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Teste de Denver II: avaliação do desenvolvimento de crianças atendidas no ambulatório do Projeto Einstein na Comunidade de Paraisópolis

RESUMO

Objetivo:

Avaliar o desenvolvimento neuropsicomotor de crianças atendidas em um ambulatório, utilizando o Teste de Triagem de Desenvolvimento de Denver II (TTDD-R).

Métodos:

Pesquisa descritiva exploratória, com abordagem quantitativa, realizada no ambulatório do Projeto Einstein na Comunidade de Paraisópolis (PECP), em São Paulo. A amostra constituiu-se de 35 crianças, de 0 a 6 anos de idade, sendo que a maioria tinha entre 1 e 3 anos (19; 54,3%). Elas foram submetidas ao Teste de Denver II, que avalia quatro áreas do desenvolvimento neuropsicomotor: motor-grosseiro, motor fino-adaptativo, linguagem e pessoal-social.

Resultados:

A maioria das crianças (24; 68,6%) apresentou teste compatível com desenvolvimento normal, enquanto 10 (28,6%) apresentaram teste “de risco” e 1 (2,9%), resultado “não-testável”, devido às recusas em realizar as atividades propostas. Quanto aos itens avaliados em cada área, 7 crianças (20%) apresentaram “atrasos” (quando a criança não executa atividade já realizada por mais de 90% das crianças com a mesma idade) e 18 (51%) apresentaram “cuidados” (quando a criança não executa atividade que já é feita por 75 a 90% das crianças de sua idade), com predomínio na área da linguagem.

Conclusões:

Embora a maioria das crianças (68,6%) tenha apresentado desenvolvimento normal no teste, ressalta-se que, nas demais (31,4%), o número de itens com “atrasos” ou “cuidados”, assim como de testes de “risco” e “não-testável” sugerem prejuízo no desenvolvimento neuropsicomotor. Enfatiza-se a importância da aplicação cotidiana do TTDD-R em ambulatórios, visando detectar precocemente áreas de desenvolvimento com deficiência para estabelecer programas de prevenção primária.

Descritores:
Desenvolvimento infantil; Atenção primária à saúde; Deficiências do desenvolvimento

ABSTRACT

Objectives:

To evaluate the neuropsychomotor development of children treated in an outpatient clinic, using the Denver Developmental Screening Test II (DDST-R).

Methods:

This was an exploratory descriptive research using a quantitative approach, conducted in the outpatient clinic of the Project Einstein in the Community of Paraisopolis (PECP), São Paulo, Brazil. The sample consisted of 35 children, from birth to 6 years of age, most of them from 1 to 3 years old (19; 54.3%). They underwent the Denver II Test, which assesses four neuropsychomotor development areas: gross motor, fine motor adaptive, language and personal-social.

Results:

Most of the children (24, 68.6%) had test results compatible with normal development, while 10 (28.6%) had a “risk” test and 1 (2.9%) was “untestable” due to refusal to carry out the proposed activities. As to the items evaluated in each area, 7 children (20%) showed a developmental “delay” (when the child does not perform the activity passed by more than 90% of the children of his/her age) and 18 (51%) required “attention” (when the child does not perform the activity passed by 75 to 90% of the children of his/her age), predominantly in the language area.

Conclusions:

Although most of the children (68.6%) presented normal development in the test, we point out that in the remaining children (31.4%), the number of items classified as “delay” or “attention”, and tests classified as “risk” or “untestable” suggest impairment in neuropsychomotor development. We underscore the importance of the routine administration of the DDST-R for an early detection of developmental disabilities and thus establish primary prevention programs.

Keywords:
Child development; Primary health care; Developmental disabilities

INTRODUÇÃO

Num conceito mais amplo, desenvolvimento infantil é entendido como um processo que se inicia desde a vida intrauterina e envolve vários aspectos, como o crescimento físico, a maturação neurológica e a construção de habilidades relacionadas ao comportamento nas esferas cognitiva, social e afetiva da criança. O desenvolvimento infantil envolve o aumento da capacidade do indivíduo em realizar funções cada vez mais complexas e sofre influência de vários fatores, merecendo atenção especial de profissionais da saúde e da educação(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.33. Marcondes E, Vaz FAC, Ramos JLA, Okay Y. Pediatria básica: pediatria geral e neonatal. 9a ed. São Paulo: Sarvier; 2002.).

