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Análise fitoquímica do extrato hidroetanólico de Turnera diffusa Willd e avaliação de seus efeitos na morte de astrócitos

RESUMO

Objetivo

Avaliar a composição fitoquímica do extrato hidroetanólico das partes aéreas de Turnera diffusa Willd (Turneraceae; T. diffusa) e sua toxicidade em astrócitos.

Métodos

Análises químicas do extrato hidroetanólico de partes aéreas de T. diffusa foram feitas por HPLC-DAD-ESI-MS/MS. Os ensaiosin vitro utilizaram culturas de astrócitos para avaliar morte celular.

Resultados

Flavonas-C, O-diglicosídeos, como, luteolina-8-C-[6-deoxi-2-O-raminosil]-xilo-hexos-3-ulosideo, apigenina-8-C-[6-deoxi-2-O-raminosil]-xilo-hexos-3-ulosideo e apigenina-7-O-6”-p-cumaroilglucosídeo foram os principais constituintes encontrados neste extrato hidroetanólico. Uma curva tempo-concentração demonstrou toxicidade desse extrato na concentração de 1.000µg/mL, na cultura de astrócitos após 6 e 24 horas de incubação.

Conclusão

Nas análises fitoquímicas, importantes antioxidantes, sobretudo flavonoides, foram observados. Extratos de T. diffusa apresentaram efeitos citotóxicos em altas concentrações, ocasionando aumento de morte celular em cultura de astrócitos.

Cognição/efeito de drogas; Extratos vegetais/toxicidade; Substâncias protetoras/toxicidade; Antioxidantes; Morte celular/efeitos de drogas

ABSTRACT

Objective

To evaluate the phytochemical composition of hydroethanolic extracts from powdered aerial parts of Turnera diffusa Willd (Turneraceae; T. diffusa), as well as its toxicity in astrocytes.

Methods

Chemical analyses of hydroethanolic extract from powdered aerial parts ofT. diffusa were carried out using HPLC-DAD-ESI-MS/MS.In vitro assays using astrocytes culture were performed to evaluate cell death.

Results

Flavone-C, O-diglycosides, such as, luteolin-8-C-[6-deoxy-2-O-rhamnosyl]-xylo-hexos-3-uloside, apigenin-8-C-[6-deoxy-2-O-rhamnosyl]-xylo-hexos-3-uloside and apigenin-7-O-6”-p-coumaroylglucoside were the main compounds found in this hydroethanolic extract. Concentration time-effect demonstrated the toxicity of this extract at a concentration of 1,000µg/mL in astrocyte culture, after 6 and 24 hours of incubation.

Conclusion

In phytochemical analyses, important antioxidants (mainly flavonoids) were observed. T. diffusa extracts presented cytotoxic effect in high concentrations, leading to increased cell death in astrocyte culture.

Cognition/drug effects; Plant extracts/toxicity; Protective agents/toxicity; Antioxidants; Cell death/drug effects

INTRODUÇÃO

O gênero Turnera (Turneraceae) engloba 135 espécies de áreas tropicais das Américas e da África.11. Thulin M, Razafimandimbison SG, Chafe P, Heidari N, Kool A, Shore JS. Phylogeny of the Turneraceae clade (Passifloraceae s.l.): Trans-Atlantic disjunctions and two new genera in Africa. Taxon. 2012;61:(2)308-23.Turnera diffusa Willd ex Schult (T. diffusa), conhecida no Brasil como “damiana”, é a espécie de Turnera mais importante, muito utilizada na medicina tradicional. É encontrada no México, América Central, ilhas do Caribe e certas áreas da América do Sul. Tradicionalmente é utilizada como afrodisíaco, para alívio de sintomas hepáticos, depressão, ansiedade e neurose, e também como expectorante, estimulante e tônico. É ainda empregada para dar sabor a sobremesas e bebidas.22. Szewczyk K, Zidorn C. Ethnobotany, phytochemistry, and bioactivity of the genus Turnera (Passifloraceae) with a focus on damiana--Turnera diffusa. J Ethnopharmacol. 2014;152(3):424-43. Review.,33. Mendes FR. Tonic, fortifier and aphrodisiac: adaptogens in the Brazilian folk medicine. Braz J Pharmacogn. 2011;21(4):754-63. Review.

Estudos anteriores analisaram a T. diffusa a partir da perspectiva fitoquímica. Em geral, os componentes aéreos (caules e folhas) da espécie apresentam boa atividade antioxidante, semelhante à da quercetina.44. Lucio-Gutiérrez JR, Garza-Juárez A, Coello J, Maspoch S, Salazar-Cavazos ML, Salazar-Aranda R, et al. Multi-wavelength high-performance liquid chromatographic fingerprints and chemometrics to predict the antioxidant activity of Turnera diffusa as part of its quality control. J Chromatogr A. 2012; 1235:68-76. Além disso, os alcaloides, glicosídeos cianogênicos, flavonoides, e óleos voláteis são as principais classes de fitoconstituintes encontradas no gêneroTurnera.22. Szewczyk K, Zidorn C. Ethnobotany, phytochemistry, and bioactivity of the genus Turnera (Passifloraceae) with a focus on damiana--Turnera diffusa. J Ethnopharmacol. 2014;152(3):424-43. Review.,44. Lucio-Gutiérrez JR, Garza-Juárez A, Coello J, Maspoch S, Salazar-Cavazos ML, Salazar-Aranda R, et al. Multi-wavelength high-performance liquid chromatographic fingerprints and chemometrics to predict the antioxidant activity of Turnera diffusa as part of its quality control. J Chromatogr A. 2012; 1235:68-76.

