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A experiência do avaliador de artigos na prática da Ciência Aberta em Bakhtiniana

Pertencer à rede SciELO, indexador de prestígio, é um compromisso de qualidade de Bakhtiniana: sempre precisamos estar atentos aos critérios de permanência na coleção, esforçando-nos para seguir e avançar ao nível de excelência requerido. Por outro lado, a rede gera novas possibilidades de divulgação dos números, não apenas por meio da publicação própria, mas também com a boa prática de divulgação de artigos por meio do BlogSciELO em Perspectiva / Humanas.

Neste ano, pela segunda vez, Bakhtiniana foi convidada a participar de uma semana de divulgação do periódico, o que ocorreu no último mês de maio. Dessa forma, entre 8 e 12 de maio de 2023, foram publicados seis posts, que deram a oportunidade ao leitor de conhecer um pouco da revista e, especialmente, os novos procedimentos adotados em termos de Ciência Aberta: (1) Bakhtiniana conversa com leitores e reforça sua identidade por meio de Editoriais, acompanhado de um vídeo das editoras, em 08/05/2023 (PISTORI, 2023PISTORI, M. H. C.; STELLA, P. R. Bakhtiniana busca visibilidade internacional com editoria em língua estrangeira [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 10 de maio de 2023. Disponível em: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/05/10/bakhtiniana-busca-visibilidade-internacional-com-editoria-em-lingua-estrangeira/. Acesso em: 20 jun. 2023.
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); (2) Para a teoria bakhtiniana, corpus e objeto são correlatos, mas diferentes, em 09/05/2023 (ROSA, 2023ROSA, C. G. A experiência do autor na prática da Ciência Aberta na Bakhtiniana [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 11 de maio de 2023. Disponível em: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/05/11/a-experiencia-do-autor-na-pratica-da-ciencia-aberta-na-bakhtiniana/. Acesso em: 20 jun. 2023.
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); (3) Diálogo é fundamental para lidar com desafios e resultados da Editoria ad hoc, em 09/05/2023 (DEL RÉ; ORVIG, 2023DEL RÉ, A.; ORVIG, A.S. Diálogo é fundamental para lidar com desafios e resultados de editorias ad hoc [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 9 de maio de 2023. Disponível em: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/05/09/dialogo-e-fundamental-para-lidar-com-desafios-e-resultados-de-editorias-ad-hoc/. Acesso em: 20 jun. 2023.
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); (4) Bakhtiniana busca visibilidade internacional com Editoria de Língua Estrangeira, em10/05/2023 (PISTORI; STELLA, 2023); (5) A experiência do autor na prática da ciência aberta, em 11/05/2023 (ROSA, 2023); (6) Diálogos com o leitor ativo e responsivo da Bakhtiniana por meio das redes sociais, em 12/05 (LOPES-DUGNANI; PISTORI, 2023LOPES-DUGNANI, B.; PISTORI, M.H.C. Diálogos com o leitor ativo e responsivo da Bakhtiniana por meio das redes sociais [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 12 de maio de 2023. Disponível em: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/05/12/dialogos-com-o-leitor-ativo-e-responsivo-da-bakhtiniana-por-meio-das-redes-sociais/. Acesso em: 20 jun. 2023.
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).

Os posts, assinados por autores, editores ad hoc e membros da Editoria do periódico, alcançaram um grande público, o que nos trouxe bastante satisfação. No entanto, uma lacuna desde o início foi sentida por nós: faltou a divulgação de um texto que proporcionasse aos leitores um ponto de vista a respeito dos novos compromissos do parecerista. Esclarecemos: na ciência aberta, há a transparência no trâmite entre pareceristas e autores. Tivemos publicada a experiência do autor que interagiu com os pareceristas, mas como essa experiência é vista pelo próprio parecerista, que terá seu parecer e nome publicados junto com o artigo que avaliou?

Alguns de nossos leitores, também editores de periódicos acadêmicos, sabem como encontrar pareceristas para os artigos submetidos pode ser uma tarefa árdua. No entanto, há excelentes pareceristas em nossa área; e deles dependemos para manter a qualidade do periódico. Por isso nós lhes somos imensamente gratos (cf. BRAIT et al, 2020BRAIT, B.; PISTORI, M. H. C.; LOPES-DUGNANI, B.; PHILIPPOV, R. Nossos pareceristas: os bastidores da produção científica. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, v. 15, n. 4, port.2-7 / Eng.2-7, 2020. Recuperado de https://revistas.pucsp.br/index.php/bakhtiniana/article/view/50948
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).

