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Modos de endereçamento em programas de rádio: o Jornal da Itatiaia1 1 A primeira versão deste artigo foi apresentada no 14º. Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, da Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor), realizado na Unisul, Palhoça - SC, de 09 a 11 de novembro de 2016. O texto foi revisto e ampliado.

Modos de direccionamiento en programas de radio: el Jornal de Itatiaia

Resumo

O artigo discute o potencial do conceito de modo de endereçamento para analisar a maneira como programas de rádio se relacionam com a sua audiência por meio da construção de um estilo próprio. Analisou-se duas semanas (edições de 18 a 23 de julho de 2016 e de 10 a 15 de abril de 2017) do jornal da rádio Itatiaia. de Minas Gerais, a partir de algumas das principais dimensões de análise do modo como o programa se endereça ao público. Constatou-se que o papel da apresentadora, a organização de temas, a distribuição de profissionais na cobertura jornalística e a publicidade são componentes fundamentais nas estratégias de endereçamento do Jornal da Itatiaia.

Palavras-chave
Modo de endereçamento; Radiojornalismo; Interpretação de produtos radiofônicos; Jornal da Itatiaia; Jornalismo e sociedade

Resumen

El artículo discute el potencial del concepto de modo de direccionamiento para analizar la forma en que los programas de radio se relacionan con su audiencia a través de la construcción de un estilo propio. Se analizó dos semanas (ediciones del 18 al 23 de julio de 2016 y del 10 al 15 de abril de 2017) del periódico de la radio Itatiaia (Minas Gerais, Brasil) a partir de algunas de las principales dimensiones de análisis del modo en que el programa se dirige al público. Se constató que el papel de la presentadora, la organización de temas, la distribución de profesionales en la cobertura periodística, y la publicidad son componentes fundamentales en las estrategias del programa dirigirse a su publico.

Palavras clabe
Modo de direcionamento; Periodismo radiofônico; Interpretacion de productos de radio; Jornal da Itatiaia; Periodismo y sociedad

Abstract

The article discusses the potential of the mode of address concept for analyzing how radio programs relate to their audience by constructing a particular style. Two weeks of the Itatiaia radio news program from Minas Gerais, Brazil, were analyzed (from 18 to 23 July 2016 and 10 to 15 April 2017) considering some of the main dimensions of the analysis of how the program addresses the public. It was found that the role of the anchor, the organization of issues and distribution of professionals in journalistic coverage and advertising are fundamental components of the news program’s strategies of address.

Keywords
Mode of address; Radiojournalism; Interpretation of radio products; Journal of Itatiaia; Journalism and society

Introdução

No ar desde 20 de janeiro de 1952, a Itatiaia se posiciona para o seu público como “a rádio de Minas”2 2 A emissora cobre 92% do território de Minas Gerais e é transmitida nas frequências 610 kHz – AM e 95,7 MHz – FM. , investindo permanentemente em uma imagem vinculada ao culto à mineiridade (SALOMÃO, 2003SALOMÃO, M. Jornalismo radiofônico e vinculação social. São Paulo: Annablume, 2003.). A emissora foi um marco para a história do rádio em Minas Gerais, principalmente por ser a primeira no estado voltada para as transmissões esportivas. Mais tarde, em 1958, foi também a primeira em Minas a manter a programação no ar por 24 horas (PRATA, 2011_____. Rádio Itatiaia: 60 anos de jornalismo. In: VII ENCONTRO NACIONAL DE HISTÓRIA DA MÍDIA. Guarapuava, 2011. Anais... Disponível em: http://www.ufrgs.br/alcar/encontros-nacionais-1/8o-encontro-2011-1/artigos/Radio%20Atalaia%2060%20anos%20de%20jornalismo.pdf/view. Acesso em: 20 jul. 2016.
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). Fez forte investimento em programação jornalística, com coberturas de impacto como julgamentos de acusados de crimes, grandes eventos e até acontecimentos internacionais. A emissora demorou mais de uma década, pelo menos, para estar entre as mais ouvidas na cidade de Belo Horizonte, capital do estado. Mas desde os anos de 1980 se consolidou como a maior emissora radiofônica de Minas Gerais em audiência e em faturamento (SALOMÃO, 2003SALOMÃO, M. Jornalismo radiofônico e vinculação social. São Paulo: Annablume, 2003.).

O jornalismo da Itatiaia ganhou maior espaço na grade de programação principalmente a partir de 1964 e teve grande impulso após a reestruturação realizada pela emissora em 1974, quando surgiu o Jornal da Itatiaia (JI), levado ao ar das 7h às 8h. A expansão da programação jornalística, na década de 1980, conduziu à criação das duas edições do JI existentes atualmente, em horários nobres do rádio. A primeira de manhã, das 6h30 às 7h30 horas, todos os dias da semana; e a segunda edição das 12h30 às 13h, de segunda a sábado3 3 A primeira e a segunda edições vão ao ar tanto pela Rádio Itatiaia AM quanto pela FM. Podem ser acessadas pelo site: www.itatiaia.com.br

O JI, nas duas edições, é o programa informativo mais ouvido em Minas Gerais, segundo pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Opinião e Estatística (Ibope) em 2015, mencionadas no site da emissora4 4 Disponível em: http://www.itatiaia.com.br/programacao. Acesso em: 18 jul. 2016. . É considerado o “carro-chefe” da programação (SALOMÃO, 2003SALOMÃO, M. Jornalismo radiofônico e vinculação social. São Paulo: Annablume, 2003.). Nossa atenção neste artigo volta-se para o JI segunda edição. Interessa-nos analisar esse produto radiojornalístico a partir de uma abordagem do conceito de modo de endereçamento, entendido como o modo próprio, ou estilo, a partir do qual cada mídia ou programa específico de televisão ou rádio se dirige e estabelece relação com a sua audiência ou com seus leitores (HARTLEY, 2001HARTLEY, J. Modo de endereçar. In: O’SULLIVAN, T. et al. Conceitos-Chave em Estudos de Comunicação e Cultura. Trad. M. Griesse e A. Nascimento. Piracicaba/SP, Ed. Unimep, 2001. p.160-161.; GOMES, 2007_____. Questões de método na análise do telejornalismo: premissas, conceitos, operadores de análise. E-Compós. Brasília, 2007. p.2-31., 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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).