5. Bezerra AG, Mendes FR, Tabach R, Carlini EA. Effects of a hydroalcoholic extract of Turnera diffusa Willd. Ex Schult., Turneraceae, in tests for adaptogenic activity. Braz J Pharmacogn. 2011;21(1):121-7.

6. Kumar S, Taneja R, Sharma A. The genus turnera.: A review update. Pharm Biol. 2005;43(5):383-91.

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As possíveis aplicações terapêuticas da T. diffusa foram descritas em estudos anteriores, incluindo os efeitos gastroprotetores, antirradiação ultravioleta e antioncogênicos,99. Soriano-Melgar Lde A, Alcaraz-Meléndez L, Méndez-Rodríguez LC, Puente ME, Rivera-Cabrera F, Zenteno-Savín T. Antioxidant responses of damiana (Turnera diffusa Willd) to exposure to artificial ultraviolet (UV) radiation in an in vitro model; part I; UV-C radiation. Nutr Hosp. 2014;29(5):1109-15.

10. Soriano-Melgar Lde A, Alcaraz-Meléndez L, Méndez-Rodríguez LC, Puente ME, Rivera-Cabrera F, Zenteno-Savín T. Antioxidant responses of damiana (Turnera diffusa Willd) to exposure to artificial ultraviolet (UV) radiation in an in vitro model; part ii; UV-B radiation. Nutr Hosp. 2014;29(5):1116-22.

11. Avelino-Flores Mdel C, Cruz-López Mdel C, Jiménez-Montejo FE, Reyes-Leyva J. Cytotoxic activity of the methanolic extract of Turnera diffusa Willd on breast cancer cells. J Med Food. 2015;18(3):299-305.
-1212. Taha MM, Salga MS, Ali HM, Abdulla MA, Abdelwahab SI, Hadi AH. Gastroprotective activities of Turnera diffusa Willd. ex Schult. revisited: Role of arbutin. J Ethnopharmacol. 2012;141(1):273-81. todos eles dependendo, até certo ponto, das propriedades antioxidantes da T. diffusa. Apesar desses possíveis efeitos positivos, nenhum estudo avaliou o limiar de toxicidade da T. diffusa. A morte celular (que inclui apoptose e necrose) está estreitamente relacionada ao estresse oxidativo;1313. Whittemore ER, Loo DT, Cotman CW. Exposure to hydrogen peroxide induces cell death via apoptosis in cultured rat cortical neurons. Neuroreport. 1994; 5(12):1485-8.,1414. Chandra J, Samali A, Orrenius S. Triggering and modulation of apoptosis by oxidative stress. Free Radic Biol Med. 2000;29(3-4):323-33. Review. mas, até agora, nenhuma publicação avaliou os efeitos da T. diffusa sobre a morte celular.

OBJETIVO

Avaliar a composição fitoquímica do extrato hidroetanólico das partes aéreas deTurnera diffusa Willd e sua toxicidade em astrócitos.

MÉTODOS

Material vegetal

Partes aéreas em pó de T. diffusa foram adquiridas comercialmente da Quimer Ltda. Esse material botânico foi depositado na Herboteca Carlos Stellfeld, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), sob número 340.55. Bezerra AG, Mendes FR, Tabach R, Carlini EA. Effects of a hydroalcoholic extract of Turnera diffusa Willd. Ex Schult., Turneraceae, in tests for adaptogenic activity. Braz J Pharmacogn. 2011;21(1):121-7.

Fármacos e preparação de extratos

Quercetina, apigenina, campferol e luteolina foram adquiridos da Sigma-Aldrich Chemical Co. (Saint Louis, MO, EUA). As soluções desses padrões (100µg/mL em etanol) foram preparadas e analisadas por cromatografia líquida de alta eficiência acoplada a um detector de arranjo de diodos (HPLC-DAD - high-performance liquid chromatography coupled to diode-array detector), a fim de otimizar as condições cromatográficas para análise do extrato hidroetanólico. Metanol grau HPLC foi adquirido da Merck (Darmstadt, Alemanha). Água grau HPLC foi obtida a partir de água destilada usando sistema Milli-Q (Millipore, Waters, Milford, MA, EUA). Partes aéreas em pó de T. diffusa (100g) foram extraídas com 1L de solução hidroetanólica (50%, v/v) por turbólise, conforme descrito por Bezerra et al.55. Bezerra AG, Mendes FR, Tabach R, Carlini EA. Effects of a hydroalcoholic extract of Turnera diffusa Willd. Ex Schult., Turneraceae, in tests for adaptogenic activity. Braz J Pharmacogn. 2011;21(1):121-7. As soluções foram filtradas, concentradas sob pressão reduzida em um evaporador rotativo, liofilizadas e armazenadas em frascos âmbar, a 5°C.

Análise do extrato hidroetanólico por cromatografia líquida de alta eficiência acoplada com um detector de arranjo de diodos e espectrometria de massa com ionização por eletrospray/espectrometria de massa.

