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O tonto e o louco. Notas sobre a cena cultural contemporânea

RESUMO

Em seu livro Cultura e explosão, no qual analisa a dinâmica cultural, Lotman utiliza as figuras do “tonto” e do “louco” como termos paradigmáticos de atitudes humanas que encarnam as formas de mudança social. Imersos no espaço de uma semiosfera, os atos humanos ganham significado em relação à totalidade desse universo. O autor propõe considerar a estrutura ternária tonto/inteligente/louco como um continuum que permite visualizar graus de adequação individual e coletiva à norma. Neste texto, sintetizarei a múltipla descrição de Lotman a ela acrescentando meus comentários e alguns exemplos, em especial da figura do tonto e do louco em diferentes espaços representativos. Estou particularmente interessada em defender a possibilidade de encontrar certas mudanças de paradigma por meio da leitura de textos da cultura contemporânea, ou melhor, certas manifestações complexas da loucura e da estupidez, cuja tradução se torna difícil para mim, sem que seja frequentemente o resultado de um juízo de valor.

PALAVRAS-CHAVE:
Lotman; Louco; Tonto: Norma; Mudança social; Cultura contemporânea

ABSTRACT

In his book Culture and Explosion, Lotman studies the dynamics of culture using thefool and the madman as paradigm characters incarnating social change. Immersed in the space of a semiosphere, human acts gain meaning only in the context of the particular universe they take place in, when understood as a whole. Lotman invites us to consider the ternary structure fool/smart/crazy as a continuum where we can gauge individual and collective adequacy to the norm. Here, I summarize Lotman’s multifaceted description through my own lens with the aid of some examples centered on the notion of the fool and the madman in some representative spaces. I am particularly interested in finding paradigm changes through the reading of contemporary texts, or better said, through some complex manifestations of madness and stupidity, which are difficult to translate accurately without a subjective assessment.

KEYWORDS:
Lotman; Madman; Fool; Norm; Social change; Contemporary culture

RESUMEN

En el libro Cultura y explosión, en el que Lotman analiza la dinámica cultural, emplea las figuras del “tonto” y del “loco” como paradigmas que encarnan las formas del cambio social. Inmersos en el espacio de una semiosfera, los actos cobran significación en relación con la totalidad de ese universo. Propone considerar la estructura ternaria tonto/inteligente/loco en tanto continuum que permite visibilizar grados de adecuación a la norma en lo individual y en lo colectivo. Sintetizaré la múltiple descripción de Lotman añadiendo mis comentarios y algunos ejemplos, en especial de la figura del tonto y del loco en diferentes espacios representativos. Me interesa plantear la posibilidad de encontrar ciertos cambios de paradigma leyendo textos de la cultura contemporánea o mejor dicho, ciertas manifestaciones complejas de la locura y la estupidez, que hacen difícil para mí su traducción sin que ella sea a menudo el resultado de un juicio de valor.

PALABRAS CLAVE:
Lotman; Loco; Tonto; Norma; Cambio social; Cultura contemporánea

Em seu denso livro Cultura y Explosión (1999), que dedica à análise da dinâmica cultural, Lotman utiliza as figuras do “tonto” e do “louco” como termos paradigmáticos de atitudes humanas que encarnam as formas de mudança social1 1 Obra não traduzida para o português. El tonto y el loco, em LOTMAN, Y.Cultura y explosión, Barcelona: Gedisa, 1999, cap. 8 (pp.61-95). O livro apareceu em 1992, meses antes do falecimento de Lotman (Kul’tura i vzryv, Moscú: Gnosis, 270 págs.). Traduzimos a edição em espanhol, citada no original. . Propõe considerar a estrutura ternária tonto/inteligente/louco, não no sentido médico, mas como um continuum que permite visualizar graus de adequação à norma cultural tanto individuais como coletivos, pois tais atitudes são parte de sistemas em circulação2 2 Creio ser interessante destacar que P. TOROP aponta a afinidade da proposta lotmaniana de ler uma conduta como texto cultural com a de C. GEERTZ em The Interpretation of Cultures (New York, 1973) [A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008; sem indicação de tradutor], embora não tenha havido contato direto entre ambos. TOROP cita GEERTZ: “[…] ´fazer etnografía´ deve significar uma tentativa de ler um manuscrito estranho, figurativo e incoerente no qual os signos gráficos da linguagem ordinária são substituídos por exemplos de comportamento. E, no marco desta concepção, a própria cultura descrita se converte em um ´documento atuante´ (acted document) que pode ser interpretado quando se comunica com ele” (TOROP, 2009/2010, pp.7-16; nossa tradução do espanhol). . Essas figuras foram tomadas à literatura e, nos textos que Lotman resgata, ele descobre modelos que em diferentes épocas foram considerados perfeição e agora, em nosso tempo, podem parecer condutas vulgares ou sem sentido:

Quando a experiência humana se torna cultura, estabelece regras que definem para o homem “programas” de comportamento. Esses programas permitem traduzir a experiência em textos e registrá-los em algumas das línguas dos mecanismos memorizantes para convertê-los em acontecimentos da cultura de uma época dada (ARAN; BAREI, 2002ARÁN, P. y BAREI, S. Texto/memoria/cultura. El pensamiento de Iuri Lotman. Córdoba: UNC, 2002., p.131)3 3 No original: “Cuando la experiencia humana se vuelve cultura, establece reglas que definen para el hombre “programas” de comportamiento. Esos programas permiten traducir la experiencia a textos y registrarlos en alguna de las lenguas de los mecanismos memorizantes para convertirlos en acontecimientos de la cultura de una época dada” (ARAN; BAREI, 2002, p.131). .

No entanto, não se trata de pensar acerca de fenômenos homogêneos, visto que podem ser incorporados em sujeitos individuais ou coletivos, ou em grupos sociais diferentes e compreender uma gama variada de matizes ou manifestações semióticas, como a moda extravagante ou as regras de cortejo feminino. Imersos no espaço de uma semiosfera, os atos particulares significam em relação com a totalidade desse universo e podem ser lidos como textos portadores de informação: constante em um caso, inovadora em outro. Digo podem ser lidos, ou melhor, podem ser traduzidos pelos códigos culturais de uma época de modo diverso e não unívoco. Perguntamo-nos: se o texto como espaço semiótico interage com outros textos da cultura, como interagem as figuras do louco e do tonto com textos da cultura na atualidade?, como traduzi-los já que, por definição, são figuras nas fronteiras da norma?

