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A divulgação científica no cruzamento de novas esferas de atividade linguageira

RESUMO

O presente artigo aborda o campo da divulgação científica através das diferentes esferas de atividade linguageira que nele se cruzam. Evocaremos incialmente o modelo clássico e linear da divulgação científica, antes de apresentarmos o deslocamento produzido, em seguida, pela mídia tradicional, que possibilitou o diálogo entre diferentes comunidades linguageiras (políticos, associações de consumidores, agricultores, pesquisadores, etc.), especialmente em acontecimentos científicos. Mostraremos finalmente as modificações trazidas pelas novas ferramentas tecnológicas nas formas de participação e de tomada da palavra proporcionadas pela Internet.

PALAVRAS-CHAVE:
Divulgação científica; Esferas de atividade linguageira; Acontecimentos científicos; Mídia; Blogs científicos

RESUME

Dans cet article, on aborde le champ de la vulgarisation scientifique en mettant l'accent sur les différentes sphères d'activité langagière qui s'y croisent. On rappelle d'abord le modèle classique et linéaire de la diffusion scientifique avant de montrer le déplacement qui s'est ensuite produit avec l'intervention des médias traditionnels, qui, notamment lors d'événements scientifiques, ont fait dialoguer différentes communautés langagières (politiques, associations de consommateurs, agriculteurs, chercheurs, etc.). On aborde enfin les changements apportés par les nouveaux outils technologiques dans des formes de participation et de prise de parole qu'autorise l'internet.

MOTS-CLES:
Vulgarisation scientifique; Sphères d'activité langagière; Evénements scientifiques; Médias; Blogs scientifiques

ABSTRACT

This paper deals with the field of popular science with a focus on the different linguistic spheres that intersect it. It starts by reviewing the classical linear model of scientific dissemination. The authors then show the displacement that took place with the involvement of traditional media that established a dialogue between different language communities (politicians, consumer associations, farmers, researchers, etc.), in particular for scientific events. Finally, the changes to forms of participation and speech resulting from new technological tools and made possible by the Internet are presented.

KEYWORDS:
Popular Science; Linguistic Spheres; Scientific Events; Media; Scientific Blogs

Iniciaremos este artigo retomando, brevemente, a história recente dos discursos da divulgação científica. Em seguida, abordaremos os discursos que se caracterizam por uma hibridez linguageira, que é decorrente da heterogeneidade dos gêneros discursivos, e, em particular, dos gêneros da Internet, e se encontra em uma forma de comunicação científica que dá voz a uma grande diversidade de atores, como já salientava D. Wolton no final do século XX: "Não mais existem dois atores, os cientistas e o público, mas, no mínimo, quatro, a ciência, a política, a comunicação e os públicos; e cada um deles se divide, frequentemente, em muitos subgrupos" (1997, p.1; nossa tradução)1 1 No original em francês: "Il n'y a plus deux acteurs, les scientifiques et le public, mais au moins quatre, la science, la politique, la communication et les publics; et chacun est lui-même souvent divisé en plusieurs sous-groupes". Todas as traduções dos excertos de textos em francês citados neste artigo são de responsabilidade das autoras. . De fato, os discursos que circulam na mídia se situam no cruzamento de diferentes esferas de atividade, no sentido que Bakhtin (Volochínov) atribui a essa palavra, como lembram S. Bouquet e S. Grillo na Introdução do número 56 da revista Linx, número dedicado à "Linguística dos gêneros", ao "programa de Bakhtin" e "suas perspectivas contemporâneas".

Conforme salientam os organizadores desse número, a perspectiva de Bakhtin e do seu Círculo, que reúne gêneros literários e não literários, propõe uma "classificação dos gêneros do discurso por esferas de atividade humana", estando estas últimas "em constante interação entre elas". Assim, as "constantes interações entre os gêneros [...] se desenvolvem nos processos de absorção de um gênero por outros e no entrecruzamento desses gêneros" (BOUQUET e GRILLO, 2007GRILLO, S. V. C. Épistémologie et genres du discours dans le cercle de Bakhtine. Linx, Nanterre, n.56, p.19-36, 2007., p.9-10; nossa tradução)2 2 No original em francês: "Les constantes interactions entre les genres [...] se développent dans les processus d'absorption d'un genre par d'autres et dans l'entrecroisement de ces genres". . Dito isso, podemos, portanto, lançar a hipótese de que essas esferas de atividade humana correspondem a esferas de atividade linguageira, que se aproximam do que a Análise do Discurso francesa chama de "formações discursivas" e do que chamamos de "comunidades linguageiras" (ver subseção 3.3). Podemos propor que uma esfera de atividade humana remete a inúmeras "esferas de atividade(s) linguageira(s)", e que, no campo da difusão das ciências e das técnicas, diversas esferas de atividade linguageira são, inevitavelmente, levadas a se encontrar3 3 Sobre a noção de esfera proposta por Bakhtin (Volochínov), ver o texto de S. Grillo (2007), bem como o de P. Sériot (2007) em Linx, n.56. .

Podemos, por outro lado, compreender essa evolução das formas discursivas da difusão das ciências (seja esta chamada de vulgarização, popularização ou divulgação), a partir de dois pontos de vista complementares: o da constituição dos corpora, aqui incluindo os "novos" gêneros de que o público participa na Internet; e o da construção dos "observáveis" da análise, ou seja, das categorias da análise, que são definidas em função das diferentes camadas do "gênero" escolhido e do modo como este se manifesta no meio considerado; ou ainda, como propusemos em 2003, em uma jornada sobre os "gêneros orais", ocasião em que tentamos "(re)pensar" essas categorias em três níveis: (a) o nível "micro", que se refere ao uso das palavras em seus cotextos sintáxico-semânticos (onde se atualizam as formas do ato de nomear e as reformulações enunciativas); (b) o nível "meso", que estuda as características da sequência textual, do período, do turno de fala, do quadro temático ou do deslizamento do objeto de discurso; (c) e o nível "macro", que tenta ligar as formas "internas" do gênero a seus exteriores sócio-políticos (MOIRAND, 2003MOIRAND, S. Formas Discursivas da difusão de Saberes na Mídia. RUA, Revista do Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade da Unicamp, Campinas, p.9-24, 2000 (traduction de l'article paru dans Hermès, Paris, n.21, p.33-44, 1997).). Pois, como propõe Myers (2003)MOURLHON-DALLIES; F., RAKOTONOELINA, F.; REBOUL-TOURE, S. (éds). Les discours de l'internet: nouveaux corpus, nouveaux modèles?Les Carnets du Cediscor, n.8. Paris: Presses Sorbonne Nouvelle, 2004. a respeito dos discursos de popularização, as interações das ciências e técnicas com os mundos (isto é, com as esferas de atividade) econômicos, políticos, sociais, etc. são constitutivas das formas discursivas que se encontram na difusão dos fatos e acontecimentos científicos.

Evocaremos, inicialmente, o primeiro deslocamento a que assistimos, quando passamos do estudo das palavras e das estruturas das línguas de especialidade e dos discursos especializados à análise dos discursos direcionados a públicos menos eruditos, ou, em outros termos, à análise dos discursos segundos, em sua diversidade genérica e situacional. Mostraremos o deslocamento produzido em seguida, quando esse modelo linear da divulgação foi "perturbado" pela comunicação midiática e pela intervenção de diferentes esferas de atividade: no caso de crises sanitárias e de questões alimentares ou ecológicas, por exemplo, observa-se a presença, em especial na mídia, de comunidades linguageiras diferentes (políticos, associações de consumidores, agricultores, cidadãos comuns, multinacionais do setor agroalimentar, laboratórios farmacêuticos, etc.). Enfim, abordaremos as modificações, trazidas pelas novas ferramentas tecnológicas, nas formas de participação e tomada da palavra proporcionadas pela Internet, bem como o aparecimento de "gêneros" sensivelmente diferentes: como esses gêneros vão além da "absorção" de gêneros anteriores (BOUQUET e GRILLO, 2007GRILLO, S. V. C. Épistémologie et genres du discours dans le cercle de Bakhtine. Linx, Nanterre, n.56, p.19-36, 2007., p.10)? O que há de novo e como explicar o surgimento desses gêneros?

1 Um pouco da história recente da divulgação científica

O modelo clássico da divulgação científica, que remonta ao Século das Luzes e que se desenvolveu na França e na Europa do século XIX, reside em um esquema linear da transmissão de saberes, quer se trate de um modelo "a duas" ou "três vozes".

O modelo a duas vozes ilustra uma transmissão direta dos discursos da esfera de atividade dos cientistas e dos pesquisadores, que se dirigem ao grande público e/ou aos representantes de esferas de atividade "não", ou "menos", eruditas. O discurso-fonte (o da esfera de atividade "erudita") é, então, reformulado pelos próprios representantes desta esfera em um leque de discursos segundos que dependem das esferas de atividade não, ou menos, eruditas: grande público, estudantes, amadores esclarecidos, simples curiosos, ou ainda, representantes de esferas de atividade ligadas à esfera de atividade-fonte (como, por exemplo, paramédicos). Quanto ao modelo a três vozes, nele intervém uma esfera de atividade "intermediária" (divulgadores, professores, editores, jornalistas científicos), cuja tarefa consiste em "reformular" o discurso da esfera "erudita" para um público menos erudito (é o que chamamos de "modelo do terceiro homem", sendo este terceiro homem, mais ou menos, especialista dessa mediação linguageira).