Esta entrevista visa ao preenchimento daquela lacuna. Convidamos o Prof. Dr. Bruno Rêgo Deusdará Rodrigues, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 2. Além de um constante avaliador de artigos para o periódico, Bruno Deusdará já publicou em Bakhtiniana (JOSIOWICZ; DEUSDARÁ, 2022JOSIOWICZ, A.; DEUSDARÁ, B. Análise tecnodiscursiva de manifestações em torno de D. Maradona: metodologias de delimitação de regiões do dizer no Twitter. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, v. 17, n. 3, port.156-181 / Eng.172-198, 2022. https://doi.org/10.1590/2176-4573p57464
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); isto é, tem certa intimidade com a revista. Para esta entrevista, tomamos como base sua experiência no texto “Cenografia, agenciamento e mundo ético na entrevista em Jogo de cena: uma abordagem discursiva”, de Silma Ramos Coimbra Mendes e Maria Cecília Pérez de Souza-e-Silva, publicado no v. 17, n. 3 de 2022MENDES, S. R. C.; SOUZA-E-SILVA, M. C. P. Cenografia, agenciamento e mundo ético na entrevista em Jogo de cena: uma abordagem discursiva. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, v. 17, n. 3, port.83-104 / Eng.93-116, 2022. https://doi.org/10.1590/2176-4573p54994
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da Revista Bakhtiniana.

1) Você já atua como parecerista de revistas científicas há algum tempo. Você nota alguma diferença no sistema de Ciência Aberta em relação ao duplo cego na sua prática de avaliador?

Essa pergunta é muito interessante, porque exige um movimento de retomada de experiências anteriores. De fato, já atuei como parecerista em periódicos com diferentes perfis de publicação, tanto daqueles que se destinam a divulgar trabalhos de pesquisadores consolidados, quanto daqueles que se dirigem a estimular a produção de estudantes e pesquisadores em formação. Esse trabalho de “bastidor”, embora pouquíssimo visível (em geral, não é reconhecido como atividade de trabalho no cômputo de nossa carga horária semanal), me entusiasma bastante. Temos a chance de acompanhar as leituras que estão sendo feitas pelos diferentes grupos de pesquisa, de identificar caminhos e impasses para empreender as análises. É, digamos, a chance de acesso a um trabalho em construção.

Tradicionalmente, a devolutiva, as críticas, as sugestões ou intervenções, nesse contexto de avaliação, são elaboradas em anonimato. Não posso deixar de pensar que esse anonimato imagina colocar em cena certa neutralidade. Pretende-se, suponho, que o desconhecimento da figura do autor me permita uma avaliação supostamente mais “livre”. Da mesma forma, faz parecer que o autor terá recebido um parecer em anonimato, encenando a presença de um enunciador-pesquisador desencarnado, quase uma voz ilusoriamente universal, emanada de uma “comunidade científica imparcial”.

Do ponto de vista que assumo aqui, com tantas modalizações e aspas, pretendo me afastar dessa crença. Diria que o pensamento é assinado de diferentes formas, seja pelas referências selecionadas, seja pelo tipo de fenômeno escolhido para análise, seja inclusive pela forma de encaminhar os processos de análise.

Podemos até não saber quem é o indivíduo que escreve o texto, mas não deixamos de reconhecer as várias assinaturas que marcam seu modo de conhecer. São os efeitos dessas trajetórias que avaliamos, as combinações construídas e as formas de articulação entre essas partes.

Reconhecer os nomes, e também poder colocar nossos nomes, a meu ver, sustenta, ao menos, dois tipos de conquista. O primeiro deles reside em desmontar essa parafernália presente em nossas práticas cotidianas, que ainda sugerem a existência de um pensamento desencarnado, de uma universalidade ilusória e de uma suposta imparcialidade científica. O segundo aponta para a construção de uma ação ética interessante: vendo os nomes e colocando os nossos nomes estamos estabelecendo uma dinâmica de reconhecimento. Esse reconhecimento não é “ruído” na interação, mas chance de cultivo de uma solidariedade entre pesquisadores que reconhecem a responsabilidade do fazer científico, mas também assumem suas dificuldades, desafios e os compartilham. Trata-se do que desejo pensar como uma ética da solidariedade, capaz de resistir aos efeitos neoliberais da concorrência predatória, que tentam invadir os ambientes acadêmicos.

2) No caso específico do artigo que você avaliou em 2022, você emitiu dois pareceres: um com correções obrigatórias e outro aprovando o artigo. Conte-nos mais do que você lembra desse processo - como foi o diálogo com as autoras, como foi receber o texto assinado na segunda rodada, como é ler um texto pela segunda vez como avaliador, ou outra coisa que lhe ocorrer.