O extrato liofilizado (8mg) foi dissolvido em 3mL de metanol: água (20:80, v/v) e filtrado em filtro de 0,45µm (German Sciences, Tóquio, Japão). Uma alíquota de 31,2µL de extrato liofilizado foi injetada no sistema HPLC. Todos os solventes utilizados eram grau HPLC e foram filtrados por um aparelho de filtragem de solventes. Um DAD SPD-M10AVP (Shimadzu) equipado com um detector de arranjo de fotodiodos foi acoplado a um espectrômetro de massa Esquire 3000 Plus (Bruker Daltonics) com uma fonte de ionização por eletrospray (ESI - electrospray ionization) e analisador de massa para armadilha de íons (ion-trap). Dupla detecção em linha foi realizada no DAD, dando-se preferência aos comprimentos de onda de 270 e 340nm, e o espectro ultravioleta em linha foi registrado no intervalo de 200 a 400nm. Uma coluna de fase reversa C18 Zorbax - 5B - RP-18 (Hewlett Packard; 4,6x250mm, 5μm) com filtro pré-coluna de guarda foi empregada para a separação dos componentes. As fases móveis consistiram de A (0,1% aq. de ácido fórmico) e B (metanol). O gradiente de eluição foi: zero minuto – 20% B em A; 10 minutos – 30% B em A; 20 minutos – 50% B em A; 30 minutos – 70% B em A; 40 minutos – 90% B em A; 45 minutos – 40% B em A; e 50 minutos – 20% B em A. A vazão foi mantida constante a 0,5mL.min-11. Thulin M, Razafimandimbison SG, Chafe P, Heidari N, Kool A, Shore JS. Phylogeny of the Turneraceae clade (Passifloraceae s.l.): Trans-Atlantic disjunctions and two new genera in Africa. Taxon. 2012;61:(2)308-23., e a temperatura da coluna foi mantida a 28°C. A análise de espectrometria de massa (MS - mass spectrometry) foi realizada utilizando ESI sob pressão atmosférica, nos modos de íons positivos e negativos. As condições de ionização foram ajustadas da seguinte forma: eletrospray de fonte iônica tensão de -40V, voltagem capilar de 4.500V e temperatura capilar de 325°C. Hélio foi utilizado como gás de colisão, e nitrogênio como de nebulização. A nebulização foi auxiliada por gás de bainha nitrogênio coaxial à pressão de 27psi. A dessolvatação foi auxiliada pelo uso de vazão de nitrogênio em contracorrente ajustada para um fluxo de 7,0L.min-11. Thulin M, Razafimandimbison SG, Chafe P, Heidari N, Kool A, Shore JS. Phylogeny of the Turneraceae clade (Passifloraceae s.l.): Trans-Atlantic disjunctions and two new genera in Africa. Taxon. 2012;61:(2)308-23.. Aquisições em massa de varredura completa foram realizadas tanto no modo de íons positivos quanto negativos, por varredura do intervalo m/z de 100 a 1.000 unidades de massa. Os espectros de dissociação induzida por colisão (CID -collision induced dissociation) foram obtidos na armadilha de íons utilizando hélio como gás de colisão, com ciclos de rampa de tensão de 0,5 a 1,3V. A caracterização dos componentes foi feita com base em UV e dados de MS, juntamente de perfis de fragmentação obtidos de espectrometria de massa/espectrometria de massa (espectros MS/MS), que foram comparados aos dados da literatura, e também com base em componentes relatados para essa espécie, em outros estudos.

Cultura de astrócitos de córtex de ratos

Uma cultura de astrócitos foi obtida a partir do córtex de ratos de 3 dias de idade, conforme descrito anteriormente por Smaili e Russell.1515. Smaili SS, Russell JT. Permeability transition pore regulates both mitochondrial membrane potential and agonist-evoked Ca2+ signals in oligodendrocyte progenitors. Cell Calcium. 1999;26(3-4):121-30. Os animais foram obtidos do Instituto Nacional de Farmacologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da UNIFESP (0464/05).

As células foram cultivadas em um meio Eagle modificado por Dulbecco com baixo teor de glicose, contendo 10% de soro fetal bovino, 0,1% de fungizona, 1% de penicilina/estreptomicina, 1mM de piruvato de sódio e 4mM de L-glutamina em 5% de CO2/95% de ar. O meio foi substituído a cada 2 dias, até a confluência (após 8 a 14 dias). Atingida a confluência, a remoção das células dos frascos foi realizada por tripsinização. Para tanto, a tripsina/EDTA (0,25%) foi adicionada aos frascos por 5 minutos, a 37°C, com subsequente inativação da enzima por DNAse (10mM) e centrifugação (2.500rpm, 10 minutos, 25°C). As células foram, então, suspensas no meio de cultura. Após a tripsinização, 10μL da suspensão foram quantificados por meio de uma câmara de Neubauer, um microscópio inverso e um contador de células. A quantidade total de células foi de 72x1044. Lucio-Gutiérrez JR, Garza-Juárez A, Coello J, Maspoch S, Salazar-Cavazos ML, Salazar-Aranda R, et al. Multi-wavelength high-performance liquid chromatographic fingerprints and chemometrics to predict the antioxidant activity of Turnera diffusa as part of its quality control. J Chromatogr A. 2012; 1235:68-76. células/mL. Após as diluições, as células foram incubadas em placa de 24 poços, chegando à concentração final de 18.000 células/poço, o que permitiu a observação e a contagem das células.

Avaliação da morte celular por meio de Hoechst 33342

A morfologia celular foi avaliada por microscopia de fluorescência após coloração com Hoechst 33342. O extrato hidroetanólico da T. diffusa foi adicionado às células em concentrações iniciais de 10, 100 e 1.000µg/mL, e avaliado após 6, 24 e 48 horas de incubação, para verificar a toxicidade dos extratos. As células de controle não receberam nenhum tratamento. Essas células também foram utilizadas em outros experimentos não relatados aqui.