Os linguistas privilegiaram a descrição do modelo a três vozes (MORTUREUX, 1982_______. Vers de nouvelles configurations discursives. Les Carnets du Cediscor, Paris, n.12, p.141-149, 2014b.; JACOBI e SCHIELE, 1988JACOBI, D.; SCHIELE, B. (Eds). Vulgariser la science. Paris: Champ Vallon, 1988.). Esse modelo reflete-se na textura enunciativa dos discursos de transmissão de conhecimentos, principalmente quando neles encontramos discursos que podem ser atribuídos às duas outras esferas de atividade. É o que ocorre quando, em seções ou programas "científicos" (na imprensa, na rádio, na televisão) e em meios especializados da edição (obras de divulgação, revistas semiespecializadas, CD-ROM), a mídia "tradicional" privilegia o uso da interrogação, dos pronomes, da forma imperativa, por exemplo:

Ex. 1

Hale-Bopp chega perto do Sol

A noite do Cometa

Como encontrá-lo? É fácil, dirão os astrônomos: ele estará a Noroeste, a cerca de 25 graus acima do horizonte. Está bem, mas como saber onde fica o Noroeste? Há três soluções: se você tiver uma bússola, o problema está resolvido. Se você não tiver uma bússola, identifique o lugar onde fica o Sol (Libération, 29 de maio de 1997; nossa tradução).4 4 No original em francês: "Hall-Bopp passe au plus près du Soleil. La nuit de la Comète. Comment la trouver? Facile, vous diront les astronomes: elle se situe au nord-ouest, à environ 25 degrés au-dessus de l'horizon. Oui, mais comment trouver le nord-ouest? Trois solutions: vous possédez une boussole, le problème est réglé. Vous n'en possédez pas. Repérez l'endroit où se trouve le soleil".

Ex. 2

Por que choramos de felicidade

Você espera ansiosamente pelo resultado de um concurso muito importante. Qual sua reação? Ri, grita... Chora? Em outra situação, diante de um lindo filhote, talvez você sinta vontade de apertá-lo. Mas lágrimas ou carinhos agressivos não são reações "negativas"? Não necessariamente. De acordo com pesquisadores da Universidade de Yale, são um recurso do cérebro para controlar emoções excessivas de felicidade (Mentecérebro, maio de 2015, p.38).

Nota-se que o jornalista científico pertence a uma esfera de atividade linguageira "intermediária", que se situa entre a esfera de atividade "erudita", dos especialistas (os astrofísicos, por exemplo), e a esfera de atividade dos leitores comuns (interessados nos cometas), fato que se traduz em um discurso (o discurso do jornalista) cujo intertexto (MOIRAND, 2000MOIRAND, S. et al. Les Carnets du Cediscor, n.1. Un lieu d'inscription de la didacticité. Les catastrophes naturelles dans la presse quotidienne. Paris: Presses Sorbonne Nouvelle, 1993. Disponible sur: [http://cediscor.revues.org/598]. Consulté le 15 Jan. 2016.
http://cediscor.revues.org/598...
; REBOUL-TOURÉ, 2000REBOUL-TOURE, S. Le transgénique et le citoyen dans la presse écrite. Diffusion de termes spécialisés et discours plurilogal. Les Carnets du Cediscor, Paris, n.6, p.99-111, 2000.) retoma sucessivamente as perguntas dos leitores e as respostas presentes no discurso da esfera de atividade dos astrônomos ou astrofísicos.

A fala do mediador, que é frequentemente um jornalista científico, é controlada pela esfera dos especialistas, e o intertexto, que é aqui monologal, refere-se ao discurso-fonte da esfera de atividade científica e manifesta, ao mesmo tempo, uma real intenção de didaticidade (ver Les Carnets du Cediscor, n.1, 1993) para com os leitores interessados, cujas perguntas são antecipadas, evidenciando uma forma de dialogismo interacional. Assim, a situação trialogal da divulgação científica, tal como ela se constituiu no Século das Luzes e se consolidou no final do século XIX em obras como L'astronomie populaire de C. Flammarion, perpetua-se nas páginas dos jornais dedicadas à ciência ou nas revistas especializadas voltadas para amadores esclarecidos (Pour la Science, Ciel et Espace, Science et Vie); essa situação trialogal é também um lugar de observação (e de confirmação) do caráter constitutivamente dialógico dos discursos de divulgação da ciência. Cabe, enfim, destacar que o dialogismo é aqui, ao mesmo tempo, interacional (ou interlocutivo) e intertextual (e interdiscursivo).

Esquema 1
Os polos da divulgação científica.

Esse modelo prototípico, em que o mediador ocupa a posição de "transmissor" e se situa entre os cientistas e o grande público, é ainda hoje utilizado nos suportes de difusão da ciência, como a imprensa, as revistas semiespecializadas, os CD-ROM, etc. Nesse caso, a análise pode incidir sobre as inúmeras reformulações que tentam explicar os termos do discurso de origem; sobre os lugares enunciativos que são discursivamente constituídos a partir dos três polos que representam as três esferas sociodiscursivas; e, por fim, sobre os inúmeros fios dialógicos que se tecem entre os discursos atribuídos a um ou outro e o discurso do mediador, que "mostra" sua posição de intermediário:

Ex. 3

Em alguns lugares distantes, podem existir planetas tão cheios de vida que fariam os melhores paraísos da Terra parecerem inóspitos como um deserto. Eles seriam parte de uma recém-catalogada categoria de planetas, a dos "super-habitáveis", ou seja, bem melhores para a vida que o nosso. É sério. O conceito foi publicado pela primeira vez no periódico científico Astrobiology, em 2014, por obra de René Heller, da Universidade McMaster, no Canadá, e John Armstrong, da Webert, uma universidade americana (NOGUEIRA, Superinteressante, junho de 2015MYERS, G. Discourse studies of scientific popularization: questioning the boundaries. Discourse Studies, Londres, vol.5, n.2, p.265-279, 2003., p.51)

Ex. 4

Eficiente contra o melanoma, um tipo grave de câncer de pele, o medicamento [Yervoy] é pioneiro na área que é a atual menina dos olhos dos pesquisadores de câncer: a imuno-oncologia, que tenta utilizar o fortalecimento do próprio sistema imunológico do paciente para combater o tumor (MIOTO, Folha de S. Paulo, 4 Junho 2015Mentecérebro. Por que choramos de felicidade, Neurocircuito, São Paulo, p.38, May 2015., p.B5)

No entanto, quando os acontecimentos começaram a questionar os discursos das esferas de atividade "fontes" (o que acontece, sobretudo, quando a ciência não consegue responder, de forma imediata, às crises sanitárias, também chamadas de "casos"5 5 "Affaires", em francês. : o caso do sangue contaminado na França, o caso da vaca louca na Europa, as gripes aviária ou porcina no mundo, o problema do aquecimento global, a questão do gás de xisto, etc.), o modelo a três vozes (ou três polos) não conseguiu resistir à chegada dos discursos de outras comunidades, discursos não oriundos das esferas de atividade dos especialistas e dos intermediários "autorizados". Tanto é que, quando ocorre algo no campo da saúde, do meio-ambiente ou da alimentação, e que esse algo se torna o "acontecimento do dia" ou do "momento", esse objeto de discurso deixa as páginas ou os programas dedicados à ciência e vai para a primeira página dos jornais, para os jornais televisivos ou boletins das emissoras de rádio.

Encontramo-nos, assim, diante de fatos científicos ainda não estabelecidos (a encefalopatia espongiforme bovina pode, ou não, ser transmitida ao homem?), diante de considerações econômico-financeiras que são mais condizentes com a ação pública e, portanto, com a política, do que com a própria ciência (é preciso vacinar a população? É preciso evacuar as pessoas que moram nos arredores das centrais nucleares? É preciso extrair o gás de xisto?), ou ainda, diante de considerações éticas que suscitam polêmicas variadas no espaço público (ver Les Carnets du Cediscor, n.6, 2000).

2 O tratamento dos acontecimentos científicos de caráter político na mídia tradicional

Ao questionarem os saberes da ciência ou a capacidade dos políticos em prever ou prevenir o que pode acontecer, certos fatos de caráter científico ou técnico se tornam acontecimentos. Quando isso ocorre, eles invadem os meios de comunicação de massa a que se "expõem" diariamente os cidadãos comuns. Estes, diante das consequências para a sociedade ou para o seu modo de vida, vão à procura de informações e de imagens, estejam elas relacionadas aos riscos da energia nuclear ou do gás de xisto, da vaca louca ou da gripe aviária, dos transgênicos, da clonagem ou do aquecimento global. Trata-se, portanto, de fatos que têm grande repercussão social, já que dizem respeito à saúde, à alimentação, ao meio-ambiente, em suma, ao nível de qualidade de vida que os cidadãos das atuais democracias desenvolvidas exigem.