O objetivo principal é explorar o potencial do conceito de modo de endereçamento para a interpretação de programas de rádio, inclusive os jornalísticos, como é o caso do Jornal da Itatiaia, nosso objeto empírico. Entendemos que o conceito é profícuo para explorar diferentes problemas de pesquisa relacionados à forma como a produção em rádio e áudio estabelece a comunicação com o seu público – algo ainda pouco explorado nos estudos da área. Na pesquisa bibliográfica que realizamos no período desta pesquisa (2016 a 2017), o único estudo encontrado utilizando o conceito de modo de endereçamento no rádio foi o de Costa Filho e Marques (2015)COSTA FILHO; I. C.; MARQUES, Â. C. S. Endereçamentos da rádio Rebelde Zapatista - articulações e autonomia. Animus – Revista Interamericana de Comunicação Midiática, v.14, n.28, UFSM, Santa Maria, 2015. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/animus/article/view/17539/0. Acesso em: 04 abr. 2016
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. Os pesquisadores analisam alguns dos endereçamentos usados nas emissões da Rádio Rebelde - iniciativa do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), em Chiapas, no México -, com o objetivo de compreender as contribuições da emissora na construção de imaginários sobre a autonomia zapatista. Para isso, os pesquisadores se concentraram na análise da temática, mediadores, recursos técnicos, linguagem radiofônica, texto verbal e do papel social da emissora como os elementos principais para identificar as estratégias de endereçamento da rádio (COSTA FILHO; MARQUES, 2015COSTA FILHO; I. C.; MARQUES, Â. C. S. Endereçamentos da rádio Rebelde Zapatista - articulações e autonomia. Animus – Revista Interamericana de Comunicação Midiática, v.14, n.28, UFSM, Santa Maria, 2015. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/animus/article/view/17539/0. Acesso em: 04 abr. 2016
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).

Acreditamos que o presente trabalho vai além e traz outra contribuição aos estudos em rádio. Isso porque sistematiza e discute diferentes dimensões possíveis de serem consideradas para analisar o modo específico como as produções radiofônicas se dirigem à audiência e para explorar outras problemáticas de pesquisa relacionadas a este vínculo entre produção e recepção. Tal reflexão será feita a partir do caso do Jornal da Itatiaia segunda edição. Como o JI constrói a sua relação com os ouvintes? O que é próprio no seu estilo de dialogar ou convocar o seu público? Que imagem projeta de si e do outro – os seus ouvintes – através dos recursos de seu endereçamento? Essas são as questões centrais que orientam o presente trabalho.

O artigo está organizado em três partes. A primeira discute o conceito de modo de endereçamento e dos operadores de análise propostos por Gomes (2004, 2005, 2011)_____. Modo de Endereçamento no Telejornalismo do Horário Nobre Brasileiro: o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. In: XXVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. Rio de Janeiro: UERJ, 2005. v.1, p.54-72. Anais... Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/74277217742772103772621605140235486090.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, adaptando-os para uma pesquisa voltada a programas de rádio. Ainda neste tópico, explicitamos os procedimentos de definição do corpus da pesquisa. A segunda parte identifica e analisa as estratégias de endereçamento do JI segunda edição. Por fim, nas conclusões, indicamos nossas considerações acerca dos achados da presente pesquisa e do potencial do conceito de modos de endereçamento para a descrição e interpretação de um programa radiofônico do gênero jornalístico.

O conceito de modo de endereçamento

Modo de endereçamento é um conceito que surge na análise fílmica e que desde os anos 1980 tem sido adaptado e usado em outras áreas, sobretudo para a interpretação da forma como programas de televisão constroem a relação com os telespectadores (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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). No âmbito de sua reflexão sobre os modos de endereçamento no cinema, Ellsworth (2001, p.11)ELLSWORTH, E. Modos de endereçamento: uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In: SILVA, T. T. (Org.). Nunca fomos humanos. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. sintetiza o conceito assim: “quem esse filme pensa que você é?”. Para a autora, o modo de endereçamento não é um momento visual ou falado, mas uma estruturação das relações entre o filme e os seus espectadores, a qual se desenvolve ao longo do tempo (ELLSWORTH, 2001ELLSWORTH, E. Modos de endereçamento: uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In: SILVA, T. T. (Org.). Nunca fomos humanos. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.). Tratar-se-ia, como completa Gomes (2011, p.34)_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, de um “processo invisível” através do qual a audiência é interpelada a assumir determinadas posições a partir das quais assistir ao filme.

Nos estudos de televisão, principalmente da recepção, o conceito tem sido entendido como “estilo” ou “tom” de um programa e é utilizado para compreender a relação de interdependência existente entre emissores e receptores na construção do sentido do texto ou produto televisivo (GOMES, 2007_____. Questões de método na análise do telejornalismo: premissas, conceitos, operadores de análise. E-Compós. Brasília, 2007. p.2-31., 2011; ROCHA, 2011ROCHA, S. M. Entre a ideologia, a hegemonia e a resistência: Os modos de endereçamento como um diálogo entre a produção e a audiência de produtos televisivos. Revista Fronteiras, v.13, n.3, Unisinos, setembro/dezembro 2011, p.174-184.). Segundo Gomes (2007, p.22)_____. Questões de método na análise do telejornalismo: premissas, conceitos, operadores de análise. E-Compós. Brasília, 2007. p.2-31., “o conceito nos leva não apenas à imagem da audiência, mas ao estilo, às especificidades de um determinado programa”, ao “apelo” particular que ele dirige à sua audiência. A construção de modos próprios de se endereçar ao público aponta para a dinâmica relacional existente entre o que é proposto no âmbito da produção e da audiência (GOMES, 2007_____. Questões de método na análise do telejornalismo: premissas, conceitos, operadores de análise. E-Compós. Brasília, 2007. p.2-31.; ROCHA, 2011ROCHA, S. M. Entre a ideologia, a hegemonia e a resistência: Os modos de endereçamento como um diálogo entre a produção e a audiência de produtos televisivos. Revista Fronteiras, v.13, n.3, Unisinos, setembro/dezembro 2011, p.174-184.). Baseados em uma audiência imaginada pela produção – explica Rocha (2011, p.183)ROCHA, S. M. Entre a ideologia, a hegemonia e a resistência: Os modos de endereçamento como um diálogo entre a produção e a audiência de produtos televisivos. Revista Fronteiras, v.13, n.3, Unisinos, setembro/dezembro 2011, p.174-184. -, “os programas criam uma determinada identidade que mobiliza linguagem própria, assim como estruturas narrativas e argumentativas específicas para dialogar com aquele público em questão”.

Nessa perspectiva, então, modo de endereçamento é o que é característico das formas e práticas comunicativas específicas de um programa; refere-se às suas estratégias de tentar construir uma forma particular de relação com a audiência (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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). O modo de endereçamento depende e estrutura-se “a partir das características de cada meio, tanto no que se refere ao suporte quanto às formas culturais adquiridas por cada mídia em uma determinada sociedade” (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, p.36). Assim, por exemplo, cinema, televisão e rádio se distinguem em função de suas possibilidades técnicas, recursos de linguagem, gêneros adotados, relação histórica construída com o público, convenções que regulam as expectativas da audiência em relação a cada um deles (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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).