Tonto e louco em Lotman são termos estruturalmente opositivos, na medida em que um aparece em condutas previsíveis em relação com a norma imperante (legal, moral, social ou psicológica) enquanto o outro, ao não permitir a previsão, aumenta a informatividade do sistema e abre possibilidades desconhecidas. Ambos os efeitos são aqueles que determinam a mobilidade do sistema cultural, como aponta o subtítulo da obra: Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social (itálicos no original) [O previsível e o imprevisível nos processos de mudança social]4 4 Nota do tradutor para a versão em inglês deste artigo: “Este subtítulo foi incluído na tradução espanhola, publicada por Gedisa, em 1999”. . Isso significa que dão sentido a microuniversos fractais de uma totalidade e permitem pensar, por um lado, em fases de repetição e estabilidade e, por outro, em um estado explosivo e inovador, fases que podem se suceder, ser sincrônicas ou mesmo se interseccionar, porque isto é parte das contradições estruturais:

A cultura, enquanto um conjunto complexo, é formada por estratos que se desenvolvem em velocidades diversas, de modo que qualquer corte sincrônico mostra a simultânea presença de vários estados. As explosões em alguns estratos podem se combinar com um desenvolvimento gradual em outros. Isso, porém, não exclui sua interação (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.26)5 5 La cultura, en tanto conjunto complejo, está formada por estratos que se desarrollan a diversa velocidad, de modo que cualquier corte sincrónico muestra la simultánea presencia de varios estados. Las explosiones en algunos estratos pueden unirse a un desarrollo gradual en otros. Esto, sin embargo, no excluye su interacción (LOTMAN, 1999, p.26). .

O tonto é o sujeito que, frente às situações em que deve atuar, parece estar sempre “fora de lugar”, como costumamos dizer, não responde às convenções porque não sabe ou não pode fazê-lo e, ao reiterar sistematicamente esse comportamento, torna-se previsível e também, em minha interpretação, inofensivo e invisível na cena social. O inteligente é aquele que, embora seja previsível, ele o é porque adapta seu comportamento à lei e à norma em uso e pensa como se espera que pense, ainda que seja apenas hipocrisia social. E o louco é aquele que, segundo Lotman, exercita a faculdade da livre escolha de seu comportamento, tornando-a extrema, imprevisível, qualidade que em si mesma é destrutiva, mas que, em situações de conflito, pode mostrar sua eficácia. Interessante pensar que um ato contrário à razão será loucura heroica se tem êxito, ou idiotice se fracassa. O cinema hollywoodiano usa sempre esses artifícios, especialmente em filmes bélicos ou de façanhas esportivas, nos quais, contra toda a razão, um personagem empreende uma ação que triunfa diante de um inimigo poderoso. E esse costuma ser o estereótipo de todos os filmes em que o protagonista tem de passar pelas provas do herói, perdendo algumas que são objeto de logro e ganhando a última por seu valor ou por sua astúcia.

Apresentadas assim as modalidades básicas6 6 Ambos papéis sociais envolvem uma série de matizes semânticos e idiomáticos no uso cotidiano. Podem mudar as denominações do tonto, tais como: sonso, estúpido, idiota, ou ainda mais desqualificadoras ou discriminatórias, como anormal e tarado; ou também, no caso do louco: extravagante, desaforado, extremo, radical (há “esportes radicais” que estão na moda), superdotado, gênio, maravilhoso, incrível. Cada um envolve uma valoração do que qualifica ou sanciona: assim a ternura destes “locos bajitos” de SERRAT (1995), ou a defesa da mãe de Forrest Gump (1994), “tolo é quem faz tolices”. Podem se multiplicar os exemplos e cada língua tem os seus, alguns efêmeros e da moda e outros privativos de certos grupos sociais, mas entendo que Lotman prefere termos mais neutros para evitar a ênfase valorativa, já que lhe interessa o modelo cultural que revelam. , Lotman descreve diferentes variantes estruturais de épocas (em especial da Idade Média), situações e tipologias, ilustrando-as com exemplos literários ou históricos. Pode ser um herói que leve ao limite seu potencial e incorpore o imaginário de toda uma comunidade: “[...] um herói de tal tipo, para ser sempre vencedor, deve dominar atividades comuns a todos, mas em formas quantitativamente hipertróficas” (1999, p.62)LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999. 7 7 No espanhol: “[...] un héroe de tal tipo, entonces, para ser siempre vencedor, debe dominar actividades comunes a todos, pero en formas cuantitativamente hipertróficas” (1999, p.62). . É o mundo dos gigantes. Evidentemente hoje os super-heróis, como Batman, Spiderman ou Superman (majoritariamente masculinos), que fazem as delícias da imaginação infantil e do merchandising, mais que hipertrofia física do herói legendário, exibem o poder daquele que o dotou da tecnologia, quase sempre associada à natureza (a energia solar, a aranha, o morcego), ou alguma mutação genética e, ainda que sua vestimenta seja funcional, chamativa e que ele nem sempre seja um humanoide, permanece o portador de um mandato planetário moralmente regulado.

Outro ideal heroico próprio do folclore é o triunfo do fraco que substitui com astúcia e inteligência a falta de força e que recorda a cena de Ulisses e o Ciclope. Em tempos mais próximos de nós, uma película colombiana, La estrategia del caracol [A estratégia do caracol] (CABRERA, 1993), resgata o engenho coletivo que se coloca em ação: diante do desalojamento abusivo, pessoas humildes abandonam a casa em cumprimento da lei, mas ao mesmo tempo levam a casa consigo e a trasladam sigilosamente, deixando só o exterior. Não é demais recordar aqui as reflexões de M. de CERTEAU (1996)8 8 DE CERTEAU, M. A invenção do cotidiano. Artes de fazer. Nova edição, estabelecida e apresentada por Luce Giard. Tradução Ephraim Ferreira Alves. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1998. acerca de táticas do fraco como formas de resistência às estratégias do poder, do mesmo modo que Bakhtin (1994)9 9 BAKHTIN, M. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento. O contexto de François Rabelais. Trad. Yara Frateschi. 4. ed. São Paulo-Brasília: Edunb-HUCITEC, 1999. o havia feito, referindo-se à cultura cômica popular que inverte a hierarquia e a ordem impostas pela sociedade feudal. Grande ou pequeno, o engenho é um modo de transformação social, imprevisível e transgressor, que é “eficaz porque tira o adversário da situação habitual para ele” (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.63)10 10 No espanhol: “eficaz porque saca al adversario de la situación habitual para él” (LOTMAN, 1999, p.63). .