A alta prevalência de doenças, o nascimento de gestações desfavoráveis e/ou incompletas e a vida sob condições socioeconômicas adversas são alguns dos riscos a que crianças de países em desenvolvimento estão expostas, aumentando suas chances de apresentar atrasos em seu potencial de crescimento e desenvolvimento(44. Biscegli TS, Polis LB, Santos LM, Vicentin M. Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor em crianças freqüentadoras de creche. Rev Paul Pediatr. 2007;25(4):337-42.55. Halpern R, Giugliani ERJ, Victora CG, Barros FC, Horta BL. Fatores de risco para suspeita de atraso no desenvolvimento neuropsicomotor aos 12 meses de vida. Rev Chil Pediatr. 2002;73(5):529-39.). Estudos mostram a influência da renda familiar, peso ao nascer e condições nutricionais na ocorrência de atrasos no desenvolvimento infantil(44. Biscegli TS, Polis LB, Santos LM, Vicentin M. Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor em crianças freqüentadoras de creche. Rev Paul Pediatr. 2007;25(4):337-42.,66. Halpern R, Barros ADJ, Matijasevich A, Santos IS, Victora CG, Barros FC. Estado de desenvolvimento aos 12 meses de idade de acordo com peso ao nascer e renda familiar: uma comparação de duas coortes de nascimentos no Brasil. Rep Public Health. 2008;24(Supl 3):S444-S450.).

A tarefa de identificar e acompanhar crianças vulneráveis ao atraso no desenvolvimento neuropsicomotor depara-se com a complexidade dos fatores que levam a esses atrasos, a inexistência de um sistema eficiente de vigilância, a não-utilização de instrumentos adequados de avaliação por ocasião da triagem, entre outros(77. Halpern R, Barros FC, Horta BL, Victora CG. Desenvolvimento neuropsicomotor aos 12 meses de idade em uma coorte de base populacional no sul do Brasil: diferenciais conforme peso ao nascer e renda familiar. Rep Public Health. 1996;12(Supl.1):73:8.).

Na tentativa de acompanhar objetivamente o desenvolvimento neuropsicomotor de crianças de zero a seis anos, foi elaborado o Teste de Triagem de Desenvolvimento de Denver (TTDD). Criado por Frankenburg et al., em 1967, é um instrumento de detecção precoce das condições de desenvolvimento da criança, avaliando quatro áreas/categorias: motor-grosseiro, motor fino-adaptativo, linguagem e pessoal-social(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.,88. Brêtas JRS, Silva MGB, Silva CV. A aplicação do teste de triagem do desenvolvimento de Denver pelo enfermeiro pediatra: relato de caso. Acta Paul. Enferm. 1995; 8(4):9-18.1212. Santos RS, Araújo APQC, Porto MAS. Diagnóstico precoce de anormalidades no desenvolvimento em prematuros: instrumentos de avaliação. J Pediatr (Rio J). 2008;84(4):289-99.).

A conduta motora está associada à maturação do sistema nervoso, correspondendo ao controle das aquisições motoras. A conduta de linguagem abrange as percepções de sons, imagens e suas respostas, enquanto a conduta adaptativa compreende a reação da criança frente a objetos e situações. Já a conduta pessoal-social corresponde à avaliação do comportamento frente a estímulos culturais(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.,88. Brêtas JRS, Silva MGB, Silva CV. A aplicação do teste de triagem do desenvolvimento de Denver pelo enfermeiro pediatra: relato de caso. Acta Paul. Enferm. 1995; 8(4):9-18.1010. Frankenburg WK, Dodds J, Archer P, Shapiro H, Bresnick B. DENVER II: training manual. 2nd ed. Denver, USA: Denver Developmental Materials; 1992.).

