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Estrutura socioeconômica e homicídios intencionais contra jovens nas metrópoles brasileiras

Resumos

A juventude é uma etapa problemática do ciclo de vida, na qual a passagem à maturidade é mediada pelas condições econômicas e institucionais que permitem ou bloqueiam a inserção no mundo adulto. Esse percurso implica a exposição diferencial dos jovens à violência. O objetivo deste artigo é explicar a dinâmica da violência contra e entre jovens nas metrópoles brasileiras. Por meio de modelos mono e multicausais, verificamos que a variação da taxa de homicídios intencionais contra essa parcela da população responde à demanda por drogas, à oferta de armas de fogo, ao apoio e controle social públicos e à exclusão socioeconômica.

Palavras-chave
homicídios intencionais; metrópoles; tensão social; controle social; juventude


Youth is a problematic stage of the life cycle, in which the transition to maturity is mediated by the economic and institutional conditions that allow or block entry into the adult world. This path implies differential exposure of young people to violence. Socioeconomic Structure and Intentional Homicides against Young People in Brazilian Metropolises aims to explain the dynamics of violence against and among young people in Brazilian metropolises. Using mono and multi-causal models, we verified that the variation in the rate of intentional homicides against this portion of the population responds to the demand for drugs, the supply of firearms, public social support, and control and socioeconomic deprivation.

Keywords:
intentional homicides; metropolises; social tension; social control; youth


Apresentação

Os jovens se destacam como os principais autores e vítimas dos crimes violentos no Brasil, e as mortes violentas, com destaque para as agressões, são as principais causas de mortalidade dessa parcela da população. As áreas urbanas, especialmente as metrópoles, têm sido o principal macrocontexto espacial dos assassinatos. O componente geracional e etário da violência, portanto, precisa de uma atenção especial para a explicação das altas taxas agregadas de homicídios dolosos nas microrregiões brasileiras, em especial nos grandes centros urbanos.

Ainda que mecanismos causais similares possam contribuir para explicar as diferenças e variações entre os níveis de criminalidade violenta pelos vários estratos demográficos, a questão da juventude é importante por causa da grande e desproporcional concentração de mortes no grupo juvenil. Certas condições socioeconômicas tornariam os jovens de uma região, em um determinado período, mais vulneráveis à criminalidade violenta?

Nossa hipótese é que a escalada ou distensão da violência contra e entre jovens responde a condições socioeconômicas por meio de processos causais subjacentes. Supomos que mecanismos sociais como tensão social, desorganização social e violência sistêmica podem explicar a incidência de criminalidade violenta entre jovens, mas o impacto mais intenso entre eles passa pela condição juvenil no ciclo de vida, que os torna excepcionalmente mais vulneráveis a fatores criminogênicos, especificamente aqueles que restringem oportunidades e apoios legítimos e ampliam as oportunidades ilegítimas ligadas aos mercados ilícitos, especialmente os de drogas e armas. Para testar a hipótese, utilizaremos um modelo multivariado com dados de mortalidade e socioeconômicos para as regiões metropolitanas de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre.

Os conceitos de juventude e a sociologia da violência

Segundo Groppo (2010)GROPPO, Luís Antonio. “Condição juvenil e modelos contemporâneos de análise sociológica das juventudes”. Ultima Década, Santiago, vol. 18, n. 33, pp. 11-26, 2010., a juventude tem sido abordada tradicionalmente por duas vias na teoria sociológica: de um lado, nas abordagens funcionalistas, ela é analisada pela dicotomia integração/desajuste social; de outro, nas abordagens da moratória social, vinculadas ao reformismo e ao desenvolvimentismo, a rebeldia juvenil é encarada como uma força motriz da mudança social. Há ainda uma terceira abordagem, desenvolvida posteriormente e inspirada no chamado pós-modernismo, em que a juventude é considerada uma identidade e um estilo de vida, tendendo ao fracionamento e à diversificação dos significados atribuídos às juventudes, agora categorizadas como nichos culturais: a delinquência (que é o que mais nos interessa aqui), a boemia e o radicalismo. A abordagem dita pós-moderna, no entanto, concebe a cultura como irredutível e imponderável, o que a impede de relacionar a tendência à fragmentação identitária às tendências objetivas do capitalismo tardio, promotor da segmentação cada vez maior dos mercados de trabalho e de consumo como estratégia preferencial de acumulação de capital, em contraste com a estratégia de padronização e massificação das relações de trabalho e dos bens de consumo, vigente no período fordista - e de hegemonia do pensamento funcionalista.

No entanto, argumenta Groppo (2010)GROPPO, Luís Antonio. “Condição juvenil e modelos contemporâneos de análise sociológica das juventudes”. Ultima Década, Santiago, vol. 18, n. 33, pp. 11-26, 2010., a rebeldia juvenil nesse contexto também pode ser concebida como uma luta por novos direitos ou por direitos ameaçados ou não efetivados, em que se concebe o jovem como cidadão. Com essa concepção, o autor busca ligar as tendências de fragmentação na esfera sociocultural às estratégias na esfera político-econômica, sobretudo observando que as políticas de desregulação econômica e erosão de dispositivos sociais do Estado ensejam a fragilização da cidadania, sentida com mais força pela juventude, uma vez que essas políticam afetam decisivamente as instâncias de socialização e integração pelas quais os jovens passam na transição da menoridade para a maturidade.

Segundo Mauger (2013)MAUGER, Gérard. “Juventude: Idades da vida e gerações”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 56, n. 1, pp. 169-183, 2013., a juventude é uma fase no ciclo de vida, entre a infância e a maturidade, em que o ator social se encontra em um período de transição, indeterminação e não classificação. Nela, as disposições incorporadas ainda não encontraram as situações que precisam para se ajustarem e estabilizarem, a saber, o matrimônio e o trabalho remunerado. Assim, a juventude se mostra como fase problemática, em que a busca por escapar ao destino social se tensiona com as inserções matrimonial e profissional, que encerram o ciclo juvenil da vida. A distância entre as expectativas e os resultados tornam o jovem propenso à revolta ou ao desencanto, mas também pode acelerar a acomodação à situação mais factível para a sua situação socioeconômica.

Dessa maneira, os múltiplos capitais herdados ou não (econômico, cultural e social) ainda não encontram plena possibilidade de realização, embora já tenham sido parcialmente incorporados. As incertezas cada vez maiores a serem encontradas no mercado de trabalho e no mercado matrimonial contribuem para a duração variável da juventude e tornam o encerramento do ciclo juvenil cada vez mais incerto e diferenciado. A definição da juventude é, assim, em larga medida, dependente da situação, da conjuntura e das instituições sociais, de maneira que não só varia entre as sociedades e épocas, como também em cada uma delas, em especial quando a transição se torna mais problemática (MAUGER, 2013MAUGER, Gérard. “Juventude: Idades da vida e gerações”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 56, n. 1, pp. 169-183, 2013.).

Sobre os “efeitos de idade” sobre a criminalidade, Hirschi e Gottfredson (1983)HIRSCHI, Travis; GOTTFREDSON, Michael R. “Age and the Explanation of Crime”. American Journal of Sociology, vol. 89, n. 3, pp. 552-584, 1983. dizem que a correlação entre juventude e criminalidade violenta são tão universais e invariantes que torna-se pouco relevante para a análise do processo de criminogênese. Teorias do crime sem um relato específico dos efeitos de idade não deveriam ser descartadas ou criticadas por esse motivo, pois a evidência maciça e a aparente invariância da associação em forma de sino entre idade e prática de crime, com uma rápida escalada a partir do início da adolescência até o início da idade adulta e posterior decréscimo gradual, torna o problema da idade pouco interessante do ponto de vista teórico. Por ser tão constante e pouco variável através de inúmeras condições sociais e quadros culturais diferentes, o efeito de idade não teria uma explicação, sendo redundantes as tentativas de elucidá-lo.

Se é constante que a criminalidade chega ao máximo na idade jovem adulta e depois declina, o importante é compreender por que alguns indivíduos manifestam maior disposição ao crime em comparação aos outros. Segundo Hirschi e Gottfredson (2004), esse fenômeno seria explicado pelos processos de socialização primária pelos quais se constitui o nível de autocontrole individual e a capacidade de adiamento da gratificação. No entanto, se o crime de fato é raro na infância e na velhice, as trajetórias de carreiras criminais mais comuns não são necessariamente idênticas, sendo a associação entre juventude e crime violento mais uma generalização empírica que exige explicação, em vez de um postulado a priori.