Assim, a mídia (incluindo-se a Internet) reproduz as expectativas de seu público, tornando-se um lugar onde se afrontam as diferentes esferas de atividade envolvidas no acontecimento, cujos interesses divergem, ou se opõem, frequentemente. Assiste-se, por conseguinte, ao recuo da vontade, que prevalecia no século XIX, de "explicar" a ciência (BENSAUDE e RASMUSSEN, 1997BENSAUDE-VINCENT, B.; RASMUSSEN, A. (éds). La science populaire dans la presse et l'édition aux 19e et 20e siècles. Paris: CNRS éditions, 1997.), bem como ao surgimento de outro modelo: o da midiatização dos fatos científicos e técnicos, modelo esse que reside na encenação (na mise-en-scène) das controvérsias existentes entre esferas de atividade que não possuem os mesmos interesses (ou as mesmas crenças). Diante disso, a coleta dos dados não pode mais limitar-se, apenas, aos discursos de transmissão de saberes - às páginas, seções, e aos programas científicos -, mas somos obrigados a levar em conta a grande diversidade de gêneros discursivos: o conjunto dos gêneros discursivos que intervêm no tratamento dos acontecimentos científicos ou tecnológicos de caráter político. Estamos, portanto, diante de um modelo de comunicação diferente, que não é mais o da divulgação científica dos séculos XVIII e XIX (WOLTON, 1997VÉRINE, B. Introduction. Cahiers de praxématique, Montpellier, n.45, p.7-16, 2005.).

A diversidade de linguagem dos atores, que fazem parte das diferentes esferas de atividade em questão, intervém, direta ou indiretamente, no tratamento midiático desses acontecimentos científicos de caráter político, quando, ao serem retomados, os discursos desses locutores se inscrevem no sentido das palavras, das formulações, dos enunciados produzidos, etc. Ora, os membros de uma coletividade não encontram palavras neutras, mas palavras "habitadas" por outras vozes, visto que "[e]m todos os seus caminhos até o objeto, em todas as direções, o discurso se encontra com o discurso de outrem e não pode deixar de participar, com ele, de uma interação viva e tensa" (em O discurso no romance, BAKHTIN, 2002BAKHTINE, M. / VOLOCHINOV V.N. Le marxisme et la philosophie du langage. Essai d'application de la méthode sociologique en linguistique. Trad. M. Yaguello. Paris: Minuit, 1977 [1929]., p.88). A midiatização dos fatos científicos e técnicos ilustra perfeitamente esse aspecto em um mesmo espaço-tempo: o do programa, da página de jornal ou da página web.

São as palavras, as construções, os dizeres relatados ou mencionados, talvez já esquecidos ou não ditos, que constituem, portanto, os lugares de inscrição das relações entre a ciência e a sociedade na mídia. Isso representa um deslocamento considerável do objeto de pesquisa, comparado aos primeiros trabalhos dos linguistas sobre as relações semânticas existentes entre os termos técnicos e científicos (GUILBERT e PEYTARD, 1973GUILBERT, L. et PEYTARD, J. (éds). Les vocabulaires techniques et scientifiques. Langue française, n.17. Paris: Larousse, 1973.). Mas isso também denota uma diferença fundamental em relação às análises dos especialistas de Comunicação, que, muitas vezes, consideram irrelevantes os modos de inscrição da língua nas materialidades verbais (e, hoje, tecnológicas).

Além das palavras e dos dizeres das diferentes comunidades que intervêm direta ou indiretamente (através de todas as formas de discurso relatado existentes), é possível observar como uma categoria discursiva, a explicação, por exemplo, que se inscreve na continuidade da fala, corresponde a uma estrutura actancial que vai se tornando cada vez mais complexa na medida de seus deslocamentos (S = cientista, ciência; Y, Y = alguma coisa, algo; M = mediador; J = jornalista):

  • S explica [X] a P

  • S explica [que X explica Y] a P

  • M explica [que S diz (que X explica Y)] a B

  • J explica [que A, B, C, D, E, S explicam Y] a B.

Assim, à medida que os fatos e os acontecimentos político-científicos vão sendo midiatizados, a explicação torna-se objeto de controvérsias entre as esferas de atividade humana que se afrontam na grande mídia (imprensa, rádio, televisão), em um mesmo programa ou no fio de um mesmo artigo de jornal: isso se traduz, portanto, na própria textura enunciativa do texto jornalístico, o que permite questionar a genericidade de um novo gênero da informação, a informação sobre as controvérsias, de que trataremos a seguir, a título de exemplo.

Enquanto fazemos a distinção, grosso modo, entre gêneros da informação, cuja enunciação tende para a objetividade, e gêneros do comentário, que tendem para a subjetividade, observamos que as controvérsias dão lugar, na imprensa escrita (em meio impresso ou digital), a um gênero particular, onde o confronto entre esferas de atividade linguageira opostas é "representado" no fio de um texto escrito por um mesmo redator (ver MOIRAND, 2014a_______. Le modèle du Cercle de Bakhtine à l'épreuve des genres de la presse. Linx, Nanterre, n.56, p.91-108, 2007.):

Ex. 5

Gás de xisto: a tentação

Enquanto o antigo primeiro-ministro François Fillon considerava ontem como "criminosa" a interdição das pesquisas sobre o gás de xisto, o chefe de Estado lembrou que a proibição do fraturamento hidráulico data de julho de 2011, da presidência... de Nicolas Sarkozy. Se o tema volta à tona, é porque, desde o último verão, os petroleiros, apoiados por políticos eleitos, acharam um argumento de peso: este "presente" poderia relançar o crescimento econômico. "Somos o único país do mundo que se recusa a procurar, enquanto podemos ter um tesouro debaixo dos nossos pés", ressalta Jacques Sallibartant, presidente da Associação dos perfuradores e das profissões do setor petrolífero. Para o antigo primeiro-ministro Michel Rocard, a França seria realmente uma terra "bendita por Deus". Um "mito" totalmente construído pelo "lobby petroleiro e do gás", segundo a ex-ministra da Ecologia Corinne Lepage. [...]

Argumentos esses que tocam os membros do PS, onde alguns eleitos esperam que o governo amenize sua posição antes do fim do mandato. "Essa atitude de renegação seria politicamente suicida, segundo o eurodeputado Verde José Bové, na linha de frente do combate contra o gás de xisto [...]" (MOUCHON; BENEZET, Le Parisien, 14 November 2012MORTUREUX, M.-F. (éd.). La vulgarisation. Langue française, n.53. Paris: Larousse, 1982., p.02; nossa tradução)6 6 No original em francês: "Gaz de schiste: la tentation. Alors que l'ancien Premier ministre François Fillon estimait hier 'criminel' de s'interdire les recherches sur le gaz de schiste, le chef de l'état a rappelé que l'interdiction de la fracture hydraulique date de juillet 2011 et la présidence... de Nicolas Sarkozy. Si le sujet ressurgit, c'est que, depuis cet été, les pétroliers, repris par des élus, ont trouvé un argument de poids: cette manne pourrait relancer la croissance économique. 'Nous sommes les seuls au monde à refuser de chercher alors qu'on a peut-être sous nos pieds un trésor', fait valoir Jacques Sallibartant, président de l'Amicale des foreurs et des métiers du pétrole. Pour l'ancien Premier ministre Michel Rocard, la France serait même 'bénie des Dieux'. Un 'mythe' construit de toute pièce par 'le lobby pétrolier et gazier' selon l'ex-ministre de l'écologie Corinne Lepage. [...] Des arguments qui font mouche dans les rangs du PS où des élus espèrent que le gouvernement assouplira sa position d'ici la fin du quinquennat. 'Ce serait un reniement suicidaire politiquement', selon l'eurodéputé vert José Bové, fer de lance du combat antigaz de schiste [...]'". .

Não retomaremos aqui as diferentes formas de discurso relatado e o intertexto "plurilogal" que caracterizam alguns textos jornalísticos. Abordaremos, antes, a maneira como esse gênero textual "faz dialogar", no texto, discursos produzidos em esferas de atividade que se afrontam, como se a intenção fosse reproduzir o que se vê na televisão e o que se ouve nas rádios, nos debates, embora haja o risco de que esse "diálogo" se faça entre locutores que nunca se encontrariam no espaço público. Por conseguinte, é possível que esse gênero textual tenha se desenvolvido sob a influência das mídias oral e audiovisual (esse tipo de gênero pode ser encontrado em todos os jornais franceses, de Libération a Le Figaro), do mesmo modo que o gênero "entrevista dialogada" se desenvolveu na imprensa, por influência das primeiras entrevistas radiofônicas. É ainda mais provável que o surgimento da web 2.0 tenha causado impacto no desenvolvimento desse gênero textual, por ser um lugar onde o público pode responder às perguntas que lhe são feitas: na França, podemos citar os exemplos do jornal Le Parisien ou do canal de televisão BFM TV, que apresentam diariamente aos seus públicos uma "pergunta do dia" (la question du jour).

