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Sociomaterialidade e Análise Organizacional: da Retórica à Relevância

Resumo

Este ensaio amplia o debate sobre a sociomaterialidade com uma crítica à atual agenda ontológica. Com base na literatura influente nas áreas de administração e estudos organizacionais, e sistemas de informação, apresenta-se o surgimento, o desenvolvimento, a consolidação e a popularização do debate sobre as relações entre o social e o material em organizações. Com base nessa trajetória, sugere-se que a atual agenda para uma ontologia sociomaterial constitui-se predominantemente por meio de usos retóricos da noção de ontologia. A relevância desta+ contribuição reside em questionar o suposto desenvolvimento de uma ontologia capaz de fundir o social e o material, descrevendo e exemplificando suas estratégias retóricas: aleatoriedade autoral, centrifugação teórica e procrastinação conceitual. Conclui-se que é necessário retornar ao fenômeno relevante “no” debate do ponto de vista de sua trajetória: a difusão de novas tecnologias e as subsequentes implicações nos níveis organizacional e social. A principal implicação para pesquisas futuras é a adoção de ontologias pragmáticas visando restaurar a primazia do fenômeno sobre a ontologia.

consequências sociais da mudança tecnológica; estrutura organizacional; mudança organizacional; pragmatismo; sociomaterialidade

Abstract

This essay expands upon the debate on sociomateriality with a critique of the current ontological agenda. Based upon the influential literature from the fields of management and organization studies, and information systems, it presents the emergence, the development, the consolidation and the popularization of the debate on the relations between the social and the material in organizations. Drawing on this trajectory, the paper suggests that the current agenda for a sociomaterial ontology is constituted predominantly through rhetorical uses of the notion of ontology. The relevance of this contribution lies in questioning the supposed development of a sociomaterial ontology, describing and exemplifying its rhetorical strategies: authorial randomness, theoretical centrifugation, and conceptual procrastination. It concludes that it is necessary to return to the phenomenon as relevant “in” the debate from the point of view of its trajectory: the diffusion of new technologies and the subsequent implications at the organizational and social levels. The main implication for future research is the adoption of pragmatic ontologies with the aim of restoring the primacy of the phenomenon over the ontology.

social consequences of the technological change; organizational structure; organizational change; pragmatism; sociomateriality

Introdução

Sociomateriality is ‘the new black’ ” é um título de artigo ( Jarzabkowski & Pinch, 2013Jarzabkowski, P., Pinch, T. (2013). Sociomateriality is ‘the new black’: accomplishing repurposing, reinscripting and repairing in context. M@n@gement , 16 (5), 579-592. doi:10.3917/mana.165.0579 ) que diz muito sobre a nova moda na análise organizacional. A fusão dos termos “socio” e “material”, deliberadamente sem hífen, foi a marca escolhida para promover o posicionamento de pesquisa no qual se assume que “o social e o material são inextricavelmente relacionados” ( Orlikowski, 2007, pOrlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies , 28 (9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138 , p. 1437, tradução nossa). Depois disso, a noção de sociomaterialidade ganhou proeminência e tem influenciado principalmente o estudo de fenômenos organizacionais contemporâneos, como o uso de redes sociais em organizações ( Treem & Leonardi, 2013)Treem, J. W., Leonardi, P. M. (2013). Social media use in organizations: exploring the affordances of visibility, editability, persistence, and association. Annals of the International Communication Association , 36 (1), 143-189. doi:10.1080/23808985.2013.11679130 , as implicações de avaliações on-line para as organizações avaliadas ( Orlikowski & Scott, 2014)Orlikowski, W. J., Scott, S. V. (2014). What happens when evaluation goes online? Exploring apparatuses of valuation in the travel sector. Organization Science , 25 (3), 868-891. doi:10.1287/orsc.2013.0877 , a realização de serviços por meio de configuração algorítmica de dados de crowdsourcing (Orlikowski & Scott, 2015b), e até uma missão espacial (Mazmanian, Cohn, & Dourish, 2014).

Essa popularidade, contudo, já é problemática. No nível internacional, apesar de alguns estudos empíricos existentes, o debate é predominantemente teórico, focado na elaboração de uma “ontologia sociomaterial”, repleta de controvérsias. Por exemplo, a alta abstração filosófica tem sido apontada ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 ; Mutch, 2013Mutch, A. (2013). Sociomateriality – Taking the wrong turning? Information and Organization , 23(1), 28-40. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.001 ) como desnecessária para o tipo de análise empírica comumente apresentada, e a maioria dos artigos que evocam a sociomaterialidade o faz com base apenas em alguns trabalhos de Wanda Orlikowski, enquanto o termo sociomaterial, com ou sem hífen, existe pelo menos desde a década de 1950 ( Jones, 2014Jones, M. (2014). A matter of life and death: exploring conceptualizations of sociomateriality in the context of critical care. MIS Quarterly , 38 (3), 895-925. doi:10.25300/MISQ/2014/38.3.12 ). No Brasil, o uso incipiente do termo já reflete esses problemas, o que pode ser verificado com uma breve busca por dissertações e teses nacionais que adotam a sociomaterialidade como perspectiva de pesquisa.

Assim, este artigo tem como propósito ampliar o debate sobre a sociomaterialidade no âmbito organizacional com uma crítica especificamente à atual agenda de desenvolvimento de uma ontologia sociomaterial, ou seja, capaz de fundir ontologicamente o social e o material. De caráter ensaístico, o artigo é baseado na literatura influente nas áreas de administração e estudos organizacionais, e sistemas de informação. Após esta introdução, apresenta-se na seção dois (a) as origens do estudo das relações entre o social e o material em organizações entre as décadas de 1950 e 1980; (b) a trajetória de quatro décadas de estudos construtivistas sobre tecnologia e organizações; (c) a consolidação e os modelos teóricos resultantes dessa trajetória; e (d) a popularização do debate sobre as relações entre o social e o material, descrevendo as razões da recente popularização acadêmica da noção de sociomaterialidade. A partir da trajetória apresentada, a seção três resgata as principais críticas existentes e endereça uma nova, qual seja, a constituição retórica da ontologia sociomaterial, isto é, sua constituição por meio de usos retóricos da noção de ontologia, descrevendo e exemplificando estratégias por meio das quais isso ocorre. As conclusões indicam a necessidade de retornar ao fenômeno relevante no debate do ponto de vista de sua trajetória, em detrimento de termos popularizados nas discussões recentes: a difusão de novas tecnologias e as implicações nos níveis organizacional e social. A principal implicação para pesquisas futuras é a adoção de ontologias pragmáticas visando restaurar a primazia do fenômeno sobre a ontologia.

O estudo das relações entre o social e o material em organizações

Resgatar o surgimento, o desenvolvimento, a consolidação e a recente popularização do estudo das relações entre o social e o material em organizações pode ajudar a compreender melhor este debate, principalmente a partir de uma análise da sua trajetória. É a partir desse ponto de vista que se fundamenta a crítica apresentada neste artigo às discussões recentes sobre uma ontologia sociomaterial.

O surgimento

É sabido ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 ) – porém pouco discutido – que é dos estudiosos da estrutura organizacional e da organização social do trabalho o mérito de primeiro terem levantado a questão das relações entre os aspectos sociais e materiais em organizações, entre as décadas de 1950 e 1980. Naquela época, auge dos estudos sobre estrutura organizacional e sobre organização social do trabalho, a análise organizacional foi marcada por duas questões-chave: Quais arranjos sociais são mais adequados a diferentes infraestruturas técnicas para obtenção de um melhor desempenho? Como um sistema social se ajusta a um sistema técnico?

A primeira questão é inaugurada pelos estudos seminais de Woodward (1958)Woodward, J. (1958). Management and technology . London: HM Stationery Office. e Perrow (1967)Perrow, C. (1967). A framework for the comparative analysis of organizations. American Sociological Review , 32 (2), 194-208. doi:10.2307/2091811 a respeito de tecnologia e estrutura organizacional. Esses autores analisaram se um tipo específico de tecnologia demandava um tipo específico de estrutura organizacional, então entendida como os arranjos necessários entre as pessoas para que o trabalho fosse realizado. Esses estudos resultaram na premissa fundadora da teoria da contingência, de que não existe uma estrutura organizacional melhor para todas as organizações, mas sim uma mais adequada a cada ambiente externo. Ao analisar a estrutura de organizações atuantes em diferentes setores industriais, esses autores concluíram que o desempenho dependia do ajuste entre a estrutura organizacional e o tipo de tecnologia usada nos processos produtivos, e que, portanto, o uso de diferentes tecnologias no sistema de produção demandava diferentes estruturas organizacionais. Assim, para que os processos produtivos fossem otimizados, era preciso desenhar diferentes formas de especializar e integrar o trabalho, dependendo do tipo de tecnologia utilizada. Essa conclusão inaugurou uma visão hoje qualificada como determinista, em que tecnologia e organização são concebidas como entidades independentes, relacionadas pelo impacto da primeira sobre a segunda ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 ). Tal visão tem sido indicada ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 ; Scott, 1990Scott, W. R. (1990). Technology and structure: an organizational-level perspective. In P. S. Goodman, & L. S. Sproull (Eds.), Technology and organizations (pp. 109-143). San Francisco: Jossey-Bass. ) como o legado mais duradouro deixado pelos trabalhos precursores da análise organizacional.

