpõem na interpretação da noção de bem-estar e engajamento comunitário no Canadá (para mais detalhes sobre as consequências de tais forças, ver DLAMINI et al., 2010DLAMINI, S. N. et al. Engaging the Canadian diaspora: youth social identities in a Canadian border city. Journal of Education: Revue des Sciences de L’éducation de McGill, v. 44, n.3, 2010.). A resiliência é construída com base em atributos humanos, como: aprender a ignorar algumas coisas, encontrar soluções para desafios, aceitar o sofrimento (de variadas formas) como parte da vida, e centrar o foco em habilidades individuais como a chave para alcançar o sucesso. Os pais, que em sua terra natal mostravam-se resilientes, dão ênfase a esta idealização perante seus filhos; consequentemente, como mostram as fotografias e transcrições de entrevistas, os jovens enfrentam as experiências de racismo por meio desta idealização, além da particular importância que atribuem aos membros mais próximos da comunidade, considerados uma modalidade de família (protetora). Muitos jovens se veem no meio de um “cabo de guerra”, por assim dizer, ou seja, um jogo de forças em que o racismo e outros obstáculos estruturais são enfrentados abertamente e, ao mesmo tempo, a resiliência é utilizada como um modo de sobrevivência, para seguir adiante com a vida cotidiana.

No EGCC, por meio dos registros em seus diários, as jovens puderam documentar algumas das alegrias e desafios da pesquisa, que permitiu a nós, pesquisadores, refletir sobre o valor de nossa metodologia. Decerto, o vínculo criado com os pares criou um senso de coletividade entre as jovens pesquisadoras e, ao mesmo tempo, trouxe à tona dúvidas sobre como as jovens deveriam lidar com aspectos conflitantes, sempre que estes surgiam. Conforme foi registrado por uma JP:

“Minha preocupação maior foi me abster de contestar os comentários feitos por ela”.

Do ponto de vista metodológico, trabalhos de pesquisa devem levar seriamente em consideração os pontos de conflito, com a mesma seriedade com que consideram o estreitamento de vínculo das pessoas durante as entrevistas. Seria interessante, por exemplo, depararmos com situações nas quais as JPs detêm a autonomia para realizar entrevistas à sua própria maneira, lidando com conflitos da forma como estes emergem na vida real, sem “absterem-se de contestar” aspectos com as quais elas não concordam.

Ambos os projetos, o Act for Youth e o EGCC, já terminaram, e novos projetos foram iniciados, o que contribuiu para evitar o que Horowitz et al. (2009)HOROWITZ, C. R.; ROBINSON, M.; SEIFER, S. Community-based participatory research from the margin to the mainstream are researchers prepared? Circulation, v. 119, n. 19, p. 2633-2642, 2009. denominaram “pesquisa helicóptero”, que se caracteriza por uma potencial exploração, que rapidamente abandona a comunidade que se propôs a examinar (HOROWITZ et al., 2009HOROWITZ, C. R.; ROBINSON, M.; SEIFER, S. Community-based participatory research from the margin to the mainstream are researchers prepared? Circulation, v. 119, n. 19, p. 2633-2642, 2009.). O Act for Youth deu nascimento a um projeto em esfera municipal, o Youth Rex, e o EGCC to Tikkun Youth. Em ambos os casos, os participantes seguem utilizando o conhecimento adquirido nos projetos anteriores, e desenvolvendo as habilidades dos jovens que neles trabalharam.