Mas também pode suceder o contrário: que a liberdade quase irracional do indivíduo ou de um grupo seja aproveitada para desorientar o inimigo. Ainda que se costume comparar a violência desconcertante da “loucura bélica” com formas de comportamento animal, segundo Lotman isto é uma interpretação errada, visto que os comportamentos animais imprevisíveis são muito limitados e menos ainda em situações de perigo. Em contrapartida, o comportamento louco do ser humano é uma arma poderosa que “se baseia numa base psicológica comum: a criação de circunstâncias nas quais o inimigo perde a orientação” (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.65)11 11 No espanhol: “se funda en una base psicológica común: la creación de circunstancias en las cuales el enemigo pierde la orientación” (LOTMAN, 1999, p.65). . São abundantes hoje os tristes exemplos de massacres inesperados levados a cabo individualmente por um jovem armado em colégios ou universidades ou, em outro extremo, ataques suicidas em lugares públicos por fanáticos membros de organizações fundamentalistas. São formas de loucura bélica em nosso cenário contemporâneo cujos efeitos vão muito além do imediato e se traduzem em medo, suspeita e fechamento de fronteiras a todo aquele que possa parecer culturalmente alheio ou diferente. Processos de desumanização programados pelos sistemas religiosos, econômicos ou políticos dominantes, que mostram o paradoxo de una loucura racional, mas não estúpida (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.65) e, por isso mesmo, signos do funcionamento de um sistema no espaço semiótico.

Não escapam à sua sagacidade as dificuldades que costumam se apresentar para caracterizar um ato como louco ou estúpido, por exemplo, o tema literário da loucura amorosa de Don Quixote, incompreensível aos olhos de Sancho, pois se impõe um sacrifício sem haver sido desdenhado por Dulcinea, apenas pelo fato de que o amor cavalheiresco é uma escala até a perfeição. Sancho utiliza o senso comum, a lógica cotidiana e, em sua simplicidade, vê que a loucura de seu amo é pura imitação do que sucede nas novelas de cavalaria: “Não é a literatura que copia a vida, mas a vida que aspira a reproduzir a literatura. Daí o absurdo do comportamento do cavaleiro como norma da vida cotidiana” (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.72). Diferentemente de Sancho, hoje para nós é mais difícil separar ficções e realidades cotidianas, imersos que estamos no espaço da globalidade virtual.

Lotman pensa que quando os atos disparatados de um personagem como Quixote passam à vida cotidiana e se naturalizam, tornam-se pura imitação e deixam de ser em si mesmo explosivos para se tornar “um fato de cultura de massas”. E por isso afirma:

A norma não tem marcas distintivas. É um ponto que carece de extensão entre o tonto e o louco. Tampouco a explosão tem marcas: mais exatamente possui toda uma série de marcas virtuais. Em sua qualidade de comportamento individual se destaca da norma e neste caso se define como loucura; tornando-se cultura de massa se define como uma forma de estupidez (1999, p.70)LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999. 12 12 No espanhol: “La norma no tiene marcas distintivas. Es un punto que carece de extensión entre el tonto y el loco. Tampoco la explosión tiene marcas: más exactamente posee toda una serie de marcas virtuales. En su cualidad de comportamiento individual se destaca de la norma y en este caso se define como locura; volviéndose masivo se define como estupidez” (1999, p.70). .

Outro exemplo interessante é Nero, cuja vida, narrada por Suetônio, mostra de que maneira tratava de imitar-se a si mesmo em montagens teatrais, transformando toda Roma em parte do espetáculo, dando rédea solta a seus excessos e perversidades morais, como também o faria Ivan, o Terrível.

Essa questão permite a Lotman desenvolver uma reflexão interessante sobre as relações entre vida e teatro, pois o teatro como imitação constitui, para Tolstoi, por exemplo, uma espécie de loucura, já que os atores simulam (no teatro de sua época) não ver os espectadores. Como sabemos, em nossa época esta fronteira entre viver e atuar, ou mostrar-se publicamente, quase desapareceu. Até a teatralização, em termos da espetacularidade, se generalizou e invadiu todos os espaços sociais. “O grande público prefere ver atores e não personagens”, diz acertadamente MOLINARI (2018)MOLINARI, B. Un voto de confianza, en La voz del Interior, suplemento VOS, viernes 25 de mayo de 2018., referindo-se ao estado do teatro independente em Córdoba, porque mais que ir ver uma obra prefere-se ver o ator da moda. Basta pensar no papel de ator que adquiriu a imagem do político e de seu discurso difundido pela televisão, com os perfis midiáticos configurados pelos assessores, em que nenhum detalhe é descuidado, desde a maquiagem, a vestimenta, os gestos, as palavras e os silêncios. Filmar-se com uma selfie e postar esses filmes/fotos nas redes permite o minuto da atuação disponível pela tecnologia ao homem comum. E quanto à adoção pela massa do comportamento excêntrico de algum indivíduo socialmente notável - esportista, músico, cantor ou personagem do mundo do espetáculo -, o fato transforma em estupidez o que era transgressivo em termos lotmanianos. E hoje, como sabemos, qualquer estupidez “se viraliza” nas redes sociais.

Outro ideal medieval de comportamento apontado por Lotman era regulado pelas ideias da “honra” e da “glória”, a primeira como signo material que outorgava um lugar social e que podia ser dispensado ou retirado (El Cid é um exemplo claro); a glória, pelo contrário, é um signo verbal que se ouve, se transmite, se difunde e é medida por sua duração. Este valor duplo atribuído ao comportamento perdura com variantes em nossa cultura. Assim podemos dizer “glória eterna aos heróis da Malvinas”13 13 N.T.: “Gloria eterna a los héroes de Malvinas” é uma expressão comum usada pela comunidade argentina como resultado do conflito no Atlântico Sul entre a Argentina e o Reino Unido, conflito conhecido como Guerra das Malvinas (ou das Falkland, como são chamadas as ilhas pelos britânicos). , reforçando não apenas o conceito de duração ilimitada dessas mortes jovens sem lhes juntar um matiz de religiosidade, de vida eterna. Nosso Hino Nacional argentino “coroados de glória vivamos ou juremos com glória morrer”, no qual a glória se conquista e se defende com a liberdade, e incluso canções escolares evocando paradigmas da civilidade (“Glória e louvor, honra sem par, [...] patrono da classe, Sarmiento imortal”)14 14 N.T.: “Gloria y loor, honra sin par, [...] padre del aula, Sarmiento inmortal”. Domingo Faustino Sarmiento Albarracín (1811-1888) foi um jornalista, escritor e sétimo presidente da Argentina (1868-1874). no qual honra e glória são formas da memória coletiva.