Apesar de essa visão ainda exercer forte influência sobre a análise organizacional, ela foi contestada, desde cedo, em estudos sobre a organização social do trabalho. Na época, pesquisadores influentes como Mann e Hoffman (1960)Mann, F. C., Hoffman, L. R. (1960). Automation and the worker: a study of social change in power plants . New York: Henry Holt. e Walker e Guest (1952)Walker, C. R., Guest, R. H. (1952). The man on the assembly line . Cambridge: Harvard University Press. investigavam o ajuste de um sistema social a um sistema técnico. A premissa central, da então chamada perspectiva sociotécnica, era que sistemas sociais e técnicos se influenciavam, portanto, a relação entre ambos era de dependência mútua, e não de impacto unidirecional. Essa premissa inaugurou uma visão hoje qualificada como interacionista, em que tecnologia e organização são concebidas como entidades interdependentes, relacionadas por interações que geram alterações organizacionais ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 ).

Embora contestasse a visão determinista, a visão interacionista não representava um rompimento brusco com os pressupostos deterministas, uma vez que as análises sociotécnicas focavam na maneira como os sistemas sociais se alteravam para se adequar aos sistemas técnicos ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 ). Logo, a visão interacionista resultou na avaliação da tecnologia como um agente causal da mudança organizacional e, em decorrência, os estudos sociotécnicos frequentemente negligenciaram a maneira como os sistemas sociais moldavam diferentes usos de uma mesma tecnologia, inclusive em organizações similares ( Leonardi & Barley, 2010Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 ).

Essa negligência começou a ser debatida de forma sistemática a partir da discussão seminal de Barley (1988a) sobre tecnologia, poder e organização social do trabalho. Ainda no início do debate sobre a transição de uma sociedade industrial para uma sociedade pós-industrial ( Bell, 1973Bell, D. (1973). The сoming of post-industrial society: a venture in social forecasting . New York: Basic Books. ), Barley contrastou analiticamente a sociologia da automação e a teoria da desqualificação, que na época eram as abordagens mais utilizadas para discutir mudança técnica no trabalho.

A sociologia da automação assumia que os atributos técnicos da tecnologia da automação tinham implicações sociais para o trabalho, inicialmente negativas, mas posteriormente positivas. Barley (1988a) criticou essa abordagem por sua visão otimista de um futuro tecnicamente determinado, em que a evolução e sofisticação técnica reduziriam a alienação e eliminariam os primeiros problemas causados pela automação – na época discutidos por autores como Braverman (1974)Braverman, H. (1974). Labor and monopoly capital: the degradation of work in the twentieth century . New York: Monthly Review. e Burawoy (1979)Burawoy, M. (1979). Manufacturing consent: changes in the labor process under monopoly capitalism . Chicago: University of Chicago Press. . Barley também apontou as falhas predominantes na condução de estudos empíricos que adotavam essa abordagem: o foco em tipologias abstratas; a interpretação sincrônica de dados diacrônicos; e a generalização feita a partir de estudos conduzidos apenas em um mesmo segmento industrial.

A teoria da desqualificação, por sua vez, assumia que a tecnologia era essencialmente um fenômeno social. Ou seja, defendia que os atributos técnicos eram intencionalmente desenhados para levar à desqualificação do trabalhador, visando reduzir custos com mão de obra. Nessa perspectiva, a causa primária da mudança era a intenção dos designers de tecnologia, e não os atributos técnicos. Os pesquisadores assumiam que os designers eram controlados pelas grandes corporações, que utilizariam a tecnologia como meio de materializar a desqualificação do trabalhador. Barley (1988a) criticou essa abordagem por sua visão limitada (a) do contexto em que a tecnologia era implementada, frequentemente ignorado pelos pesquisadores, e (b) da relação entre gerência e design tecnológico, que os pesquisadores pressupunham ser de influência direta de gerentes sobre designers. Barley também apontou as falhas predominantes na condução de estudos empíricos que adotavam essa abordagem: as generalizações feitas a partir da análise de um pequeno número de ocupações; o foco no declínio de ocupações e a desconsideração pelo surgimento de outras; a escassez ou ausência de evidências empíricas que sustentassem o argumento de uma intenção gerencial de desqualificar o trabalhador, argumento que era baseado predominantemente no discurso de vendedores, e não de compradores, de máquinas; a escassez ou ausência de evidências empíricas que sustentassem o argumento do aumento de controle gerencial sobre o trabalho em decorrência da automação; e a desconsideração dos efeitos dos atributos técnicos.

A partir dessas críticas, Barley (1988a) explorou aspectos que deveriam ser considerados para entender como o social e o material se relacionam nas organizações, sistematizando-os a partir dos seguintes eixos: materialismo interpretativo; qualificação e dinâmicas de poder; atributos técnicos; milieu organizacional e ocupacional; e ambiente socioeconômico. O primeiro compreende as fontes de interpretação do contexto em que a tecnologia é usada e que moldam como as pessoas atribuem sentidos a máquinas e técnicas. No segundo estão contidos os processos pelos quais uma ocupação ganha ou perde relevância na sociedade em decorrência da alteração nas dinâmicas de poder, causada pelo surgimento de novos conhecimentos. Os atributos técnicos são os parâmetros contextuais que condicionam a ação social e, portanto, afetam a tendência da tecnologia de empoderar ou degradar seus usuários. Já no milieu organizacional e ocupacional, estão incluídas as influências oriundas da estrutura organizacional, do processo de gestão por meio do qual a tecnologia é introduzida na organização, do controle ideológico, das entidades sindicais, e do grau de profissionalização. E, por último, o ambiente socioeconômico abarca as influências oriundas da comercialização de produtos, do mercado de trabalho, e das relações entre indústrias.

Ao discutir esses direcionamentos para pesquisas futuras, Barley (1988a) avançou na superação das dicotomias e limitações dos estudos influenciados pela sociologia da automação e pela teoria da desqualificação. Seus direcionamentos fundamentaram tentativas posteriores de entender as relações entre o social e o material em organizações. Desse ponto de vista, o autor foi um dos pioneiros, pois já na década de 1980 ele chamava a atenção para o fato de que: “se pesquisadores querem persistir na esperança de prognosticar como a tecnologia irá reestruturar o trabalho, eles precisarão decodificar sistematicamente não apenas ações e interpretações, mas também a importância de atributos técnicos relevantes” (p. 73, tradução nossa).

Em suma, os precursores do estudo das relações entre o social e o material em organizações foram os estudiosos da estrutura organizacional e dos efeitos sociais negativos da difusão de novas tecnologias, entre as décadas de 1950 e 1980. Foi nesse contexto que surgiram as primeiras tentativas de compreender os fenômenos organizacionais como misturas de aspectos sociais e materiais, ainda que o termo “sociomaterialidade” não fosse comum. A partir desse contexto, desenvolveu-se uma longa trajetória de pesquisas que de diferentes modos enfatizavam as relações entre interpretação e atributo técnico.

O desenvolvimento

Conforme a contextualização feita por Leonardi & Barley (2010)Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 , cabe a autores como Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 , Fulk, Steinfield, Schmitz e Power (1987), Rice (1987)Rice, R. E. (1987). Computer‐mediated communication and organizational innovation. Journal of Communication , 37 (4), 65-94. e Zuboff (1988)Zuboff, S. (1988). In the age of the smart machine: the future of work and power . New York: Basic Books. o mérito – comumente não reconhecido por debatedores contemporâneos – de primeiro argumentarem, com base em evidências empíricas, que os efeitos da tecnologia em organizações não são tecnicamente determinados, mas sim socialmente construídos. Esse argumento foi fundamental para o desenvolvimento de uma visão não determinista da tecnologia.

As primeiras pesquisas realizadas sob influência desses autores argumentavam que não seria possível explicar como as tecnologias afetavam as organizações sem levar em conta as complexidades do contexto social e, por isso, foram classificadas como construtivistas1 1 . Diferente do construcionismo, que foca na produção de sentidos por meio da linguagem, o construtivismo foca na produção de processos cognitivos, como memória e aprendizagem, por meio de interações intra e intergrupais. ( Leonardi & Barley, 2010Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 ). Em geral, essas pesquisas apresentavam as seguintes características: tratavam a tecnologia como um objeto concreto e não como um processo de produção; rejeitavam o determinismo técnico, mesmo reconhecendo que as propriedades materiais de uma tecnologia poderiam afetar práticas de trabalho; defendiam que dinâmicas sociais moldavam a adoção, implementação e uso de uma tecnologia, bem como os sentidos atribuídos a ela, e argumentavam que estudos anteriores haviam negligenciado isso; por fim acreditavam que tecnologias idênticas poderiam desencadear diferentes dinâmicas e resultados, mesmo em contextos organizacionais similares ( Leonardi & Barley, 2010)Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 .

O amplo corpus formado por esses estudos retrata a relação entre tecnologia e organização como entidades interdependentes. Ou seja, explica como os efeitos da tecnologia na organização são socialmente construídos ao longo de sua implementação e argumentam que a mudança organizacional emerge em um fluxo contínuo de ação social em que as pessoas reagem às possibilidades e restrições trazidas pela tecnologia da mesma forma como reagem umas às outras. Leonardi e Barley (2010)Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 também classificaram esse corpus considerando as diferenças a respeito da fase analisada, do fenômeno social construído, e do processo pelo qual a construção social ocorreu. Desse modo, indicaram cinco perspectivas construtivistas distintas, sumariadas na Tabela 1 .