Aplicada aos estudos do jornalismo – ênfase das pesquisas de Gomes (2004, 2005, 2007, 2011)_____. Questões de método na análise do telejornalismo: premissas, conceitos, operadores de análise. E-Compós. Brasília, 2007. p.2-31. –, essa abordagem do modo de endereçamento conduz a adotar o pressuposto de que a produção de uma notícia deverá considerar tanto uma orientação em relação ao acontecimento quanto em relação ao receptor, com um modo de dizer específico (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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). O modo de endereçamento é esta “orientação para o receptor” e “é ele que provê grande parte do apelo de programa” para o seu público (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, p.36 – Grifo no original).

Tal abordagem nos inspira aqui a pensar o modo de endereçamento como um conceito profícuo também para descrever e analisar programas de rádio e a forma singular como eles constroem o vínculo com seus ouvintes. Assim, adotamos tal conceito, no presente trabalho, no sentido proposto por Gomes (2011, p.36)_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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: “modo de endereçamento se refere ao modo como um determinado programa se relaciona com sua audiência a partir da construção de um estilo, que o identifica e que o diferencia dos demais”. Acreditamos que tal perspectiva possibilita tanto a investigação e análise concreta dos programas (o que é característico da materialidade de um dado produto de rádio ou áudio, especificidades do meio e suas linguagens) quanto a consideração do contexto social, cultural e histórico ao qual ele está vinculado (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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; ROCHA, 2011ROCHA, S. M. Entre a ideologia, a hegemonia e a resistência: Os modos de endereçamento como um diálogo entre a produção e a audiência de produtos televisivos. Revista Fronteiras, v.13, n.3, Unisinos, setembro/dezembro 2011, p.174-184.).

Dimensões de análise do modo de endereçamento

Os modos como um programa – de televisão, de rádio – se endereça à sua audiência, buscando construir uma relação e uma identidade que o distingue dos outros programas do mesmo gênero, podem ser apreendidos a partir de vários elementos. No entanto, eles não podem ser vistos como algo isolado, mas sim profundamente interligados (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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). As nove dimensões listadas a seguir resultam de uma sistematização que nós fazemos de operadores de análise trabalhados em pesquisas desenvolvidas ou coordenadas por Gomes (2004, 2005, 2011)GOMES, I. Quem o Jornal do SBT pensa que somos? Modo de endereçamento no telejornalismo show. Revista da Famecos. n.25. Porto Alegre, 2004. e que adaptamos aqui para testá-los na interpretação de um programa de radiojornalismo. Não se trata, portanto, de mera transposição para descrever e analisar programas de rádio, mas uma adaptação que leva em conta as especificidades socio-técnicas, formatos e linguagens específicas deste meio de comunicação e seus modos de construir o vínculo com o público.

O mediador

A compreensão do modo de endereçamento de um programa implica analisar os seus mediadores: quem são, como se posicionam no programa e para a sua audiência, com quem estabelecem determinados tipos de vínculos (de familiaridade, de formalidade ou informalidade). No caso do jornalismo, dada a variedade de formatos, em um mesmo programa pode haver vários mediadores: apresentador(a), repórteres, comentaristas. O(a) apresentador(a) ou âncora, porém, é normalmente a figura central em qualquer formato de programa. Ele ou ela é a “cara” – ou a “voz” – do programa: é quem constrói a ligação com o ouvinte e também com os demais integrantes da produção como repórteres e produtores (GOMES, 2004GOMES, I. Quem o Jornal do SBT pensa que somos? Modo de endereçamento no telejornalismo show. Revista da Famecos. n.25. Porto Alegre, 2004., 2005, 2011). Portanto, a performance do(a) apresentador(a) ou âncora – o seu desempenho na representação daquele papel (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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), o uso que faz da linguagem falada, da sua voz e suas características – é um aspecto fundamental na compreensão do modo de uma rádio se endereçar ao ouvinte. “O jornal toma a ‘cara’ do âncora [...]. Sua participação no ar e na confecção do jornal identificam-no junto aos ouvintes” (BARBEIRO; LIMA, 2001BARBEIRO, H.; LIMA, P. R. Manual de radiojornalismo – produção, ética e internet. Rio de Janeiro: Campus, 2001., p.52). O(a) apresentador(a) é “talvez o fator mais importante para a criação de um estilo consistente [...], é quem regula o tom do programa de acordo com a maneira como ele aborda o ouvinte” (MCLEISH, 2001MCLEISH, R. Produção de rádio: um guia abrangente de produção radiofônica. Trad. Mauro Silva. São Paulo: Summus, 2001., p.142).

Organização temática e proximidade com a audiência

A organização dos temas priorizados por um programa envolve uma aposta da produção em determinados interesses e competências da sua audiência. Em um programa temático, como, por exemplo, de jornalismo esportivo, a temática é a principal dimensão para analisar o modo de endereçamento. Analisa-se, então, como o tema é abordado e como se articula com os outros operadores de análise. Já em programas de temas variados – como, por exemplo, o do JI, nosso objeto aqui -, a análise e a compreensão da organização temática requerem observar também o modo específico da organização e apresentação de seções ou editorias, blocos, construção de proximidade geográfica com a audiência, entre outros (GOMES, 2004GOMES, I. Quem o Jornal do SBT pensa que somos? Modo de endereçamento no telejornalismo show. Revista da Famecos. n.25. Porto Alegre, 2004., 2005, 2011; MCLEISH, 2001MCLEISH, R. Produção de rádio: um guia abrangente de produção radiofônica. Trad. Mauro Silva. São Paulo: Summus, 2001.).

Contexto comunicativo

O contexto comunicativo no qual o programa atua envolve emissor, audiência e as circunstâncias espaço-temporais nas quais acontece o processo comunicativo. A comunicação se dá em um ambiente físico, social e mental partilhado, e se orienta por determinadas “instruções” ou princípios reguladores da comunicação. Isto é, “os modos como os emissores se apresentam, como representam seus receptores e como situam uns e outros em uma situação comunicativa concreta” (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, p.39). Um programa jornalístico apresenta definições de seus participantes, dos seus objetivos, das formas de comunicar. Posiciona a si mesmo e posiciona os demais (ouvintes) de determinada maneira. Tais definições se manifestam explicitamente (“você, amigo da CBN”; “a rádio de todos os mineiros”; “para você que nos ouve agora”; “esta é a notícia mais importante do dia”) ou implicitamente, através da postura ou posicionamento do(a) apresentador(a), das escolhas técnicas realizadas (GOMES, 2004GOMES, I. Quem o Jornal do SBT pensa que somos? Modo de endereçamento no telejornalismo show. Revista da Famecos. n.25. Porto Alegre, 2004., 2005, 2011; MCLEISH, 2001MCLEISH, R. Produção de rádio: um guia abrangente de produção radiofônica. Trad. Mauro Silva. São Paulo: Summus, 2001.).