Enquanto linguistas, podemos, portanto, observar, além dos discursos dos que participam dos debates, o lugar ocupado pelo jornalista da imprensa, o modo como este se inscreve no fio do texto enquanto "moderador" do debate, o que se dá através da seleção, feita pelo redator, de sequências "relatadas", e, principalmente, do modo como estas últimas são delimitadas e designadas como sendo, por exemplo, "argumentos"... Mas também através do modo como ele as caracteriza (argumento de peso; argumentos que tocam) ou situa sua origem (construído pelo lobby petroleiro e do gás; na linha de frente do combate contra o gás de xisto). Abaixo, podemos visualizar a chegada dessas novas figuras, sobretudo oriundas da esfera política, na comunicação científica:

Esquema 2
Introdução de novas figuras da divulgação científica.

Enquanto especialistas do texto, podemos, então, questionar "o sentido" dessas marcas metalinguageiras e perguntar, "sem levar em conta a narração de palavras", de que forma elas funcionam ao lado de outros marcadores de heterogeneidade mostrada (como os verba dicendi, que introduzem os discursos das esferas antagônicas) e como elas articulam "as proposições ou as sequências textuais ao seu início, ao seu fim ou ao seu exterior" (VÉRINE, 2005TODOROV, T. Mikhaïl Bakhtine, le principe dialogique. Paris: Seuil, 1981., p.12; nossa tradução)7 7 No original em francês: "les propositions ou les séquences textuelles à leur amont, à leur aval ou à leur ailleurs". . Assim, por exemplo, no momento da publicação de um estudo sobre ratos que foram alimentados com milho transgênico durante dois anos, foi possível identificar, na imprensa, marcas dessa fraseologia particular, mas também metáforas que as caracterizam:

Ex. 6

Alimentar ratos durante dois anos com milho transgênico lhes é fatal [..](NOUALHAT, Libération, 20 September 2012NOUALHAT, L. OGM: gros dégâts chez les rats. Libération, Terre, Paris, p.19- 20 Sept. 2012., p.19).

Verdadeira bomba que relança o debate sobre os transgênicos

A publicação reavivou o debate [...] (NOUALHAT, Libération, 20 September 2012NOUALHAT, L. OGM: gros dégâts chez les rats. Libération, Terre, Paris, p.19- 20 Sept. 2012., p.19).

Um barril de pólvora... O estudo do Prof. Gilles-Éric Séralini [...] reacendeu o debate (DEMEY, Le Journal du dimanche, 23 September 2012DEMEY, J. OGM, le débat empoisonné. Le Journal du dimanche, Société, Paris, 23 Sept. 2012. Disponible: [http://www.lejdd.fr/Societe/Actualite/OGM-le-debat-empoisonne-559388]. Consulté le 15 Jan. 2016.
http://www.lejdd.fr/Societe/Actualite/OG...
, online) ( nossa tradução)8 8 No original em francês: "Nourrir des rats pendant deux ans avec du maïs transgénique leur est fatal"; "Véritable bombe qui relance le débat sur les OGM"; "La publication a ravivé le débat"; "Une traînée de poudre... L'étude du Pr Gilles-Éric Séralini... a rallumé le débat". .

Enquanto especialistas em análise da mídia, podemos ainda questionar a forma como essas controvérsias são anunciadas no paratexto midiático (a instância editorial), desde o título da primeira página, das páginas internas ou das páginas duplas, até os subtítulos, entretítulos e elementos destacados:

Ex. 7

Transgênicos: o debate envenenado

Transgênicos ou fome?

Transgênicos: os argumentos, verdadeiros ou falsos, do Prof. Gilles-Éric Séralini

A favor ou contra os transgênicos? (nossa tradução)9 9 No original em francês: "OGM: le débat empoisonné "; "L'OGM ou la faim?"; "OGM: les vrais ou les faux arguments du Pr Gilles-Éric Séralini"; "Pour ou contre les OGM?".

Podemos, enfim, questionar as razões que levam o artigo de informação a evoluir em sua "genericidade", bem como o lugar que ele ocupa na diversidade dos gêneros que são coproduzidos por um órgão de imprensa sobre um mesmo acontecimento, quando esse acontecimento se torna fonte de controvérsias. Para tanto, é preciso que a reflexão se estenda à história da imprensa e à história da sociedade em que vivemos e evoluímos, não, apenas, em seu aspecto tecnológico (fator que certamente influencia; ver, abaixo, seção 3), mas, também, em razão do tipo de "democracia" que se constrói.

Se quisermos abordar essa questão pelo viés da história da imprensa, podemos retomar, como fez o professor universitário alemão E. U. Grosse, o desenvolvimento da imprensa francesa, onde a opinião e o debate aparecem juntamente com a informação: "A Revolução Francesa e a sua influência no período napoleônico e, mais tarde, nas revoltas e revoluções que ocorreram nos países situados ao redor da França, criaram uma imprensa onde a opinião e o debate aparecem ao lado da informação" (GROSSE, 2000GROSSE, E.U. Évolution et typologie des genres journalistiques. Semen, Besançon, n.13, p.25-36, 2000., p.25; nossa tradução)10 10 No original em francês: "La Révolution française et son rayonnement dans l'époque napoléonienne et, plus tard, dans les révoltes et révolutions qui ont lieu dans les pays situés autour de la France crée une presse où l'opinion et le débat apparaissent à côté de l'information". . Podemos também comparar a imprensa francesa atual com as imprensas dos países do Norte da Europa ou da Suíça, onde a cultura do consenso é mais desenvolvida do que na França.

Não haveria também uma cultura do confronto, específica à sociedade francesa, que se manifesta, seja qual for o objeto de enfrentamento, desde a Revolução Francesa, até mesmo no uso que se faz das palavras "droite" ("direita") e "gauche" ("esquerda")? De fato, essas palavras, que eram, no início, unicamente utilizadas para exprimir a lateralidade, passaram a designar, em seguida, os deputados que, durante a Assembleia revolucionária, enfrentavam-se em torno do eventual direito de veto do rei: à direita do presidente de sessão, estavam os partidários de uma monarquia forte; à sua esquerda, os defensores de um regime de monarquia constitucional. Com o passar do tempo, essas palavras serviram de "receptáculo" das divisões e das oposições existentes na sociedade francesa: no século XIX, a oposição entre a direita e a esquerda refletia politicamente a oposição fundamental, existente então na sociedade, entre os valores do Antigo Regime e os direitos adquiridos durante a Revolução Francesa; uma vez consolidado o regime republicano, essas palavras passaram a fazer referência a outras divisões da sociedade, como a oposição entre o clericalismo e a laicidade, ou entre o liberalismo econômico e o coletivismo. Assim, desde 1789, a oposição entre a direita e a esquerda estrutura o campo político francês, o que pode ser explicado pela capacidade dessas palavras em tornar visível o confronto entre pessoas e ideias em oposição, seja qual for o contexto. Da importância dada a essa oposição, emerge uma das características da cultura política francesa: essa divisão da vida política em duas grandes tendências contrárias revela que os membros da sociedade francesa precisam organizar o campo da política em função de um quadro democrático que implica posições conflituosas e necessariamente opostas (RIBEIRO, 2015_______. Montrer les mots. In: PAISSA, P.; RIGAT, F.; VITTOZ, M.-B. (éds). Hommage à Mariagrazia Margarito. Alessandria: Edizioni dell'Orso, à paraître.)11 11 Ao comparar os discursos de Le Monde sobre a eleição presidencial de 2007 na França com os discursos de O Estado de S. Paulo sobre a eleição presidencial de 2002 no Brasil, foram observadas diferenças no uso das palavras da oposição ("droite/gauche"; "direita/esquerda"): enquanto no jornal francês, as palavras contribuem para tornar o conflito eleitoral mais inteligível, ao se referirem a categorias distintas que se enfrentam, no jornal paulista, elas não desempenham o mesmo papel, já que, no contexto brasileiro, a redução do acontecimento eleitoral a essa oposição é impossível (RIBEIRO, 2015). . Isso nos autoriza, finalmente, a pensar que existiria, na França, uma "cultura do confronto", que transformaria qualquer debate público - um acontecimento não só eleitoral, mas também científico - em objeto de controvérsias.

De qualquer forma, parece-nos que as observações, que podem ser feitas sobre o papel desse novo "gênero" de texto informativo na imprensa, devem entrar em relação com as teorias de Bakhtin (Volóchinov) que concebe a enunciação como "uma estrutura puramente social" e se propõe a dar uma "orientação sociológica" ao "fenômeno de transmissão da palavra de outrem" (2006, p.130 e p.145). Se, como afirma Todorov sobre os textos de Bakthin e Volochínov (1981, p.96)SERIOT, P. Généraliser l'unique: genres, types et sphères chez Bakhtine. Linx, Nanterre, n.56, p.37-53, 2007., a intertextualidade pertence ao discurso e não à língua, parece que, nesse caso, os gêneros discursivos se distinguem pelos níveis observados na presença do discurso de outrem, bem como pelo papel que desempenham na representação das relações entre diferentes esferas de atividade. Além disso, os gêneros discursivos se formam e se transformam sob a influência conjunta das evoluções sociais, políticas e tecnológicas.