Na abordagem do interacionismo simbólico, o campo de possibilidades de cada ator, em cada situação, é variado, e suas escolhas são feitas de acordo com experiências prévias que constituem uma identidade social como relação do ator consigo mesmo e com os outros. No curso da vida, os papéis e compromissos do indivíduo podem transitar dos grupos convencionais para os papéis e compromissos delinquenciais, cuja incidência é mais frequente na juventude, entre o final da adolescência e o início da idade adulta. Essa relação entre juventude e delinquência de rua revela o quanto os compromissos e papéis relacionados ao mundo do crime são de uma duração relativamente curta, associada a uma fase da vida, quando as disposições físicas e emocionais são mais dispostas para o envolvimento em gangues e prática de crimes violentos. Por outro lado, as transições de papéis sociais são mais problemáticas, especificamente entre a infância e a maturidade. Com a maturação e o posterior envelhecimento psicofísico, o exercício de atividades e compromissos criminosos é declinante, até ser abandonado (MATSUEDA e HEIMER, 1997MATSUEDA, Ross L.; HEIMER, Karen. “A Symbolic Interactionist Theory of Role-Transitions, Role-Commitments and Deliquency”. In: THORNBERRY, Terence P. (org.). Developmental Theories of Crime and Delinquency. New Brunswick, NJ: Transaction, 1997, pp. 163-213.; HEIMER e MATSUEDA, 1994HEIMER, Karen; MATSUEDA, Ross L. “Role-Taking, Role Commitment, and Delinquency: A Theory of Differential Social Control”. American Sociological Review, vol. 59, pp. 365-390, 1994.).

Podemos estabelecer uma conexão dessas teorizações sobre a juventude com outras, relativas à violência criminal. Vemos a importância dos laços sociais estabelecidos junto à família e aos locais de moradia, estudo e trabalho que são reputados como protetores contra o envolvimento criminal (HIRSCHI, 2004HIRSCHI, Travis. “Self-Control and Crime”. In: BAUMEISTER, Roy F.; VOHS, Kathleen D. (orgs). Handbook of Self-Regulation: Research, Theory, and Applications. Nova York: Guilford, 2004, pp. 537-552.; CULLEN, 1994). E, ainda, a tensão social relacionada à contradição entre as metas hegemônicas de sucesso financeiro, de um lado, e a estrutura muitas vezes desigual e restrita de oportunidades legítimas e ilegítimas de realização individual, de outro, ocasionando problemas socioeconômicos que alimentam a propensão ao delito, drogadição etc. (MERTON, 1938MERTON, Robert K. “Social Structure and Anomie”. American Sociological Review, vol. 3, n. 5, pp. 672-682, 1938.; CLOWARD e OHLIN, 2011CLOWARD, Richard A.; OHLIN, Lloyd E. Delinquency and Opportunity. Nova York: Taylor & Francis, 2011.; AGNEW, 1992AGNEW, Robert. “Foundation for a General Strain Theory of Crime and Delinquency”. Criminology, vol. 30, n. 1, pp. 47-88, 1992.; AGNEW et al., 2015).

Provisão de apoio e controle social por instituições públicas poderiam aliviar e compensar os efeitos das privações absolutas e relativas por meio da desmercantilização socioeconômica (CURRIE, 1997; CULLEN, 1994; MESSNER e ROSENFELD, 1997MESSNER, Steven F.; ROSENFELD, Richard. “Political Restraint of the Market and Levels of Criminal Homicide: A Cross-National Application of Institutional-Anomie Theory”. Social Forces, vol. 75, n. 4, pp. 1393-1416, 1997.). Inversamente, as oportunidades ilegítimas de ganho nos mercados ilícitos colocariam jovens em situações de alta exposição à violência, como as disputas entre grupos criminais e a repressão policial (GOLDSTEIN, 1985GOLDSTEIN, Paul J. “The Drugs/Violence Nexus: A Tripartite Conceptual Framework”. Journal of Drug Issues, vol. 15, n. 4, pp. 493-506, 1985.).

Ruotti, Massa e Peres (2011)RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011. criticam o conceito de risco aplicado aos estudos sobre violência contra (e entre) jovens. Segundo as autoras, a pretensa neutralidade do termo “risco”, quando aplicado à questão da violência, contribui para a formação de estigmas sobre os grupos sociais mais atingidos pelos crimes violentos. No lugar de risco, elas propõem a categoria “vulnerabilidade à violência”, em busca de uma conjugação entre a análise dos determinantes epidemiológicos e a interpretação dos significados e implicações da violência na trajetória e interação entre os atores sociais. O conceito de vulnerabilidade permite ao mesmo tempo evitar a estigmatização das vítimas mais frequentes da violência e compreender o sentido que os atores atribuem ao seu envolvimento, voluntário ou não, em situações que os expõem à morte violenta por agressão.

Na sociedade e na cultura contemporâneas, observamos uma grande ênfase no imperativo do sucesso indiviudal, medido em termos de renda, patrimônio e consumo, e a valorização da ideia de arriscar-se para ser bem-sucedido. No entanto, esse engajamento em assumir os riscos é desigual. Alguns jovens mais privilegiados têm a segurança e as oportunidades para se envolverem em atividades positivas, absorvendo riscos por meio do apoio familiar, ao passo que para os jovens pobres as oportunidades são escassas e os perigos das atividades ilícitas envolvem a exposição à violência. Dessa maneira, a juventude se torna uma idade problemática porque a transição entre a infância e o mundo adulto, mediada pelo trabalho, não mais encontra um leque de opções estáveis e confiáveis de trabalho para os jovens das classes populares (RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.).

Ao mesmo tempo que esses jovens são instados a se arriscar pelo sucesso, não encontram oportunidades materiais nem recompensas simbólicas para a integração produtiva à sociedade nos postos de trabalho - em geral instáveis, de baixa remuneração e pouco estimados pela cultura hegemônica. Dessa maneira, as atividades ilícitas lucrativas aparecem como alternativa por gerarem maior renda no curto prazo, mesmo ao custo de crescente exposição à violência - o que, de certa maneira, se acomoda ao propósito hegemônico de se arriscar pelo sucesso. Nesse sentido, a juventude parece uma etapa da vida em que as tensões sociais têm maior probabilidade de se expressarem por meio de conduta delinquente, inclusive a violenta (RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.).

Gadea et al. (2017)GADEA, Carlos A. et al. “Trajetórias de jovens em situação de vulnerabilidade social: sobre a realidade juvenil, violência intersubjetiva e políticas para jovens em Porto Alegre - RS”. Sociologias, Porto Alegre, vol. 19, n. 45, pp. 258-299, 2017., em seu estudo sobre jovens egressos do sistema socioeducativo - Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul (Fase/RS) - em Porto Alegre, constatam também uma trajetória em que se evidencia um conjunto de carências sobrepostas: situações socioeconômicas precárias e carências culturais e sociais. Passando por um sistema escolar precário, os jovens de camadas populares se defrontam com um mercado de trabalho caracterizado pela instabilidade, informalidade e baixas remunerações. A iniciação precoce no mundo do trabalho, como no mundo dos pequenos crimes, é comum na trajetória desses jovens, que muitas vezes buscam desenvolver estratégias de inserção baseadas em redes associativas e interpessoais. Estas podem conduzir ao aprofundamento da relação com o mundo do crime e do tráfico de drogas ilícitas ou então à inserção no trabalho remunerado, ainda que informal e instável. Um complexo conjunto de precariedades sobrepostas se apresenta a esses jovens desprovidos de capital econômico, cultural e social e, ainda assim, tratados como os principais responsáveis por sua situação, portadores de um estigma que os associa à violência - o que se revela ora como uma profecia autorrealizadora, ora como um obstáculo a mais na suas vidas.

Ainda sobre o conceito de vulnerabilidade, Pimenta (2014)PIMENTA, Melissa de Mattos. “Violência e vulnerabilidade social”. In: TAVARES DOS SANTOS, José Vicente; MADEIRA, Lígia Mori (orgs.). Segurança Cidadã. Porto Alegre: Tomo, 2014, pp. 217-248. argumenta que ele tem o potencial de ultrapassar as insuficiências do conceito mais tradicional de pobreza, ao considerar as múltiplas dimensões das privações absolutas e relativas a que o agente social está submetido, bem como suas orientações de ação para lidar com a condição de vítima. O agente passa a ser, assim, mais que mera vítima das suas condições, passando a ser considerado um agente ativo, que desenvolve práticas singulares. Esse conceito é importante para abordar as dinâmicas da violência entre jovens, na medida em que considera não apenas sua posição socioeconômica e os estigmas que pesam sobre alguns, mas

as dinâmicas de sociabilidade, entendidas como as diferentes relações e interações sociais que permeiam a vida cotidiana de adolescentes e jovens e se dão predominantemente no contexto familiar e na convivência com “grupos de pares”, possibilitam identificar muitas das interações complexas que ajudam a explicar como jovens de ambos os sexos se tornam vítimas e perpetradores da violência (PIMENTA, 2014PIMENTA, Melissa de Mattos. “Violência e vulnerabilidade social”. In: TAVARES DOS SANTOS, José Vicente; MADEIRA, Lígia Mori (orgs.). Segurança Cidadã. Porto Alegre: Tomo, 2014, pp. 217-248., p. 230).