Em 1990, os autores propuseram uma nova versão, conhecida como Teste de Triagem do Desenvolvimento de Denver Revisado (TTDD-R) ou Denver II. Alguns itens relacionados à linguagem foram excluídos e outros, de difícil aplicação ou interpretação, foram modificados ou excluídos. O teste passou a conter 125 itens, alterando-se, também, a maneira de interpretar a aplicação das tarefas e do teste como um todo(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.,44. Biscegli TS, Polis LB, Santos LM, Vicentin M. Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor em crianças freqüentadoras de creche. Rev Paul Pediatr. 2007;25(4):337-42.,99. Barness LA. Manual de diagnóstico físico pediátrico. São Paulo. McGraw-Hill. São Paulo; 2000.1010. Frankenburg WK, Dodds J, Archer P, Shapiro H, Bresnick B. DENVER II: training manual. 2nd ed. Denver, USA: Denver Developmental Materials; 1992.,1212. Santos RS, Araújo APQC, Porto MAS. Diagnóstico precoce de anormalidades no desenvolvimento em prematuros: instrumentos de avaliação. J Pediatr (Rio J). 2008;84(4):289-99.1313. Rezende AR, Beteli VC, Santos JLF. Avaliação de habilidades de linguagem e pessoal-sociais pelo Teste de Denver II em instituições de educação infantil. Acta Paul Enferm. 2005;18(1):56-63.).

Vale ressaltar que esse instrumento não é um teste de avaliação dos coeficientes de inteligência e de desenvolvimento, mas permite avaliar a condição atual do desenvolvimento maturacional da criança, não devendo ser utilizado como um instrumento diagnóstico(88. Brêtas JRS, Silva MGB, Silva CV. A aplicação do teste de triagem do desenvolvimento de Denver pelo enfermeiro pediatra: relato de caso. Acta Paul. Enferm. 1995; 8(4):9-18.,1111. Ribeiro CA, Borba RIH. Crescimento e desenvolvimento da criança. In: Santos L, Silva E. Creche e pré-escola: uma abordagem de saúde. São Paulo: Artes Médicas; 2004.).

Os dados obtidos por meio da sua aplicação indicam se a criança está progredindo conforme o esperado para sua idade cronológica e maturidade, fornecendo subsídios para o planejamento de estratégias de atuação junto à criança e para a orientação aos pais(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.,44. Biscegli TS, Polis LB, Santos LM, Vicentin M. Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor em crianças freqüentadoras de creche. Rev Paul Pediatr. 2007;25(4):337-42.,88. Brêtas JRS, Silva MGB, Silva CV. A aplicação do teste de triagem do desenvolvimento de Denver pelo enfermeiro pediatra: relato de caso. Acta Paul. Enferm. 1995; 8(4):9-18.1010. Frankenburg WK, Dodds J, Archer P, Shapiro H, Bresnick B. DENVER II: training manual. 2nd ed. Denver, USA: Denver Developmental Materials; 1992.).

Dentre os testes utilizados para acompanhamento do desenvolvimento infantil, o TTDD-R é um dos mais utilizados, segundo levantamento bibliográfico realizado nos últimos 25 anos e que analisou 174 artigos científicos(1212. Santos RS, Araújo APQC, Porto MAS. Diagnóstico precoce de anormalidades no desenvolvimento em prematuros: instrumentos de avaliação. J Pediatr (Rio J). 2008;84(4):289-99.).

Na área da Enfermagem pediátrica, esse teste é utilizado como estratégia efetiva de levantamento de dados sobre a criança, essenciais para elaboração da prescrição dos cuidados de enfermagem, visando à assistência integral da criança e da família(88. Brêtas JRS, Silva MGB, Silva CV. A aplicação do teste de triagem do desenvolvimento de Denver pelo enfermeiro pediatra: relato de caso. Acta Paul. Enferm. 1995; 8(4):9-18.).