Há, no entanto, uma esfera que parece ser menos representada do que as outras: a esfera do público. O público não tem sua palavra autorizada e só aparece, na imprensa e na mídia, através de entrevistas, cartas de leitores, quando solicitado por telefone ou correio eletrônico... Ou por intermédio das redes sociais e dos tweets. Diante desse novo contexto, em que o público passa da instância interpretativa, que é apenas passiva, para a instância interpretativa/participativa e a instância produtiva, podemos perguntar como esses novos meios de comunicação (Internet e web 2.0) modificam o espaço da difusão das ciências e as relações entre as diferentes esferas de atividade. É o que abordaremos a seguir.

3 A divulgação científica na Internet: novas configurações discursivas?

Vários são os lugares que se dedicam à divulgação científica na Internet: revistas disponíveis em bancas criaram seus próprios sites12 12 Ao começarem, esses sites eram, apenas, uma versão digital do suporte impresso; eles foram evoluindo com o tempo: Ciel et Espace, 1945; Cosinus, 1999; Pour la Science, 1977; La Recherche, 1970 [1946]; Science et Avenir, 1947; Science et Vie, 1913, etc. , e sites, sem publicação impressa anterior, foram concebidos para o suporte digital13 13 Futura sciences, le savoir s'invite chez vous; Universcience.tv, a Web TV científica semanal da Cité des sciences et de l'industrie e do Palais de la découverte, etc. . Pareceu-nos, então, que a divulgação científica, ao introduzir novas figuras (ver esquema acima) e apresentar-se na Internet através dos sites, já havia explorado todas as esferas de atividade linguageira. O que percebemos, no entanto, foi uma reviravolta inesperada, com o surgimento de um novo espaço de transmissão de conhecimentos: a divulgação científica agora também emerge de "blogs científicos"14 14 Alguns blogs científicos na França {Sciences}2, http://sciences.blogs.liberation.fr/ Chroniques de l'espace-temps, http://espace-temps.blogs.nouvelobs.com/ Science étonnante, https://sciencetonnante.wordpress.com/ Pascal Lapointe, http://www.sciencepresse.qc.ca/users/plapointe Le cosmographe, http://www.lecosmographe.com/blog La galaxie de Florence Porcelle, http://www.florenceporcel.com/ Culture volcan, http://laculturevolcan.blogspot.com/ Le dinoblog, http://www.dinosauria.org/blog Pourquoi le ciel est bleu, http://pourquoilecielestbleu.cafe-sciences.org/ Guy Doyen, http://guydoyen.fr/ , através de uma nova figura, a do amador.

Hoje, o número de blogs científicos aumentou. Uma classificação desses blogs foi, aliás, realizada, tendo em conta vários parâmetros15 15 Teads: http://fr.labs.teads.tv/top-blogs/sciences. (como a rede de links do blog, constituída a partir de outros blogs; o compartilhamento de artigos no Facebook, no Twitter, etc.).

3.1 A intervenção de uma nova figura na divulgação científica: o amador

O estudo dos discursos da Internet (MOURLHON-DALLIES et al., 2004MOURLHON-DALLIES; F., RAKOTONOELINA, F.; REBOUL-TOURE, S. (éds). Les discours de l'internet: nouveaux corpus, nouveaux modèles?Les Carnets du Cediscor, n.8. Paris: Presses Sorbonne Nouvelle, 2004.) evidenciou, no início dos anos 2000, a demultiplicação das páginas pessoais na Internet, páginas essas onde os internautas intervinham para falar do que lhes interessava. Devido à facilidade para criar sites, surgiram, então, nessa mesma linha, os blogs: segundo o dicionário de língua francesa Le Robert, o blog é um "site na Internet animado por um indivíduo ou uma comunidade que se exprime regularmente em um jornal, artigos"16 16 No original em francês: "Site Internet animé par un individu ou une communauté qui s'exprime régulièrement dans un journal, des billets", Le Petit Robert (2011). . Esses artigos (ou posts) são organizados de forma cronologicamente inversa: espera-se, portanto, que haja certa periodicidade e ritmo na escrita. Links hipertextuais são também visíveis, mas o que, principalmente, caracteriza o blog é a possibilidade de interação do visitante: de fato, os leitores não são mais simples leitores; eles são convidados a reagir, a fazer comentários.

Esses novos blogueiros contribuem para o "crescimento potencial dos amadores" (RIEFFEL, 2014RIBEIRO M. P. "Droite" et "gauche" dans les discours d'un événement électoral. Une étude sémantique et contrastive des presses brésilienne et française. 2015. 2 vol. Thèse en sciences du langage. Université Sorbonne nouvelle, Paris.), que participam do movimento de ampliação das competências e dos saberes, competências e saberes que têm a ver com uma espécie de autoaprendizagem, pois, ao contrário das hierarquias escolares, nenhum diploma é exigido:

Descobrimos, assim, um mundo que é, no mínimo, complexo, forjado segundo modalidades inéditas de aprendizagem dos conhecimentos, constituído por interações em rede dentro de comunidades virtuais, por procedimentos muito variados de hibridez e de busca insistente, que ora abalam os métodos tradicionais de aquisição dos saberes ora ficam claramente ao lado ou à margem das atividades tradicionalmente mais legítimas. Eis, aqui, um quadro típico de inovação ascendente, oriunda do povo e não mais das elites, que são celebradas por todos os fundadores da web.(RIEFFEL, 2014RIBEIRO M. P. "Droite" et "gauche" dans les discours d'un événement électoral. Une étude sémantique et contrastive des presses brésilienne et française. 2015. 2 vol. Thèse en sciences du langage. Université Sorbonne nouvelle, Paris., p.128; nossa tradução)17 17 No original em francês: "On découvre ainsi un monde pour le moins complexe, forgé selon des modalités inédites d'apprentissage des connaissances, constitué d'échanges en réseau au sein de communautés virtuelles, de procédures d'hybridation et de braconnage très variées qui soit ébranlent les processus traditionnels d'acquisition des savoirs, soit se situent carrément à côté ou en marge des activités traditionnellement les plus légitimes. Nous sommes ici typiquement dans le cadre de l'innovation ascendante, venue du peuple et non plus des élites, célébrées par tous les fondateurs du web". .

Na blogosfera, identificamos, portanto, blogueiros científicos que transmitem conhecimentos para outros internautas. É o que ilustra a estrutura reflexiva do esquema (3):

Esquema 3
Novas circulações para a divulgação científica na Internet.

A liberdade proporcionada pela Internet permite, assim, que amadores se tornem "atores" da divulgação científica ao se dirigirem a outros internautas, como destaca, de modo geral, P. Flichy (2010FLICHY, P. Le sacre de l'amateur: Sociologie des passions à l'ère numérique. Paris: Seuil-La République des idées, 2010.):

Indivíduos comuns conquistaram a Internet. [...] Na França, Wikipédia reúne um milhão de artigos, e foram criados dez milhões de blogs. Um quarto dos internautas já assinou uma petição na Internet. Esses números ilustram um fenômeno essencial: a web contemporânea se transformou no mundo dos amadores. [...]

Da mesma forma que vivemos, nos últimos dois séculos, uma dupla democratização, ao mesmo tempo política e escolar, também estamos entrando em uma nova era de democratização, a democratização das competências (FLICHY, 2010FLICHY, P. Le sacre de l'amateur: Sociologie des passions à l'ère numérique. Paris: Seuil-La République des idées, 2010., p.7; nossa tradução)18 18 No original em francês: "Les quidams ont conquis Internet. [...] En France, Wikipédia réunit un million d'articles, et dix millions de blogs ont été créés. Un quart des internautes a déjà signé une pétition en ligne. Ces quelques chiffres illustrent un phénomène essentiel : le web contemporain est devenu le monde des amateurs. [...] De même que nous avons vécu depuis deux siècles une double démocratisation, à la fois politique et scolaire, de même nous entrons dans une nouvelle ère de démocratisation, celle des compétences". .

Constatamos, portanto, o desaparecimento do divulgador enquanto tal, que pode ser substituído por um amador. Aqui, podemos falar de uma redistribuição dos polos na divulgação científica e do aparecimento de uma "desintermediação":

As novas tecnologias digitais geram, em graus diferentes, uma perda dos marcos tradicionais em matéria de cultura, fato esse que apoia a emergência de um fenômeno considerável: o fim (ou, pelo menos, a diminuição da influência) dos mediadores e dos intermediários (ou seja, a "desintermediação", no jargão dos especialistas). [...] A partir do momento em que todos podem a priori experimentar e criar, graças aos novos suportes e ferramentas digitais [...], o papel dos profissionais e dos especialistas diminui de importância. [...] Ora, podemos realmente imaginar uma democracia sem "corpos intermediários"; podemos transmitir uma cultura sem contextualização e sem uma verdadeira hierarquização? (RIEFFEL, 2014RIBEIRO M. P. "Droite" et "gauche" dans les discours d'un événement électoral. Une étude sémantique et contrastive des presses brésilienne et française. 2015. 2 vol. Thèse en sciences du langage. Université Sorbonne nouvelle, Paris., p.265-266; nossa tradução)19 19 No original em francês: "Les nouvelles technologies numériques engendrent à des degrés divers, une perte des repères traditionnels en matière culturelle qui conforte l'émergence d'un phénomène majeur : la fin (ou du moins la diminution de l'influence) des médiateurs et des intermédiaires (la 'désintermédiation' dans le jargon des spécialistes). [...] A partir du moment où tout le monde peut a priori expérimenter et créer grâce aux nouveaux supports et outils numériques [...], le rôle des professionnels et des experts perd de son importance. [...] Or peut-on véritablement imaginer une démocratie sans corps intermédiaires, peut-on transmettre une culture sans contextualisation et sans véritable hiérarchisation?".