Considerando os casos de homicídios dolosos julgados nas principais capitais do Brasil, “são os homens jovens, de cor escura e baixa escolaridade os que mais morrem e os que mais matam” (RIBEIRO e COUTO, 2015, pp. 167-169). Ribeiro e Couto (2015) constatam que em uma parcela dos casos de homicídios dolosos entre homens jovens, o acusado ou suspeito de um crime acaba sendo assassinado em outro crime, com características similares (p. 170). Apesar de a pesquisa utilizar como fonte os processos judiciais de homicídios dolosos em capitais brasileiras - que representam uma fração minoritária e presumivelmente enviesada dos casos de homicídios dolosos -, a tipologia desdobrada da análise permite fazer algumas inferências, uma vez que a vitimização de jovens em áreas de periferia ou favela urbana, mortos em locais públicos por disparos de arma de fogo, corresponde às características estatisticamente predominantes dos homicídios dolosos. Há, portanto, uma similaridade sociodemográfica e criminológica entre a população carcerária, as vítimas de homicídios e os suspeitos e condenados por homicídios intencionais (RIBEIRO e COUTO, 2015). A semelhança entre agentes e vítimas e o fato de que não é incomum que a vítima de um crime seja agente de outro explicitam um contexto em que há vinganças, retaliações e disputas territoriais entre grupos armados, mas também rixas e brigas entre conhecidos, levando muitas vezes a desfechos trágicos. Esse segundo caso é mais fácil de resolver que o primeiro, o que explica que entre os homicídios dolosos ocorridos e os homicídios dolosos julgados haja uma proporção invertida de motivações ligadas às disputas entre gangues de traficantes e ligadas às rixas e brigas entre conhecidos, amigos e familiares (RIBEIRO e COUTO, 2015, p. 171).

Ao estudar as subculturas de gangues em Belo Horizonte, Zilli (2015)ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015. constatou a dispersão territorial e associativa dos grupos criminosos, dos quais participam sobretudo homens jovens, residentes nas áreas de favela e periferia. Os jovens se unem a gangues como um mecanismo de defesa mútua contra as gangues rivais e outras ameaças, buscando também acessar oportunidades ilícitas de lucro financeiro e de prestígio masculino, além de retaliar, intimidar e vingar-se de ofensores e agressores. As gangues acabam por se tornar mantenedoras da ordem comunitária local, justificando o uso da violência para retaliar e vingar ataques aos moradores. Isso é visto também como um meio de desencorajar o recurso dos moradores à polícia, instituição que, de qualquer maneira, não é vista como eficiente ou confiável pelos moradores. As disputas internas ou territoriais envolvendo as gangues de jovens armados são provavelmente as principais motivações e circunstâncias dos homicídios dolosos.

Machado e Noronha (2002)MACHADO, Eduardo Paes; NORONHA, Ceci Vilar. “A polícia dos pobres: violência policial em classes populares urbanas”. Sociologias, Porto Alegre, n. 7, pp. 188-221, 2002., pesquisando em Salvador, e Paiva (2014)PAIVA, Luiz Fábio Silva. Contingências da violência em um território estigmatizado. Campinas: Pontes, 2014., pesquisando em Fortaleza, encontraram cenários comunitários muito similares: a desconfiança popular nas instituições de segurança e de justiça, a desarticulação e precariedade de instituições integradoras (família, trabalho remunerado, escola pública), a fragilidade dos laços de solidariedade local, a violência policial muitas vezes motivada por preconceitos ou por corrupção e o apoio (ou ao menos a não reprovação popular) às práticas de resolução particular e violenta de conflitos. As gangues de jovens pobres, nesse cenário de segregação e precariedade, buscam explorar as oportunidades de lucro por meio de roubos e do tráfico de drogas ilícitas, tentando se defender das gangues rivais e evitar a repressão policial. Isso as leva, por vezes, a desempenhar um papel de mediação e resolução dos conflitos pessoais entre moradores, muitas vezes usando a violência e a ameaça.

Dessa maneira, buscando generalizar os vários casos, pode-se identificar que o envolvimento de jovens em gangues é muitas vezes uma tentativa, de um lado, de mediação entre a frustração com a impossibilidade de ascensão social por vias lícitas e a fragilidade de laços sociais integradores e, de outro, de obtenção de respeito, prestígio e renda mais rápida e maior por meio do crime, em níveis maiores do que seria possível por meio do trabalho nos mercados formal e informal. A violência, longe de ser uma excepcionalidade, é uma constante ameaça, partindo muitas vezes da família ou da polícia e raramente sendo controlada por instituições, o que parece favorecer não apenas uma visão instrumental da violência física, como também a avaliação de que em muitos casos ela é justa e merecida.

Nos EUA, Miethe e Regoeczi (2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004., pp. 169-171) verificam que a estrutura de situações violentas envolvendo jovens mudou menos que a incidência total dessa violência. As situações exclusivas para ofensores jovens envolvem ofensores de “minorias” (negros e latinos), uso de armas de fogo, vários agressores, violência entre estranhos e ambientes urbanos, abarcando grupos similares na etnia, gênero e idade, decorrentes de violências entre desconhecidos ou entre conhecidos. A tendência de crescimento desse tipo é relacionável à epidemia de violência vinculada ao mercado de drogas ilícitas, que atingiu o auge em 1993, e ao pertencimento às gangues. No entanto, o uso de armas de fogo é generalizado entre homens jovens, mesmo fora do contexto de drogas e gangues, assim como a motivação de vingança privada violenta como resposta a ofensas percebidas pelo agressor como cometidas pela vítima contra o próprio agressor, sua família ou membros da gangue (MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004., pp. 175- 181).

Aparece aqui a dificuldade de acesso a sistemas formais de controle social e mediação de conflitos e a disposição para a busca de vingança particular contra ofensores e desafiantes da honra masculina, da família ou da gangue dos agressores. Dessa maneira, a violência acaba servindo de mecanismo de controle social substitutivo, na falta de acesso à justiça formal e de laços fortes que promovam controle informal familiar ou comunitário. Também é comum entre os homicídios intencionais cometidos por jovens a presença de motivações instrumentais, ou seja, a busca por lucro e ganhos materiais - embora no caso dos roubos a morte seja mais uma consequência muitas vezes não planejada ou desejada, enquanto nas guerras de gangues o motivo instrumental do controle territorial do tráfico de drogas ilícitas acabe se mesclando às motivações expressivas do prestígio entre os pares, masculinidade e vingança (MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004., pp. 184, 186, 189).

Entre os latino-americanos residentes nas comunidades estudadas pelos pesquisadores, há predomínio de participação em homicídios relacionados a gangues quando eles são autores ou vitimas (MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004., p. 212). A sobreposição entre classe baixa e raça/etnia “minoritárias”, no contexto americano, sugere que a violência tem sido utilizada como um meio substitutivo para a afirmação da identidade masculina independente por homens jovens que não encontram oportunidades para a sua realização pelas vias tradicionais de transição para a idade adulta, como um trabalho remunerado e a chefia de uma família estável (MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004., p. 225).