Tabela 1
: Sumário de estudos construtivistas sobre tecnologia e organizações

Os estudos classificados na perspectiva da percepção focavam na influência social de atitudes, crenças e valores ao longo do processo de adoção de novas tecnologias. Por exemplo, Fulk et al. (1987)Fulk, J., Steinfield, C. W., Schmitz, J., Power, J. G. (1987). A social information processing model of media use in organizations. Communication Research , 14 (5), 529-552. doi:10.1177/009365087014005005 investigaram como as percepções individuais a respeito das possibilidades e restrições trazidas por uma nova tecnologia eram formadas a partir de atitudes, declarações e comportamentos de colegas de trabalho. Já os estudos classificados na perspectiva da interpretação estavam centrados na transferência de esquemas e quadros interpretativos durante o uso de tecnologias. Por exemplo, Barley (1988b) investigou como usuários interpretavam as possibilidades e restrições trazidas por uma nova tecnologia a partir das experiências de uso de tecnologias anteriores, mesmo tratando-se de uma tecnologia diferente. Os estudos classificados na perspectiva da apropriação, por sua vez, realçavam os padrões de desvio e conformidade na interação intragrupo durante o uso de tecnologia. Por exemplo, Watson, DeSanctis e Poole (1988) investigaram como sistemas de suporte à tomada de decisão levavam a um maior ou menor grau de interação e colaboração e por conseguinte a uma tomada de decisão com maior ou menor grau de consenso. Aqueles classificados na perspectiva da constituição enfatizavam as práticas de trabalho improvisadas durante o uso de tecnologias. Por exemplo, Yates e Orlikowski (1992)Yates, J., Orlikowski, W. J. (1992). Genres of organizational communication: a structurational approach to studying communication and media. Academy of Management Review , 17 (2), 299-326. doi:10.2307/258774 analisaram como diferentes formas de comunicação eletrônica eram constituídas a partir do uso de diferentes tecnologias. Por fim, os estudos classificados na perspectiva do alinhamento focavam em papéis e relações durante a adaptação. Por exemplo, Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 mapeou como a estrutura organizacional se alinhava a partir de alterações em papéis e relações, causadas pelos novos tipos de interação decorrentes das possibilidades e limitações trazidas por uma nova tecnologia.

Até recentemente, pesquisadores ainda desenvolviam estudos construtivistas, posicionados na perspectiva da percepção ( Yuan et al., 2005Yuan, Y., Fulk, J., Shumate, M., Monge, P. R., Bryant, J. A., Matsaganis, M. (2005). Individual participation in organizational information commons: the impact of team level social influence and technology-specific competence. Human Communication Research , 31 (2), 212-240. doi:10.1111/j.1468-2958.2005.tb00870.x ), da interpretação (Hsiao, Wu, & Hou, 2008), da apropriação ( Maznevski & Chudoba, 2000)Maznevski, M. L., Chudoba, K. M. (2000). Bridging space over time: global virtual team dynamics and effectiveness. Organization Science , 11 (5), 473-492. doi:10.1287/orsc.11.5.473.15200 , da constituição (Volkoff, Strong, & Elmes, 2007), e do alinhamento ( Leonardi, 2007)Leonardi, P. M. (2007). Activating the informational capabilities of information technology for organizational change. Organization Science , 18 (5), 813-831. doi: 10.1287/orsc.1070.0284 . Porém, tem sido reconhecido que “estudantes de tecnologia e organizações não precisam mais gastar capital intelectual e energia para desmitificar o determinismo tecnológico: construtivistas sociais têm mostrado convincentemente que o determinismo tecnológico não se sustenta” ( Leonardi & Barley, 2010, pLeonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 , p. 41, tradução nossa). Ou seja, tem sido reconhecido que os estudos construtivistas já acumularam evidências empíricas suficientes para refutar a visão determinista da tecnologia e da organização como entidades independentes e relacionadas pelo impacto unidirecional da primeira sobre a segunda. Esses estudos contestaram convincentemente a lógica de impacto, moderação, imperativo técnico e variância herdada de estudos anteriores, como os de Woodward (1958)Woodward, J. (1958). Management and technology . London: HM Stationery Office. e Perrow (1967)Perrow, C. (1967). A framework for the comparative analysis of organizations. American Sociological Review , 32 (2), 194-208. doi:10.2307/2091811 .

Em suma, a trajetória de cerca de quatro décadas de estudos construtivistas sobre tecnologia e organizações refutou a visão de uma relação determinista entre o social e o material. Esses estudos permitiram argumentar, conceitualmente, que fenômenos organizacionais são produzidos pela interdependência entre os aspectos sociais e materiais. Desse modo, eles tiveram um papel fundamental no estudo das relações entre esses aspectos, ainda que não empregassem o termo “sociomaterialidade”.

A consolidação

De acordo com a contextualização feita por Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , cabe a Stephen Barley o mérito – comumente não evocado na literatura recente – de ter elaborado a primeira crítica conceitualmente sistematizada acerca do determinismo técnico, que, inclusive, influenciou uma miríade de pesquisas posteriores.

O modelo da mudança estrutural ocasionada por tecnologia

Conforme Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , apesar de os estudos sociotécnicos serem abundantes na década de 1970, eles não chegavam a produzir uma crítica conceitual da visão determinista sobre a relação entre tecnologia e estrutura organizacional que predominava na época. O autor situa o surgimento de uma crítica conceitual no estudo de Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767: “ Technology as an occasion for structuring ”.

Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 empregou a teoria da estruturação ( Giddens, 1979Giddens, A. (1979). Central problems in social theory: action, structure and contradiction in social analysis . Berkeley: University of California Press. ; 1984) para argumentar conceitualmente que a tecnologia não era um determinante da estrutura organizacional, como defendiam os estudos ligados à teoria da contingência. O argumento de Barley era que o processo de implementação de uma tecnologia em uma organização era uma ocasião na qual os atores organizacionais reavaliavam ou reimaginavam as estruturas sociais em que trabalhavam.

O uso da teoria da estruturação feito por Barley tratou a tecnologia como um ponto de pivô entre a ação (comunicação) e a estrutura (centralização da tomada de decisão). . . . quando os atores usaram a nova tecnologia e se orientaram para ela, eles mudaram sua comunicação, o que, com o tempo, alterou os direitos decisórios. ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , p. 62, tradução nossa)

Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 estudou a adoção da tomografia computadorizada em dois hospitais para analisar como se dava o processo de estruturação da tomada de decisão durante a mudança tecnológica. Ele tratou aquela tecnologia como um objeto social e material, e a estrutura organizacional (delimitada à tomada de decisão) como um processo, e não uma entidade. Em seu estudo, os scanners de tomografia computadorizada ocasionaram processos de estruturação similares em dois departamentos de radiologia e, ainda assim, levaram à estruturação de formas organizacionais (delimitadas à tomada de decisão) diferentes. Após a implementação e uso recorrente da tomografia computadorizada, ambos os hospitais se tornaram mais descentralizados, porém de maneiras diferentes e em níveis diferentes. Assim, Barley sugeriu que, para entender como a estrutura organizacional se alterava após a chegada da nova tecnologia, pesquisadores precisariam integrar o estudo da ação e da estrutura social.

Em resumo, ele concluiu que “ao tratar a tecnologia como uma ocasião para a estruturação, pesquisadores se confrontarão com resultados contraditórios devido ao paradoxo central da estruturação: tecnologias idênticas podem ocasionar dinâmicas similares e ainda assim levar a diferentes resultados estruturais” ( Barley, 1986Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 , p. 105, tradução nossa). Esse argumento, conceitualmente respaldado pela teoria da estruturação e empiricamente demonstrado no estudo de adoção da tomografia computadorizada, foi o ponto de partida para refutar conceitualmente a visão da tecnologia e da organização como entidades independentes e relacionadas pelo determinismo técnico da primeira sobre a segunda. Dessa forma, ao sistematizar seu modelo da mudança estrutural ocasionada por tecnologia, Barley influenciou pesquisadores a desenvolver novos tipos de estudos, os quais resultaram no surgimento de um novo modelo teórico alguns anos depois.

A teoria da estruturação adaptativa

Poucos anos depois da publicação do estudo de Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 , outro modelo teórico foi desenvolvido por Gerardine DeSanctis e Marshall Poole ( DeSanctis & Poole, 1994DeSanctis, G., Poole, M. S. (1994). Capturing the complexity in advanced technology use: adaptive structuration theory. Organization Science , 5 (2), 121-147. ; Poole & DeSanctis, 1990Poole, M. S., DeSanctis, G. (1990). Understanding the use of group decision support systems: the theory of adaptative structuration. In J. Fulk, & C. Steinfield (Eds.), Organizations and communication technology (pp. 173-193). Newbury Park: Sage. doi:10.4135/9781483325385.n8 ; 1992). Esses autores também empregaram a teoria da estruturação para estudar as relações entre aspectos sociais e materiais no uso recorrente de tecnologia. Seus estudos resultaram no desenvolvimento da teoria da estruturação adaptativa (TEA). A principal diferença entre a TEA e o modelo de Barley era que, em vez de utilizar a noção abstrata de estrutura social para se referir à tomada de decisão organizacional (como fez Barley), DeSanctis e Poole a utilizaram para se referir às normas de comportamento de pequenos grupos tomadores de decisão. “Poole e DeSanctis se apropriaram da teoria da estruturação para explicar a relação entre tecnologia e interação social . . . porém eles consideraram a estrutura social como sendo as normas de comportamento que governam pequenos grupos tomadores de decisão” ( Leonardi, 2013, pLeonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , p. 63, tradução nossa). Assim, a TEA explicava principalmente questões do tipo: “por que os efeitos tecnológicos são frequentemente mais sutis do que dramáticos? Positivos em algumas organizações, ainda que neutros ou mesmo negativos em outras?” ( DeSanctis & Poole, 1994, pDeSanctis, G., Poole, M. S. (1994). Capturing the complexity in advanced technology use: adaptive structuration theory. Organization Science , 5 (2), 121-147. , p. 142, tradução nossa). A resposta sugerida por seus autores era a seguinte:

Como as novas estruturas oferecidas pela tecnologia devem ser combinadas com as práticas organizacionais existentes, uma mudança radical de comportamento leva tempo para emergir e, em alguns casos, pode nem ocorrer. . . . Os efeitos da tecnologia nos resultados do grupo dependem: do potencial estrutural da tecnologia (ou seja, suas características estruturais), de como a tecnologia e outras estruturas (como as tarefas de trabalho, o sistema interno do grupo e o ambiente organizacional) são apropriados pelos membros do grupo; e de que novas estruturas sociais são formadas ao longo do tempo. ( DeSanctis & Poole, 1994DeSanctis, G., Poole, M. S. (1994). Capturing the complexity in advanced technology use: adaptive structuration theory. Organization Science , 5 (2), 121-147. , pp. 141-142, tradução nossa)

Assim como o modelo da mudança estrutural ocasionada por tecnologia ( Barley, 1986Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 ), a TEA ( DeSanctis & Poole, 1994DeSanctis, G., Poole, M. S. (1994). Capturing the complexity in advanced technology use: adaptive structuration theory. Organization Science , 5 (2), 121-147. ; Poole & DeSanctis, 1990Poole, M. S., DeSanctis, G. (1990). Understanding the use of group decision support systems: the theory of adaptative structuration. In J. Fulk, & C. Steinfield (Eds.), Organizations and communication technology (pp. 173-193). Newbury Park: Sage. doi:10.4135/9781483325385.n8 ; 1992) considerava que a mediação entre ação e estrutura ocorria ao longo do uso recorrente de uma nova tecnologia. A explicação que Barley ofereceu para isso é que a mudança tecnológica fazia com que as pessoas se comunicassem de uma forma diferente, o que intensificava a probabilidade de acontecerem “deslizes” entre o modelo institucional de comunicação e as exigências da vida cotidiana. Já a explicação dada por DeSanctis e Poole foi que a mudança tecnológica fazia com que as pessoas desenvolvessem “apropriações infiéis” dos atributos da nova tecnologia, por meio de afirmações, negações e ambiguidades. As diferenças introduzidas por DeSanctis e Poole fizeram com que o debate avançasse. Com o tempo, novos tipos de estudos foram desenvolvidos, os quais resultaram no surgimento de outro modelo teórico.

O modelo da dualidade da tecnologia

A premissa comum ao modelo da mudança estrutural ocasionada por tecnologia ( Barley, 1986Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 ) e à TEA ( DeSanctis & Poole, 1994DeSanctis, G., Poole, M. S. (1994). Capturing the complexity in advanced technology use: adaptive structuration theory. Organization Science , 5 (2), 121-147. ; Poole & DeSanctis, 1990Poole, M. S., DeSanctis, G. (1990). Understanding the use of group decision support systems: the theory of adaptative structuration. In J. Fulk, & C. Steinfield (Eds.), Organizations and communication technology (pp. 173-193). Newbury Park: Sage. doi:10.4135/9781483325385.n8 ; 1992) – de que a mudança tecnológica desencadeava uma mudança estrutural pela alteração nos processos de comunicação – começou a ser questionada com o estudo de Orlikowski (1992)Orlikowski, W. J. (1992). The duality of technology: Rethinking the concept of technology in organizations. Organization Science, 3 (3), 398-427. doi:10.1287/orsc.3.3.398 . Ao discutir seus achados, a autora propôs o que logo se tornou o influente modelo de dualidade da tecnologia. Ela afirmou que era o próprio uso da tecnologia, e não a comunicação, o que representava a dimensão da “ação” a partir da qual a dimensão da “estrutura” era preservada ou alterada ao longo do uso recorrente da nova tecnologia. No modelo elaborado por Orlikowski,

As pessoas poderiam se rebelar e usar a tecnologia de forma diferente, o que levaria a mudanças nas estruturas (organizacionais) de significação, legitimação e dominação. Assim, com a abordagem da dualidade da tecnologia, o uso da tecnologia se torna uma característica constitutiva da estrutura organizacional. ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , p. 64, tradução nossa)

Nesse modelo, o foco estava em como o uso da tecnologia pelas pessoas podia sempre levar a mudanças nas formas predominantes de significação, legitimação e dominação. Para Orlikowski, era o próprio uso da tecnologia o que poderia ou não levar a mudanças na estrutura organizacional, e não a comunicação, como haviam sugerido Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 e DeSanctis e Poole (1994)DeSanctis, G., Poole, M. S. (1994). Capturing the complexity in advanced technology use: adaptive structuration theory. Organization Science , 5 (2), 121-147. .

Como mostra o estudo de campo, há fortes tendências dentro das práticas institucionalizadas que restringem e facilitam certos desenvolvimentos e implementações de tecnologia. Em particular, entender como diferentes condições influenciam o desenvolvimento, a manutenção e o uso de tecnologias mais ou menos interpretativamente flexíveis proporcionaria uma visão dos limites e oportunidades da escolha humana e do design organizacional. ( Orlikowski, 1992Orlikowski, W. J. (1992). The duality of technology: Rethinking the concept of technology in organizations. Organization Science, 3 (3), 398-427. doi:10.1287/orsc.3.3.398 , p. 34, tradução nossa)

Com esse argumento, Orlikowski (1992)Orlikowski, W. J. (1992). The duality of technology: Rethinking the concept of technology in organizations. Organization Science, 3 (3), 398-427. doi:10.1287/orsc.3.3.398 provocou uma importante mudança de foco no estudo das relações entre o social e o material em organizações. O foco deixou de ser as alterações nos processos de comunicação, ocasionadas pelos atributos técnicos da tecnologia, e passou a ser as práticas de trabalho por meio das quais a tecnologia é usada de modo recorrente. Essa mudança fez o debate avançar e, no início dos anos 2000, novos estudos culminaram na proposição de um novo modelo.

O modelo da lente prática

Orlikowski aprofundou o estudo do uso de tecnologias em práticas de trabalho. Mais especificamente, ela passou a enfatizar a possibilidade de fazer diferente a partir da escolha humana sempre presente, mesmo em face das formas predominantes de significação, legitimação e dominação existentes no contexto organizacional. Ao longo do tempo, a autora aumentou a relevância dada aos limites e às oportunidades da escolha humana, os quais foram uma ponte entre o modelo da dualidade da tecnologia (Orlikowski, 1992) e a elaboração de um novo modelo, que privilegiasse a capacidade reflexiva dos atores humanos em suas práticas de trabalho. Esse avanço resultou no modelo da lente prática ( Orlikowski, 2000Orlikowski, W. J. (2000). Using technology and constituting structures: a practice lens for studying technology in organizations. Organization Science , 11 (4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600 ). A mudança fundamental trazida por este novo modelo também já foi discutida por Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 e pode ser resumida como:

A lente prática argumentava que certos padrões de uso de tecnologia se agregavam em “tecnologias-na-prática” específicas, na medida em que as pessoas formavam interpretações, na prática de trabalho, sobre como as características da tecnologia as ajudariam a desenvolver tarefas e interações sociais com outras pessoas. . .. A lente prática trata a estrutura como se ela estivesse sempre em um estado de “vir a ser”. ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , p. 64, tradução nossa)

Ao propor o termo “tecnologia-na-prática”, Orlikowski (2000)Orlikowski, W. J. (2000). Using technology and constituting structures: a practice lens for studying technology in organizations. Organization Science , 11 (4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600 afirmou que as estruturas específicas são rotineiramente constituídas na medida em que as pessoas usam máquinas, técnicas, dispositivos ou aparelhos específicos de maneira recorrente em atividades cotidianas. Na explicação sugerida pela autora, isso acontecia porque, ao fazê-lo, as pessoas se baseariam nas propriedades que compõem o artefato tecnológico, em suas habilidades, no poder, no conhecimento, e nas suposições e expectativas sobre a tecnologia e seu uso, além de serem tipicamente influenciadas por treinamentos, comunicações, usos e experiências prévias. Em resumo, Orlikowski argumentou que instalações, normas e esquemas interpretativos eram usados pelas pessoas como regras e fontes instanciadas para o uso da tecnologia.