A presença da "desintermediação" é visível nos blogs científicos, mas também em sites onde o internauta pode fazer sua pergunta diretamente para um especialista. Essas novas figuras que intervêm na esfera de transmissão de conhecimentos científicos fazem convergir formas linguageiras já existentes (artigo, carta de leitores, discussão/ debate), mas essas formas tomam outra dimensão com o suporte digital (multimídia, hipertextos, um elemento da carta de leitores que se resume em um clique, o "like") ou com a transferência do artigo para outra rede com vistas à difusão. Assim, os amadores proporcionam novas combinações de escrita e de leitura ao intervirem na transmissão de conhecimentos e ao promoverem a convergência de formas discursivas que, até então, apresentavam-se separadamente. Eles estão, portanto, na origem de novas circulações discursivas que participam da criação dessas formas inéditas e contribuem para a transmissão dos conhecimentos. De acordo com Flichy:

No processo de democratização das competências que está no centro da atividade do amador, não há, de um lado, os "sábios", especialistas, e, de outro, os que recolhem informações; há uma construção comum da ciência e de seus savoir-faire. Trata-se, portanto, de elaborar o que a corrente interacionista da Sociologia das Ciências chama de um "objeto-fronteira", adaptado aos amadores e especialistas (2010, p.79; nossa tradução)20 20 No original em francês: "Dans le processus de démocratisation des compétences qui est au coeur de l'activité amateur, il n'y a pas d'un côté, les savants, et de l'autre, les ramasseurs d'information ; il y a une construction commune de la science et de ses savoir-faire. Il s'agit donc d'élaborer ce que le courant interactionniste de la sociologie des sciences appelle un 'objet-frontière', adapté aux amateurs et aux experts". .

O amador teria, assim, um papel importante na transmissão dos conhecimentos.

3.2 A multiplicação do discurso do outro

A intervenção do amador no circuito da divulgação científica, por intermédio de blogs, gera circulações discursivas particulares. Abordaremos aqui as questões do duplo dialogismo, já delimitada nos anos 1980, e da "traçabilidade" do discurso relatado nos artigos de blogs, especialmente no que diz respeito às marcas linguísticas identificadas nos discursos do blogueiro. Do lado do leitor/escritor, novos discursos vão surgir, como os comentários que sucedem à publicação dos artigos, e/ou o encaminhamento desses textos para outras redes, com vistas a uma maior difusão.

3.2.1 Duas formas de dialogismo

A passagem de um discurso científico para um discurso vulgarizado, de um discurso-fonte para um discurso segundo, produz heterogeneidade discursiva. Podemos observar, no discurso de divulgação, o discurso da ciência. De fato:

nos textos da D.C. [divulgação científica], são aspas duplas que correm paralelamente sobre palavras "científicas" (eu falo com palavras de especialistas, sabendo bem que não são as palavras de vocês leitores) e sobre palavras correntes (eu falo com as suas palavras de todos os dias, sabendo bem que não são as palavras da Ciência). [...]

É, então, ora a palavra científica que é designada como corpo estrangeiro relativamente à "língua" suposta do receptor, ora, ao contrário, as palavras familiares que suscitam uma tomada de distanciamento em relação à "língua" científica (AUTHIER-REVUZ, 1998, p.118).

Essa característica linguística do discurso de divulgação está presente nos artigos dos blogs científicos. Podemos, portanto, partir das bolhas de champanhe para chegar ao gás carbônico:

Ex. 8

A primeira coisa que se deve saber é que, como para a maioria das bebidas gasosas, as bolhas de champanhe são bolhas de gás carbônico, o famoso CO2. Esse gás carbônico é produzido diretamente da reação que transforma o açúcar em álcool, o que chamamos de fermentação alcoólica. Essa reação é produzida graças às leveduras e ao açúcar que são acrescentados ao vinho de champanhe (que inicialmente não faz estalos!) (Science étonnante; nossa tradução)21 21 No original em francês: "La première chose à savoir, c'est que comme pour la plupart des boissons gazeuses, les bulles du champagne sont des bulles de gaz carbonique, le fameux CO2. Ce gaz carbonique est un produit direct de la réaction qui transforme le sucre en alcool, ce qu'on appelle la fermentation alcoolique. Cette réaction se produit grâce aux levures et au sucre que l'on ajoute au vin de champagne (qui initialement ne pétille pas!)." .

Destacamos aqui, portanto, duas formas de dialogismo, como ressalta J. Authier-Revuz:

O que as numerosas análises do círculo de Bakhtin destacam é o quanto o discurso do "eu" é sempre marcado pela "voz do outro" [...].

O "falar pelos outros" proclamado nos textos de D.C. é a outra das duas formas de dialogismo, vistas na lente de aumento da explicitação sistemática: o divulgador, com as palavras dos dois, fala para - no lugar do um, científico, e fala para - na intenção do outro, público; é, pois, um discurso marcado por esta dupla determinação (1998, p.122).

3.2.2 A "traçabilidade" do discurso relatado

Poderíamos falar, em seguida, de "discursos folheados", pois existem inúmeras "camadas" de discursos relatados. De fato, ao relatarem as palavras dos especialistas, os blogueiros podem utilizar os links hipertextuais para situar outra vez o discurso relatado no seu contexto. Essa particularidade, proporcionada pelo suporte digital, permite a "traçabilidade" dos discursos oriundos do exterior, sendo uma garantia de cientificidade (mesmo sem citação ou referência bibliográfica, as fontes são citadas, uma vez que o texto inteiro é posto à disposição do leitor). Existem, portanto, inúmeras "camadas", já que é preciso sair da página onde se encontra o artigo para obter o contexto do discurso relatado, em outro estrato da Internet.

Os links hipertextuais podem ser encontrados em diferentes formas de discurso relatado, como a modalização em discurso segundo (segundo X...):

Ex. 9

Mas os oceanógrafos não estavam completamente certos, já que outro fator, um pequeno reaquecimento aparente nas estatísticas, ajudara a fabricar esse "hiato". Fabricar, pois, como mostra o estudo publicado na revista Science [...] ({Sciences}2; nossa tradução)22 22 No original em francês: "Mais les océanographes n'avaient pas entièrement raison, car un autre facteur était venu fabriquer ce 'hiatus', un moindre réchauffement apparent dans les statistiques. Fabriquer, car, comme le montre l'analyse publiée dans la revue Science [...] ". ;

ou em verbos de fala:

Ex. 10

Contatada, nessa ocasião, por Arrêt sur Images, a direção do CNRS parece não ter adotado, a tempo, as medidas necessárias para parar a divulgação de um documento presumidamente confidencial, como confirmou a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) no início de novembro do mesmo ano (La science au XXIe siècle; nossa tradução)23 23 No original em francês: "Contactée à cette occasion par Arrêt sur Images, la direction du CNRS ne semble pas avoir adopté en temps utile des mesures de nature à arrêter la divulgation d'un document censé être confidentiel comme la Commission d'Accès aux Documents Administratifs (CADA) l'a confirmé début novembre de la même année". .

ou ainda, nos advérbios "ici" e "" ("aqui" e "lá") (REBOUL-TOURÉ, 2004REBOUL-TOURE, S. Le transgénique et le citoyen dans la presse écrite. Diffusion de termes spécialisés et discours plurilogal. Les Carnets du Cediscor, Paris, n.6, p.99-111, 2000.; no prelo). Portanto, o discurso citado pode ser, nesses casos, lido integralmente. Essa traçabilidade se apresenta como uma garantia de seriedade: o blogueiro pode não apenas citar, mas também mostrar as suas fontes.

3.2.3 Um discurso "comentado"

A estrutura do blog convida os leitores a deixar um comentário depois de um artigo. É possível que não haja nenhuma resposta, ou apenas alguns comentários. Mas se o artigo gerar polêmica, os comentários podem, nesse caso, ultrapassar a centena, já que os "comentadores" discutem não mais com o blogueiro diretamente, mas entre eles mesmos. É o que ocorre, por exemplo, no site {Sciences}2, de Sylvestre Huet, jornalista científico em Libération:


Tem-se aqui, portanto, uma forma de diálogo: um diálogo com o autor ou, ainda, um "diálogo", uma conversa, entre os comentadores.

3.2.4 Um discurso "difundido"

A circulação dos discursos segue novos caminhos, e alguns artigos podem ter uma repercussão importante, em razão dos dispositivos associados a essa nova liberdade de escrita dos internautas, que podem contribuir para a circulação de um artigo através das redes sociais, Facebook, Twitter, Tumblr, etc. Cada blogueiro escolhe as suas redes para fazer a divulgação, e os leitores podem difundir um artigo que, ao passar por outras redes, vai ao encontro de novos leitores, o que demonstra a fluência da comunidade.