No Brasil, as causas externas sempre foram proeminentes entre mortes de jovens, mas entre 1930 e 1991 elas cresceram em termos absolutos, proporcionais e relativos, com o aumento dos homicídios intencionais e das mortes acidentais e a redução de mortes por causas internas, em razão da lenta difusão dos avanços da medicina e da seguridade social na onda da expansão econômica e urbanização. Depois de 1964, a política econômica e social do autoritarismo burocrático imposta pelo golpe civil-militar no Brasil favoreceu a concentração de riquezas e o arrocho salarial, causando elevação da mortalidade de todos os tipos, mas especialmente a violenta, e levando a uma relativa estagnação das causas internas. Isto é, apesar de o crescimento econômico da década de 1970 ter permitido algumas possibilidades restritas e desiguais de expansão do consumo e de infraestruturas em setores urbanos restritos (basicamente as classes média e alta das grandes cidades), as políticas de austeridade no início (1964-1968) e a crise de hiperinflação, desigualdade e dívida externa no período final (1978-1985) geraram mortes maciças mais amplamente que a violência política. Parte desse aumento deveu-se ao crescimento da circulação de automóveis (uma tendência desde a década de 1950), mas a urbanização desigual, favorecida pela política social autoritária, mesmo no período do “milagre econômico”, criou as condições objetivas para a escalada das violências interpessoais, policiais e de gangues (VERMELHO e JORGE, 1996VERMELHO, Letícia Legay; JORGE, Maria Helena P. de Mello. “Mortalidade de jovens: análise do período de 1930 a 1991 (a transição epidemiológica para a violência)”. Rev. Saúde Pública, São Paulo, vol. 30, n. 4, pp. 319-331, 1996.).

Estudando o efeito das taxas gerais de desemprego sobre os homicídios de jovens nas regiões metropolitanas brasileiras, Guimarães (2011GUIMARÃES, Roberta. “O papel do desemprego nas altas taxas de homicídio entre os jovens no Brasil Metropolitano”. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Segurança, Justiça e Cidadania. O panorama dos homicídios no Brasil. Ano 3, n. 6. Brasília: Senasp, 2011, pp. 183-204., pp. 185-186) constata que metade das mortes por homicídio intencional no Brasil ocorreram nas dez maiores regiões metropolitanas entre 1980 e 2006, e que os homens entre 15 e 29 anos representavam 6% da população e 30% dos assassinados no mesmo período. Articulando as perspectivas da escolha racional, da anomia social e do controle social, a autora alega que os efeitos da renda média e da pobreza podem ser ambivalentes. A renda média pode aumentar a arrecadação do Estado, aumentando sua capacidade de investir em segurança pública, mas pode também pode propiciar a ampliação das oportunidades de ganhos por meios ilícitos (roubos, furtos, tráfico de drogas ilícitas etc.), ao contrário do desemprego e do percentual de residentes em favelas que causariam, respectivamente, a frustração social com a ausência de oportunidades e a desorganização social pela incapacidade do Estado absorver demandas da população urbana. De fato, os indicadores de desemprego, de renda média e de favelização tiveram efeitos significativos e positivos sobre a vitimização de jovens por homicídios intencionais.

Com relação a explicações demográficas, Manetta e Alves (2018)MANETTA, Alex; ALVES, José Eustáquio Diniz. “A validade da explicação demográfica para a tendência recente do homicídio de homens jovens em quatro regiões metropolitanas brasileiras (2002-2012)”. Idéias, vol. 9, n. 1, pp. 193-220, 2018. estudam se a redução do percentual de homens jovens ajuda a explicar a variação da taxa de homicídios de homens jovens nas regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. A hipótese é que a redução do peso demográfico dos homens jovens reduziria a demanda por inserção laboral desse estrato populacional, reduzindo a pressão social que leva à delinquência violenta. No entanto, apenas em São Paulo houve o resultado esperado, e em Recife, apenas para o grupo de 20 a 25 anos. No Rio de Janeiro e em Salvador, pelo contrário, houve aumento da inatividade juvenil, resultando em menor alteração da taxa de desocupação juvenil. Em São Paulo, verificou-se que a explicação precisou integrar o aumento das taxas de matrícula de jovens no ensino formal médio e superior.

Em suma, podemos identificar nessas pesquisas algumas convergências com teorias criminológicas consagradas. Privações socioeconômicas, associadas tanto ao mercado de trabalho como à prestação de serviços públicos sociais, são identificadas como causadoras da criminalidade violenta juvenil, especialmente porque a pressão pelo sucesso gera frustrações naqueles que não têm acesso a canais legítimos de realização pessoal (MERTON, 1938MERTON, Robert K. “Social Structure and Anomie”. American Sociological Review, vol. 3, n. 5, pp. 672-682, 1938.) e a dispositivos robustos de apoio social (CULLEN, 1995).

A tensão entre metas de sucesso e oportunidades legítimas restritas tornariam a criminalidade um caminho factível para obter, por vias ilegítimas, o que não está disponível por meios legais. A disputa por essas fontes de lucro criminal ensejaria dinâmicas de retaliação que levariam a uma violência sistêmica (GOLDSTEIN, 1985GOLDSTEIN, Paul J. “The Drugs/Violence Nexus: A Tripartite Conceptual Framework”. Journal of Drug Issues, vol. 15, n. 4, pp. 493-506, 1985.). O processo de urbanização também favoreceria essa dinâmica, pois geraria uma aglomeração das privações socioeconômicas em frações do espaço urbano, como as favelas e as periferias.

Procedimentos metodológicos

Foram coletados dados referentes às regiões metropolitanas de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre, abrangendo as macrorregiões Norte, Nordeste, Sudeste e Sul.

A escolha das unidades de corte transversal e do comprimento da série temporal foi orientada pela disponibilidade dos dados. Felizmente, as regiões correspondem também aproximadamente às maiores em termos populacionais; são todas centralizadas por capitais estaduais e representam quase todas as regiões brasileiras, exceto a Centro-Oeste. As séries obtidas para todos os dados abrangem essas nove regiões entre 1992 e 2014.

O objetivo é analisar a causalidade social sistêmica da violência letal intencional contra jovens, inferida por meio de modelos de regressão simples e múltipla das taxas de homicídios intencionais específica para a idade entre 15 e 29 anos por um conjunto de variáveis socioeconômicas e sociodemográficas. Considerando o problema de subnotificação que enviesa a quantificação dos homicídios intencionais (SOARES, 2008SOARES, Gláucio Ary Dillon. Não matarás: Desenvolvimento, desigualdade e homicídios. Rio de Janeiro: FGV, 2008.), corrigimos a taxa de homicídios de jovens pela seguinte conta: somamos o número de mortes por agressão e operações de guerra.

Em seguida, calculamos a proporção relativa às mortes por causas definidas e multiplicamos o resultado pelo número de mortes com causas mal definidas. Repetimos o procedimento, mas dessa vez com mortes violentas cuja intenção é conhecida (agressões, autoprovocadas e acidentais, e sequelas), e multiplicamos o resultado pelo número de mortes violentas por intenção indeterminada. Ambos os produtos foram somados ao número de mortes por agressão e operações de guerra ou intervenção legal. A partir disso, calculamos o número por 100 mil habitantes. A fórmula usada foi a seguinte:

TxAjHomicid = ( ( H i + ( ( H i / M v i d ) M v i i ) + ( ( H i / M c c ) M c i d ) ) 100000 ) / População

Nela, Hi são homicídios intencionais (agressões e intervenções legais ou operações de guerra), Mvid são mortes violentas com intenção conhecida (agressões, suicídios, acidentes e intervenções legais ou operações de guerra), Mvii são mortes violentas por por intenção indeterminada, Mcc são mortes por causas conhecidas e Mcid são mortes por causas desconhecidas.

Utilizamos o recorte etário em todas as etapas. Consideramos, então, que a proporção de mortes de jovens por causas mal definidas que são homicídios intencionais subnotificados é igual à proporção de homicídios intencionais de jovens notificados sobre as mortes de jovens com causa definida. E que a proporção de mortes violentas de jovens por intenção indeterminada que são homicídios intencionais subnotificados é igual à proporção de homicídios intencionais de jovens sobre mortes de jovens por causas externas cuja intenção é determinada. Aplicamos a transformação logarítmica à variável dependente, ou seja, à taxa corrigida de mortes de jovens (15-29 anos) por agressão por 100 mil habitantes.