Dessa forma, o uso que as pessoas fazem da tecnologia se torna estruturado por essas experiências, conhecimentos, significados, hábitos, relações de poder, normas e os artefatos tecnológicos disponíveis. Essa estruturação estabelece um conjunto específico de regras e recursos na prática que serve para estruturar o uso futuro, na medida em que as pessoas continuam a interagir com a tecnologia em suas práticas recorrentes. Assim, ao longo do tempo, as pessoas constituem e reconstituem uma estrutura de uso da tecnologia, isto é, constituem uma tecnologia-na-prática distinta. ( Orlikowski, 2000Orlikowski, W. J. (2000). Using technology and constituting structures: a practice lens for studying technology in organizations. Organization Science , 11 (4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600 , p. 410, tradução nossa)

A autora afirmou também que essa constituição ocorre quando as pessoas interagem com as tecnologias nas práticas de trabalho e, por isso, mudanças sempre podem ocorrer:

Modificações nos padrões de uso também podem resultar de deslizes ou falhas inadvertidas, quando, por desatenção ou erro, os usuários caem em uma forma diferente de uso, como esquecer de anexar proteções de segurança ou interromper o uso complicado de um elemento com defeito. As pessoas também podem mudar suas tecnologias-na-prática por meio de improvisos, isto é, gerando inovações situadas em resposta a oportunidades ou desafios inesperados, como quando uma solução temporária para uma máquina se torna a prática preferida porque é mais eficaz do que a prática original. ( Orlikowski, 2000Orlikowski, W. J. (2000). Using technology and constituting structures: a practice lens for studying technology in organizations. Organization Science , 11 (4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600 , p. 412, tradução nossa)

O modelo da lente prática ( Orlikowski, 2000Orlikowski, W. J. (2000). Using technology and constituting structures: a practice lens for studying technology in organizations. Organization Science , 11 (4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600 ) foi criticado nas discussões posteriores principalmente por sugerir que as estruturas só eram constituídas na prática e por isso os usuários tinham a opção de escolher usar a tecnologia de formas diferentes, a qualquer momento e nas condições existentes. As razões das críticas podem ser assim resumidas:

A lente prática tem sido criticada por oferecer uma visão excessivamente socializada da tecnologia. Essa crítica vem do fato de que o domínio da ação consiste em pessoas que escolhem usar uma tecnologia de uma determinada maneira. Aqui, as próprias tecnologias são apenas players periféricos que estão sujeitos aos caprichos de seus usuários. . .. No nível macrossocial, uma tecnologia-na-prática nada mais é do que um conjunto de normas que regem quando, por que e como usar uma tecnologia em um ambiente específico. Embora a tecnologia seja objeto de investigação em estudos que adotam uma lente prática, é como se não existisse tecnologia alguma na maioria dos relatos empíricos que a empregam, porque ação (uso de tecnologia), estrutura (tecnologia-na-prática) e modalidade (interpretação) são todos fundamentalmente sociais. Suas formulações teóricas dependem da existência de alguma tecnologia, certamente, mas só vemos a sombra dessa tecnologia na constituição de processos sociais no modelo da lente prática. ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , p. 64, tradução nossa)

Desde sua proposição, o modelo da lente prática tem sido criticado pela ênfase na possibilidade de escolha humana, em detrimento dos atributos técnicos da tecnologia em uso. Por isso, desde então, pesquisadores têm tentado reavivar a necessidade, há muito postulada por Barley (1988a), de decodificar sistematicamente os atributos técnicos relevantes. Isso tem sido feito colocando-se o foco nas características materiais da tecnologia em estudo ( Leonardi, 2007Leonardi, P. M. (2007). Activating the informational capabilities of information technology for organizational change. Organization Science , 18 (5), 813-831. doi: 10.1287/orsc.1070.0284 ; Svahn, Henfridsson, & Yoo, 2009; Volkoff et al., 2007)Volkoff, O., Strong, D. M., Elmes, M. B. (2007). Technological embeddedness and organizational change. Organization Science , 18 (5), 832-848. doi:10.1287/orsc.1070.0288 , ou em aspectos materiais que são permanentes em diferentes contextos sociais (Jackson, Poole, & Kuhn, 2002; Kallinikos, 2004Kallinikos, J. (2004). Farewell to constructivism: technology and context-embedded action. In C. Avgerou, C. Ciborra, & F. Land (Eds.), The social study of information and communication technology: innovation, actors and contexts (pp. 140-161). Oxford: Oxford University ; Leonardi, 2009)Leonardi, P. M. (2009). Crossing the implementation line: the mutual constitution of technology and organizing across development and use activities. Communication Theory, 19 (3), 278-310. doi:10.1111/j.1468-2885.2009.01344.x .

Em suma, nas últimas quatro décadas, diferentes modelos teóricos sobre tecnologia e organizações foram desenvolvidos. Contextualizados em detalhes por Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , eles podem ser assim sumariados:

  1. Modelo da mudança estrutural ocasionada por tecnologia: sugere que a mudança tecnológica é um processo de reestruturação organizacional ocasionado por deslizes na comunicação, os quais podem levar a modificações nos papéis decisórios.

  2. Teoria da estruturação adaptativa (TEA): sugere que a mudança tecnológica é um processo de reestruturação organizacional em que apropriações infiéis dos atributos da nova tecnologia, feitas por pequenos grupos por meio de afirmações, negações e ambiguidades, podem levar a mudanças nas regras e recursos que organizam a interação social no nível macro da organização.

  3. Modelo da dualidade da tecnologia: sugere que a mudança tecnológica é um processo de reestruturação organizacional contínuo em que as pessoas podem sempre escolher usar a tecnologia de modos diferentes em suas práticas de trabalho, o que pode levar a mudanças nas formas de significação, legitimação e dominação predominantes no ambiente institucional da organização.

  4. Modelo da lente prática: sugere que a mudança tecnológica é um processo contínuo em que práticas de trabalho improvisadas durante o uso recursivo da tecnologia podem sempre levar a um novo tipo de uso recursivo da tecnologia.

Em resposta às críticas ao modelo da lente prática, Orlikowski (2007)Orlikowski, W. J. (2007). Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies , 28 (9), 1435-1448. doi:10.1177/0170840607081138 passou a discutir mais especificamente as relações entre o social e o material, argumentando que “o social e o material são inextricavelmente relacionados – não há nenhum social que não seja também material, e nenhum material que não seja também social” (p. 1437, tradução nossa). Depois disso, o termo “sociomaterialidade” ganhou proeminência na análise organizacional.

A popularização

Com base nas contextualizações feitas por Leonardi e Barley (2010)Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 e Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , é possível argumentar que as principais razões da recente popularização da noção de sociomaterialidade são as críticas às perspectivas construtivistas e a proposição de uma agenda ontológica sociomaterial. Esta última é comumente o ponto central de discussão na literatura atual.

A crítica ao construtivismo

Na última década, tem sido argumentado ( Leonardi & Barley, 2010Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 ) que, embora os estudos construtivistas neguem a visão determinista da tecnologia, eles têm adotado uma visão predominantemente social-voluntarista e que, por isso, são incapazes de abordar a questão maior de como a tecnologia afeta a ordem social, considerando-a apenas como uma ativadora de processos sociais que, por sua vez, constroem fenômenos sociais. Além disso, argumentam que os construtivistas são incapazes de abordar o papel que atores poderosos desempenham na mudança organizacional ocasionada por tecnologia, separando as microinstituições que emergem como consequência da mudança tecnológica das macroinstituições nas quais elas estão enraizadas.

Ao classificar e discutir os estudos construtivistas, Leonardi e Barley (2010)Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 enfatizaram as peculiaridades das diferentes orientações ontológicas que eles abarcam. No entanto, para os autores, as críticas a esses estudos são conceitualmente relevantes devido à ideia de que os aspectos materiais fazem coisas que não podem ser atribuídas à prática social3 3 . Por exemplo, a opacidade de uma parede de concreto impossibilita enxergar através dela independentemente de interpretação, contexto ou prática social. ( Fujimura, 2006Fujimura, J. H. (2006). Sex genes: a critical sociomaterial approach to the politics and molecular genetics of sex determination. Signs , 32 (1), 49-82. doi:10.1086/505612 ; Hutchby, 2001Hutchby, I. (2001). Technologies, texts and affordances. Sociology , 35 (2), 441-456. doi:10.1177/S0038038501000219 ; Pickering, 2001Pickering, A. (2001). Practice and posthumanism: social theory and a history of agency. In T. R. Schatzki, K. K. Cetina, & E. von Savigny (Eds.), The practice turn in contemporary theory (pp. 163-174). London: Routledge. ). Essas críticas têm fomentado discussões sobre uma integração ontológica entre uma visão construtivista e uma visão determinista, para além da sobreposição de uma visão sobre a outra. Uma consequência dessa tentativa de integração tem sido o reconhecimento, por parte de alguns dos mais influentes estudiosos de tecnologia e organizações, de que o desafio atual do campo é “forjar uma abordagem que integre, ao invés de alternar entre as trombetas do determinismo e do voluntarismo”, o que “exigirá uma visão pragmática da realidade sociomaterial” ( Leonardi & Barley, 2010Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 , p. 3, tradução nossa). Assim, as críticas às perspectivas construtivistas têm colocado em evidência a oportunidade de focar nas relações entre o social e o material, o que tem contribuído fortemente para a recente popularização da noção de sociomaterialidade. A consequência imediata foi a proposição de uma nova agenda ontológica, visando respaldar o desenvolvimento de uma perspectiva comumente nomeada como “ontologia sociomaterial”.