Voltando à literatura, Lotman argumenta que, enquanto a ruptura da norma é o trivial no modelo romântico, o alcance da norma, que é o valor absoluto (do herói, do santo, do cavaleiro), é o modelo quase inalcançável da Idade Média, modelo que apenas se cumpre na invenção literária como forma ideal, e que Cervantes ridiculariza porque só um louco pode querer cumpri-las. E faz uma interessante observação metodológica: não é suficiente investigar a norma nos textos reais da Idade Média, mas deve-se descobri-la em outras estruturas sociais, onde esteja formulada como metatexto em forma de regras, ensinamentos ou tratados teóricos.

Nesse sentido, cabe perguntar-se a origem da norma: a multidão no período romântico, que por isso a desdenha, o soberano ou Deus na Idade Média, que por isso é inalcançável. Costumo perceber que, no espaço cultural onde vivo, a norma social se escreve ou se dita a partir do Estado, da escola, da família ou do costume, mas a norma não escrita ou não dita, de origem incerta e quase nunca inocente, gera situações entrópicas e um equilíbrio sempre instável entre um saber e um fazer. Como propõe Lotman teoricamente, deve-se buscá-la em outros espaços transversais, em nosso caso, por exemplo, nas estruturas onde se gera e circula a informação, um metatexto incessante de alcance global que, em diferentes traduções, produz fissuras no modelo cultural desejado ou herdado e imprime outro ritmo, outra direção às mudanças nos comportamentos previsíveis.

De forma concomitante, hoje a norma também é ditada pelo mercado, no sentido de que nada é inalcançável, ainda que não seja razoável nem valioso para o homem. Arrisco a ideia de que isso vá gerando formas de resistência e de memória em bolsões culturais, que começaram a pensar na recuperação de aspectos biológicos da espécie humana como modelo coletivo a alcançar, imitando antigas culturas que se regem por dinâmicas dos ciclos naturais, como magma para nova fase de explosão. O previsível não pode gerar entropia? Não era esse aspecto que Bakhtin interpretava nos rituais carnavalescos quando a celebração dos ciclos era geradora de nova informação captada criativamente por Rabelais?

Nos dias de hoje, o rito da celebração do solstício de inverno, quase esquecido ou próprio de pequenas comunidades étnicas, tem muitos seguidores em vários países e regiões da América Latina. E enquanto o imprevisível da explosão tecnoinformática se busca criativamente em muitas zonas planetárias, recuperar o cíclico como princípio de produção de nova informação é outra possibilidade que torna a codificar velhos textos e a dotá-los de outra significação em novos contextos de interação. Não será isto, me pergunto, associado ao movimento ocidental de empoderamento da mulher, modelo que tem sido sempre naturalizado em termos culturais e que agora busca “criar janelas em certo estrato semiótico” (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.42)15 15 No espanhol: “crear ventanas en cierto estrato semiótico” (LOTMAN, 1999, p.42). ? Faz-se necessário citar extensamente Lotman em um parágrafo que inspira minhas reflexões:

Se se renuncia aos juízos de valor, então temos diante de nós dois aspectos de um mesmo processo, reciprocamente indispensáveis que continuamente se sucedem um ao outro na unidade do desenvolvimento dinâmico. A complexidade contraditória do processo histórico ativa ou uma ou outra forma. No momento atual, no âmbito da civilização europeia (incluídas América e Rússia), se assiste a um descrédito geral da ideia de explosão. A humanidade tem vivido entre os séculos XVIII e XX um processo que pode descrever-se como realização de uma metáfora; os processos socioculturais se encontram sob o influxo da imagem da explosão não como conceito filosófico, mas em sua correlação vulgar com a explosão da pólvora, da dinamite ou do núcleo atômico. A explosão como fenômeno físico, transferível apenas metaforicamente a outros processos, tem sido identificada pelo homem contemporâneo com ideais de devastação e tem se tornado símbolo de destruição. Mas se na base de nossas representações de hoje estivesse a associação com as épocas dos grandes descobrimentos, como o Renascimento, ou em geral com a arte, então o conceito de explosão evocaria para nós fenômenos como o nascimento de uma nova criatura vivente ou qualquer outra transformação criativa da estrutura da vida (1999, p.22-23)16 16 No espanhol: “Si se renuncia a los juicios de valor, entonces nos hallamos frente a dos aspectos de un mismo proceso, recíprocamente indispensables y que continuamente se suceden el uno al otro en la unidad del desarrollo dinámico. La complejidad contradictoria del proceso histórico activa ya sea una u otra forma. En el momento actual, en el ámbito de la civilización europea (incluidas América y Rusia), se asiste a un descrédito general de la idea de explosión. La humanidad ha vivido entre los siglos XVIII y XX un proceso que puede describirse como realización de una metáfora; los procesos socioculturales se encuentran bajo el influjo de la imagen de la explosión no como concepto filosófico, sino en su vulgar correlación con la explosión de la pólvora, de la dinamita o del núcleo atómico. La explosión como fenómeno físico, transferible solo metafóricamente a otros procesos, ha sido identificada por el hombre contemporáneo con ideas de devastación y se ha vuelto símbolo de destrucción. Pero si en la base de nuestras representaciones de hoy estuviera la asociación con las épocas de los grandes descubrimientos, como el Renacimiento, o en general con el arte, entonces el concepto de explosión evocaría en nosotros fenómenos como el nacimiento de una nueva criatura viviente o cualquier otra transformación creativa de la estructura de la vida” (1999, p.22-23). .

Esta profunda exposição me leva a considerar a problemática da temporalidade em Lotman associada ao estudo da história. É uma questão filosófica desvelada na última etapa de sua produção e à qual, em outra oportunidade, dediquei um longo trabalho àquilo que caracterizei como “metamorfoses culturais”, associando-as à figura matriz da literatura fantástica, já que a arte é o grande condensador cronotópico (ARÁN, 2014ARÁN, P. Metamorfosis culturales. Ciencia, historia y arte en la última producción de Lotman. En Lotman. In memoriam, Facultad de Lenguas: UNC, 2014, pp.163-175.). À noção espacial de semiosfera (que sintetiza todo um período de buscas), ele acrescenta, nos últimos anos, a noção de temporalidade, que na realidade nunca esteve totalmente ausente de sua teoria, seja no conceito de memória seja como o desenvolvimento das tipologias. Mas até o final de sua vida, essa questão tomará uma direção mais orientada aos processos de mudança histórica e às formas políticas adotadas pela cultura russa contemporânea.