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  • 1
    - Exemplo admirável disso é o papel desempenhado pelos jovens, com sua rejeição às posturas e atitudes do segundo presidente sul-africano, Thabo Mbheki, no que diz respeito à extrema urgência de importação de remédios para o tratamento da Aids.
  • 2
    - Dlamini (2008)DLAMINI, S. N. Beyond vulnerability: examining the educational experiences of vulnerable children in Tanzania. Windsor: University of Windsor, 2008. explica em detalhes a importância do capital social na forma de vínculos, que permitiu aos jovens encontrar empregos de meio-período, por exemplo, numa época em que o modelo tradicional de familia, formado por pai e mãe (ambos empregados), estava sendo abandonado.
  • 3
    - Num artigo sobre identidade racializada, Dei (1997) faz uma distinção entre “ser negro” (isto é, ter uma identidade racial) e “tornar-se negro” (isto é, relacionar-se com a identidade racializada com uma conotação política). Esta última permite o desenvolvimento de “uma identidade “resistente”, e a possível associação entre identidade politizada e prática social” (DEI; JAMES, 1998, p. 93).
  • 4
    - Mais detalhes sobre as conclusões obtidas neste estudo estão disponíveis no artigo de Dlamini, Anucha e Wolfe (2012), intitulado Negotiated Challenges in the Workplace, in Affilia: Journal of Women in Social Work. Particularmente interessante, neste estudo, é a descrição das maneiras pelas quais as mulheres imigrantes beneficiaram-se do capital social de vínculos para encontrar empregos, num período de até cinco anos após sua migração para o Canadá.
  • 5
    - Os grupos de trabalho são: (a) Youth Voices, cuja função é a análise das perspectivas dos jovens em relação à violência, bem-estar e questões de disputa de territórios; (b) Youth Survey, que elaborou uma pesquisa com a finalidade de criar um perfil de atributos dos jovens de Jane-Finch; (c) Youth Education and Employment Strategies, voltada à exploração dos caminhos direcionados ao aperfeiçoamento da economia; (d) Reframing Discourse through a Strategic Frame Analysis of Media and Documents, cujo objetivo é buscar os meios para transformar o discurso público negativo sobre a juventude em um discurso público que sirva de base para o desenvolvimento de políticas positivas para os jovens; (e) Evaluation and Monitoring Theme, cuja função é desenvolver um modelo de avaliações com vistas à emancipação, para apontar meios pelos quais os pesquisadores possam estabelecer uma parceria igualitária e sustentável para as pesquisas dentro da comunidade universitária.
  • 6
    - No verão de 2010, o YVWG trabalhou em dois projetos: o Mobile Speakers’ Corner (Espaço dos Usuários de Celulares) e o Projeto PhotoVoice. O primeiro deles consistia num dispositivo de áudio móvel, instalado em dois shopping centers em Jane-Finch. Jovens frequentadores destes shoppings foram escolhidos para gravar um clip de 5 minutos, no qual responderiam a uma dentre três perguntas da pesquisa da YVWG.
  • 7
    - Esta pergunta pode ser formulada de diferentes maneiras: De que modo os jovens definem a comunidade que representam? Eles circulam livremente pelas comunidades de negros? Parceiros da comunidade que trabalham para a instalação de centros comunitários propícios aos jovens foram essenciais na elaboração das questões, e para tornar a linguagem acessível a eles.
  • 8
    - O MSC é composto por uma unidade móvel de áudio, instalada em dois shopping centers da região de Jane-Finch. Após um treinamento com pesquisadores e assistentes da York University, a fim de saber mais sobre o projeto, sobre práticas éticas a ele associadas, e sobre técnicas de gravação, os jovens pesquisadores (JP) se dispersaram pela área dos shoppings, para recrutar outros jovens, e lhes pedir que fizessem suas próprias gravações, respondendo a uma das três questões temáticas acima mencionadas. Resumidamente, o método de coleta de dados obedeceu a esta sequência: (i) os JPs colocaram mesas em locais estratégicos, nos shoppings, munidos de instrumentos de pesquisa e de cartazes com os dizeres “ACT for Youth”, em letras que chamassem a atenção; (ii) assim que uma pessoa entrava no shopping, era abordada por um JP, que lhe passava informações sobre o estudo, mencionando procedimentos éticos de pesquisa, e convidando-a a participar; (iii) caso se interessasse, o participante recebia um gravador e uma folha com as perguntas da pesquisa. A seguir, o JP explicava o procedimento de gravação, ressaltando que o entrevistado deveria responder a apenas uma das três questões propostas. Para cada uma das três questões, havia sub-questões, visando levar o participante a uma reflexão mais aprofundada sobre a questão (ver apêndice i); (iv) Por fim, gravador e questões à mão, o participante selecionado se distanciaria, indo para um lugar dentro do campo de visão – mas não de audição – do JP, gravaria sua fala na fita por cerca de 5 minutos, devolveria a fita, e receberia seu pagamento (10 dólares). No final, foram criteriosamente selecionados 50 participantes/moradores de Jane-Finch, de modo a serem classificados na faixa etária entre 16 e 26 anos.
  • 9
    - É importante observar que o grupo ACT for Youth aproveitou outros dados que também contribuíram para dar consistência à análise das fotografias. Por exemplo, dados das pesquisas com os estudantes foram coletados em todas as escolas de Ensino Médio da região de Jane-Finch. Ver também a nota ix, acima.
  • 10
    - Dois dos facilitadores eram Assistentes de Pesquisa (AP): um deles, aluno de Mestrado com foco no uso da metodologia PV; e outro, um doutorando em Estudos Sociais e de Igualdade, que também era fotógrafo profissional. O terceiro facilitador era um jovem voluntário numa organização comunitária local.
  • 11
    - Cada um dos grupos do ACT for Youth é coordenado conjuntamente por uma comunidade, e um co-participante do projeto acadêmico. Na análise de dados, o YVWG valorizava a combinação do conhecimento acadêmico e aquele com base na comunidade, pois isto lhes proporcionava autenticidade e uma interpretação matizada das representações dos jovens.
  • 12
    - Embora esta seja uma metáfora academicamente associada a Duncan-Andrade, é importante lembrar que ela foi criada pelo rapster Tupac Shakur, nos versos a seguir (aqui traduzidos): “A rosa que nasceu no meio do concreto – Você ouviu falar na rosa que nasceu no meio de uma fenda no concreto? Contrariando as leis da natureza, ela aprendeu a andar sem ter pernas. Engraçado, ela parece fazer isso alimentando seus sonhos; aprendeu a respirar ar fresco. Longa vida à rosa que cresceu no meio do concreto, quando ninguém ligava para ela”. Acessado emhttps://www.goodreads.com/work/quotes/181246-the-rose-that-grew-from-concrete.
  • 13
    - Enquanto a maioria das jovens usou o PowerPoint como principal ferramenta de apoio, algumas delas criaram vídeos ou apresentaram fotografias, como um modo de enriquecer suas apresentações.
  • 14
    - Por exemplo, uma das JPs, estudante do Ensino Médio, conseguiu ingressar na universidade, e começou seu curso superior. Outra ex-JP do EGCC trabalha hoje como Assistente de Pesquisa, numa universidade.
  • I- Gostaria de agradecer ao Social Sciences Humanities Research Canada pelo financiamento do projeto de pesquisa, cujos dados constituem a base deste artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    15 Jan 2015
  • Aceito
    24 Abr 2015
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