Após período de incubação, as células foram lavadas com tampão e coradas com Hoechst 33342 (1µg/mL) durante 15 minutos, à temperatura ambiente, no escuro. A morte celular foi identificada por algumas características, como condensação nuclear, formação de bolhas na membrana e corpos apoptóticos. Os núcleos fragmentados ou com cromatina condensada foram contados e a porcentagem desses núcleos, em relação ao total de núcleos, foi calculada por campo observado. Os resultados para cada concentração e tempo de incubação foram determinados a partir de, pelo menos, quatro experimentos independentes realizados de forma triplicada.1616. Rosenstock TR, Carvalho AC, Jurkiewicz A, Frussa-Filho R, Smaili SS. Mitochondrial calcium, oxidative stress and apoptosis in a neurodegenerative disease model induced by 3-nitropropionic acid. J Neurochem. 2004;88(5): 1220-8.

Análise estatística

A análise dos dados foi realizada utilizando-se o teste de Análise de Variância Univariada (ANOVA), seguido do teste de Duncan, quando apropriado. Os resultados foram expressos como média ± erro padrão (EP) da média e adotaram nível de significância de 5% (p<0,05).

RESULTADOS

Análises fitoquímicas

A tabela 1 apresenta os tempos de retenção (Rt - retention times), dados espectrais de MS e comprimento de onda de absorção máxima (λmax) para os componentes químicos encontrados nos extratos hidroetanólicos. A caracterização dos componentes foi alcançada por meio de dados espectrais de MS reportados anteriormente para os compostos relacionados a este ou outros materiais vegetais. O cromatograma de corrente iônica total obtido no modo de ionização negativa do ESI-MS está representado na figura 1.

Tabela 1
Tempos de retenção, dados de espectro de massas e o comprimento de onda de absorção máxima (λmax) para os componentes químicos encontrados em extratos hidroetanólicos deTurnera diffusa

Figura 1
Cromatograma de corrente de íon total obtido de ionização por eletrospray

A análise de espectrofotometria de massa em modo de ionização negativa do extrato hidroetanólico da T. diffusa está representado nafigura 1. Os números de pico são correspondentes aos compostos relacionados na tabela 1.

Os principais componentes encontrados na T. diffusa foram flavonoides, uma mistura de flavona-C, O-diglicosídeos,C-glicosil flavona acilada com ácidos aromáticos e flavonóis 3-O-diglucosídeos.

Os compostos 1, 2, 9 e 10 apresentaram espectros de UV característicos de flavonas. O espectro ESI-MS do composto 9, o principal componente encontrado neste extrato, apresentou molécula desprotonada e protonada a m/z 575 e m/z 577, respectivamente. Após experimentos MS/MS, houve produção abundante de íon fragmento a m/z 411, que correspondeu à perda de 164 unidades de massa, açúcar (ramnose) e frações de água (146 + 18), característica de uma ligação entre um açúcar (ramnose) e um grupo de hidroxila não fenólica, mais provavelmente na posição 2”-Oda outra fração de açúcar, indicando glicosilação de O- com desoxihexose (ramnose). Esse padrão de fragmentação no modo de ionização negativa é típico de O, C-diglicosilflavona. Um íon fragmento incomum ocorreu em m/z 301 (60%), em conjunto com o íon fragmento correspondente à luteolina aglicona a m/z 285 (20%).

O composto 10 apresentou moléculas desprotonadas e protonadas a m/z 559 e m/z 561, respectivamente, nos espectros de ESI-MS. O espectro MS/MS do íon precursor em m/z 559 apresentou abundantes íons fragmentos a m/z 395, indicando 2”-O-glicosilação com desoxihexose (ramnose), e íon fragmento a m/z 269 (20%), indicando apigenina como aglicona.

O espectro de ESI-MS do composto 2 apresentou molécula desprotonada a m/z 567, que, após experimentos MS/MS, produziu íon fragmento a m/z 521, correspondente a uma perda de 46 unidades de massa [HCOOH], o que poderia ocorrer por meio de descarboxilação de um ácido carboxílico da fração de ácido benzoico. A fração de açúcar ligada à luteolina poderia ser glicose substituída por ácido benzoico no grupo hidroxila na posição 6 “-O da glicose, porque, nessa posição, a clivagem do grupo benzoíla era mais difícil. O composto 2 foi temporariamente identificado como luteolina-8-C-(6”-O-p-benzoíla) glucosídeo.

O espectro de ESI-MS do composto 4 apresentou molécula desprotonada a m/z 743. A massa molecular do composto 4 indicou presença de uma porção adicional de fração de feruloil (176 unidades de massa) em sua estrutura, quando comparado ao composto 2. A localização exata do grupo acilo na fração glicosídica encontrou dificuldade de ser determinado apenas com base em MS. No entanto, o espectro MS/MS do íon precursor em m/z 743 apresentou abundante íon fragmento a m/z605, correspondente à perda de 137 unidades de massa (fração de ácido hidroxibenzoico), o que possibilitou indicar que o ácido hidroxibenzoico estava ligado à glicose na posição 2”-O-. O composto 4 foi provisoriamente identificado como luteolina-8-C-(O-p-feruloil- 2”-O-benzoil)-glucosídeo.

Para o composto 1, o espectro de ESI-MS apresentou molécula desprotonada a m/z 593, que, após experimentos MS/MS, produziu abundante íon fragmento a m/z 473, característica da presença de hexose como fração de açúcar C-glicosilado. Os íons fragmentos a m/z 357 (A + 71) e m/z327 (A + 41) eram característicos de flavonas- O,C-diglicosídeos e sugeriram luteolina como aglicona.