A ideia de explosão está ligada à de imprevisibilidade e esta última à de azar ou casualidade, visto que, em seu conceito, a lógica historicista herdada de Hegel atendia apenas os fatos efetivamente sucedidos sem reparar nas inumeráveis possibilidades abertas por um fato explosivo; e sem se perguntar, em contraposição, pelo não sucedido, como se a lógica linear causa-efeito fosse a única possível. Por que não pensar que cada momento realizado esteve rodeado de outros que não aconteceram? E que o realizado foi obra da casualidade e fonte inesperada de outras transformações?

Em um universo pluridimensional (e, nesse sentido, é notória a influência de Prygogine), as direções possíveis não apenas não teriam de ser excluídas, mas deveriam buscar-se contrastivamente em outras formas culturais que o mesmo processo pudesse adotar em diferentes semiosferas, como sucede com variantes do Romantismo ou nas etapas que sucedem o Renascimento. Ou, de outro lado, comparar uma obra de arte com um processo econômico, reciprocamente intraduzíveis, mostra influências recíprocas, o que significa abrir-se não apenas a uma ideia de futuro não determinista, mas também a novas formas para ler o passado.

Cada processo histórico pode ler-se em duas dimensões, tanto do lado da previsibilidade como da imprevisibilidade; nesse sentido, o louco e o tonto, mais que termos opositivos com significações absolutas, são relacionais:

[...] são as duas rodas da bicicleta da história.

Temos afirmando que o homem que vive segundo os usos e as tradições, do ponto de vista do herói empreendedor da época explosiva, é estúpido: e este último, da posição de seu oponente, é infiel sem honra. Agora tem sentido ver estes personagens em conflito como os elos de uma única cadeia (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.87)17 17 Em espanhol: “[...] son las dos ruedas de la bicicleta de la historia”. Ya hemos dicho que el hombre que vive según los usos y las tradiciones, desde el punto de vista del héroe emprendedor de la época explosiva, es estúpido: y este último, desde la posición de su oponente, es infiel y sin honor. Ahora tiene sentido ver a estos personajes en conflicto como los anillos de una única cadena. (LOTMAN, 1999, p.87). .

E se compreende então de que modo os processos de desenvolvimento cultural modelam condutas que incorporam a arte e a literatura, aproximando-se esta ideia àquela que Bakhtin havia trabalhado como herói na novela de educação (1982)18 18 BAKHTIN, M. O romance de educação e sua importância na história do realismo. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 4.ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p.205-258. , embora em Bakhtin a concepção do papel do homem na história estivesse acentuado mais ideológica que antropologicamente.

A modelização das condutas que tomam forma na literatura me permite entrar em uma novela crua, que poderíamos chamar um observatório social de nosso tempo, e ver como os papéis actanciais do louco e do tonto funcionam em um microssistema. Cabe recordar que Lotman considera que a arte busca sempre novas línguas para traduzir as línguas da realidade, com as tensões consequentes que provoca. Fora de lugar, a novela do escritor argentino Martín Kohan (2016), apresenta uma modelização do mundo dos adultos em uma trama que tem muito do gênero do policial negro; no entanto, como o resto dos componentes formais e semânticos, tende a produzir constantemente a significação pelo atrito entre o desvio da norma em diferentes zonas de fronteira que remetem a tudo o que, a partir do olhar de certo observador, está “fora de lugar”, enquanto que, para outro, parece não estar. O mal-estar da contradição.

Basicamente se trata de um grupo de pessoas que empreendem o negócio de fotografar jovens pré-adolescentes, desvalidos, alojados em um asilo. Eles os fazem brincar nus, sem que haja nenhum assédio ou aproximação corporal, como uma cena natural, para vender pacotes de fotos o mais longe possível, aos países do Leste, contando com o exotismo dessas crianças morenas. O sucesso artístico das descrições verbais, reiteradas em mínima progressão, transforma a inocência dos corpos infantis brincando nus em algo repulsivo para o leitor, colocado em uma situação de voyeur. A história e a rede de negócio, que deve alterar sua rotina com a chegada de fotos digitais e de Internet, vai se ramificando espacialmente pelo território de maneira enigmática e vai gerando novas vítimas e vitimizadores, cujos aparentes suicídios deixam aberta uma trama sem solução.

Uma das crianças recrutadas por seu tio para o negócio tem um raro problema de desenvolvimento, parece “distanciado”, mas seu relato, incoerente na aparência, contém as pistas do que está sucedendo, ainda que ninguém o escute19 19 Sem dúvida, aqui se pode ler uma homenagem ao famoso conto de Piglia, La loca y el relato del crimen [1975] (2017), e do mesmo modo, no sócio que cheio de dinheiro se suicida se lê o intertexto com o apontamento de Chekov para um conto: o homem que tendo ganhado uma grande soma no cassino chega em casa e se suicida, narrado por Piglia en Formas breves (1999). . E, por outro lado, o estranho suicídio do tio produz o final incerto do jovem familiar que decide, louca, heroica ou inocentemente, investigar por sua conta o enigma. Um tonto e um louco, um submetido, outro, livre e confiado, encontra a morte buscando a verdade. Eu me pergunto: onde tem origem a estupidez ou a loucura dos personagens desta novela imersos nesta rede? Com que regras podem ser medidos? Qual é a norma dominante e qual a subjacente? Que alcance tem a liberdade dos comportamentos?

No mundo apresentado dessa forma, a modelização social da conduta adulta e livre expressa como valores a alcançar não reconhece paradigmas estáveis, deslocada para as fronteiras, colocada em questão, é quase enigmática, motivo constante de debates; o ethos se realiza de modo mais subjetivo que social. Por exemplo, no caso das fotos: aqueles que as tomam como negócio, mas também como fato artístico, aqueles que as distribuem, aqueles que as compram para vê-las, sem que, em princípio, pareça haver delito sexual explícito, nem pornografia, salvo um negócio (clandestino) montado para abastecer uma demanda massiva. Em una sociedade capitalista, manifesta-se o que Marx chamara “o fetichismo da mercadoria”, isto é, a figura quase fantasmática do produto separado da ação dos produtores, operando quase com autonomia no mercado, sem sanção social.