O pacto sobre o papel do jornalismo

Em programas de cunho jornalístico, um pacto sobre o papel do jornalismo na sociedade regula a relação entre o programa e o seu público. Esse pacto indica ao ouvinte o que esperar do programa, quais expectativas ele se propõe a atender. Tais expectativas podem ser, por exemplo, investigação e informação de qualidade e credibilidade”, no caso de programas do gênero jornalístico (GOMES, 2004GOMES, I. Quem o Jornal do SBT pensa que somos? Modo de endereçamento no telejornalismo show. Revista da Famecos. n.25. Porto Alegre, 2004., 2005), ou entretenimento e fruição, no caso de programas do gênero de entretenimento ou diversional, como os musicais, artísticos, radioteatro, entre outros (BARBOSA FILHO, 2003). A compreensão do pacto entre o programa e o receptor supõe analisar a maneira como o programa lida ou atualiza certas noções, normas, valores e convenções que constituem o jornalismo como uma instituição social: objetividade, imparcialidade, factualidade, interesse público, responsabilidade social, liberdade de expressão e de opinião, atualidade, quarto poder; verdade, pertinência e relevância da notícia, prioridade a certos valores-notícia (GOMES, 2004GOMES, I. Quem o Jornal do SBT pensa que somos? Modo de endereçamento no telejornalismo show. Revista da Famecos. n.25. Porto Alegre, 2004., 2005, 2011; TRAQUINA, 2005TRAQUINA, N. Teorias do Jornalismo. A tribo jornalística – uma comunidade interpretativa transnacional. 2. ed. Florianópolis: Insular, 2005.).

Recursos técnicos a serviço do jornalismo

Relacionados também ao pacto entre programa e audiência, as dimensões sistematizadas na sequência (linguagem, formatos, entre outros) são importantes para identificar o modo de endereçamento. O primeiro deles refere-se aos recursos técnicos das emissoras para a produção de seu jornalismo: tecnologias e qualidade na captação de sons, edição, a plástica radiofônica, ou seja, a organização dos conteúdos na programação (blocos, intervalos, vinhetas, efeitos sonoros, trilhas). Além destes, as entradas e coberturas ao vivo, e o apelo a certos recursos sinalizando à audiência o trabalho de produção da notícia são outros importantes dispositivos de construção da credibilidade e identidade do programa e da emissora, da autenticidade e agilidade de sua cobertura jornalística (GOMES, 2004GOMES, I. Quem o Jornal do SBT pensa que somos? Modo de endereçamento no telejornalismo show. Revista da Famecos. n.25. Porto Alegre, 2004., 2005, 2011; COSTA FILHO; MARQUES, 2015COSTA FILHO; I. C.; MARQUES, Â. C. S. Endereçamentos da rádio Rebelde Zapatista - articulações e autonomia. Animus – Revista Interamericana de Comunicação Midiática, v.14, n.28, UFSM, Santa Maria, 2015. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/animus/article/view/17539/0. Acesso em: 04 abr. 2016
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). No contexto atual de reconfiguração do sistema midiático e de convergência de mídias, a compreensão do modo como um programa se orienta ao seu ouvinte implica também atentar à apropriação que as emissoras – e cada programa especificamente - estão fazendo dos recursos tecnológicos (PRATA, 2012PRATA, N. Webrádio: novos gêneros, novas formas de interação. 2ª. edição, Florianópolis: Insular, 2012.; FERRARETO; KLOCKNER, 2010FERRARETO, L. A.; KLOCKNER, L. (Orgs.). E o rádio? Novos horizontes midiáticos. Edipucrs. Porto Alegre. 2010. Disponível em: http://www.pucrs.br/edipucrs/eoradio.pdf. Acesso em: 28 ago. 2013.
http://www.pucrs.br/edipucrs/eoradio.pdf...
).

Recursos da linguagem radiofônica

Essa dimensão de análise refere-se à exploração das potencialidades da linguagem específica do meio, tal como ela é construída em um programa e compartilhada pela audiência (GOMES, 2005_____. Modo de Endereçamento no Telejornalismo do Horário Nobre Brasileiro: o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. In: XXVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. Rio de Janeiro: UERJ, 2005. v.1, p.54-72. Anais... Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/74277217742772103772621605140235486090.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/...
, 2011). No caso do rádio, a observação desse aspecto pode se dar em dois eixos, que estão interligados. O primeiro atenta aos recursos de gravação e edição utilizados pelo programa e/ou à maneira como um maior ou menor poderio técnico (referenciado no operador antes mencionado) contribui para potencializar o uso da linguagem própria do meio. Linguagem constituída por palavras, som e efeitos sonoros, música, ruídos, silêncio (MEDITSCH, 1995MEDITSCH, E. Sete meias-verdades e um lamentável engano que prejudicam o entendimento da linguagem do radiojornalismo na era eletrônica. Palestra à Licenciatura em Jornalismo da Universidade de Coimbra. Coimbra, 1995. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/meditsch-eduardo-meias-verdades.pdf. Acesso em: 01 mar. 2004.
http://www.bocc.ubi.pt/pag/meditsch-edua...
; MCLEISH, 2001MCLEISH, R. Produção de rádio: um guia abrangente de produção radiofônica. Trad. Mauro Silva. São Paulo: Summus, 2001.; BARBOSA FILHO, 2003), que deixa marcas no estilo do programa e que colabora na construção da sua credibilidade. O segundo eixo atenta ao modo específico como o programa concebe, lida ou atualiza um conjunto de características consideradas específicas do rádio e importantes no entendimento da mediação entre produção e recepção: oralidade, poder de penetração, mobilidade, instantaneidade e autonomia (ORTRIWANO, 1985ORTRIWANO, G. S. A informação no rádio: os grupos de poder e a determinação dosconteúdos. São Paulo: Summus, 1985.); sensorialidade, regionalismo, intimidade, imediatismo/instantaneidade (BARBOSA FILHO, 2003); e invocação, entonação, clareza, repetição, rapidez e simultaneidade (PRADO, 1989PRADO, E. Estrutura da informação radiofônica. São Paulo: Summus, 1989.).