Devido a sua praticidade, o TTDD-R pode ser utilizado em unidades básicas de Saúde, ambulatórios, consultórios, clínicas, unidades pediátricas em hospitais, creches, pré-escolas e serviços especializados em distúrbios do desenvolvimento infantil. Permite a cada profissional uma leitura dos dados obtidos, conforme sua formação específica(88. Brêtas JRS, Silva MGB, Silva CV. A aplicação do teste de triagem do desenvolvimento de Denver pelo enfermeiro pediatra: relato de caso. Acta Paul. Enferm. 1995; 8(4):9-18.).

A aplicabilidade do TTDD-R em ambulatório pediátrico é de fundamental importância, visto que, sendo um serviço de atenção primária, que visa à promoção da saúde, propicia a detecção precoce de déficits no desenvolvimento neuropsicomotor. Diante disso, este trabalho propôs-se a abordar a utilização desse instrumento no acompanhamento do desenvolvimento de crianças atendidas em um ambulatório que atende crianças em uma favela de São Paulo.

OBJETIVO

Avaliar o desenvolvimento neuropsicomotor de crianças entre zero e seis anos de idade, atendidas em ambulatório, por meio do Teste de Triagem de Desenvolvimento de Denver II (TTDD-R).

MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo exploratório de abordagem quantitativa, realizado no ambulatório do Projeto Einstein na Comunidade de Paraisópolis (PECP), localizado no município de São Paulo.

Esse serviço atende cerca de 10 mil crianças, com até 10 anos de idade, oferecendo atendimento médico e hospitalar gratuito, orientação para uso dos medicamentos fornecidos e múltiplas iniciativas complementares na área de Saúde(1414. Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis [Internet]. Brasil: Sociedade Beneficente Israelita Brasileira [atualizada 2007; citado 2009 Fev 17]. Disponível em: http://www.einstein.br/portal2007
http://www.einstein.br/portal2007...
).

Participaram da amostra 35 crianças entre 0 e 6 anos, regularmente matriculadas e atendidas na referida instituição, com a concordância dos seus responsáveis legais, por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A maioria das crianças tinha entre 12 e 36 meses de idade (19; 54,3%), segundo a tabela 1.

Tabela 1
Distribuição das crianças submetidas ao TTDD-R, de acordo com o estágio do desenvolvimento

A coleta de dados foi realizada mediante aprovação do projeto de pesquisa pela Comissão Científica da Faculdade de Enfermagem do Hospital Israelita Albert Einstein e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição (CAAE: 0160.0.028.000-08), além da autorização da gerência do ambulatório onde ocorreu a coleta.

Os dados foram colhidos no segundo semestre do ano de 2008, por meio da aplicação do TTDD-R, sendo que os materiais utilizados para sua execução foram: pompom de lã vermelha com um fio; chocalho de cabo estreito; uvas passas; sino pequeno; dez blocos de madeira quadrados e coloridos, com 2,5 cm3; pote transparente com abertura estreita; bola de tênis; lápis vermelho; boneca de plástico pequena com mamadeira; caneca de plástico com asa e papel em branco(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.).

Os dados foram analisados quantitativamente por meio de técnicas de estatística descritiva e apresentados em números absolutos e percentuais, sob a forma de tabelas, considerando-se os critérios de interpretação dos resultados do teste.

O TTDD-R correlaciona cada item com a idade e o percentual da população padronizada que realizou determinado item ou comportamento. Cada um dos itens avaliados é classificado como:

  • normal: quando a criança executa a atividade prevista para a idade ou não executa uma atividade realizada por menos de 75% das crianças da mesma idade;

  • cuidado: quando a criança não executa ou se recusa a realizar atividade que já é feita por 75 a 90% das crianças daquela idade;

  • atraso: quando a criança não executa ou se recusa a realizar atividade que já é executada por mais de 90% das crianças que têm sua idade(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.,88. Brêtas JRS, Silva MGB, Silva CV. A aplicação do teste de triagem do desenvolvimento de Denver pelo enfermeiro pediatra: relato de caso. Acta Paul. Enferm. 1995; 8(4):9-18.1010. Frankenburg WK, Dodds J, Archer P, Shapiro H, Bresnick B. DENVER II: training manual. 2nd ed. Denver, USA: Denver Developmental Materials; 1992.,1313. Rezende AR, Beteli VC, Santos JLF. Avaliação de habilidades de linguagem e pessoal-sociais pelo Teste de Denver II em instituições de educação infantil. Acta Paul Enferm. 2005;18(1):56-63.).