Esta é uma excelente oportunidade de relembrar esse exercício recente de elaboração de parecer para a Revista Bakhtiniana, no contexto da Ciência Aberta. Desde o início da leitura, as referências teóricas, sustentadas em uma articulação entre a perspectiva discursiva de D. Maingueneau e os estudos sobre cinema, me indicavam certa assinatura de seu pensamento. Pude até imaginar que eu pudesse conhecer as autoras do texto. Havia ainda uma menção a um texto que Décio [Rocha] e eu havíamos escrito em 2005. Ao mesmo tempo, eu me encantava com a articulação que eu via se montando entre noções como a de cenografia e de mundo ético - mais uma pista da atualidade da inscrição das autoras na comunidade de leitores atuais de uma orientação discursiva -, sendo lançado em uma provocação criativa e inovadora.

Nesse processo, fui me colocando no lugar de um leitor muito interessado. Simultaneamente, fui me dando conta de que a leitura do artigo produzia remissões a saberes constituídos em outro campo: o dos estudos sobre cinema. Eu reconhecia ali referências com as quais já havia tido contato, em momentos anteriores. Esses elementos mostravam um mergulho aprofundado das autoras no campo com o qual estabeleciam diálogo. Diante disso, fui construindo hipóteses sobre pistas e marcas que poderiam ser deixadas no texto, que pudessem possibilitar o acesso a leitores iniciados, mas não totalmente conhecedores dos estudos sobre cinema mencionados e das referências mais atuais do campo do discurso.

Foi com base nesse perfil de leitor, que busca periódicos como a Bakhtiniana para produzir referências a seus próprios saltos e mergulhos, que indiquei observações. A meu ver, tais observações tornariam o texto mais acessível a um público mais amplo, incluindo estudantes de pós-graduação, interessados nas inovações e articulações propostas.

Quando recebi o texto assinado, fiquei muito feliz de ter podido participar desse processo. Tenho a certeza de que nossos orientandos e pesquisadores em formação, ao lado dos nossos colegas de área, poderão usufruir da leitura da proposta atual e audaciosa construída ali.

3) Na Bakhtiniana, só são publicados pareceres de artigos aceitos para publicação e com o aval do autor do artigo e do autor do parecer, que ainda tem a opção de publicar anonimamente. Quais critérios você tem para escolher dentre as três opções que tem o avaliador (publicar com autoria, publicar anonimamente e não publicar)?

Do meu ponto de vista, o parecer de um artigo deve expressar, antes de tudo, nosso reconhecimento de que um trabalho de elaboração sustenta o texto que lemos e avaliamos. Essa é uma diretriz ética que nos faz percorrer o texto de modo que se busque restituir esse esforço empreendido. E digo isso tanto nos casos em que se lê o texto com mais interesse, admiração, entusiasmo - este é exatamente o caso do parecer enviado, que enseja este diálogo -, quanto nas circunstâncias em que prevalecem discordâncias pontuais ou mesmo estruturais sobre os efeitos obtidos em sua construção. Posso sempre respeitar o esforço e buscar dialogar no sentido de expor os movimentos de leituras que se orientam pela aprovação ou não dos resultados obtidos. Esse diálogo respeitoso me faz optar pelo aval da publicação dos pareceres que emito, com assinatura.

4) Na Revista Bakhtiniana, você participou como avaliador num texto de parecer aberto. Como autor, você já passou por este processo?

Ainda não. Sigo ansioso para que tenha essa oportunidade e, especialmente, que esse conjunto de práticas se imponha como hábito em nossa comunidade científica.

5) Que conselho o seu “eu-parecerista” daria aos autores que pretendem publicar em Bakhtiniana?

Considero a Revista Bakhtiniana um espaço dialógico destacado para uma comunidade científica que ainda se organiza por rótulos bastante abrangentes. Isso porque nossa área dispõe, atualmente, de um número significativo de veículos qualificados, com periodicidade regular. No entanto, grande parte deles se organiza em torno de um rótulo mais abrangente: Letras ou Linguística.

Lembrando que há muitos modos de atualizar uma reflexão no campo dos estudos da linguagem, a Bakhtiniana assume um lugar especial, pois possibilita a entrada em cena de um viés filosófico marcado, que se orienta pela crítica qualificada a noções como as de texto, discurso, autoria, entre outras. Dessa forma, uma exposição bem fundamentada e, ao mesmo tempo, referenciada com outros campos do saber é sempre um exercício interessante, que se apropria do universo crítico construído e o leva adiante. De modo semelhante, a exposição detalhada das formas e estratégias de aproximação à materialidade linguístico-discursiva a ser investigada é também um cuidado relevante, nesse processo de busca pela ampliação das formas de divulgação e popularização da ciência.

REFERÊNCIAS

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Set 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2023

Histórico

  • Recebido
    20 Jun 2023
  • Aceito
    18 Jul 2023
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