A seguir apresentamos a lista de variáveis, selecionadas segundo a pertinência teórica:

Quadro 1
Variáveis explicativas da violência criminal nas metrópoles

Algumas considerações sobre as variáveis usadas nas análises de regressão:

1) A mortalidade por consumo de álcool e drogas ilícitas expressa a demanda mórbida por psicoativos, especialmente os mais potencialmente letais, como o crack. O uso de drogas agravaria as motivações expressivas e instrumentais para a violência. O tráfico de drogas varejista seria então uma fonte de renda acessível a jovens pobres, assim como crimes patrimoniais seriam um meio para adquirir o dinheiro necessário ao consumo de psicoativos. Em algumas situações, o consumo de psicoativos, em especial álcool, cocaína e crack, precipitariam brigas e rixas, mas a literatura sugere que a violência mais frequente se dá em torno do tráfico de drogas (GOLDSTEIN, 1985GOLDSTEIN, Paul J. “The Drugs/Violence Nexus: A Tripartite Conceptual Framework”. Journal of Drug Issues, vol. 15, n. 4, pp. 493-506, 1985.; DAUDELIN e RATTON, 2017DAUDELIN, Jean; RATTON, José Luiz. “Mercados de drogas, guerra e paz no Recife”. Tempo soc., São Paulo, vol. 29, n. 2, pp. 115-134, 2017.; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.; MACHADO e NORONHA, 2002MACHADO, Eduardo Paes; NORONHA, Ceci Vilar. “A polícia dos pobres: violência policial em classes populares urbanas”. Sociologias, Porto Alegre, n. 7, pp. 188-221, 2002.; PAIVA, 2014PAIVA, Luiz Fábio Silva. Contingências da violência em um território estigmatizado. Campinas: Pontes, 2014.; RIBEIRO e COUTO, 2015, MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.).

2) A média entre os percentuais de suicídios e de homicídios intencionais cometidos com arma de fogo é uma proxy para a oferta ampla de armas de fogo, pretendendo capturar a facilidade para se obter armas de fogo e munições, tendo ou não origem legal privada (domicílios e empresas de segurança) ou pública (arsenais policiais e militares), ou importadas via contrabando. O indicador é conhecido como “índice Cook” (HEMENWAY et al., 2000HEMENWAY, David et al. “Firearm Availability and Homicide Rates Across 26 High-Income Countries”. Journal of Trauma and Acute Care Surgery, vol. 49, n. 6, pp. 985-988, 2000.; COOK, 1979COOK, Philip J. “The Effect of Gun Availability on Robbery and Robbery Murder”. Policy studies review annual, vol. 3, pp. 743-81, 1979.; HEPBURN e HEMENWAY, 2004HEPBURN, Lisa M.; HEMENWAY, David. “Firearm Availability and Homicide: A Review of the Literature”. Aggression and Violent behavior, vol. 9, n. 4, pp. 417-440, 2004.).

3) O valor adicionado per capita pelo setor público à economia, isto é, a contribuição das diversas atividades estatais ao produto interno bruto. O valor adicionado da administração pública é obtida pela soma dos salários dos servidores, do consumo intermediário dos órgãos públicos, de transferências via seguridade social e do resultado das empresas públicas. Trata-se tanto de capacidade extrativa quanto de decisões alocativas do poder público na região. Os efeitos inibidores se dariam pelo financiamento da dissuasão policial e do apoio social público (CULLEN, 1995; BECKER e KASSOUF, 2017BECKER, Kalinca Léia; KASSOUF, Ana Lúcia. “Uma análise do efeito dos gastos públicos em educação sobre a criminalidade no Brasil”. Economia e Sociedade, vol. 26, n. 1, pp. 215-242, 2017.; MESSNER e ROSENFELD, 1997MESSNER, Steven F.; ROSENFELD, Richard. “Political Restraint of the Market and Levels of Criminal Homicide: A Cross-National Application of Institutional-Anomie Theory”. Social Forces, vol. 75, n. 4, pp. 1393-1416, 1997.; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.; RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.).

4) A renda média domiciliar per capita pode ser relacionada a oportunidades para obtenção de renda pelos atores, tanto criminais quanto laborais, como também aos padrões de consumo de referência e à renda tributável que compõe parte do setor público. Controlada pelos demais fatores, permitirá inferir o peso das oportunidades criminais rentáveis sobre a violência (MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.).

5) Os homens são o grupo demográfico mais frequentemente envolvido em situações violentas, como autores ou vítimas - ambos com mais frequência, e por isso espera-se que seu peso relativo na população se correlacione a maior violência (MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.; PIMENTA, 2014PIMENTA, Melissa de Mattos. “Violência e vulnerabilidade social”. In: TAVARES DOS SANTOS, José Vicente; MADEIRA, Lígia Mori (orgs.). Segurança Cidadã. Porto Alegre: Tomo, 2014, pp. 217-248.), embora altos níveis de violência letal entre os homens possam reduzir sua proporção na população.

6) Monoparentalidade feminina pode ser relacionada aos conceitos de laços sociais e apoios sociais (CULLEN, 1995; HIRSCHI, 2004HIRSCHI, Travis. “Self-Control and Crime”. In: BAUMEISTER, Roy F.; VOHS, Kathleen D. (orgs). Handbook of Self-Regulation: Research, Theory, and Applications. Nova York: Guilford, 2004, pp. 537-552.; HIRSCHI e GOTTFREDSON, 1983HIRSCHI, Travis; GOTTFREDSON, Michael R. “Age and the Explanation of Crime”. American Journal of Sociology, vol. 89, n. 3, pp. 552-584, 1983.), na medida em que podemos considerar uma proxy da proporção de mães solteiras, sendo a ausência do pai relacionada ao abandono, ao encarceramento ou à mortalidade e, de qualquer maneira, resultando em menor capacidade de controle e apoio social pela responsável pelo núcleo familiar. A questão familiar é importante para a juventude por causa da coesão do núcleo familiar de formação e da constituição de novas famílias pelos jovens (MAUGER, 2013MAUGER, Gérard. “Juventude: Idades da vida e gerações”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 56, n. 1, pp. 169-183, 2013.).

7) Os padrões de urbanização desigual que formaram as grandes metrópoles brasileiras são muitas vezes considerados causadores das altas taxas de homicídios desses milieux, especialmente em áreas de periferias urbanas e favelas em que se constituíram ambientes hostis, marcados pela concentração socioespacial de privações absolutas e relativas, materiais e simbólicas, que erodem localmente os mecanismos de controle e apoio social e o acesso a oportunidades legítimas, criando um contexto favorável para a formação de gangues armadas, que muitas vezes funcionam como focos de solidariedade grupal e meios de obtenção de renda nos mercados ilícitos para jovens. No mesmo sentido, o acesso a esgotamento sanitário, controlado pela urbanização, é uma proxy da favelização da metrópole (VERMELHO e JORGE, 1996VERMELHO, Letícia Legay; JORGE, Maria Helena P. de Mello. “Mortalidade de jovens: análise do período de 1930 a 1991 (a transição epidemiológica para a violência)”. Rev. Saúde Pública, São Paulo, vol. 30, n. 4, pp. 319-331, 1996. ; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.; MACHADO e NORONHA, 2002MACHADO, Eduardo Paes; NORONHA, Ceci Vilar. “A polícia dos pobres: violência policial em classes populares urbanas”. Sociologias, Porto Alegre, n. 7, pp. 188-221, 2002.; PAIVA, 2014PAIVA, Luiz Fábio Silva. Contingências da violência em um território estigmatizado. Campinas: Pontes, 2014.).

8) Crescimento populacional é a variação percentual da população nos últimos cinco anos anteriores ao ano de referência. Trata-se de um indicador clássico para inferir a instabilidade e heterogeneidade sociodemográficas que seriam causadas pelo afluxo de migrantes e pela alta natalidade, resultando em fragmentação cultural, sobrecarga de serviços públicos, sobreoferta de força de trabalho e superdemanda habitacional, criando um contexto favorável à delinquência (SOARES, 2008SOARES, Gláucio Ary Dillon. Não matarás: Desenvolvimento, desigualdade e homicídios. Rio de Janeiro: FGV, 2008.; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.).

9) A educação formal é uma das vias de acesso às oportunidades legítimas, além de ser um veículo de difusão de informação qualificada e de valores democráticos, aplacando a vulnerabilidade juvenil à violência ( RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.).