Há um forte efeito semântico no desacomodamento dos valores, a ambiguidade do mal, as fronteiras sociais, espaciais, mentais, subsumidas no grande espaço da Internet, o lugar de onde tudo se pode ver sem ser visto; é a negativa de reconhecer nos próprios atos a perversão ou a cumplicidade, a sublinhar a inocência do olhar que é a estratégia das fotos de periódicos. Mas não é novela de denúncia, antes uma descrição descarnada, brutal, de um estado social; creio que, se há interpelação ao leitor, ela opera por desvio e substituição na responsabilidade do que cada um faz, transferindo-a sempre a outro. Diz seu autor: “Nesta novela [...] os que fazem coisas perversas as fazem de uma posição de absoluta certeza a respeito do correto, e em alguns casos, são até moralistas” (RAPACIOLI, 2016RAPACIOLI, J. Kohan Martín: “me interesa el carácter normal que puede tener lo atroz”, entrevista en Telam, sección Cultura, 18/03/2016. Disponible en [http://www.telam.com.ar/notas/201603/140102-martin-kohan-fuera-de-lugar-pedofilia-novela.html] Acceso 20/06/2018.
http://www.telam.com.ar/notas/201603/140...
).

Mas também há a perturbação como efeito de sentido que se produz ao lê-la em relação com outros textos do espaço sociossignificante, nos quais circulam de diferentes formas a questão da pornografia infantil, os abusos, o uso das redes sociais e a experiência cheia de medos e ameaças da sociedade contemporânea, mesmo quando parece que se está fazendo uso de toda liberdade. Uma sociedade eticamente opaca que nos interpela diariamente em suas múltiplas manifestações.

Toda semiosfera modeliza seus tontos e seus loucos, seus outros e seus normais, e isto varia segundo o ciclo da dinâmica em que está imersa. Onde vivo há duas expressões que me parecem significativas, uma é “fazer-se de tonto” [“hacerse el tonto”], a outra, “fazer-se de louco” [“hacerse el loco”]. Ambas envolvem hipocrisia ou astúcia para se fugir de uma responsabilidade, passivamente em um caso, ativamente no outro, por ação ou omissão. E, de modo concomitante, se diz: “se tornou louco”, “se tornou estúpido”, quando se quer destacar que inesperadamente alguém de conduta normal passa uma fronteira e comete um ato racionalmente incompreensível, como estado momentâneo ou passageiro.

Tampouco nas notícias do que acontece na cena internacional conseguimos discernir as diferenças. Observando os programas de comportamento de uma semiosfera global imposta pelos atores políticos e naturalizada pelos meios informativos: quem se faz de tonto? quem se tornou louco? Imersos nós também na rede, lemos todos os dias as notícias e perguntamos: nos fazemos de tontos ou estamos loucos?, quem é mais louco, o que faz uma muralha ou quem tenta cruzá-la?, o que vende armas ou o que assassina um montão de gente, os que cruzam o mar em um bote frágil para fugir do horror ou os que fecham os portos para não recebê-los?

Onde encontrar a liberdade do homem e que sentido tem exercitá-la? E se é verdade que no futuro a guerra ocorrerá entre robôs… em que lugar ficaremos para ver as fotos?

Diante do que sentimos como opacidade ou entropia em nossa experiência diária, Lotman sustenta que os estados de grande saturação semiótica têm que ser pensados como possibilidades que abrem caminhos novos e inesperados e que apenas a matriz de um modelo histórico linear (ou cíclico) nos leva a um final escatológico ou à repetição do mesmo. Afirma que os modelos binários conduzem somente à frustração, que costumam ser dispositivos políticos e negam a importância dos fragmentos de memória que são trasladados ao centro do sistema para gerar nova informação. O homem tende a reduzir as temporalidades explosivas e desordenadas às dinâmicas conhecidas, sem considerar uma terceira possibilidade, em um ponto extratemporal e não previsível. Neste livro testamentário20 20 “Em seus dois últimos livros La cultura e la esplosione, traduzido para o italiano por Caterina Valentino (Feltrinelli, 1993) e Cercare la strada, em tradução italiana de Nicoleta Marcialis (Marsilio, 1994), Lotman se entregou à invenção mais que em seus trabalhos anteriores, quase como que incitado pelo temor de não poder comunicar-nos todas as suas ideias. Podemos considerá-los como um testamento” (SEGRE, 2004). N.T.: Essas obras de Y. Lotman também não foram traduzidas para o português. , Cultura y explosión, que entrevimos apenas por uma de suas vias de acesso, mantém com firmeza e com beleza sua convicção, não apenas nos muitos caminhos que surgem da liberdade do homem, mas nas possibilidades da arte como transformação da experiência da realidade em semiósis ilimitadas:

Em lugar deste modelo, nós propomos outro, no qual a imprevisibilidade da explosão extratemporal se transforma constantemente, na consciência dos homens, na previsibilidade da dinâmica por ela gerada e vice-versa. O primeiro modelo pode metaforicamente representar o Senhor como um grande pedagogo que com uma maestria incomum demonstra (a quem?) um processo que conhece previamente. O segundo modelo pode ser ilustrado com a imagem de um criador-experimentador, que trabalhou em um grande experimento, cujos resultados são inesperados e imprevisíveis mesmo para ele mesmo. Desse ponto de vista, o universo é transformado em fonte inesgotável de informação, naquela Psiquê para quem lhe é próprio o logos que se acrescenta a si mesmo, de quem Heráclito falava.

Em suas buscas de uma nova língua, a arte não pode se esgotar nem tampouco pode esgotar a realidade que vai conhecendo (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.212-213)21 21 No espanhol: “En lugar de este modelo nosotros proponemos otro, en el cual la imprevisibilidad de la explosión extratemporal se transforma constantemente, en la conciencia de los hombres, en la previsibilidad de la dinámica por ella generada y viceversa. El primer modelo puede metafóricamente representarse al Señor como un gran pedagogo, el que con inusual maestría demuestra (¿a quién?) un proceso para él conocido previamente. El segundo modelo puede ser ilustrado con la imagen de un creador-experimentador, que ha trabajado en un gran experimento, cuyos resultados son para él mismo inesperados e imprevisibles. Una mirada tal transforma el universo en fuente inagotable de información, en aquella Psique a la que le es propio el logos que se acrecienta a sí mismo, de la que hablaba Heráclito (fragmento 112 en la traducción de M. A. Dynnik). En sus búsquedas de una nueva lengua, el arte no puede agotarse como tampoco puede agotarse la realidad que va conociendo” (Lotman, 1999, p.212-213). .