Formatos de apresentação das informações

Os formatos que um programa jornalístico utiliza para apresentação da notícia dão pistas sobre o tipo de jornalismo ali praticado e, também, sobre o investimento da emissora na produção de notícias (GOMES, 2005_____. Modo de Endereçamento no Telejornalismo do Horário Nobre Brasileiro: o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. In: XXVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. Rio de Janeiro: UERJ, 2005. v.1, p.54-72. Anais... Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/74277217742772103772621605140235486090.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/...
, 2011). Dentre os vários formatos do gênero jornalístico no rádio, cita-se, seguindo Barbosa Filho (2003, p.89): nota; notícia radiofônica; boletim; reportagem; entrevista; crônica; jornal ou radiojornal – formato que congrega outros formatos jornalísticos como os antes citados; o comentário; o editorial – pouco utilizado no rádio; o documentário; as mesas-redondas ou debates radiofônicos; os programas policiais e programas esportivos, veiculados dentro dos noticiários ou em programas específicos; e a divulgação tecnocientífica.

Relação com as fontes de informação

Além dos formatos jornalísticos priorizados, a relação do programa com as fontes que aciona para a produção de informações é outro importante indicador de escolhas jornalísticas realizadas, bem como de construção da credibilidade, imparcialidade, emissão ou não de opinião explícita (GOMES, 2005_____. Modo de Endereçamento no Telejornalismo do Horário Nobre Brasileiro: o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. In: XXVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. Rio de Janeiro: UERJ, 2005. v.1, p.54-72. Anais... Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/74277217742772103772621605140235486090.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, 2011). Para além das diferentes formas de classificar as fontes jornalísticas (LAGE, 2011LAGE, N. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. 9ª edição, Rio de Janeiro: Record, 2011.), interessa aqui destacar três tipos básicos de fontes normalmente acionadas: as fontes oficiais (autoridades) e os especialistas, ambas consideradas vozes autorizadas a dar credibilidade à notícia e ao programa; e os cidadãos comuns, normalmente mencionados quando são afetados pelo assunto, quando se tornam notícia e/ou para humanizar o relato e autenticar a cobertura jornalística (GOMES, 2005_____. Modo de Endereçamento no Telejornalismo do Horário Nobre Brasileiro: o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. In: XXVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. Rio de Janeiro: UERJ, 2005. v.1, p.54-72. Anais... Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/74277217742772103772621605140235486090.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, 2011).

Texto verbal

A análise do texto verbal revela as estratégias usadas pelos(as) mediadores(as) para construir as notícias, interpelar diretamente a audiência e construir credibilidade (GOMES, 2005_____. Modo de Endereçamento no Telejornalismo do Horário Nobre Brasileiro: o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. In: XXVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. Rio de Janeiro: UERJ, 2005. v.1, p.54-72. Anais... Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/74277217742772103772621605140235486090.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, 2011). No caso do rádio, esse é um aspecto também importante a ser observado para a compreensão dos endereçamentos de um programa. Afinal, como bem destaca Meditsch (1995, p.3)MEDITSCH, E. Sete meias-verdades e um lamentável engano que prejudicam o entendimento da linguagem do radiojornalismo na era eletrônica. Palestra à Licenciatura em Jornalismo da Universidade de Coimbra. Coimbra, 1995. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/meditsch-eduardo-meias-verdades.pdf. Acesso em: 01 mar. 2004.
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a propósito da linguagem radiofônica: “a oralidade no rádio é apenas a sua manifestação aparente, há um mundo de escrita e um modo eletrônico por trás de sua produção”. A observação do texto verbal, conforme Gomes (2005, 2011)_____. Modo de Endereçamento no Telejornalismo do Horário Nobre Brasileiro: o Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. In: XXVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. Rio de Janeiro: UERJ, 2005. v.1, p.54-72. Anais... Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/74277217742772103772621605140235486090.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/...
, pode ser feita a partir da identificação de estratégias narrativas e argumentativas, recursos retóricos e persuasivos adotados, bem como de modalizadores linguísticos que evidenciam diferentes estratégias: de interpelação e aproximação com o ouvinte (“Olá, boa tarde”; “Ouça agora, no Jornal da Itatiaia”), de atualidade, objetividade, didático, entre outros.

Nota-se, portanto, que a compreensão das estratégias de construção dos modos de endereçamento implica, conforme salientado por Gomes (2011)_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, a articulação de elementos semióticos, discursivos, sociais, ideológicos e comunicacionais. Da mesma forma, é importante considerar que essas dimensões do modo de endereçamento não são excludentes e exaustivas. Estão articuladas entre si. Não devem, portanto, ser observadas nem interpretadas de forma isolada. “É o modo mesmo de configuração dos programas que dirá ao analista a partir de quais operadores um programa concreto se constrói” (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
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, p.38). Ao mesmo tempo, “o objetivo de análise não deve ser descrever ou interpretar cada um dos operadores isoladamente, mas, através dos operadores, acessar o modo de endereçamento de um programa específico” (GOMES, 2011_____. (Org.) Gêneros televisivos e modos de endereçamento no telejornalismo. Salvador, Edufba, 2011. pp.223-242. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/bitstream/ri/1585/1/Generos%20televisivos.pdf. Acesso em: 02 mar. 2015.
http://www.repositorio.ufba.br:8080/ri/b...
, p.38).

A fim de explorar as possibilidades do conceito de modo de endereçamento na análise de programas de rádio, procedemos, na sequência, à descrição e interpretação de um programa jornalístico da rádio Itatiaia, a emissora de maior audiência no estado de Minas Gerais no ano de 2015 e a quinta colocada no ranking nacional, conforme pesquisa do Ibope5 5 Disponível em: http://www.ouvintes.com.br/

Para a presente análise, gravamos doze edições do JI segunda edição, que foram ao ar entre os dias 18 e 23 de julho de 2016 e de 10 a 15 de abril de 2017, respectivamente, das 12h30 às 13h. Este é, portanto, o corpus da presente análise. Para este estudo, inicialmente foi feita uma pesquisa exploratória sobre o programa, buscando compreender a sua organização: blocos, temas prioritários e fazer uma primeira identificação de operadores mais proeminentes no programa. Posteriormente, nos dedicamos à descrição e interpretação do JI, buscando analisar o modo como o programa, enquanto produto jornalístico em rádio, dialoga com a sua audiência a partir da construção de um estilo particular. O que é próprio do JI? De que modo ele convoca o ouvinte?