10) O mercado de trabalho é central para pensar a questão da juventude (GROPPO, 2010GROPPO, Luís Antonio. “Condição juvenil e modelos contemporâneos de análise sociológica das juventudes”. Ultima Década, Santiago, vol. 18, n. 33, pp. 11-26, 2010.; MAUGER, 2013MAUGER, Gérard. “Juventude: Idades da vida e gerações”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 56, n. 1, pp. 169-183, 2013.). O desemprego entre jovens aponta para o mecanismo de bloqueio de oportunidades legítimas, gerando uma tensão social que favoreceria condutas desviantes, como a delinquência e a drogadição, ao provocar uma frustração persistente. Ademais, aponta para a disponibilidade de meios legítimos ou ilegítimos para transitar para a vida adulta por meio da inserção profissional e da renda individua - o que, dependendo das circunstâncias, pode ser algo muito mais factível por meio do crime do que por trabalhos legítimos. Enquanto o desemprego juvenil indica bloqueio de oportunidades, a desigualdade de renda implicaria a violência por meio de uma comparação feita pelos jovens na base da pirâmide social entre a sua situação e entre as dos que estão mais próximos do topo, gerando uma frustração pela privação relativa (MERTON, 1938MERTON, Robert K. “Social Structure and Anomie”. American Sociological Review, vol. 3, n. 5, pp. 672-682, 1938.; CLOWARD e OHLIN, 2011CLOWARD, Richard A.; OHLIN, Lloyd E. Delinquency and Opportunity. Nova York: Taylor & Francis, 2011.; AGNEW, 1992AGNEW, Robert. “Foundation for a General Strain Theory of Crime and Delinquency”. Criminology, vol. 30, n. 1, pp. 47-88, 1992., 2008AGNEW, Robert et al. “Socioeconomic Status, Economic Problems, and Delinquency”. Youth & Society, vol. 40, n. 2, pp. 159-181, 2008., 2015AGNEW, Robert. “Strain, Economic Status, and Crime”. In: PIQUERO, Alex R. (org). The Handbook of Criminological Theory. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015, pp. 209-229.; GUIMARÃES, 2011GUIMARÃES, Roberta. “O papel do desemprego nas altas taxas de homicídio entre os jovens no Brasil Metropolitano”. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Segurança, Justiça e Cidadania. O panorama dos homicídios no Brasil. Ano 3, n. 6. Brasília: Senasp, 2011, pp. 183-204.; RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.; PIMENTA, 2014PIMENTA, Melissa de Mattos. “Violência e vulnerabilidade social”. In: TAVARES DOS SANTOS, José Vicente; MADEIRA, Lígia Mori (orgs.). Segurança Cidadã. Porto Alegre: Tomo, 2014, pp. 217-248.; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.).

A seguir, apresentamos a matriz de correlação entre as variáveis independentes:

Figura 1
Matriz de correlação entre variáveis independentes - metrópoles (1992-2014)

Procedemos com análises descritivas, regressões simples e um modelo multivariado. Como os dados são estruturados como painel balanceado, aplicamos um teste de dependência de corte transversal e um teste de Hausmann, concluindo pela utilização do painel de efeitos fixos. A vantagem desse método é identificar os efeitos singulares unitários, podendo ser considerada uma constante própria (somada ou subtraída à constante geral) para cada metrópole.

Sendo assim, consideramos que o logaritmo natural da taxa de homicídios intencionais de jovens em uma região metropolitana, em um dado ano, é igual a uma constante geral mais ou menos uma constante unitária, mais a soma do produto do valor de cada uma das variáveis naquela região e naquele ano multiplicada pelo coeficiente (beta) de cada variável, mais um erro aleatório, no seguinte formato:

Ln_Yij=Constante+Efeito fixoj+B1X1ij+B2X2ij+...BkXkij+Eij

Y é a taxa de homicídios intencionais e Xk, as variáveis independentes. Utilizamos o método PCSE (panel corrected standard errors) de Beck e Katz (1995)BECK, Nathaniel; KATZ, Jonathan N. “What to Do (and Not to Do) with Time-Series Cross-Section Data”. American Political Science Review, v. 89, n. 3, p. 634-647, 1995. para corrigir a heterocedasticidade comum nos modelos de dados em painel e obter estimativas mais eficientes.

Se o efeito fixo é útil para controlar os efeitos das singularidades locais, o modelo de painel dinâmico é usado para o controle do viés causado pela autocorrelação temporal das taxas de homicídios intencionais, a “dependência de trajetória” do nível de crimes letais intencionais. Construímos painéis dinâmicos pelo método generalizado dos momentos em diferença (GMM-Dif) em um passo e um AR0F1 1 Autoregression (autorregressão, em português). Termo técnico de econometria/estatística de séries temporais. , obtendo apoio do teste de Sargan para essa especificação.

Descrição dos resultados

Oficialmente, 354.463 jovens foram assassinados entre 1979 e 2019 nestas regiões metropolitanas. Pela nossa estimativa, no entanto, podem ter sido mais de 408.800. Apesar da nossa análise centrar-se entre 1992 e 2014, o dado é, por si mesmo, impactante, pois comunica a magnitude da vitimização juvenil por agressões. Além do contraste entre as taxas oficiais e as taxas ajustadas de homicídios em geral e juvenis, também o desemprego como problemática da juventude podem ser vistos a seguir:

Quadro 2
Estatísticas descritivas, usando as observações 1:01-9:27

A macro incidência das agressões letais contra e entre jovens variou muito ao longo do tempo entre as metrópoles, como pode-se verificar na Figura 2, observando o crescimento da criminalidade violenta, especialmente em Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre e o decréscimo em São Paulo e no Rio de Janeiro. Constatamos também que as metrópoles de Recife e Belo Horizonte tiveram um auge no meio da série, com um início de decréscimo posterior:

Figura 2
Séries temporais da taxa ajustada de homicídios intencionais de jovens nas metrópoles de Belém (1), Fortaleza (2), Recife (3), Salvador (4), Belo Horizonte (5), Rio de Janeiro (6), São Paulo (7), Curitiba (8) e Porto Alegre (9), 1992-2014

Nas regressões bivariadas, o consumo mórbido de drogas, o setor público per capita, o esgotamento sanitário e a renda média domiciliar não tiveram efeitos significativos sobre a taxa de homicídios intencionais de jovens. O desemprego geral e entre jovens, a prevalência de armas de fogo pelo Índice Cook, a monoparentalidade feminina, a urbanização e a taxa de homicídios de jovens do ano anterior, como esperado, tiveram efeitos positivos e significativos. Já o crescimento populacional, a razão entre homens e mulheres, a escolaridade e a desigualdade de renda tiveram efeitos significativos e contrários às expectativas, como pode-se observar a seguir.

Figura 3
Regressões bivariadas sobre homicídios de jovens nas metrópoles

Nos modelos multivariados, alguns resultados foram diferentes, sugerindo a existência de moderações e mediações entre algumas variáveis. Considerando 5% de significância aceitável (dois ou três asteriscos), o consumo mórbido de drogas e a renda domiciliar per capita adquiriram significância e efeitos positivos, enquanto o crescimento populacional, a razão entre homens e mulheres, a monoparentalidade feminina, a desigualdade de renda e a urbanização perderam a significância. A presença socioeconômica do Estado tornou-se significativa, e com sinal negativo. O desemprego juvenil e o acesso a armas de fogo mantiveram o efeito positivo e significativo. A escolaridade teve o sinal invertido, mas perdeu a significância.

O modelo multivariado pode ter contribuído para isolar efeitos específicos de algumas variáveis e reduzir confusão devido à sobreposição de causalidades. Efeitos fixos unitários também podem ter ajudado a eliminar confusões entre múltiplas causas. O modelo alcançou 60% de poder explicativo com as dummies unitárias, e 46% de coeficiente de explicação “por dentro”.

Quadro 3
Efeitos-fixos, usando 207 observações. Incluídas nove unidades de corte transversal. Comprimento da série temporal = 23. Variável dependente: l_TxAjHomicidJovens. Erros padrão de Beck-Katz

Os modelos de painel dinâmico, usando o método generalizado dos momentos em diferença e em um passo, tiveram ainda outro resultado: constatamos que o consumo de álcool e drogas manteve o sinal e a significância, e a escolaridade adquiriu significância, com sinal negativo, que era o esperado, enquanto a razão de homens por mulher voltou a mostrar sinal negativo e significativo, um resultado contrário ao esperado, mas consistente com regressão bivariada.

Quadro 4
Painel dinâmico (GGM-Dif) em 1 passo, usando 189 observações. Incluídas 9 unidades de corte transversal. Matriz H de acordo com Ox/DPD. Variável dependente: l_TxAjHomicidJovens

Análise dos resultados

O proxy para consumo de álcool e drogas apoia, nos modelos multivariados, a hipótese da existência de efeitos do consumo de psicoativos (álcool e drogas ilícitas) sobre a taxa de homicídios dolosos de jovens, principalmente pela via das disputas relacionadas aos mercados de drogas ilícitas, também mostrando que a mortalidade por consumo de psicoativos pode ser uma proxy útil para inferir o volume de atividade do tráfico de drogas. O consumo de psicoativos pode ser ligado à violência em vários níveis. Algumas substâncias afrouxam o autocontrole individual ou podem estimular a agressividade, aumentando a chance do indivíduo se envolver em situações violentas. O uso compulsivo e a falta de dinheiro podem incentivar o usuário a recorrer a atividades ilícitas como meio de aquisição da subsistência e dos psicoativos, sobretudo recorrendo aos roubos, que podem resultar em mortes (latrocínios) ou ser retaliados por meio de linchamentos, violência policial e assassinato por encomenda. Usuários mórbidos podem se endividar para consumir drogas ilícitas, acabando assassinados pelos traficantes credores.