  • 1
    Obra não traduzida para o português. El tonto y el loco, em LOTMAN, Y.LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999.Cultura y explosión, Barcelona: Gedisa, 1999, cap. 8 (pp.61-95). O livro apareceu em 1992, meses antes do falecimento de Lotman (Kul’tura i vzryv, Moscú: Gnosis, 270 págs.). Traduzimos a edição em espanhol, citada no original.
  • 2
    Creio ser interessante destacar que P. TOROP aponta a afinidade da proposta lotmaniana de ler uma conduta como texto cultural com a de C. GEERTZ em The Interpretation of Cultures (New York, 1973) [A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008; sem indicação de tradutor], embora não tenha havido contato direto entre ambos. TOROP cita GEERTZ: “[…] ´fazer etnografía´ deve significar uma tentativa de ler um manuscrito estranho, figurativo e incoerente no qual os signos gráficos da linguagem ordinária são substituídos por exemplos de comportamento. E, no marco desta concepção, a própria cultura descrita se converte em um ´documento atuante´ (acted document) que pode ser interpretado quando se comunica com ele” (TOROP, 2009/2010TOROP, P. Semiótica de la cultura y cultura. Trad. del ruso E. Chávez Herrera y K. Kaldjärv. Entretextos, 14-15-16, 2009/2010. Fac. de Filosofía y Letras, Univ. de Granada, España. Recuperado en https://www.academia.edu/4160279/Semi%C3%B3tica_de_la_cultura_y_cultura_de_Peeter_Torop
    https://www.academia.edu/4160279/Semi%C3...
    , pp.7-16; nossa tradução do espanhol).
  • 3
    No original: “Cuando la experiencia humana se vuelve cultura, establece reglas que definen para el hombre “programas” de comportamiento. Esos programas permiten traducir la experiencia a textos y registrarlos en alguna de las lenguas de los mecanismos memorizantes para convertirlos en acontecimientos de la cultura de una época dada” (ARAN; BAREI, 2002ARÁN, P. y BAREI, S. Texto/memoria/cultura. El pensamiento de Iuri Lotman. Córdoba: UNC, 2002., p.131).
  • 4
    Nota do tradutor para a versão em inglês deste artigo: “Este subtítulo foi incluído na tradução espanhola, publicada por Gedisa, em 1999”.
  • 5
    La cultura, en tanto conjunto complejo, está formada por estratos que se desarrollan a diversa velocidad, de modo que cualquier corte sincrónico muestra la simultánea presencia de varios estados. Las explosiones en algunos estratos pueden unirse a un desarrollo gradual en otros. Esto, sin embargo, no excluye su interacción (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.26).
  • 6
    Ambos papéis sociais envolvem uma série de matizes semânticos e idiomáticos no uso cotidiano. Podem mudar as denominações do tonto, tais como: sonso, estúpido, idiota, ou ainda mais desqualificadoras ou discriminatórias, como anormal e tarado; ou também, no caso do louco: extravagante, desaforado, extremo, radical (há “esportes radicais” que estão na moda), superdotado, gênio, maravilhoso, incrível. Cada um envolve uma valoração do que qualifica ou sanciona: assim a ternura destes “locos bajitos” de SERRAT (1995), ou a defesa da mãe de Forrest Gump (1994), “tolo é quem faz tolices”. Podem se multiplicar os exemplos e cada língua tem os seus, alguns efêmeros e da moda e outros privativos de certos grupos sociais, mas entendo que Lotman prefere termos mais neutros para evitar a ênfase valorativa, já que lhe interessa o modelo cultural que revelam.
  • 7
    No espanhol: “[...] un héroe de tal tipo, entonces, para ser siempre vencedor, debe dominar actividades comunes a todos, pero en formas cuantitativamente hipertróficas” (1999, p.62).
  • 8
    DE CERTEAU, M. A invenção do cotidiano. Artes de fazer. Nova edição, estabelecida e apresentada por Luce Giard. Tradução Ephraim Ferreira Alves. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
  • 9
    BAKHTIN, M. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento. O contexto de François Rabelais. Trad. Yara Frateschi. 4. ed. São Paulo-Brasília: Edunb-HUCITEC, 1999.
  • 10
    No espanhol: “eficaz porque saca al adversario de la situación habitual para él” (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.63).
  • 11
    No espanhol: “se funda en una base psicológica común: la creación de circunstancias en las cuales el enemigo pierde la orientación” (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.65).
  • 12
    No espanhol: “La norma no tiene marcas distintivas. Es un punto que carece de extensión entre el tonto y el loco. Tampoco la explosión tiene marcas: más exactamente posee toda una serie de marcas virtuales. En su cualidad de comportamiento individual se destaca de la norma y en este caso se define como locura; volviéndose masivo se define como estupidez” (1999, p.70)LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999..
  • 13
    N.T.: “Gloria eterna a los héroes de Malvinas” é uma expressão comum usada pela comunidade argentina como resultado do conflito no Atlântico Sul entre a Argentina e o Reino Unido, conflito conhecido como Guerra das Malvinas (ou das Falkland, como são chamadas as ilhas pelos britânicos).
  • 14
    N.T.: “Gloria y loor, honra sin par, [...] padre del aula, Sarmiento inmortal”. Domingo Faustino Sarmiento Albarracín (1811-1888) foi um jornalista, escritor e sétimo presidente da Argentina (1868-1874).
  • 15
    No espanhol: “crear ventanas en cierto estrato semiótico” (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.42).
  • 16
    No espanhol: “Si se renuncia a los juicios de valor, entonces nos hallamos frente a dos aspectos de un mismo proceso, recíprocamente indispensables y que continuamente se suceden el uno al otro en la unidad del desarrollo dinámico. La complejidad contradictoria del proceso histórico activa ya sea una u otra forma. En el momento actual, en el ámbito de la civilización europea (incluidas América y Rusia), se asiste a un descrédito general de la idea de explosión. La humanidad ha vivido entre los siglos XVIII y XX un proceso que puede describirse como realización de una metáfora; los procesos socioculturales se encuentran bajo el influjo de la imagen de la explosión no como concepto filosófico, sino en su vulgar correlación con la explosión de la pólvora, de la dinamita o del núcleo atómico. La explosión como fenómeno físico, transferible solo metafóricamente a otros procesos, ha sido identificada por el hombre contemporáneo con ideas de devastación y se ha vuelto símbolo de destrucción. Pero si en la base de nuestras representaciones de hoy estuviera la asociación con las épocas de los grandes descubrimientos, como el Renacimiento, o en general con el arte, entonces el concepto de explosión evocaría en nosotros fenómenos como el nacimiento de una nueva criatura viviente o cualquier otra transformación creativa de la estructura de la vida” (1999, p.22-23).
  • 17
    Em espanhol: “[...] son las dos ruedas de la bicicleta de la historia”. Ya hemos dicho que el hombre que vive según los usos y las tradiciones, desde el punto de vista del héroe emprendedor de la época explosiva, es estúpido: y este último, desde la posición de su oponente, es infiel y sin honor. Ahora tiene sentido ver a estos personajes en conflicto como los anillos de una única cadena. (LOTMAN, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.87).
  • 18
    BAKHTIN, M. O romance de educação e sua importância na história do realismo. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 4.ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p.205-258.
  • 19
    Sem dúvida, aqui se pode ler uma homenagem ao famoso conto de Piglia, La loca y el relato del crimen [1975] (2017)PIGLIA, R. La loca y el relato del crimen, en El cajón. Lys ce que voudra, nº 195, noviembre 25 de 2017. Disponible en [https://lomioesamateur.wordpress.com/el-cuento-del-mes/la-loca-y-el-relato-del-crimen-de-ricardo-piglia/] Acceso 29/06/2018.
    https://lomioesamateur.wordpress.com/el-...
    , e do mesmo modo, no sócio que cheio de dinheiro se suicida se lê o intertexto com o apontamento de Chekov para um conto: o homem que tendo ganhado uma grande soma no cassino chega em casa e se suicida, narrado por Piglia en Formas breves (1999)PIGLIA, R. Formas breves. Buenos Aires: Temas Grupo Editorial, 1999..
  • 20
    “Em seus dois últimos livros La cultura e la esplosione, traduzido para o italiano por Caterina Valentino (Feltrinelli, 1993) e Cercare la strada, em tradução italiana de Nicoleta Marcialis (Marsilio, 1994), Lotman se entregou à invenção mais que em seus trabalhos anteriores, quase como que incitado pelo temor de não poder comunicar-nos todas as suas ideias. Podemos considerá-los como um testamento” (SEGRE, 2004SEGRE, C. El testamento de Lotman. Entretextos, 4, 2004. Disponible en [http://www.ugr.es/~mcaceres/entretextos/pdf/entre4/segre.pdf]. Acceso 23/06/2018.
    http://www.ugr.es/~mcaceres/entretextos/...
    ). N.T.: Essas obras de Y. Lotman também não foram traduzidas para o português.
  • 21
    No espanhol: “En lugar de este modelo nosotros proponemos otro, en el cual la imprevisibilidad de la explosión extratemporal se transforma constantemente, en la conciencia de los hombres, en la previsibilidad de la dinámica por ella generada y viceversa. El primer modelo puede metafóricamente representarse al Señor como un gran pedagogo, el que con inusual maestría demuestra (¿a quién?) un proceso para él conocido previamente. El segundo modelo puede ser ilustrado con la imagen de un creador-experimentador, que ha trabajado en un gran experimento, cuyos resultados son para él mismo inesperados e imprevisibles. Una mirada tal transforma el universo en fuente inagotable de información, en aquella Psique a la que le es propio el logos que se acrecienta a sí mismo, de la que hablaba Heráclito (fragmento 112 en la traducción de M. A. Dynnik). En sus búsquedas de una nueva lengua, el arte no puede agotarse como tampoco puede agotarse la realidad que va conociendo” (Lotman, 1999LOTMAN, Y. Cultura y explosión. Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999., p.212-213).
  • Tradução de Maria Helena Cruz Pistori mhcpist@gmail.com; https://orcid.org/0000-0003-0751-3178