As estratégias de endereçamento do Jornal da Itatiaia

O JI apresenta inúmeras características que colaboram para a sua identificação com o gênero jornalístico de um radiojornal: a temática e os formatos de estruturação das informações, o agenciamento de fontes informativas, a apresentação e organização do programa. O programa coloca-se como praticante de “um jornalismo executado de maneira responsável, imparcial e de muita credibilidade”6 6 Rádio Itatiaia. Disponível em: http://www.itatiaia.com.br/programacao . Acesso em: 18 jul. 2016. . Tal posicionamento sinaliza o pacto que o JI propõe ao seu ouvinte sobre o que entende ser o papel do jornalismo na sociedade, reafirmando valores jornalísticos clássicos, como os ideais de objetividade, imparcialidade e responsabilidade, por meio dos quais o programa busca sustentar a credibilidade junto à sua audiência.

O JI tem duração de aproximadamente 28 a 30 minutos e é organizado em quatro blocos, com notícias dos principais acontecimentos do dia em Minas Gerais, no Brasil e no mundo. A organização dos blocos segue um padrão de divisão em seções ou editorias. O primeiro bloco é composto por notícias sobre política e economia, normalmente com os mesmos temas e enquadramentos que predominam na agenda da mídia informativa hegemônica e que são apresentadas pela repórter Aparecida Ferreira, direto de Brasília7 7 Cita-se, como exemplos, as seguintes chamadas extraídas do corpus da pesquisa: “Governo tenta reaproximar do Congresso para país tirar o pé do freio”; “Ministro do Superior Tribunal Federal Edson Fachin abre inquérito para investigar nove ministro e três governadores”; “Senador Aécio Neves é citado em delação do empresário da JBS, Joesley Batista” (JI – 2ª edição, 2016 e 2017). . Se, no primeiro bloco, o JI remete seus ouvintes aos destaques no cenário da política oficial do país, demarcando sua presença no centro dos acontecimentos que afetam os brasileiros (especialmente Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro), no segundo bloco o Jornal os localiza temática e geograficamente no grande território de Minas Gerais. Traz temas da capital Belo Horizonte e do interior do estado, apresenta a situação das rodovias estaduais e federais, localizadas em relação às cidades mineiras que lhes são próximas e destaca os assuntos que propõe à sua audiência como sendo os principais do dia no estado8 8 Como exemplos, cita-se as chamadas: “Clima de férias lota salas de cinema na capital”; “PF cumpre mandado de prisão da ‘Operação Hashtag’ em Varginha”; “Para diminuir risco de contágio, SUS vai disponibilizar coquetel contra HIV em Minas”; “Agências da Caixa Econômica da capital abrem mais cedo para saque do FGTS”; “Mais de duas mil pessoas são abordadas em Belo Horizonte em Operação Viagem Segura” (JI segunda edição, 2016; 2017). . O bloco três apresenta a opinião do renomado comentarista da Rede Globo, Alexandre Garcia, direto do Rio de Janeiro, sobre temas nacionais9 9 Dentre os temas comentados nas 12 edições analisadas, destaca-se: o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff; discussão sobre desconto no salário de deputados federais faltantes ao trabalho; divulgação de áudios do empresário da JBS Joesley Batista afirmando o envolvimento do senador Aécio Neves e do presidente Michel Temer em esquemas de corrupção e lavagem de dinheiro. ; notícias produzidas por repórteres dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro10 10 Por exemplo: “Onda de terrorismo faz Brasil ampliar vistoria no Rio de Janeiro”; “Quatro pessoas são presas em São Paulo por suspeita de ligação com o Estado Islâmico” (JI segunda edição, 2016; 2017). ; e algum fato de destaque no cenário internacional, sobretudo os que reforçam o agendamento da mídia informativa no cenário interno do Brasil11 11 Por exemplo: “França prorroga estado de emergência”; “Estado Islâmico reivindica ataque com machado em trem da Alemanha”; “Ataque de mísseis à Síria por governo de Donald Trump causa instabilidade internacional”; “Papa Francisco condena ataques a mísseis na Síria” (JI segunda edição, 2016; 2017). . O último bloco é dedicado às notícias do esporte, em especial aos dois principais times mineiros de futebol (Atlético e Cruzeiro).

A organização temática do JI mostra, assim, um conjunto de estratégias de endereçamento, ao mesmo tempo em que dá indicações também sobre o contexto comunicativo. Através da maneira como seleciona, organiza e distribui os temas que trata, o JI posiciona-se frente a seus ouvintes como um jornal que está presente em lugares-chave para os mineiros (as várias regiões de Minas, além do eixo Brasília-Rio de Janeiro-São Paulo) e que tem recursos técnicos e humanos suficientes para a produção de notas, notícias e reportagens – seus principais formatos informativos – a partir de distintos e distantes lugares. Nas 12 edições analisadas destaca-se a presença de repórteres espalhados em lugares estratégicos do mundo (Nova Iorque, Londres e Jerusalém, por exemplo), do Brasil (Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro) e do estado de Minas Gerais (na capital Belo Horizonte e cidades do interior). Trata-se, portanto, de apresentar-se como um noticiário capaz de organizar para o seu ouvinte ocorrências julgadas relevantes em capitais importantes do país e do mundo ao mesmo tempo em que o aproxima e localiza naquilo que o afeta ou ocorre em Minas Gerais na atualidade.

Esses aspectos da forma de endereçamento do JI (construção de uma presença em vários lugares e na cobertura de diversos assuntos – dos mais distantes aos mais próximos) são reforçados pelo destaque dado à cobertura jornalística e à aparente valorização do trabalho dos repórteres. Tais profissionais são referenciados, em várias matérias, nos locais da cobertura, evidenciando, em alguns casos, os sotaques regionais dos repórteres e enfatizando, assim, o trabalho de construção da referencialidade das notícias e da credibilidade do jornal. Isso se dá tanto em coberturas especiais, como aconteceu nos Jogos Olímpicos de 201612 12 Por exemplo: “Do Rio de Janeiro, Nívea Santos, para o Jornal da Itatiaia”; “Para o Jornal da Itatiaia, a rádio oficial dos jogos olímpicos, de Goiânia, Welinton Campos” (JI – 2ª edição, 2016). , quanto em coberturas cotidianas13 13 Por exemplo: “Aqui em Minas, a FIEMG divulgou há pouco os dados...”; “Aqui em Minas produtos consumidos na Semana Santa estão mais caros este ano, segundo o Dieese” (JI segunda edição, 2016; 2017). . Nota-se, assim, a busca do JI por construir, junto ao seu ouvinte, uma imagem de quase onipresença. de poder estar em vários lugares, de capacidade de ampla cobertura geográfica e temática14 14 Como ilustram algumas das manchetes: “Pampulha vai ganhar barco e ônibus de turismo após título nacional”; “Preço de gás de cozinha aumenta mais de 10% no interior do estado”; “Milícia pode ter ligação com ataque a veículos no Rio de Janeiro”; “Em Brasília, Governo Federal quer agilizar mudanças nas leis trabalhistas”; Em São Paulo, comunidade islâmica divulga nota sobre atentados”; “Homem invade escola nos Estados Unidos e mata professora” (JI segunda edição, 2016; 2017 – Grifo nosso). .