A venda de drogas ilícitas serve de fonte de lucro principal para gangues armadas territoriais, que disputam entre si o controle de pontos de venda e usam a renda obtida com o tráfico para adquirir armas de fogo e subornar policiais. O uso e o tráfico de drogas ilícitas, como atividades proibidas e criminalizadas, são reprimidos por forças policiais e militares, que podem se envolver em confrontos armados com gangues de traficantes ou cometer excessos e abusos letais no decorrer da ação repressiva. Os confrontos entre gangues e entre elas e policias e militares muitas vezes vitimam moradores e transeuntes sem envolvimento com o tráfico de drogas ilícitas. Os próprios policiais e militares encarregados de reprimir o tráfico de drogas podem buscar a sua parcela nos lucros, extorquindo traficantes por meio da ameaça de prisão ou de morte. Por fim, o consumo de drogas ilícitas se associa à tensão social e à anomia por ser uma das suas modalidades de expressão (GOLDSTEIN, 1985GOLDSTEIN, Paul J. “The Drugs/Violence Nexus: A Tripartite Conceptual Framework”. Journal of Drug Issues, vol. 15, n. 4, pp. 493-506, 1985.; DAUDELIN e RATTON, 2017DAUDELIN, Jean; RATTON, José Luiz. “Mercados de drogas, guerra e paz no Recife”. Tempo soc., São Paulo, vol. 29, n. 2, pp. 115-134, 2017.; MINAYO, 1998MINAYO, Maria Cecília de Souza; DESLANDES, Suely Ferreira. “A complexidade das relações entre drogas, álcool e violência”. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, vol. 14, n. 1, pp. 35-42, 1998.; MACHADO e NORONHA, 2002MACHADO, Eduardo Paes; NORONHA, Ceci Vilar. “A polícia dos pobres: violência policial em classes populares urbanas”. Sociologias, Porto Alegre, n. 7, pp. 188-221, 2002.; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.; MIETHE e RECOACZE, 2004).

No mesmo sentido, o acesso a armas de fogo, medido pelo Índice Cook, mostrou-se positivo e significativo, como esperado, na regressão simples e efeitos fixos multivariado, só perdendo a significância no painel dinâmico. Isso evidencia que as armas de fogo estão estreitamente ligadas à violência letal, servindo como um facilitador de homicídios intencionais contra jovens, quaisquer que sejam os motivos. Por outro lado, a perda de significância do painel dinâmico pode sugerir que o inverso também é verdade: maiores níveis de violência semeiam o medo e estimulam o armamento privado, assim como um tráfico de drogas mais lucrativo permite maior gasto com armas pelos grupos criminosos (HEMENWAY et al., 2000HEMENWAY, David et al. “Firearm Availability and Homicide Rates Across 26 High-Income Countries”. Journal of Trauma and Acute Care Surgery, vol. 49, n. 6, pp. 985-988, 2000.; COOK, 1979COOK, Philip J. “The Effect of Gun Availability on Robbery and Robbery Murder”. Policy studies review annual, vol. 3, pp. 743-81, 1979.; HEPBURN e HEMENWAY, 2004HEPBURN, Lisa M.; HEMENWAY, David. “Firearm Availability and Homicide: A Review of the Literature”. Aggression and Violent behavior, vol. 9, n. 4, pp. 417-440, 2004.).

A conexão bivariada entre o setor público local e os homicídios de jovens é não significativa na regressão simples e no painel dinâmico, mas negativa e significativa no painel de efeitos fixos. A explicação reside no controle e mediação dos fatores correlatos às capacidades públicas, pois a renda dos mercados consumidores e o crescimento econômico impulsionado por investimentos públicos também podem favorecer a violência por meio da multiplicação de oportunidades criminais lucrativas. A análise multivariada atesta que a despesa pública direta local para a implementação de políticas públicas e prestação de serviços mostra um efeito dissuasivo e preventivo da violência criminal.

Não é possível dizer se a redução dos homicídios intencionais pela ação do setor público se dá pela capacidade da polícia e do Poder Judiciário de efetivar o monopólio da violência legítima ao punir criminosos violentos (ELIAS, 2011ELIAS, Norbert. O processo civilizador. 2.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, 2 vols.; EISNER, 2014EISNER, Manuel. “From Swords to Words: Does Macro-Level Change in Self-Control Predict Long-Term Variation in Levels of Homicide?”. Crime and Justice, vol. 43, n. 1, pp. 65-134, 2014.), pelo apoio social público, compensando o enfraquecimento dos laços sociais tradicionais com as famílias e comunidades com laços sociais modernos, ligados à educação, ao uso de serviços públicos e ao trabalho (CULLEN, 1995; RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.) ou pela regulação política dos mercados, ao coibir a prevalência do instrumentalismo e robustecer o poder normativo das instituições e valores não mercadológicos, prevenindo a anomia institucional (MESSNER e ROSENFELD, 1997MESSNER, Steven F.; ROSENFELD, Richard. “Political Restraint of the Market and Levels of Criminal Homicide: A Cross-National Application of Institutional-Anomie Theory”. Social Forces, vol. 75, n. 4, pp. 1393-1416, 1997.; CURRIE, 1997; 2018).

Estudos indicam que tanto gastos na educação e em políticas como o Programa Bolsa Família, como gastos na segurança pública, especialmente na melhoria da quantidade e qualidade do efetivo policial, contribuem para a redução da criminalidade violenta, mas que o encarceramento não têm efeitos significativos (DE ARAUJO JR. et al., 2014DE ARAUJO JR., Ari Francisco et al. “O efeito do encarceramento sobre as taxas de homicídio no Brasil”. Revista do Instituto do Direito Brasileiro, vol. 3, n. 9, pp. 6359-6388, 2014.; BECKER e KASSOUF, 2017BECKER, Kalinca Léia; KASSOUF, Ana Lúcia. “Uma análise do efeito dos gastos públicos em educação sobre a criminalidade no Brasil”. Economia e Sociedade, vol. 26, n. 1, pp. 215-242, 2017.; GAULEZ e FERRO, 2018GAULEZ, Maiara Patti; FERRO, Andrea Rodrigues; MOREIRA, Gustavo Carvalho. “O efeito do encarceramento de homicidas sobre a taxa de homicídios no Brasil”. Economic Analysis of Law Review, vol. 9, n. 2, pp. 288-307, 2018.). É mais provável que se trate de uma combinação de dissuasão policial, apoio social e regulação normativa, que impactam a criminalidade violenta de maneira diferenciada e complementar. De qualquer maneira, o controle da violência exige a construção de um Estado democrático robusto, ao mesmo tempo amplo nas atribuições e eficiente em sua prestação. A perda de significância no painel dinâmico pode dever-se à ligação entre as trajetórias locais da violência criminal e da formação do Estado, sendo talvez a ação estatal, no modelo de painel dinâmico, mais bem capturada indiretamente, por meio do efeito preventivo (negativo e significativo) da escolaridade sobre os homicídios intencionais.

A renda média domiciliar per capita não foi significativa na análise simples, mas foi positiva na análise multivariada de efeitos fixos e não significativa no painel dinâmico. A indiferença, no modelo simples, entre o mercado consumidor e a violência letal contra/entre jovens pode ser encarada como a combinação de efeitos em sentido contrário. Enquanto a prosperidade econômica, ligada a maiores oportunidades legítimas (trabalho remunerado), reduz parcialmente uma das principais fontes de tensão social (MERTON, 1938MERTON, Robert K. “Social Structure and Anomie”. American Sociological Review, vol. 3, n. 5, pp. 672-682, 1938.; AGNEW, 2008AGNEW, Robert et al. “Socioeconomic Status, Economic Problems, and Delinquency”. Youth & Society, vol. 40, n. 2, pp. 159-181, 2008. e 2015AGNEW, Robert. “Strain, Economic Status, and Crime”. In: PIQUERO, Alex R. (org). The Handbook of Criminological Theory. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015, pp. 209-229.), a maior arrecadação estatal permite maior aporte em políticas públicas que reduzem a violência por meio do apoio social e da coerção legal (CULLEN, 1995; HIRSCHI, 2004HIRSCHI, Travis. “Self-Control and Crime”. In: BAUMEISTER, Roy F.; VOHS, Kathleen D. (orgs). Handbook of Self-Regulation: Research, Theory, and Applications. Nova York: Guilford, 2004, pp. 537-552.; ELIAS, 2011ELIAS, Norbert. O processo civilizador. 2.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, 2 vols.).