REFERÊNCIAS

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  • BAJTÍN, M. La cultura popular en la Edad Media y en el Renacimiento El contexto de François Rabelais. Tr. Julio Boreat y César Conroy. Buenos Aires: Alianza, 1994.
  • BAJTÍN, M. La novela de educación y su importancia en la historia del realismo. En: Estética de la creación verbal Madrid: Siglo XXI, 1982, pp.200-247.
  • DE CERTEAU, M. La invención de lo cotidiano Artes de hacer. v 1. Trad. del francés Alejandro Pescador. Mexico: Universidad Iberoamericana, 2000.
  • LOTMAN, Y. Cultura y explosión Lo previsible y lo imprevisible en los procesos de cambio social. Trad. del italiano Delfina Muschietti. 1ª edición. Barcelona: Gedisa, 1999.
  • MOLINARI, B. Un voto de confianza, en La voz del Interior, suplemento VOS, viernes 25 de mayo de 2018.
  • PIGLIA, R. Formas breves Buenos Aires: Temas Grupo Editorial, 1999.
  • PIGLIA, R. La loca y el relato del crimen, en El cajón. Lys ce que voudra, nº 195, noviembre 25 de 2017. Disponible en [https://lomioesamateur.wordpress.com/el-cuento-del-mes/la-loca-y-el-relato-del-crimen-de-ricardo-piglia/] Acceso 29/06/2018.
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  • RAPACIOLI, J. Kohan Martín: “me interesa el carácter normal que puede tener lo atroz”, entrevista en Telam, sección Cultura, 18/03/2016. Disponible en [http://www.telam.com.ar/notas/201603/140102-martin-kohan-fuera-de-lugar-pedofilia-novela.html] Acceso 20/06/2018.
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  • SEGRE, C. El testamento de Lotman. Entretextos, 4, 2004. Disponible en [http://www.ugr.es/~mcaceres/entretextos/pdf/entre4/segre.pdf]. Acceso 23/06/2018.
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  • TOROP, P. Semiótica de la cultura y cultura. Trad. del ruso E. Chávez Herrera y K. Kaldjärv. Entretextos, 14-15-16, 2009/2010. Fac. de Filosofía y Letras, Univ. de Granada, España. Recuperado en https://www.academia.edu/4160279/Semi%C3%B3tica_de_la_cultura_y_cultura_de_Peeter_Torop
    » https://www.academia.edu/4160279/Semi%C3%B3tica_de_la_cultura_y_cultura_de_Peeter_Torop

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2019

Histórico

  • Recebido
    10 Jul 2018
  • Aceito
    23 Ago 2019
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