O JI reforça, assim, a imagem que a emissora busca construir de si: “a rádio de Minas”, “de todos os mineiros”, do esporte, mas também de temas políticos, econômicos e sociais. Ao mesmo tempo, o Jornal projeta o seu público: são habitantes de Minas bem como mineiros que moram, circulam ou se interessam pelas regiões e cidades próximas ao estado (Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Goiânia) e que podem ouvir, online, o noticiário da Itatiaia. Trata-se de um público que se interessa pelos assuntos políticos, econômicos, sociais, esportivos destacados pelo programa. Esses temas tratados são específicos da cobertura da emissora no que se refere à agenda regional/estadual, mas são os mesmos da agenda das mídias informativas brasileiras no que concerne aos temas nacionais e/ou internacionais.

Essa forma de se orientar e de construir a relação com o ouvinte – baseada na construção da proximidade geográfica (e temática) das regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil – é complementada por um estilo relativamente formal e polido na apresentação das notícias e do noticiário. Nesse aspecto, ganha destaque o papel da mediadora na construção do modo de endereçamento do JI. Logo que a vinheta abre o programa, anunciando apenas o nome do programa, surge a voz da apresentadora, Kátia Pereira, informando a hora e a temperatura em Belo Horizonte, cidade de transmissão do jornal. Kátia Pereira é a âncora que está há mais tempo à frente do JI: desde 2009. Ela destaca-se na locução radiofônica, um espaço ocupado geralmente por homens, o que sinaliza também uma estratégia do JI de se diferenciar de outros programas radiofônicos do gênero. Considerada uma das principais vozes do jornalismo mineiro, ela venceu o prêmio Troféu Mulher Imprensa no ano de 2016 na categoria âncora de rádio. Na apresentação do JI, logo após entrar a vinheta da Rádio Itatiaia, a apresentadora anuncia as principais manchetes. Com voz entonada, de forma ágil e polida, quase formal, a âncora chama a atenção do ouvinte para o que o Jornal destaca como fatos mais importantes do dia: o cumprimento e a abertura por ela realizados (“Olá, boa tarde! Começa agora o Jornal da Itatiaia segunda edição!”) evidencia, no texto verbal e na entonação da voz, um chamado para acompanhar o radiojornal e a intenção de uma proximidade com o ouvinte.

Trata-se, porém, de uma proximidade que guarda certa distância. Isso porque a apresentadora mantém uma dose de formalidade ou impessoalidade, ratificadas pelo estilo de apresentação do noticiário e, inclusive, na forma como o encerra: “Com a apresentação de Kátia Pereira, termina aqui o Jornal da Itatiaia segunda edição. Uma ótima tarde pra você”.

Na estrutura do programa, a apresentadora do Jornal desempenha um papel que busca afirmar uma certa neutralidade: ela apenas “chama” as notícias, os repórteres e os comentaristas, sem expor seu posicionamento em momento algum. Tal postura de apenas apresentar é um dos pontos-chave para perceber como o JI se endereça ao seu ouvinte. Ela reforça a estratégia de construção da imparcialidade das notícias que o JI reafirma constantemente, como parte do pacto com o seu público sobre o papel do jornalismo. Tal reafirmação aparece em vários discursos da emissora e no slogan do JI: “um jornalismo executado de maneira responsável, imparcial e de muita credibilidade”. Além de reservar a opinião explícita sobre temas importantes da agenda nacional para o comentarista Alexandre Garcia, o relativo distanciamento da âncora sobre as notícias apresentadas é, portanto, um elemento central nas noções de imparcialidade, objetividade e credibilidade com as quais opera o JI. Isso porque os enquadramentos acionados para interpretar os acontecimentos e temas tratados no noticiário, assim como a ausência, em algumas matérias, da regra básica de ouvir os dois lados implicados no fato, não corroboram o discurso de imparcialidade da emissora e do JI.

Distinguindo-se de outros programas de radiojornalismo similares – e, assim, atualizando o gênero –, o JI apresenta o expediente do jornal (direção, edição e coordenação) logo na abertura, após a chamada das manchetes do dia. Em seguida, os patrocinadores15 15 Em 2016 e 2017, os patrocinadores eram Banco do Brasil e Codemig. se apresentam e mostram – para o público e para a nossa análise – o quanto a publicidade tem um papel importante no modo de endereçamento do programa ao ouvinte. A publicidade auxilia na construção e (re)afirmação de identidades (do programa, da rádio e do estado de Minas Gerais), bem como na estratégia da Itatiaia e do seu jornal de posicionarem-se ante o seu ouvinte como uma emissora presente em vários lugares (de Minas Gerais e das regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil) e como “a rádio de Minas”, “de todos os mineiros”. Neste sentido, surge logo no início do programa o “oferecimento Banco do Brasil” – ora como “o Banco do Agronegócio”, ora “apoiando o esporte brasileiro”. Aparece também o oferecimento da “Codemig, águas de Minas Gerais, fonte pura de desenvolvimento”. Da mesma forma, nos intervalos comerciais, os anúncios contribuem para mostrar que o JI está em todas as regiões de Minas e que ele fala com amplos setores da população mineira, seja pelas cidades de origem ou cobertura dos spots publicitários, seja pelo regionalismo e sotaque dos personagens das peças publicitárias. Esse aspecto é ilustrado, por exemplo, pela voz de uma senhora do interior em um anúncio do Banco Mercantil e pela voz de um jovem conectado às novidades tecnológicas em um anúncio de serviços de telefonia e de internet (“Aff, pra quê que eu vou fugir de uma casa com Net?!”).

A publicidade desempenha um papel tão central na estratégia de endereçamento do JI que há momentos nos quais o anúncio publicitário é colado na matéria jornalística que o precedeu e é pronunciado pelo mesmo repórter que elaborou a notícia anterior. Em outros momentos, o anúncio publicitário é construído no próprio formato de notícia radiofônica: o repórter apresenta o assunto e entrevista uma fonte. Uma ilustração é dada pela propaganda do “Trem da Vale”, veiculada amplamente em junho de 2016, na qual um representante da mineradora Vale S.A. é entrevistado sobre os serviços disponíveis no meio de transporte desta empresa que conduz passageiros entre Belo Horizonte e Vitória (capital do estado do Espírito Santo).