No Rt de 25,5 minutos, foi observada uma co-eluição dos dois compostos, o composto 3 e outro componente em menor teor, que apresentou íon molecular desprotonado a m/z 593 e foi temporariamente caracterizado como diramnosídeo de quercetina. Os compostos 3, 5, 6 e 8 apresentaram espectros UV característicos de flavonóis, e seus espectros de ESI-MS apresentaram moléculas desprotonadas a m/z 641, 625, 655 e 669, respectivamente. Os espectros de ESI-MS/MS desses compostos, no modo de ionização negativa, apresentaram perda de 324 unidades de massa, indicando a presença de duas hexoses (glicoses), provavelmente ligadas à posição 3-O- de aglicona. Assim, o composto 3 foi sugerido como miricetina-3-O-diglucosídeo, o composto 5 como quercetina-3-O -diglucosídeo, o composto 6 como laricitina-3-O-diglucosídeo, e o 8 como siringetina-3-O-diglucosídeo.

O espectro de MS do composto 7 apresentou molécula desprotonada a m/z 639 e, após experimentos de MS/MS, apresentou um abundante íon fragmento a m/z 575, correspondente à perda de 64 unidades de massa, o que poderia ser atribuído a uma perda combinada dos grupos COOH e OH. De acordo com os dados espectrais de MS, sugeriu-se que o composto 7 era quercetina cafeoil glucuronida.

A absorção máxima de UV a 312nm e o Rt mais elevado indicaram que o composto 11 era um glicosídeo flavonoide esterificado com ácidos aromáticos. Os espectros de ESI-MS apresentaram moléculas protonadas e desprotonadas a m/z 579 e 577, respectivamente. O espectro MS/MS do íon precursor a m/z 577 apresentou abundante íon fragmento a m/z 269, o que foi atribuído à perda de 308 unidades de massa (glicose com fração p-cumaroila) e indicou apigenina como aglicona.

Avaliação da morte celular por meio de Hoechst 33342

A ANOVA detectou um aumento significativo na porcentagem de células mortas após incubação, por 6 horas, com extrato de T. difusa, à concentração de 1.000µg/L, quando comparado com o grupo de controle e a concentrações mais baixas [F(3,32)=3,03; p<0,05] (Figura 2). Esse efeito persistiu em células avaliadas após 24 horas de incubação [F(3,32)=5,19; p<0,05], mas apenas quando comparado com o grupo de controle e à concentração de 10µg/mL (Duncan; p<0,01). A figura 3 apresenta um exemplo de coloração com Hoechst 33342, exibindo núcleos de astrócitos tanto vivos quanto mortos.

Figura 2
Células mortas após incubação por 6, 24 e 48 horas, em doses de 10, 100 e 1.000µg/mL de extrato Turnera diffusa

Figura 3
Núcleos de astrócitos marcados com Hoechst 33342 e examinados com microscópio de fluorescência. As setas identificam os núcleos de células mortas, e os núcleos restantes representam células vivas

DISCUSSÃO

Os principais componentes encontrados neste extrato foram flavonoides (flavonas e flavonóis glicosídeos). Flavonóis e flavonas foram diferenciados por seus espectros UV com máximos de 255/370 e 268/340nm, respectivamente, e também pelo padrão de fragmentação de flavonoides C-glicosil e O-glicosil. Os flavonoides C-glicosídeos são estáveis à hidrólise ácida, devido à ligação C-C glicosídica, e as principais fragmentações acontecem no açúcar, que possui as ligações mais fracas.1717. Ferreres F, Gil-Izquierdo A, Vinholes J, Silva ST, Valentão P, Andrade PB. Bauhinia forficata Link authenticity using flavonoids profile: relation with their biological properties. Food Chem. 2012;134(2):894-904.,1818. Abad-García B, Berrueta LA, Garmón-Lobato S, Gallo B, Vicente F. A general analytical strategy for the characterization of phenolic compounds in fruit juices by high-performance liquid chromatography with diode array detection coupled to electrospray ionization and triple quadrupole mass spectrometry. J Chromatogr A. 2009;1216(28):5398-415. FlavonoidesO-glicosídeos se ligam a um açúcar com formação de uma ligação glicosídica O-C ácido lábil. A fragmentação desses flavonoides envolve clivagem na ligação O-glicosídica, com um concomitante rearranjo-H, que leva à eliminação do resíduo de sacarídeo.1818. Abad-García B, Berrueta LA, Garmón-Lobato S, Gallo B, Vicente F. A general analytical strategy for the characterization of phenolic compounds in fruit juices by high-performance liquid chromatography with diode array detection coupled to electrospray ionization and triple quadrupole mass spectrometry. J Chromatogr A. 2009;1216(28):5398-415.

19. Gouveia SC, Castilho PC. Characterization of phenolic compounds in Helichrysum melaleucum by high-performance liquid chromatography with on-line ultraviolet and mass spectrometry detection. Rapid Commun Mass Spectrom. 2010;24(13):1851-68.