3.3 O blog científico: um gênero novo?

A Internet certamente contribui para o surgimento de novas esferas de atividade humana. Ora, a esfera é o primeiro aspecto do gênero destacado por Bakhtin (GRILLO, 2007GRILLO, S. V. C. Épistémologie et genres du discours dans le cercle de Bakhtine. Linx, Nanterre, n.56, p.19-36, 2007., p.24). Por outro lado,

Se, como diz Bakhtin, cada esfera da atividade humana tem o seu próprio repertório de gêneros, com suas normas de funcionamento, é normal que se assista a uma reconstituição dos repertórios, à medida que forem surgindo novas atividades ou que forem evoluindo certas práticas professionais, ligadas, muitas vezes, à evolução dos suportes (na mídia, com a Internet, com o aparecimento dos "gratuitos"...). Uma comunidade linguageira (noção que preferimos à de esfera...) dispõe, assim, de um repertório genérico que não é fixo, mas evolutivo; é o caso das comunidades linguageiras profissionais que pertencem ao mundo social da mídia (MOIRAND, 2007_______. Quelles catégories descriptives pour la mise au jour des genres du discours?Texte édité sur le site du GRIC (UMR ICAR), université Lyon 2-Lumière et ENS-LSH, 2003. Disponible sur: [http://gric.univ-lyon2.fr/Equipe1/actes/journees_genre.htm] Consulté le 15 Jan. 2016.
http://gric.univ-lyon2.fr/Equipe1/actes/...
, p.92-93; nossa tradução)24 24 No original em francês: "Si, comme le dit Bakhtine, chaque sphère de l'activité humaine a son propre répertoire de genres, avec ses normes de fonctionnement, il est normal qu'au fur et à mesure du surgissement de nouvelles activités ou de l'évolution de certaines pratiques professionnelles, liées souvent à l'évolution des supports (dans les médias, avec l'internet, avec l'apparition des 'gratuits'...), on assiste à une reconstitution des répertoires. C'est ainsi qu'une communauté langagière (notion que l'on substitue à celle de sphère...) dispose d'un répertoire générique non pas fixe mais évolutif, et c'est le cas des communautés langagières professionnelles qui appartiennent au monde social des médias". .

Em uma esfera como a midiática, espera-se o aparecimento de novos gêneros, já que "a questão do suporte se tornou um componente essencial da reflexão sobre os gêneros" (BRANCA-ROSOFF, 2007_______. Genres et activité langagière: l'exemple des tchats. Linx, Nanterre, n.56, p.127-141, 2007., p.137; nossa tradução)25 25 No original em francês: "la question du support est devenue une composante essentielle de la réflexion sur les genres". . O blog pode fazer parte dessa reflexão, em especial por causa de sua nova denominação, que nomeia uma realidade, até então, inexistente. A criação lexical de "blogueur" ("blogueiro"), para designar o internauta, autor dos artigos, valida linguisticamente uma comunidade linguageira, bem como a ação de "bloguer" ("blogar"), que "cristaliza a tomada de consciência de que se trata de uma nova atividade linguageira" (BRANCA-ROSOFF, 2007, p.132; nossa tradução)26 26 No original em francês: "cristallise la prise de conscience qu'il s'agit d'une nouvelle activité langagière" , pois não existia, até então, essa forma de diário de bordo. Essas são as determinações externas do gênero.

Em outro nível, onde as determinações externas do gênero se articulam a certas formas linguísticas internas, podemos isolar o que define um blog científico:

Se procuramos articular formas linguísticas e funcionamentos sociais, situamo-nos no nível de gêneros menores [...]. A lista renova-se com as práticas sociais: uma modificação da finalidade do discurso, dos estatutos dos parceiros ou do tempo e do lugar da comunicação, do suporte material, das condições de aprendizagem das formas textuais, etc., ocasiona, no fim, uma modificação das rotinas empregadas pelos locutores para a execução de suas tarefas. O procedimento de análise [...] [consiste] em privilegiar as categorias que estabilizam formas de associação entre formas de ação (papéis discursivos, tarefas cognitivas), conteúdos e maneiras de dizer (dispositivos de enunciação, novas denominações [...] etc.) (BRANCA-ROSOFF, 2004, p.252-253).

De fato, o blog científico se serve de formas linguísticas particulares, como, por exemplo, a reformulação (ver REBOUL-TOURE, 2014_______. Écrire la vulgarisation scientifique aujourd'hui. In: Colloque Sciences, Médias et Société. Lyon: ENS-LSH, 2004. Disponible sur: [http://sciences-medias.ens-lyon.fr/article.php3?id_article=65] Consulté le 26 Jan. 2016.
http://sciences-medias.ens-lyon.fr/artic...
), que caracteriza o discurso da divulgação científica. Nele também encontramos definições e questionamentos sobre a denominação científica. Mas o blog pode sair desse quadro, indo além das formas da divulgação científica, ao utilizar sequências diferentes, como um recurso humorístico ou um elemento (uma imagem, um desenho, um texto breve) destinado a chamar a atenção sobre um fato da atualidade. Aparecem, então, os comentários deixados pelos leitores/ escritores: um misto de discursos "ordinários" e especializados, que representa, enfim, uma oportunidade para questionar a "permeabilidade das fronteiras entre o ordinário e o especializado" (RAKOTONOELINA (Ed.) 2014PAVEAU, M.-A. Ce qui s'écrit dans les univers numériques. Matières techno-langagières et formes technodiscursives. Preprint, article pour la revue Itinéraires, dossier sur les "textualités numériques", Villetaneuse, 19p., 2013. Disponible sur: [https://hal.archives-ouvertes.fr/hal-00990029] Consulté le 15 Jan. 2016.
https://hal.archives-ouvertes.fr/hal-009...
). E por que não falar, nesse caso, de gênero híbrido?

Consideração final

A mistura dos discursos nessas novas esferas vai além do desdobramento da enunciação, e a multiplicação das interações discursivas convida-nos a retomar aqui o conceito de "hibridez discursiva" 27 27 Noção proposta por Gambier e Suomela-Salmi (2011) que poderia ser revisitada e entrar no quadro da análise do discurso. , para reagrupar o conjunto dos discursos, colocados em rede em torno, por exemplo, dos artigos de um blog científico. Esse conceito, que é "menos técnico do que o de heterogeneidade enunciativa, [...] dá conta da diversidade das vozes presente em um gênero monologal", permitindo integrar "a multimodalidade de certas produções ou interações" (MOIRAND, 2014b_______. L'hétérogénéité énonciative au fil du texte: la représentation des controverses dans les genres de l'information de la presse quotidienne. Arena Romanistica, Bergen, n.14, p. 140-164, 2014a., p.144; nossa tradução)28 28 No original em francês: "Ce concept "moins technique que celui d'hétérogénéité énonciative, [...] rend compte de la diversité des voix présente dans un genre monologal" et permet d'intégrer "la multimodalité de certaines productions ou interactions". . Esse conceito também permite integrar a noção de "tecnologia discursiva", que é "o conjunto dos processos de discursivização da língua em um ambiente tecnológico"; "um dispositivo em que a produção discursiva está intrinsecamente ligada a ferramentas tecnológicas" (PAVEAU, 2015PAVEAU, M.-A. Ce qui s'écrit dans les univers numériques. Matières techno-langagières et formes technodiscursives. Preprint, article pour la revue Itinéraires, dossier sur les "textualités numériques", Villetaneuse, 19p., 2013. Disponible sur: [https://hal.archives-ouvertes.fr/hal-00990029] Consulté le 15 Jan. 2016.
https://hal.archives-ouvertes.fr/hal-009...
, p.3; nossa tradução)29 29 No original em francês: "La technologie discursive est l'ensemble des processus de mise en discours de la langue dans un environnement technologique. C'est un dispositif au sein duquel la production discursive est intrinsèquement liée à des outils technologiques". . Enquanto inovação tecnológica, a Internet dá origem, portanto, a novas esferas de atividade linguageira em que se desenvolvem novos gêneros, que são, sem dúvida, híbridos, como é o caso do "blog científico", que mais se parece com um blog de divulgação científica.