A agenda para uma ontologia sociomaterial

É possível argumentar que pesquisadores começaram a discutir a elaboração de uma perspectiva que forneça uma linguagem capaz de teorizar a mistura ontológica entre o social e o material como resposta às críticas ao construtivismo. Na metáfora utilizada por Leonardi e Barley (2010)Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 , seria preciso adotar simultaneamente a visão do determinista material e a visão do voluntarista social, como na noção taoísta de yin e yang. Para os autores, essa tentativa de fusão pode não apresentar uma resolução, mas pode trazer alguma transcendência após anos de alternância entre esses dois polos:

Não parece mais necessário continuar demonstrando que a construção social ocorre. Em vez disso, o que mais faria avançar o conhecimento neste momento seriam teorias e pesquisas que demonstrem como vários processos de construção social entram em cena e se entrelaçam com as propriedades materiais da tecnologia, bem como com a estrutura social existente do contexto no qual ela é usada. ( Leonardi & Barley, 2010Leonardi, P. M., Barley, S. R. (2010). What’s under construction here? Social action, materiality, and power in constructivist studies of technology and organizing. Academy of Management Annals , 4 (1), 1-51. doi:10.5465/19416521003654160 , p. 6, tradução nossa)

Orlikowski e Scott, que têm encabeçado esta agenda, enfatizam que:

Esta é uma ontologia relacional que pressupõe o social e o material como inerentemente inseparáveis. . . a perspectiva sociomaterial presume o social e o material como um emaranhamento constitutivo, e não como entidades independentes ou interdependentes com características distintas e inerentes; a palavra “sociomaterial” (sem hífen) tenta sinalizar essa fusão ontológica, e qualquer distinção entre humanos e tecnologias é apenas analítica. ( Orlikowski & Scott, 2008Orlikowski, W. J., Scott, S. V. (2008). Sociomateriality: challenging the separation of technology, work and organization. Academy of Management Annals , 2 (1), 433-474. doi:10.1080/19416520802211644 , p. 45, tradução nossa)

Até agora, essa agenda ontológica tentou responder aos críticos do construtivismo de duas formas. A primeira por meio do jogo de linguagem: “Sair de uma discussão sobre tecnologia para uma discussão sobre a sociomaterialidade visa chamar a atenção, daqueles que normalmente não consideram explicitamente a tecnologia em suas pesquisas, quanto à importância das bases técnicas da vida organizacional, sem usar diretamente o termo ‘tecnologia’” ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , p. 65, tradução nossa). A segunda é o marco de uma transição:

O uso do termo “sociomaterial” também se baseia nas abordagens estruturacionais da tecnologia, que mostraram que todos os artefatos tecnológicos são criados por meio de interação social entre as pessoas e que quaisquer efeitos que esses artefatos tecnológicos possam ter na organização do trabalho foram moderados e moldados por interação social. Assim, ao sair do “uso de tecnologia” e do “artefato técnico” para “social”, “material” e, finalmente, “sociomaterial”, pode-se afirmar filosoficamente que toda ação que constitui a organização não é mais ou menos social do que material. ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , p. 65, tradução nossa)

Em suma, o debate sobre as relações entre o social e o material tem se tornado popular devido às críticas ao construtivismo social, que nega uma visão determinista da tecnologia, porém adota uma visão predominantemente social-voluntarista. Também em razão do desenvolvimento de uma agenda para uma ontologia sociomaterial, visando fornecer uma linguagem capaz de teorizar a mistura ontológica entre o social e o material, valendo-se de um novo jogo de linguagem e de um rompimento com o pressuposto (oriundo da teoria da estruturação) de que a reflexividade humana predomina sobre a agência material. Dadas as controvérsias do debate neste ponto, este artigo visa contribuir acrescentando uma acrítica à atual agenda para uma ontologia sociomaterial, que tem se constituído por meio de usos retóricos da noção de ontologia.

As críticas

A partir da agenda para uma ontologia sociomaterial, o termo se tornou popular – e controverso –, muito embora poucos de seus adeptos dediquem espaço em seus trabalhos para responder ou discutir as críticas. Assim, os objetivos da discussão proposta são: (a) resgatar as principais críticas existentes; (b) argumentar, com base na trajetória apresentada, que a atual agenda para uma ontologia sociomaterial se constitui retoricamente; e (c) descrever e exemplificar estratégias por meio das quais essa constituição retórica opera.

As principais críticas

As críticas mais comuns à agenda sociomaterial são a alta abstração filosófica, apontada como desnecessária para o tipo de análise empírica comumente apresentada ( Leonardi, 2013Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 ; Mutch, 2013Mutch, A. (2013). Sociomateriality – Taking the wrong turning? Information and Organization , 23(1), 28-40. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.001 ), e a desconsideração do debate mais amplo para além de menções a alguns textos de Wanda Orlikowski ( Jones, 2014Jones, M. (2014). A matter of life and death: exploring conceptualizations of sociomateriality in the context of critical care. MIS Quarterly , 38 (3), 895-925. doi:10.25300/MISQ/2014/38.3.12 ).

É possível ampliar a lista, a começar pela discussão apresentada por Mutch (2013)Mutch, A. (2013). Sociomateriality – Taking the wrong turning? Information and Organization , 23(1), 28-40. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.001 , que destaca a ausência de clareza sobre como e por que os insights obtidos em análises sociomateriais não poderiam também ser obtidos por meio de outras abordagens e ontologias muito menos abstratas ou filosóficas; a falta de especificidade sobre o que é considerado “material” e a negligência em relação a estruturas sociais mais amplas, além do fato de que, quando consideradas, essas o são a partir de recursos convencionais ou clássicos da teoria social; a dependência do pesquisador em relação à percepção dos participantes das pesquisas para compreender as relações entre o social e o material e para atribuir agência ao material, resultando, contraditoriamente, em relatos centrados na fala humana, dos participantes, apesar do argumento superficial da existência de uma ontologia sociomaterial; o reducionismo da vida social à prática refletida por informantes e a contingências particulares observadas por uma parte externa a ela, o pesquisador; e principalmente a tentativa de aplicar uma abordagem sociomaterial parece levantar questões de poder e de domínio de recursos, abordadas por perspectivas tradicionais em que conceitos como “papel” e “estrutura” ajudam há tempos a explicar o que essas investigações sociomateriais se propõem a “revelar”.

Ainda outra importante crítica de Mutch (2013)Mutch, A. (2013). Sociomateriality – Taking the wrong turning? Information and Organization , 23(1), 28-40. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.001 , que já foi discutida por Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 especificamente no que diz respeito a análises sociomateriais focadas em práticas, está relacionada à temporalidade. Segundo Mutch, uma vez que as abordagens sociomateriais negam a existência de estruturas sociais, elas ignoram o papel do tempo na produção de constelações particulares de posições-práticas que emergem da atividade de pessoas, mas não são reduzíveis a essas atividades. Essa crítica se torna ainda mais relevante quando se considera que, como colocado por Mutch e já enfatizado por Leonardi, as condições em que tais práticas ocorrem não foram produzidas no “aqui e agora”, no presente do pesquisador.

Pode-se ainda acrescentar a falta de clareza com relação à constituição mútua do social e do material, se ocorre apenas analiticamente ou também empiricamente, já que atores humanos – participantes em um campo de pesquisa – “naturalmente” distinguem algo que veem como material de algo que veem como social. Aspecto provocativo enfatizado por autores como Faulkner e Runde (2012)Faulkner, P., Runde, J. (2012). On sociomateriality. In P. M. Leonardi, B. A. Nardi, & J. Kallinikos (Eds.), Materiality and organizing: social interaction in a technological world (pp. 49-66). Oxford: Oxford University Press. doi:10.1093/acprof:oso/9780199664054.001.0001 , Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , Jones (2014)Jones, M. (2014). A matter of life and death: exploring conceptualizations of sociomateriality in the context of critical care. MIS Quarterly , 38 (3), 895-925. doi:10.25300/MISQ/2014/38.3.12 e Putnam (2014)Putnam, L. L. (2014). Unpacking the dialectic: alternative views on the discourse-materiality relationship. Journal of Management Studies , 52 (5), 706-716. doi:10.1111/joms.12115 e comumente não apontado por adeptos da ontologia sociomaterial.

Uma característica comum a essas críticas é que elas se baseiam em argumentos teóricos inerentes à própria agenda para uma ontologia sociomaterial. Ampliando o debate, acrescenta-se aqui uma crítica cuja originalidade reside em sua natureza, que não é teórica, no sentido de debater e/ou contra-argumentar teoricamente os argumentos da agenda sociomaterial, como fazem as críticas apresentadas. Busca-se apresentar uma crítica fundamentada na trajetória do debate e focada em evidenciar o caráter retórico da agenda para uma ontologia sociomaterial.

Ontologia sociomaterial como retórica

A despeito dos aspectos teóricos envolvidos na discussão sobre uma ontologia sociomaterial, é possível argumentar que ela se constitui por meio de usos retóricos da noção de ontologia, resultando em discussões de baixa relevância do ponto de vista do próprio debate, quando sua trajetória é considerada. O principal argumento que viabiliza – ou pelo menos justifica – a proposição inicial desta crítica é que atualmente a questão ontológica é mais central no debate do que o próprio fenômeno que ele analisa, já praticamente ignorado pela maioria dos estudos contemporâneos de abordagem sociomaterial. Se na década de 1980 Barley (1988a) chamou a atenção de pesquisadores para a necessidade de decodificar sistematicamente não apenas interpretações, mas também atributos técnicos materiais, foi como um meio de aprofundar as discussões sobre estrutura organizacional e sobre as consequências sociais negativas da difusão de novas tecnologias. Na atual agenda para uma ontologia sociomaterial, o meio se tornou um fim em si mesmo, com pouca ou nenhuma ligação com a finalidade para a qual ele foi primeiro sugerido.