20. Gouveia S, Castilho PC. Characterization of phenolic acid derivatives and flavonoids from different morphological parts of Helichrysum obconicum by a RP-HPLC-DAD-(-)-ESI-MS(n) method. Food Chem. 2011;129(2):333-44.
-2121. Orhan IE, Senol FS, Ercetin T, Kahraman A, Celep F, Akaydin G, et al. Assessment of anticholinesterase and antioxidant properties of selected sage (Salvia) species with their total phenol and flavonoid contentes. Industrial Crops and Products. 2013;41:21-30. No caso dos flavonóis, as posições 3-OH e 7-OH são locais de glicosilação regular.2222. Abad-García B, Garmón-Lobato S, Berrueta LA, Gallo B, Vicente F. On line characterization of 58 phenolic compounds in Citrus fruit juices from Spanish cultivars by high-performance liquid chromatography with photodiode-array detection coupled to electrospray ionization triple quadrupole mass spectrometry. Talanta. 2012;99:213-24.

De acordo com dados espectrais de MS relatados por Ferreres et al.2323. Ferreres F, Sousa C, Valentão P, Andrade PB, Seabra RM, Gil-Izquierdo A. New C-deoxyhexosyl flavones and antioxidant properties of Passiflora edulis leaf extract. J Agric Food Chem. 2007;55(25):10187-93. e Figueirinha et al.,2424. Figueirinha A, Paranhos A, Pérez-Alonso JJ, Santos-Buelga C, Batista MT. Cymbopogon citratus leaves: Characterization of flavonoids by HPLC-PDA-ESI/MS/MS and an approach to their potential as a source of bioactive polyphenols. Food Chem. 2008;110(3):718-28. o composto 9, encontrado no presente estudo, foi caracterizado como luteolina-8-C-[6-desoxi-2-O-ramnosil]-xilo- hexos-3-ulosideo, que também foi encontrado por Zhao et al.77. Zhao J, Pawar RS, Ali Z, Khan IA. Phytochemical investigation of Turnera diffusa. J Nat Prod. 2007;70(2):289-92.,88. Zhao J, Dasmahapatra AK, Khan SI, Khan IA. Anti-aromatase activity of the constituents from damiana (Turnera diffusa). J Ethnopharmacol. 2008; 120(3):387-93. na T. diffusa, e por Figueirinha et al.2424. Figueirinha A, Paranhos A, Pérez-Alonso JJ, Santos-Buelga C, Batista MT. Cymbopogon citratus leaves: Characterization of flavonoids by HPLC-PDA-ESI/MS/MS and an approach to their potential as a source of bioactive polyphenols. Food Chem. 2008;110(3):718-28., emCymbopogon citratus. Em conformidade com dados espectrais de MS relatados por Ferreres et al.,2323. Ferreres F, Sousa C, Valentão P, Andrade PB, Seabra RM, Gil-Izquierdo A. New C-deoxyhexosyl flavones and antioxidant properties of Passiflora edulis leaf extract. J Agric Food Chem. 2007;55(25):10187-93. o composto 10 foi identificado como apigenina-8-C- [6-desoxi-2-O-ramnosil]-xilo-hexos-3-ulosideo, que foi relatado naPassiflora edulis.2323. Ferreres F, Sousa C, Valentão P, Andrade PB, Seabra RM, Gil-Izquierdo A. New C-deoxyhexosyl flavones and antioxidant properties of Passiflora edulis leaf extract. J Agric Food Chem. 2007;55(25):10187-93. Arbutina (4-hidroxifenil β-D-glucosídeo) e glucosídeosp-cumaroil foram relatados nesta espécie.77. Zhao J, Pawar RS, Ali Z, Khan IA. Phytochemical investigation of Turnera diffusa. J Nat Prod. 2007;70(2):289-92.,88. Zhao J, Dasmahapatra AK, Khan SI, Khan IA. Anti-aromatase activity of the constituents from damiana (Turnera diffusa). J Ethnopharmacol. 2008; 120(3):387-93.

Em consonância com os dados de MS relatados por Ferreres et al.,1717. Ferreres F, Gil-Izquierdo A, Vinholes J, Silva ST, Valentão P, Andrade PB. Bauhinia forficata Link authenticity using flavonoids profile: relation with their biological properties. Food Chem. 2012;134(2):894-904.,2323. Ferreres F, Sousa C, Valentão P, Andrade PB, Seabra RM, Gil-Izquierdo A. New C-deoxyhexosyl flavones and antioxidant properties of Passiflora edulis leaf extract. J Agric Food Chem. 2007;55(25):10187-93. o composto 1 foi temporariamente identificado como luteolina-6-C-glicosil-2”-O-ramnosídeo. O íon fragmento em m/z 429 atribuído à perda de ramnose e frações hídricas indicaram O-glicosilação com uma desoxihexose (ramnose) na posição 2”-O da glicose.2323. Ferreres F, Sousa C, Valentão P, Andrade PB, Seabra RM, Gil-Izquierdo A. New C-deoxyhexosyl flavones and antioxidant properties of Passiflora edulis leaf extract. J Agric Food Chem. 2007;55(25):10187-93.