A interpretação dos itens permite classificar o teste como: normal, quando a criança não apresenta nenhum “atraso” ou um cuidado no máximo; risco, quando apresenta dois ou mais “cuidados” e/ou um ou mais “atrasos”; não testável, quando “recusa-se” a realizar a atividade em um ou mais itens com a linha da idade completamente à direita (ou seja, realizada por quase todas as crianças) ou em mais do que um item com a linha da idade na área em que 75 a 90% já executam o item(11. Almeida FA. Desenvolvimento da criança. In: Farah OGD, Sá AC, organizadores. Psicologia aplicada à enfermagem. São Paulo: Manole; 2008.,1010. Frankenburg WK, Dodds J, Archer P, Shapiro H, Bresnick B. DENVER II: training manual. 2nd ed. Denver, USA: Denver Developmental Materials; 1992.,1313. Rezende AR, Beteli VC, Santos JLF. Avaliação de habilidades de linguagem e pessoal-sociais pelo Teste de Denver II em instituições de educação infantil. Acta Paul Enferm. 2005;18(1):56-63.).

RESULTADOS

A maioria das crianças avaliadas (24; 68,5%) apresentou desenvolvimento compatível à sua faixa etária, sendo que 10 (28,6%) apresentaram teste “de risco” e apenas 1 (2,9%) apresentou resultado “não testável”.

Considerando-se, inicialmente, o número de crianças com “atrasos”, em um total de 7, constatou-se que a categoria “motor fino-adaptativo” foi a que se destacou (3; 42%), seguida pelas categorias “pessoal-social” (2; 28,6%) e “linguagem” (2; 28,6%). Quanto ao número total de atrasos identificados, em um total de 10, metade (5; 50%) ocorreu na área da linguagem (Tabela 2).

Tabela 2
Número de crianças que apresentaram “atraso” e itens detectados como “atraso” na aplicação do TTDD-R, de acordo com cada área/categoria do teste* * Atraso: ocorre quando a criança não executa ou se recusa a realizar uma atividade que já é executada por mais de 90% das crianças de sua idade.

Quanto às atividades classificadas como “cuidado”, num total de 21, identificadas em 18 crianças, verificouse também que a área de linguagem se destacou, tanto em relação ao número de crianças (7; 38,9%), quanto ao número de itens do teste (9; 42,9%), como mostra a tabela 3.

Tabela 3
Número de crianças que apresentaram “cuidado” e itens detectados como “cuidado” na aplicação do TTDD-R, de acordo com cada área/categoria do teste* * Cuidado: ocorre quando a criança não executa ou se recusa a realizar uma atividade que já é feita por 75 a 90% das crianças de sua idade.

Em relação à única criança (2,9%) que apresentou recusas durante o teste, observou-se discreto predomínio entre itens da área da linguagem (2; 50%), conforme a tabela 4.

Tabela 4
Número de crianças que apresentaram “recusa” na aplicação do TTDD-R, de acordo com cada área/categoria do teste* * Recusa: ocorre quando a criança recusa-se a realizar a atividade em um ou mais itens já realizados por mais de 90% das crianças de sua idade, ou em mais do que um item em que 75 a 90% das crianças de sua idade já realizam.

DISCUSSÃO

O número de “atrasos” e de testes definidos como “de risco” entre as crianças avaliadas reforçam o que estudos anteriores enfatizam, no que se refere aos efeitos cumulativos de fatores de risco múltiplos, que aumentam a probabilidade de comprometimento no desenvolvimento infantil(1515. Meisels JS, Wasik BA. Who should be served? Identifying children in need of early intervention. In: Shonkoff JP, Meisels SJ, editors. Handbook of early intervention. Cambridge: Cambridge University Press; 1990. p. 605-32.1616. Sameroff AJ, Seifer R, Barocas R, Zax M, Greenspan S. Intelligence quotient scores of 4-year-old children: social-environmental risk factors. Pediatrics. 1987:79(3):343-50.).