Conforme percebe-se a partir da trajetória, o debate surgiu devido a duas questões-chave: Quais arranjos sociais são mais adequados a diferentes infraestruturas técnicas para obtenção de um melhor desempenho? Como um sistema social se ajusta a um sistema técnico? A primeira refletia a relevância dada por pesquisadores como Woodward (1958)Woodward, J. (1958). Management and technology . London: HM Stationery Office. e Perrow (1967)Perrow, C. (1967). A framework for the comparative analysis of organizations. American Sociological Review , 32 (2), 194-208. doi:10.2307/2091811 ao desempenho organizacional no contexto do desenvolvimento da indústria inglesa no pós-Segunda Guerra Mundial, norteando os posteriores teóricos da contingência. O grande interesse era compreender como desenhar diferentes estruturas organizacionais, então entendidas principalmente como formas de especializar e integrar o trabalho, dependendo do tipo de tecnologia utilizada, e como otimizar processos produtivos em organizações operando em diferentes indústrias. A segunda refletia a relevância dada por pesquisadores como Mann e Hoffman (1960)Mann, F. C., Hoffman, L. R. (1960). Automation and the worker: a study of social change in power plants . New York: Henry Holt. , Walker e Guest (1952)Walker, C. R., Guest, R. H. (1952). The man on the assembly line . Cambridge: Harvard University Press. , e também Barley (1988a), às consequências sociais negativas da automação, principalmente a desqualificação ou alienação do trabalhador no contexto de aumento da automação no pós-guerra.

Assim, de um lado havia um interesse no desempenho organizacional, visando resolver o problema produtivo da indústria e, de outro, uma busca por soluções para as consequências sociais negativas daquela transição histórica. Do ponto de vista teórico, o foco do debate era o mesmo fenômeno: a difusão de novas tecnologias e as implicações nos níveis organizacional e social. No nível organizacional, havia um foco na estrutura organizacional; no nível social, um foco nas consequências para o trabalho. Não há “separabilidade ontológica” alguma nessas duas questões, ambas retratam as duas faces do mesmo fenômeno, qual seja, a difusão de novas tecnologias e as implicações nos níveis organizacional e social.

Esse fenômeno permaneceu como o centro do debate ao longo de seu desenvolvimento e consolidação. A discussão seminal de Barley (1986)Barley, S. R. (1986). Technology as an occasion for structuring: evidence from observations of CT scanners and the social order of radiology departments. Administrative Science Quarterly , 31 (1), 78-108. doi:10.2307/2392767 era sobre estrutura organizacional, delimitada a seu alinhamento a uma nova tecnologia inserida no trabalho, o que resultaria – ou não – em uma nova forma organizacional. Estudos posteriores bastante influentes continuaram interessados em compreender e debater este mesmo fenômeno. Por exemplo, trabalhos como os de Watson, DeSanctis e Poole (1988), de Poole e DeSanctis (1990Poole, M. S., DeSanctis, G. (1990). Understanding the use of group decision support systems: the theory of adaptative structuration. In J. Fulk, & C. Steinfield (Eds.), Organizations and communication technology (pp. 173-193). Newbury Park: Sage. doi:10.4135/9781483325385.n8 , 1992Poole, M. S., DeSanctis, G. (1992). Microlevel structuration in computer‐supported group decision making. Human Communication Research , 19 (1), 5-49. doi:10.1111/j.1468-2958.1992.tb00294.x ), e de DeSanctis e Poole (1994)DeSanctis, G., Poole, M. S. (1994). Capturing the complexity in advanced technology use: adaptive structuration theory. Organization Science , 5 (2), 121-147. estavam centrados nos principais aspectos do tema da estrutura organizacional, como integração do trabalho e tomada de decisão. É este o ponto central do debate também nos modelos teóricos formulados na época, como o modelo da mudança estrutural ocasionada por tecnologia, o da teoria de estruturação adaptativa e o modelo da dualidade da tecnologia.

Do mesmo modo, é inegável o débito dos estudos construtivistas sobre tecnologia e organizações para com a tradição sociotécnica e seu interesse nas implicações sociais negativas da difusão de novas tecnologias no trabalho. Se o estudo seminal de Zuboff (1988)Zuboff, S. (1988). In the age of the smart machine: the future of work and power . New York: Basic Books. , que influenciou toda a geração construtivista, é hoje geralmente lembrado para justificar o uso de tal abordagem, é preciso resgatar que o intuito central da autora não era desenvolver uma abordagem construtivista para estudar tecnologia e organizações – o que foi um meio, não uma finalidade –, mas sim analisar se a computação traria maior qualificação ou desqualificação para o trabalhador, em uma discussão de base assumidamente marxista e centralmente focada na questão da alienação do trabalhador.

É apenas na medida em que o debate se populariza que o interesse das novas gerações de pesquisadores deixa de ser as implicações organizacionais e sociais da difusão de novas tecnologias no trabalho e passa a ser a abordagem em si, ou seja, a questão ontológica. Mais especificamente, é possível situar o ponto crítico desta ruptura no modelo da lente prática ( Orlikowski, 1992Orlikowski, W. J. (1992). The duality of technology: Rethinking the concept of technology in organizations. Organization Science, 3 (3), 398-427. doi:10.1287/orsc.3.3.398 ). A partir deste modelo, o que era central se torna periférico no debate, e vice-versa. O fenômeno da difusão de novas tecnologias e suas implicações organizacionais e sociais começa a ser “apagado”, e a questão da “lente de análise” e posteriormente da “ontologia” se torna o foco. Nas influentes releituras tanto de Orlikowski e Scott (2008)Orlikowski, W. J., Scott, S. V. (2008). Sociomateriality: challenging the separation of technology, work and organization. Academy of Management Annals , 2 (1), 433-474. doi:10.1080/19416520802211644 quanto de Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 , ambas quase puramente ontológicas, o fenômeno é praticamente esquecido. Assim, acusadas de “determinismo material” e de “voluntarismo social”, as questões centrais que originaram, desenvolveram e consolidaram o debate sobre as relações entre o social e o material se tornaram “ontologicamente démodé” e a nova moda da análise organizacional se tornou a própria “sociomaterialidade”. O resultado foi que o fenômeno perdeu sua primazia sobre a ontologia, enquanto a perspectiva, a lente analítica, o posicionamento do pesquisador etc. se tornaram praticamente um fim em si mesmo.

A despeito de ganhos já indicados pelos adeptos do termo “sociomaterialidade”, é possível enriquecer o debate considerando a possibilidade de que a agenda ontológica sociomaterial se constitua muito mais como pura retórica – para publicação? – do que como avanço do conhecimento sobre o fenômeno, pouco familiar à maioria dos seus adeptos mais recentes.

Uma das estratégias retóricas utilizadas para justificar o suposto desenvolvimento de uma ontologia sociomaterial é a aleatoriedade autoral , que consiste em selecionar aleatoriamente qualquer “grande autor” e discutir suas supostas “contribuições” para o debate, sem clareza sobre qual base ontológica mais ampla permite a seleção de determinados autores e a exclusão de outros. A título de exemplo, o conjunto dos trabalhos mais influentes de Wanda Orlikowski resulta numa coleção indefinida de artigos sem clareza sobre qual o fio ontológico condutor que a orienta, por exemplo, para Latour ( Orlikowski & Scott, 2008Orlikowski, W. J., Scott, S. V. (2008). Sociomateriality: challenging the separation of technology, work and organization. Academy of Management Annals , 2 (1), 433-474. doi:10.1080/19416520802211644 ), em seguida para Bourdieu ( Feldman & Orlikowski, 2011)Feldman, M. S., Orlikowski, W. J. (2011). Theorizing practice and practicing theory. Organization Science , 22 (5), 1240-1253. doi:10.1287/orsc.1100.0612 , então para Barad ( Scott & Orlikowski, 2014)Scott, S. V., Orlikowski, W. J. (2014). Entanglements in practice: performing anonymity through social media. MIS Quarterly , 38 (3), 873-894. doi:10.25300/MISQ/2014/38.3.11 , terminando em ninguém menos que Foucault (Orlikowski & Scott, 2015a). Uma análise aprofundada deste trajeto poderia revelar que se vai de um a outro de forma ontologicamente indiscriminada. A começar pelo “uso” de Latour, cujo trabalho em grande parte é resultado – e não fundação – do debate sobre o social e o material já existente na tradição sociotécnica, que o precede em pelo menos três décadas. Além da falta de clareza sobre como se salta dos híbridos de Latour, defensor ávido de uma “pós-ciência”, para o clássico “campo social” de Bourdieu, e deste à física teórica quântica a partir da qual trabalha Barad, é irônico que se chegue, ao final, em Foucault, cuja obra foi quase inteiramente produzida a partir de análises da antiguidade, contexto empírico bastante distinto da atual difusão tecnológica pervasiva evocada pela autora como justificativa e relevância para uma ontologia sociomaterial. Caso se queira resguardar um mínimo de historicidade teórica e rigor ontológico, esta aleatoriedade precisa ser esclarecida pela agenda sociomaterial. Como isso não ocorre, ironicamente, o resultado é que um debate cujo centro é uma agenda ontológica que visa integrar o social e o material acaba tendo pouca ou nenhuma integração ontológica interna, terminando como uma coleção de usos predominantemente retóricos da noção de ontologia para criar discussões de autores tão aleatórios quanto famosos.