A construção da publicidade no JI e do papel que é atribuído ao jornalismo, a apresentação relativamente formal e impessoal por parte da âncora, e a organização do programa – os blocos, os temas, a presença de profissionais em diferentes locais de cobertura de acontecimentos - são, portanto, aspectos salientes no modo peculiar como o Jornal da Itatiaia constrói um estilo de radiojornalismo e de vínculo com o seu público.

Conclusão

O presente trabalho objetivou explorar a potencialidade do conceito de modo de endereçamento para a descrição e análise de programas de rádio, entre os quais os do gênero jornalístico. Para testar nosso argumento, realizamos uma análise do JI segunda edição, o programa radiojornalístico de maior audiência no estado de Minas Gerais. Procuramos identificar os modos como o JI se dirige e constrói vínculos com o seu público, e o que seria característico deste programa na construção da relação com o ouvinte.

A análise mostra o quanto a organização do programa e da sua produção – seleção temática e aspectos geográfico e regional do seu tratamento – é importante na forma como o JI se relaciona com os seus ouvintes, e o quanto a publicidade desempenha também um papel importante na construção dessa relação. Ambos contribuem para posicionar o JI como um jornal presente em todo o estado e nos vizinhos, bem como para reforçar a imagem institucional da “rádio de Minas” e para (re)afirmar identidades (do programa, da rádio e do estado de Minas Gerais).

Ademais, a organização do programa – a divisão dos blocos, com suas temáticas locais, regionais, nacionais e internacionais, e a distribuição de profissionais em diferentes lugares – colabora para construir a imagem de uma rádio com poderio técnico-humano e quase onipresença em cidades de Minas Gerais, do Brasil e do mundo. Destacamos, ainda, o papel da mediadora do programa no modo como o Jornal da Itatiaia se endereça ao seu ouvinte, revelando uma estratégia de construção de uma proximidade, mas, ao mesmo tempo, de certa formalidade e distanciamento que reforçam o discurso de imparcialidade e credibilidade do jornal.

Por fim, entendemos que a análise empreendida sobre o JI segunda edição sustenta o argumento defendido neste trabalho. Defendemos que modo de endereçamento é um conceito profícuo para apreender a forma singular como cada programa busca estabelecer a relação com o seu público, a partir de um estilo próprio que identifica e diferencia tal programa de outros similares do mesmo gênero. Ademais, é uma ferramenta metodológica que pode auxiliar na exploração de outros objetos de estudo relacionados ao diálogo entre a produção em rádio, sua recepção e o contexto sociocultural no qual estão inseridos.

  • 1
    A primeira versão deste artigo foi apresentada no 14º. Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, da Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor), realizado na Unisul, Palhoça - SC, de 09 a 11 de novembro de 2016. O texto foi revisto e ampliado.
  • 2
    A emissora cobre 92% do território de Minas Gerais e é transmitida nas frequências 610 kHz – AM e 95,7 MHz – FM.
  • 3
    A primeira e a segunda edições vão ao ar tanto pela Rádio Itatiaia AM quanto pela FM. Podem ser acessadas pelo site: www.itatiaia.com.br
  • 4
    Disponível em: http://www.itatiaia.com.br/programacao. Acesso em: 18 jul. 2016.
  • 5
    Disponível em: http://www.ouvintes.com.br/
  • 6
    Rádio Itatiaia. Disponível em: http://www.itatiaia.com.br/programacao . Acesso em: 18 jul. 2016.
  • 7
    Cita-se, como exemplos, as seguintes chamadas extraídas do corpus da pesquisa: “Governo tenta reaproximar do Congresso para país tirar o pé do freio”; “Ministro do Superior Tribunal Federal Edson Fachin abre inquérito para investigar nove ministro e três governadores”; “Senador Aécio Neves é citado em delação do empresário da JBS, Joesley Batista” (JI – 2ª edição, 2016 e 2017).
  • 8
    Como exemplos, cita-se as chamadas: “Clima de férias lota salas de cinema na capital”; “PF cumpre mandado de prisão da ‘Operação Hashtag’ em Varginha”; “Para diminuir risco de contágio, SUS vai disponibilizar coquetel contra HIV em Minas”; “Agências da Caixa Econômica da capital abrem mais cedo para saque do FGTS”; “Mais de duas mil pessoas são abordadas em Belo Horizonte em Operação Viagem Segura” (JI segunda edição, 2016; 2017).
  • 9
    Dentre os temas comentados nas 12 edições analisadas, destaca-se: o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff; discussão sobre desconto no salário de deputados federais faltantes ao trabalho; divulgação de áudios do empresário da JBS Joesley Batista afirmando o envolvimento do senador Aécio Neves e do presidente Michel Temer em esquemas de corrupção e lavagem de dinheiro.
  • 10
    Por exemplo: “Onda de terrorismo faz Brasil ampliar vistoria no Rio de Janeiro”; “Quatro pessoas são presas em São Paulo por suspeita de ligação com o Estado Islâmico” (JI segunda edição, 2016; 2017).
  • 11
    Por exemplo: “França prorroga estado de emergência”; “Estado Islâmico reivindica ataque com machado em trem da Alemanha”; “Ataque de mísseis à Síria por governo de Donald Trump causa instabilidade internacional”; “Papa Francisco condena ataques a mísseis na Síria” (JI segunda edição, 2016; 2017).
  • 12
    Por exemplo: “Do Rio de Janeiro, Nívea Santos, para o Jornal da Itatiaia”; “Para o Jornal da Itatiaia, a rádio oficial dos jogos olímpicos, de Goiânia, Welinton Campos” (JI – 2ª edição, 2016).
  • 13
    Por exemplo: “Aqui em Minas, a FIEMG divulgou há pouco os dados...”; “Aqui em Minas produtos consumidos na Semana Santa estão mais caros este ano, segundo o Dieese” (JI segunda edição, 2016; 2017).
  • 14
    Como ilustram algumas das manchetes: “Pampulha vai ganhar barco e ônibus de turismo após título nacional”; “Preço de gás de cozinha aumenta mais de 10% no interior do estado”; “Milícia pode ter ligação com ataque a veículos no Rio de Janeiro”; “Em Brasília, Governo Federal quer agilizar mudanças nas leis trabalhistas”; Em São Paulo, comunidade islâmica divulga nota sobre atentados”; “Homem invade escola nos Estados Unidos e mata professora” (JI segunda edição, 2016; 2017 – Grifo nosso).
  • 15
    Em 2016 e 2017, os patrocinadores eram Banco do Brasil e Codemig.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    28 Dez 2017
  • Aceito
    30 Out 2018
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