Crianças de países subdesenvolvidos concentram a grande maioria das possíveis causas que levam a atrasos no desenvolvimento. Vale ressaltar que este estudo foi realizado junto à comunidade da segunda maior favela do Estado de São Paulo. Todavia, existem outras variáveis, como educação materna, tamanho da família e ocupação do pai, as quais, neste estudo, não foram abordadas e também são importantes preditores do desenvolvimento futuro da criança(77. Halpern R, Barros FC, Horta BL, Victora CG. Desenvolvimento neuropsicomotor aos 12 meses de idade em uma coorte de base populacional no sul do Brasil: diferenciais conforme peso ao nascer e renda familiar. Rep Public Health. 1996;12(Supl.1):73:8.).

Como o objetivo dos ambulatórios é prestar atendimento primário à população, contemplando diversas especialidades da área da saúde, a aplicação cotidiana do TTDD-R facilitaria o acompanhamento das possíveis falhas encontradas no desenvolvimento neuropsicomotor das crianças, permitindo o estabelecimento de programas de intervenção que visem à prevenção de distúrbios.

Analisando-se os resultados encontrados em relação aos testes “de risco” ou “não-testáveis”, a conduta recomendada é repetir o TTDD-R em outra ocasião, preferencialmente após duas semanas, para uma melhor avaliação da criança.

Em relação à maior ocorrência de “atrasos” e “cuidados” na área da linguagem, dois estudos desenvolvidos com crianças em creches também destacam a persistência de deficiências nessa área, que se acentuam a partir dos três anos de idade. Segundo os autores, esses resultados se justificam, entre outros fatores, pela imaturidade neurofisiológica para a aquisição e domínio da linguagem e pelos estímulos sociais, essenciais para que os padrões linguísticos se desenvolvam(1313. Rezende AR, Beteli VC, Santos JLF. Avaliação de habilidades de linguagem e pessoal-sociais pelo Teste de Denver II em instituições de educação infantil. Acta Paul Enferm. 2005;18(1):56-63.,1717. Andrade CRF. Prevalência das desordens idiopáticas da fala e da linguagem em crianças de um a onze anos de idade. J Public Health.1997;31(5):495-501.).

Considerando essa situação, seria importante orientar os pais sobre a necessidade de acompanhar as atividades de seu filho e utilizar estratégias que estimulem a sua verbalização, como falar pausadamente e articuladamente, cantar cantigas, ler histórias infantis, entre outras.

Na persistência de testes de “risco”, deve-se avaliar a possibilidade de encaminhar a criança a profissionais especializados (fonoaudiólogo, psicólogo, otorrinolaringologista, entre outros), como recomenda a literatura(44. Biscegli TS, Polis LB, Santos LM, Vicentin M. Avaliação do estado nutricional e do desenvolvimento neuropsicomotor em crianças freqüentadoras de creche. Rev Paul Pediatr. 2007;25(4):337-42.), a fim de se identificar outros fatores relacionados a esse desempenho insuficiente, como, por exemplo, os déficits auditivos ou problemas emocionais.

CONCLUSÕES

Diante dos resultados, concluiu-se que a maioria das crianças apresentou desenvolvimento normal, sendo que 1/4 delas apresentou teste “de risco” e apenas 1 obteve resultado “não-testável”. A área da linguagem foi a que apresentou maior número de itens com “atrasos” e “cuidados” na realização das atividades pelas crianças.

Considerando-se o número de crianças com “atrasos” ou “cuidados”, constatou-se que a área da linguagem destacou-se em relação ao “cuidado”, identificando-se mais crianças com “atrasos” na área “motor fino-adaptativo”.

  • Trabalho realizado no Projeto Einstein na Comunidade de Paraisópolis (PECP) da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein – SBIBAE, São Paulo (SP), Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2010

Histórico

  • Recebido
    12 Fev 2010
  • Aceito
    10 Maio 2010
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