Em relação aos compostos 3, 5, 6 e 8, Fracassetti et al.2525. Fracassetti D, Costa C, Moulay L, Tomás-Barberán FA. Ellagic acid derivatives, ellagitannins, proanthocyanidins and other phenolics, vitamin C and antioxidant capacity of two powder products from camu-camu fruit (Myrciaria dubia). Food Chem. 2013;139(1-4):578-88.) argumentam que um flavonol-O-glicosídeo com uma hidroxila livre na posição 3-O apresentou uma banda I UV máxima de 374nm, enquanto um flavonol com uma hidroxila bloqueada na posição 3-O da aglicona apresentou banda I UV máxima de 356nm. A introdução de grupos de metila nos flavonóis aumenta o Rt,1818. Abad-García B, Berrueta LA, Garmón-Lobato S, Gallo B, Vicente F. A general analytical strategy for the characterization of phenolic compounds in fruit juices by high-performance liquid chromatography with diode array detection coupled to electrospray ionization and triple quadrupole mass spectrometry. J Chromatogr A. 2009;1216(28):5398-415. e foi determinado que a ordem de eluição seria miricetina (m/z 317), quercetina (m/z 301), laricitina (m/z 331) e siringetina (m/z 345). Laricitina-3-O-diglucosídeo e siringetina-3-O-diglucosídeo foram relatados na T. diffusa por Zhao et al.77. Zhao J, Pawar RS, Ali Z, Khan IA. Phytochemical investigation of Turnera diffusa. J Nat Prod. 2007;70(2):289-92.,88. Zhao J, Dasmahapatra AK, Khan SI, Khan IA. Anti-aromatase activity of the constituents from damiana (Turnera diffusa). J Ethnopharmacol. 2008; 120(3):387-93. e Szewczyk e Zidorn.22. Szewczyk K, Zidorn C. Ethnobotany, phytochemistry, and bioactivity of the genus Turnera (Passifloraceae) with a focus on damiana--Turnera diffusa. J Ethnopharmacol. 2014;152(3):424-43. Review.

Em geral, os flavonóis glicosídeos esterificados com ácidos aromáticos têm Rt mais longo em colunas RP-HPLC que os diglicosídeos e monoglicosídeos, e seus espectros UV apresentam uma banda I intensa (aproximadamente 330nm) e uma pequena banda II a 270nm, resultante da sobreposição da absorção de UV do flavonoide e do ácido cinamoil.1818. Abad-García B, Berrueta LA, Garmón-Lobato S, Gallo B, Vicente F. A general analytical strategy for the characterization of phenolic compounds in fruit juices by high-performance liquid chromatography with diode array detection coupled to electrospray ionization and triple quadrupole mass spectrometry. J Chromatogr A. 2009;1216(28):5398-415. O local predominante da ligação dos grupos acila é geralmente a posição 6”- da hexose, embora outras posições também devam ser consideradas.1818. Abad-García B, Berrueta LA, Garmón-Lobato S, Gallo B, Vicente F. A general analytical strategy for the characterization of phenolic compounds in fruit juices by high-performance liquid chromatography with diode array detection coupled to electrospray ionization and triple quadrupole mass spectrometry. J Chromatogr A. 2009;1216(28):5398-415. O composto 11 foi identificado como apigenina-7-O-(6”-O-p-cumaroil)-glucosídeo, encontrado em alta concentração nessa espécie por Camargo e Vilegas.2626. Camargo EE, Vilegas W. Quality control of polar extracts from Turnera diffusa Willd. ex Schult., Turneraceae. Braz J Pharmacogn. 2010;20(2):228-32.

Alguns estudos mostraram que os flavonoides de diversos fitoterápicos têm efeitos significativos em diferentes estágios de desenvolvimento do sistema nervoso, incluindo a diferenciação neuronal de células-tronco, crescimento de neurites, e plasticidade neuronal.2727. Liu B, Tang J, Zhang J, Li S, Yuan M, Wang R. Autophagy activation aggravates neuronal injury in the hippocampus of vascular dementia rats. Neural Regen Res. 2014;9(13):1288-96.,2828. Xu SL, Zhu KY, Bi CW, Yan L, Men SW, Dong TT, et al. Flavonoids, derived from traditional Chinese medicines, show roles in the differentiation of neurons: possible targets in developing health food products. Birth Defects Res C Embryo Today. 2013;99(4):292-9. Review. Polifenois e flavonoides presentes no extrato hidroalcoólico de Ocimum sanctummelhoraram os danos neuronais induzidos por H2O2, por meio de seu mecanismo de defesa antioxidante, demonstrando potencial para ser utilizado no tratamento de distúrbios neuronais induzidos pelo estresse oxidativo.2929. Venuprasad MP, Hemanth Kumar K, Khanum F. Neuroprotective effects of hydroalcoholic extract of Ocimum sanctum against H2O2 induced neuronal cell damage in SH-SY5Y cells via its antioxidative defence mechanism. Neurochem Res. 2013;38(10):2190-200.Acredita-se que as ações neuroprotetoras dos flavonoides ocorram por meio de interações diretas com cascatas celulares, gerando expressão de proteínas neuroprotetoras e neuromoduladoras, que promovem a neurogênese, a função neuronal e a conectividade cerebral, e também pela melhora do fluxo sanguíneo e da angiogênese no cérebro e nos sistemas sensoriais.3030. Sokolov AN, Pavlova MA, Klosterhalfen S, Enck P. Chocolate and the brain: neurobiological impact of cocoa flavanols on cognition and behavior. Neurosci Biobehav Rev. 2013;37(10 Pt 2):2445-53. Review.