O resultado mais capilarizado dessa aleatoriedade autoral é o que se pode chamar de centrifugação teórica , ou seja, uma fuga – comum à maioria dos estudos que utilizam a perspectiva da sociomaterialidade – ao dever de discutir a própria ontologia sociomaterial, supostamente em desenvolvimento. Dito de outro modo, trata-se da estratégia de defender uma ontologia sociomaterial, porém meramente como uma “lente analítica”, em que os resultados das análises pouco ou nada são utilizados para contribuir com o aprofundamento da própria ontologia sociomaterial, mas apenas para “contribuir com os estudos sobre. . . [qualquer outra coisa desejada]”. Por exemplo, Stigliani e Ravasi (2012)Stigliani, I., Ravasi, D. (2012). Organizing thoughts and connecting brains: material practices and the transition from individual to group-level prospective sensemaking. Academy of Management Journal , 55 (5), 1232-1259. doi:10.5465/amj.2010.0890 empregam a sociomaterialidade para discutir sensemaking ; Cabantous e Gond (2011)Cabantous, L., & Gond, J.-P. (2011). Rational decision making as performative praxis: explaining rationality’s éternel retour. Organization Science , 22 (3), 573-586. doi:10.1287/orsc.1100.0534 , para discutir tomada de decisão; Mingers e Willcocks (2017)Mingers, J., Willcocks, L. (2017). An integrative semiotic methodology for IS research. Information and Organization , 27 (1), 17-36. doi:10.1016/j.infoandorg.2016.12.001 , para discutir semiótica, e assim sucessivamente. Ironicamente, o resultado é que um debate cujo centro é uma agenda ontológica que visa integrar o social e o material acaba tendo pouca ou nenhuma força conceitual centrípeta, ou seja, de esforço para utilizar os achados de diferentes estudos sociomateriais para discutir a própria ontologia sociomaterial, terminando, assim, como uma coleção de usos predominantemente retóricos da noção de ontologia para criar uma coleção de discussões tão diversas quanto desintegradas.

Outra estratégia característica da agenda sociomaterial é uma procrastinação conceitual , ou seja, o fato de que em geral os conceitos empregados levam à necessidade de utilizar um outro conceito, e assim indefinidamente, sem que se chegue a um corpus conceitual consolidado capaz de trazer luz sobre o que seria uma mistura ontológica do social com o material. Em outras palavras, o entendimento será sempre decorrente de uma nova discussão a partir da assimilação de novos conceitos ainda “pouco debatidos”. Por exemplo, ao desafiar uma separação ontológica entre tecnologia, trabalho e organização e propor uma ontologia sociomaterial, Orlikowski e Scott (2008)Orlikowski, W. J., Scott, S. V. (2008). Sociomateriality: challenging the separation of technology, work and organization. Academy of Management Annals , 2 (1), 433-474. doi:10.1080/19416520802211644 se respaldam em uma longa lista de conceitos deixados para serem debatidos posteriormente – como ator-rede, mistura de práticas, reconfiguração algorítmica etc. – e que jamais foi retomada de modo a demonstrar uma integração entre eles. Em vez disso, as autoras reorientam suas discussões para a noção de prática material-discursiva (Orlikowski & Scott, 2015a) e passam a sugerir um aprofundamento da noção de realismo agêntico, de Barad (2007)Barad, K. (2007). Meeting the universe halfway: quantum physics and the entanglement of matter and meaning . Durham: Duke University Press. , sem clareza desse rumo em relação ao chamado de Leonardi (2013)Leonardi, P. M. (2013). Theoretical foundations for the study of sociomateriality. Information and Organization , 23 (2), 59-76. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.002 para o realismo crítico, sugerido por Mutch (2013)Mutch, A. (2013). Sociomateriality – Taking the wrong turning? Information and Organization , 23(1), 28-40. doi:10.1016/j.infoandorg.2013.02.001 , o qual, por sua vez, tinha como implicação um redirecionamento para a abordagem morfogênica de Archer (1995)Archer, M. (1995). Realist social theory: the morphogenetic approach . Cambridge: Cambridge University Press. , e assim indefinidamente… O resultado é uma espécie de milagre da multiplicação dos conceitos, em que o conhecimento sobre o que possa ser uma mistura ontológica do social com o material estará sempre no próximo grande conceito, o qual se desdobrará em tantas grandes discussões conceituais quanto sabáticos acadêmicos permitirem. Um recente e influente call for papers (Beyes, Chun, Clarke, Flyverbom, & Holt, 2019) pode ser visto como um exemplo claro da popularidade dessa estratégia. Nele, os editores encorajam discussões engajadas em uma lista de cerca de vinte grandes conceitos, cuja base ontológica comum ficou longe de ser esclarecida, em vez de direcionar para um sentido integrador.

Conclusões

De caráter ensaístico, este artigo visa ampliar o debate sobre a sociomaterialidade com uma crítica à atual agenda ontológica. A originalidade desta crítica reside em sua natureza – diferente das críticas precedentes, ela é fundamentada não em argumentos teóricos, mas na trajetória do debate em questão – e, do mesmo modo, não é endereçada aos argumentos teóricos da ontologia sociomaterial em desenvolvimento, mas sim a seu próprio modo de desenvolvimento. Conforme se procurou demonstrar, a suposta ontologia sociomaterial tem se constituído retoricamente, ou seja, por meio de usos retóricos da noção de ontologia. A relevância desta contribuição reside em questionar o suposto desenvolvimento de uma ontologia sociomaterial, descrevendo e exemplificando suas estratégias retóricas: a aleatoriedade autoral, a centrifugação teórica e a procrastinação conceitual. Ao descrever e exemplificar essas estratégias, expande-se a possibilidade de analisar o estado atual do debate para além do ponto de vista da argumentação teórica interna (sociomaterial), mas também a partir do próprio modo de produção deste conhecimento. Isso é relevante porque os usos retóricos indicados e exemplificados têm resultado em um “esquecimento” das questões que estiveram no centro do debate por cerca de sete décadas, e em uma “glorificação” daquilo que sempre foi um meio, e não um fim, ou seja, a discussão de abordagens que possam contribuir para elucidar o fenômeno.

A conclusão mais clara é a necessidade de um retorno àquilo que é considerado relevante no debate do ponto de vista de sua trajetória, em detrimento de discussões retóricas sobre ontologia. A saber, a difusão de novas tecnologias no trabalho e as subsequentes implicações nos níveis organizacional e social. Dito de outro modo, recolocar no centro do debate que, se pesquisadores têm discutido por décadas as relações entre o social e o material em organizações, é como um meio de compreender as implicações organizacionais e sociais da difusão de novas tecnologias. Mais especificamente, significa retomar o compromisso de contribuir com o tema da estrutura organizacional e das consequências sociais negativas da difusão de novas tecnologias.

Se se quiser efetivamente buscar este retorno, a principal implicação é a adoção de ontologias pragmáticas. Pragmáticas não no sentido comumente atribuído por adeptos de abordagens sociomateriais, em que pragmatismo é entendido como a substituição de estruturas sociais por práticas situacionais, o que se aproxima muito mais de um pragmaticismo; mas sim no sentido de conceber que qualquer conceito, teoria ou ontologia deve ser adotada não pela sua relevância em si mesma, mas sim pelo seu potencial de explicar o fenômeno analisado, o que só pode ser avaliado a partir do foco no fenômeno. Tal posicionamento por parte de pesquisadores obriga, consequentemente, a reestabelecer a primazia do fenômeno sobre a ontologia, lógica invertida na atual agenda ontológica sociomaterial. Em suma, implica recolocar no centro do debate a questão “Quais as implicações organizacionais e sociais da difusão de novas tecnologias?”, em detrimento de “Como fundir ontologicamente o social e o material?”.

Decorrente desta, outra implicação é a elaboração de análises críticas ou reflexivas sobre o próprio modo de produção de conhecimento na agenda para uma ontologia sociomaterial. Enquanto as críticas existentes são majoritariamente endereçadas a partir de, ou a, aspectos teóricos da teoria da estruturação, uma crítica reflexiva sobre o próprio modo de manuseio de teorias por parte de pesquisadores pode revelar problemas de outras naturezas, como as estratégias de aleatoriedade autoral, centrifugação teórica e procrastinação conceitual apresentadas neste ensaio. De modo algum se trata de atribuí-las à intenção dos autores mencionados como exemplos, mas sim de trazê-las à tona como um reflexo do próprio modo de produção de conhecimento prevalecente na agenda sociomaterial: retórico e de pouco rigor ontológico. Novas análises deste tipo podem revelar outros problemas e fomentar contrapontos e contra-argumentos. Seja no sentido de contestar ou de reafirmar e consolidar uma ontologia sociomaterial, o debate como um todo só tem a ganhar.

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Notas

  • 1
    . Diferente do construcionismo, que foca na produção de sentidos por meio da linguagem, o construtivismo foca na produção de processos cognitivos, como memória e aprendizagem, por meio de interações intra e intergrupais.
  • 2
    . No original, enactment , termo frequentemente empregado nos estudos de tecnologia e organizações para se referir ao processo de constituição ( enactment ) da ordem social situada e empiricamente observável.
  • 3
    . Por exemplo, a opacidade de uma parede de concreto impossibilita enxergar através dela independentemente de interpretação, contexto ou prática social.
  • Verificação de plágio
  • A O&S submete todos os documentos aprovados para a publicação à verificação de plágio, mediante o uso de ferramenta específica.
  • Disponibilidade de dados
  • A O&S incentiva o compartilhamento de dados. Entretanto, por respeito a ditames éticos, não requer a divulgação de qualquer meio de identificação dos participantes de pesquisa, preservando plenamente sua privacidade. A prática do open data busca assegurar a transparência dos resultados da pesquisa, sem que seja revelada a identidade dos participantes da pesquisa.
  • Financiamento: Agradeço às agências de fomento mencionadas a seguir pelo apoio, em momentos distintos, ao projeto de pesquisa do qual este artigo é resultado parcial. O presente trabalho é resultado parcial de um projeto realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Set 2021
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2021

Histórico

  • Recebido
    21 Set 2018
  • Aceito
    22 Maio 2020
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