  • Traduzido do francês por Michele Pordeus Ribeiro - michelepordeus@yahoo.fr
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    No original em francês: "Il n'y a plus deux acteurs, les scientifiques et le public, mais au moins quatre, la science, la politique, la communication et les publics; et chacun est lui-même souvent divisé en plusieurs sous-groupes". Todas as traduções dos excertos de textos em francês citados neste artigo são de responsabilidade das autoras.
  • 2
    No original em francês: "Les constantes interactions entre les genres [...] se développent dans les processus d'absorption d'un genre par d'autres et dans l'entrecroisement de ces genres".
  • 3
    Sobre a noção de esfera proposta por Bakhtin (Volochínov), ver o texto de S. Grillo (2007)GRILLO, S. V. C. Épistémologie et genres du discours dans le cercle de Bakhtine. Linx, Nanterre, n.56, p.19-36, 2007., bem como o de P. Sériot (2007)SERIOT, P. Généraliser l'unique: genres, types et sphères chez Bakhtine. Linx, Nanterre, n.56, p.37-53, 2007. em Linx, n.56.
  • 4
    No original em francês: "Hall-Bopp passe au plus près du Soleil. La nuit de la Comète. Comment la trouver? Facile, vous diront les astronomes: elle se situe au nord-ouest, à environ 25 degrés au-dessus de l'horizon. Oui, mais comment trouver le nord-ouest? Trois solutions: vous possédez une boussole, le problème est réglé. Vous n'en possédez pas. Repérez l'endroit où se trouve le soleil".
  • 5
    "Affaires", em francês.
  • 6
    No original em francês: "Gaz de schiste: la tentation. Alors que l'ancien Premier ministre François Fillon estimait hier 'criminel' de s'interdire les recherches sur le gaz de schiste, le chef de l'état a rappelé que l'interdiction de la fracture hydraulique date de juillet 2011 et la présidence... de Nicolas Sarkozy. Si le sujet ressurgit, c'est que, depuis cet été, les pétroliers, repris par des élus, ont trouvé un argument de poids: cette manne pourrait relancer la croissance économique. 'Nous sommes les seuls au monde à refuser de chercher alors qu'on a peut-être sous nos pieds un trésor', fait valoir Jacques Sallibartant, président de l'Amicale des foreurs et des métiers du pétrole. Pour l'ancien Premier ministre Michel Rocard, la France serait même 'bénie des Dieux'. Un 'mythe' construit de toute pièce par 'le lobby pétrolier et gazier' selon l'ex-ministre de l'écologie Corinne Lepage. [...] Des arguments qui font mouche dans les rangs du PSdes élus espèrent que le gouvernement assouplira sa position d'ici la fin du quinquennat. 'Ce serait un reniement suicidaire politiquement', selon l'eurodéputé vert José Bové, fer de lance du combat antigaz de schiste [...]'".
  • 7
    No original em francês: "les propositions ou les séquences textuelles à leur amont, à leur aval ou à leur ailleurs".
  • 8
    No original em francês: "Nourrir des rats pendant deux ans avec du maïs transgénique leur est fatal"; "Véritable bombe qui relance le débat sur les OGM"; "La publication a ravivé le débat"; "Une traînée de poudre... L'étude du Pr Gilles-Éric Séralini... a rallumé le débat".
  • 9
    No original em francês: "OGM: le débat empoisonné "; "L'OGM ou la faim?"; "OGM: les vrais ou les faux arguments du Pr Gilles-Éric Séralini"; "Pour ou contre les OGM?".
  • 10
    No original em francês: "La Révolution française et son rayonnement dans l'époque napoléonienne et, plus tard, dans les révoltes et révolutions qui ont lieu dans les pays situés autour de la France crée une presse où l'opinion et le débat apparaissent à côté de l'information".
  • 11
    Ao comparar os discursos de Le Monde sobre a eleição presidencial de 2007 na França com os discursos de O Estado de S. Paulo sobre a eleição presidencial de 2002 no Brasil, foram observadas diferenças no uso das palavras da oposição ("droite/gauche"; "direita/esquerda"): enquanto no jornal francês, as palavras contribuem para tornar o conflito eleitoral mais inteligível, ao se referirem a categorias distintas que se enfrentam, no jornal paulista, elas não desempenham o mesmo papel, já que, no contexto brasileiro, a redução do acontecimento eleitoral a essa oposição é impossível (RIBEIRO, 2015RIBEIRO M. P. "Droite" et "gauche" dans les discours d'un événement électoral. Une étude sémantique et contrastive des presses brésilienne et française. 2015. 2 vol. Thèse en sciences du langage. Université Sorbonne nouvelle, Paris.).
  • 12
    Ao começarem, esses sites eram, apenas, uma versão digital do suporte impresso; eles foram evoluindo com o tempo: Ciel et Espace, 1945; Cosinus, 1999; Pour la Science, 1977; La Recherche, 1970 [1946]; Science et Avenir, 1947; Science et Vie, 1913, etc.
  • 13
    Futura sciences, le savoir s'invite chez vous; Universcience.tv, a Web TV científica semanal da Cité des sciences et de l'industrie e do Palais de la découverte, etc.
  • 14
    Alguns blogs científicos na França {Sciences}2, http://sciences.blogs.liberation.fr/
    Chroniques de l'espace-temps, http://espace-temps.blogs.nouvelobs.com/
    La galaxie de Florence Porcelle, http://www.florenceporcel.com/
  • 15
  • 16
    No original em francês: "Site Internet animé par un individu ou une communauté qui s'exprime régulièrement dans un journal, des billets", Le Petit Robert (2011).
  • 17
    No original em francês: "On découvre ainsi un monde pour le moins complexe, forgé selon des modalités inédites d'apprentissage des connaissances, constitué d'échanges en réseau au sein de communautés virtuelles, de procédures d'hybridation et de braconnage très variées qui soit ébranlent les processus traditionnels d'acquisition des savoirs, soit se situent carrément à côté ou en marge des activités traditionnellement les plus légitimes. Nous sommes ici typiquement dans le cadre de l'innovation ascendante, venue du peuple et non plus des élites, célébrées par tous les fondateurs du web".
  • 18
    No original em francês: "Les quidams ont conquis Internet. [...] En France, Wikipédia réunit un million d'articles, et dix millions de blogs ont été créés. Un quart des internautes a déjà signé une pétition en ligne. Ces quelques chiffres illustrent un phénomène essentiel : le web contemporain est devenu le monde des amateurs. [...] De même que nous avons vécu depuis deux siècles une double démocratisation, à la fois politique et scolaire, de même nous entrons dans une nouvelle ère de démocratisation, celle des compétences".
  • 19
    No original em francês: "Les nouvelles technologies numériques engendrent à des degrés divers, une perte des repères traditionnels en matière culturelle qui conforte l'émergence d'un phénomène majeur : la fin (ou du moins la diminution de l'influence) des médiateurs et des intermédiaires (la 'désintermédiation' dans le jargon des spécialistes). [...] A partir du moment où tout le monde peut a priori expérimenter et créer grâce aux nouveaux supports et outils numériques [...], le rôle des professionnels et des experts perd de son importance. [...] Or peut-on véritablement imaginer une démocratie sans corps intermédiaires, peut-on transmettre une culture sans contextualisation et sans véritable hiérarchisation?".
  • 20
    No original em francês: "Dans le processus de démocratisation des compétences qui est au coeur de l'activité amateur, il n'y a pas d'un côté, les savants, et de l'autre, les ramasseurs d'information ; il y a une construction commune de la science et de ses savoir-faire. Il s'agit donc d'élaborer ce que le courant interactionniste de la sociologie des sciences appelle un 'objet-frontière', adapté aux amateurs et aux experts".
  • 21
    No original em francês: "La première chose à savoir, c'est que comme pour la plupart des boissons gazeuses, les bulles du champagne sont des bulles de gaz carbonique, le fameux CO2. Ce gaz carbonique est un produit direct de la réaction qui transforme le sucre en alcool, ce qu'on appelle la fermentation alcoolique. Cette réaction se produit grâce aux levures et au sucre que l'on ajoute au vin de champagne (qui initialement ne pétille pas!)."
  • 22
    No original em francês: "Mais les océanographes n'avaient pas entièrement raison, car un autre facteur était venu fabriquer ce 'hiatus', un moindre réchauffement apparent dans les statistiques. Fabriquer, car, comme le montre l'analyse publiée dans la revue Science [...] ".
  • 23
    No original em francês: "Contactée à cette occasion par Arrêt sur Images, la direction du CNRS ne semble pas avoir adopté en temps utile des mesures de nature à arrêter la divulgation d'un document censé être confidentiel comme la Commission d'Accès aux Documents Administratifs (CADA) l'a confirmé début novembre de la même année".
  • 24
    No original em francês: "Si, comme le dit Bakhtine, chaque sphère de l'activité humaine a son propre répertoire de genres, avec ses normes de fonctionnement, il est normal qu'au fur et à mesure du surgissement de nouvelles activités ou de l'évolution de certaines pratiques professionnelles, liées souvent à l'évolution des supports (dans les médias, avec l'internet, avec l'apparition des 'gratuits'...), on assiste à une reconstitution des répertoires. C'est ainsi qu'une communauté langagière (notion que l'on substitue à celle de sphère...) dispose d'un répertoire générique non pas fixe mais évolutif, et c'est le cas des communautés langagières professionnelles qui appartiennent au monde social des médias".
  • 25
    No original em francês: "la question du support est devenue une composante essentielle de la réflexion sur les genres".
  • 26
    No original em francês: "cristallise la prise de conscience qu'il s'agit d'une nouvelle activité langagière"
  • 27
    Noção proposta por Gambier e Suomela-Salmi (2011) que poderia ser revisitada e entrar no quadro da análise do discurso.
  • 28
    No original em francês: "Ce concept "moins technique que celui d'hétérogénéité énonciative, [...] rend compte de la diversité des voix présente dans un genre monologal" et permet d'intégrer "la multimodalité de certaines productions ou interactions".
  • 29
    No original em francês: "La technologie discursive est l'ensemble des processus de mise en discours de la langue dans un environnement technologique. C'est un dispositif au sein duquel la production discursive est intrinsèquement liée à des outils technologiques".

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    13 Jul 2015
  • Aceito
    27 Jan 2016
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