Estudos anteriores demonstraram os efeitos neuroprotetores da luteolina, por meio do aumento da viabilidade neuronal, da redução do número de células apoptóticas3131. Zhu L, Bi W, Lu D, Zhang C, Shu X. Luteolin inhibits SH-SY5Y cell apoptosis through suppression of the nuclear transcription factor-κB, mitogen-activated protein kinase and protein kinase B pathways in lipopolysaccharide-stimulated cocultured BV2 cells. Exp Ther Med. 2014;7(5):1065-70. e da redução da lesão celular induzida por isquemia.3232. Zhang YC, Gan FF, Shelar SB, Ng KY, Chew EH. Antioxidant and Nrf2 inducing activities of luteolin, a flavonoid constituent in Ixeris sonchifolia Hance, provide neuroprotective effects against ischemia-induced cellular injury. Food Chem Toxicol. 2013;59:272-80. A prevenção do estresse oxidativo foi atribuída aos flavonoides, que também podem modular a atividade tanto de enzimas quanto de receptores, atuando como fitoterápicos ou medicamentos multialvo.3333. Grosso C, Valentão P, Ferreres F, Andrade PB. The use of flavonoids in central nervous system disorders. Curr Med Chem. 2013;20(37):4694-719. Review. No entanto, em certas concentrações, os flavonoides podem também atuar como pró-oxidantes, esgotando os sistemas de defesa nucleares antioxidantes e levando a danos oxidativos no DNA.3434. Cariddi L, Escobar F, Sabini C, Torres C, Reinoso E, Cristofolini A, et al. Apoptosis and mutagenicity induction by a characterized aqueous extract of Baccharis articulata (Lam.) Pers. (Asteraceae) on normal cells. Food Chem Toxicol. 2012;50(2):155-61.Este achado está de acordo com nossos resultados, que indicaram que altas concentrações de T. diffusa poderiam causar morte celular em astrócitos.

O extrato de T. diffusa apresentou toxicidade na concentração de 1.000µg/mL depois de 6 e 24 horas de incubação. No entanto, concentrações de 10 e 100µg/mL do extrato apresentaram efeitos semelhantes aos observados no grupo de controle, o que reforça a baixa toxicidade celular dessas doses durante esse período. Assim, pode-se observar que a T. diffusa apresenta toxicidade dose-dependente. O limiar de toxicidade para essa planta situa-se entre 100 e 1.000µg/mL para morte de astrócitos. Essa relação dose-dependente e essa estimativa do limiar de toxicidade podem explicar, até certo ponto, a oposição nos efeitos anti e pró-oxidativos.

Esperava-se que, após 48 horas de incubação, concentrações de 1.000µg/mL do extrato da T. diffusa também diminuiriam a viabilidade de astrócitos, mas os resultados indicaram que as células não diferiram daquelas do grupo controle. Esse resultado pode ter ocorrido porque os nutrientes das células do controle começaram a se esgotar após 48 horas em meio inalterado, levando a perda de aderência e morte natural.

Para uma avaliação adequada destes resultados, algumas limitações devem ser levadas em conta. Em primeiro lugar, deve-se ter em mente que, apesar de ser um método amplamente utilizado, a Hoechst 33342 é uma técnica altamente inespecífica. Assim, não é possível determinar o verdadeiro tipo de natureza de morte celular observada nestas experiências. Em outras palavras, não é possível determinar se a morte celular foi provocada por apoptose, necrose ou outros fenômenos. Outra ressalva importante deve ser feita em relação à definição do limite de toxicidade. De acordo com nossos experimentos, é possível afirmar que o limiar de toxicidade encontra-se em algum ponto entre 100 e 1.000µg/mL. Este intervalo é bastante amplo, e a falta de outros ensaios que avaliem os efeitos tóxicos da T. diffusa impedem o estabelecimento de um nível de toxicidade mais preciso. Além disso, deve-se levar em consideração que esse nível de toxicidade aplica-se exclusivamente à morte celular observada nos astrócitos. Qualquer outro tipo de efeito tóxico, bem como efeitos sobre outros tipos de células e tecidos, pode ter seus próprios níveis de toxicidade. Por outro lado, pode-se supor que futuros estudos sobre os possíveis efeitos terapêuticos da T. diffusa se restrinjam a doses inferiores a 100µg/mL. Uma advertência final refere-se ao perfil fitoquímico observado neste experimento. Como acontece em grande parte dos experimentos realizados com plantas medicinais, os compostos extraídos dependem de fatores ambientais (local de plantio, características do solo, temperatura e umidade, entre outros), procedimentos de colheita e pós-colheita (secagem, moagem e armazenamento), e extração (diferentes técnicas, solventes e concentrações). Assim, os resultados obtidos devem ser contextualizados de acordo com as características deste experimento. É altamente provável que outros estudos que utilizem o extrato deT. diffusa apresentem perfil fitoquímico semelhante, porém com algumas variações, razão pela qual a análise fitoquímica é sempre útil para esse tipo de ensaio.

CONCLUSÃO

A Turnera diffusa Willd (Turneraceae) é utilizada pela população brasileira, e a avaliação de sua eficácia tem valor do ponto de vista etnofarmacológico. A análise química revelou a presença de flavona-C, O-diglicosídeos, tais como luteolina-8-C-[6-desoxi -2-O-ramnosil]-xilo-hexos-3-ulosideo, apigenina-8-C [6- desoxi-2-O-ramnosil]-xilo-hexos-3-uloside e apigenina-7-O-6”-p-cumaroilglucosídeo em altas concentrações neste extrato hidroetanólico. Esses mesmos compostos também foram relatados nessa espécie. O extrato hidroetanólico da Turnera diffusaapresentou atividade citotóxica e aumentou a porcentagem de morte dos astrócitos somente em 1.000µg/mL, tanto após 6 quanto após 24 horas de exposição.

AGRADECIMENTOS

Este ensaio contou com o apoio das seguintes instituições: Associação Fundo de Incentivo à Psicofarmacologia (AFIP), Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    16 Maio 2015
  • Aceito
    13 Jan 2016
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