Por outro lado, a renda média indica mais diretamente o tamanho relativo do mercado consumidor, o que pode desaguar também nos mercados ilícitos, por ação dos próprios consumidores (aquisição de produtos ilícitos como drogas, armas, apostas ilegais, produtos roubados e furtados etc.) ou pelo uso da violência para extrair bens e renda desses mesmos consumidores, por meio de roubos e extorsão. Por último, a renda média pode se revestir de um significado sociocultural ao indicar um possível padrão médio de consumo, objeto de anseio e comparação para todos, cuja elevação pode se tornar uma fonte adicional de tensão social quando não é acompanhada pela ampliação de oportunidades legítimas, apoios públicos, dissuasão policial e laços sociais.

Esse sentido sociocultural do consumo médio pode ser observado, na análise multivariada, pela cláusula ceteris paribus: mantendo constantes as demais variáveis, como o nível do desemprego, a desigualdade, a presença socioeconômica do Estado e as condições urbanas, o acesso a armas e o uso mórbido de drogas e álcool, o aumento da renda média domiciliar per capita, ou seja, do mercado consumidor privado interno, tem-se o acréscimo das oportunidades criminais lucrativas e da privação relativa, levando ao crescimento dos homicídios intencionais contra jovens (MESSNER, THOME e ROSENFELD, 2008MESSNER, Steven F.; THOME, Helmut; ROSENFELD, Richard. “Institutions, Anomie, and Violent Crime: Clarifying and Elaborating Institutional-Anomie Theory”. International Journal of Conflict and Violence (IJCV), vol. 2, n. 2, pp. 163-181, 2008.; AGNEW, 1992AGNEW, Robert. “Foundation for a General Strain Theory of Crime and Delinquency”. Criminology, vol. 30, n. 1, pp. 47-88, 1992., 2008AGNEW, Robert et al. “Socioeconomic Status, Economic Problems, and Delinquency”. Youth & Society, vol. 40, n. 2, pp. 159-181, 2008., 2015AGNEW, Robert. “Strain, Economic Status, and Crime”. In: PIQUERO, Alex R. (org). The Handbook of Criminological Theory. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015, pp. 209-229.).

Embora uma parcela da violência anômica resultante possa ficar oculta sob a deterioração das estatísticas criminais e vitais - o que tentamos corrigir -, a maior circulação de riquezas entre a população também significa maior abundância de renda que pode ser roubada, extorquida ou usada para o consumo de mercadorias ilícitas, como drogas e armas de fogo, propiciando maior lucro para atividades criminosas e, por conseguinte, o acirramento das disputas entre criminosos pelo controle dessas crescentes fontes de renda (GOLDSTEIN, 1985GOLDSTEIN, Paul J. “The Drugs/Violence Nexus: A Tripartite Conceptual Framework”. Journal of Drug Issues, vol. 15, n. 4, pp. 493-506, 1985.; ZALUAR e BARCELOS, 2013ZALUAR, Alba; BARCELLOS, Christovam. “Mortes prematuras e conflito armado pelo domínio das favelas no Rio de Janeiro”. Rev. bras. Ci. Soc., São Paulo, vol. 28, n. 81, pp. 17-31, 2013.). O efeito positivo e significativo da renda média, mantendo o desemprego, desigualdade, serviço público e educação constantes, portanto, pode ser explicado pelo aumento tanto pelo significado sociocultural do consumo individual como do transbordamento da renda dos domicílios para a economia criminal.

O declínio ou a prevalência da família nuclear tradicional (chefiada por um homem) e seu resultado na regressão bivariada tem afinidade com aquilo que Hirschi e Gottfredson (2006)HIRSCHI, Travis; GOTTFREDSON, Michael R. “A General Theory of Crime”. In: CULLEN, Francis T.; AGNEW, Robert (orgs). Criminological Theory: Past to Present (Essential Readings). 3.ed. Los Angeles: Roxbury Publishing Co., 2006, pp. 228-240. chamaram de “controle social”: laços sociais fortes em famílias tradicionais. O sentido não deixa de ser ambivalente: alta monoparentalidade feminina soma tanto mulheres que moram sozinhas, com ou sem filhos, como pais ausentes por terem abandonado filhos e esposa ou terem sido mortos ou encarcerados - essas últimas hipóteses podem indicar uma retroalimentação entre violência e arranjos familiares monoparentais em alguns contextos. Sozinhas, as mães têm menor capacidade de apoio e supervisão dos filhos do que se compartilhassem essas responsabilidades. O sentido é similar ao do setor público local, que também contribui para o controle social e apoio social institucionalizados, mas por meios administrativos, em vez dos laços sociais. Nas análises multivariadas não verificamos significância: é provável que o declínio da coesão familiar possa ser compensada por níveis de apoio social público, escolarização e oportunidades de trabalho, tornando-se menos relevante.

Por outro lado, o efeito negativo e significativo do crescimento populacional quinquenal na regressão simples e o efeito não significativo no modelo multivariado contrariam a hipótese de que a migração e alta natalidade necessariamente levam à desorganização social. Com base nesse resultado, é possível especular que, nas metrópoles brasileiras, a atração de migrantes seja efeito da demanda por força de trabalho e da qualidade da administração pública na metrópole, enquanto a estagnação populacional revelaria o contrário, pois, quando controlado pelo desemprego e pelo setor público per capita, o crescimento populacional manteve o sinal, mas perdeu a significância.

No mesmo sentido, a urbanização é vista como uma das causadoras da violência criminal, por ensejar uma aglomeração de privações socioeconômicas em frações do espaço urbano e reduzir o controle social comunitário, criando contextos onde se formam subculturas criminais (ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.; MACHADO e NORONHA, 2002MACHADO, Eduardo Paes; NORONHA, Ceci Vilar. “A polícia dos pobres: violência policial em classes populares urbanas”. Sociologias, Porto Alegre, n. 7, pp. 188-221, 2002.; PAIVA, 2014PAIVA, Luiz Fábio Silva. Contingências da violência em um território estigmatizado. Campinas: Pontes, 2014.), o que justificaria igualmente a hipótese de efeitos negativos entre esgotamento sanitário e taxa de homicídios. No entanto, a urbanização só foi significativa e positiva na regressão bivariada, e o esgotamento sanitário não foi significativo nem na regressão simples nem na múltipla com efeitos fixos ou momentos generalizados, exceto quando usamos o percentual de suicídios como proxy para o acesso a armas de fogo. Podemos especular se o que foi visto como efeito da urbanização seria, na verdade, um efeito espacial combinado de um setor público pequeno (incluindo um sistema educacional público de baixa qualidade e investimento), um mercado de trabalho excludente, decadência dos laços sociais tradicionais e aumento das oportunidades criminais lucrativas criadas pelos amplos mercados de consumo protagonizados pelas classes médias e altas urbanas. Logo, a urbanização impactaria os homicídios intencionais por meio da estrutura socioeconômica das metrópoles.

A escolaridade, contrariando a hipótese, mostrou efeitos positivos e significativos sobre a taxa de homicídios intencionais de jovens no modelo de regressão simples, enquanto na análise multivariada mudou de sinal, talvez devido ao controle por correlatos como a renda média e a urbanização, tornando-se não significativa pelo método de efeitos fixos e significativa, no sentido esperado, pelo método generalizado dos momentos. Como a escolaridade média é acumulada pelo indivíduo ao longo da trajetória escolar, pode-se interpretar o sinal negativo como a formação de disposições contrárias à violência por meio da socialização escolar, em que se formariam laços com professores e colegas, exigindo ainda um maior autocontrole dos alunos para progredir na escolarização, incidindo tanto entre gerações como no ciclo de vida individual e viabilizando acesso a melhores oportunidades de trabalho, o que reduziria a tensão inerente à fase juvenil (MAUGER, 2013MAUGER, Gérard. “Juventude: Idades da vida e gerações”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 56, n. 1, pp. 169-183, 2013.; GROPPO, 2011; PIMENTA, 2014PIMENTA, Melissa de Mattos. “Violência e vulnerabilidade social”. In: TAVARES DOS SANTOS, José Vicente; MADEIRA, Lígia Mori (orgs.). Segurança Cidadã. Porto Alegre: Tomo, 2014, pp. 217-248.; HIRSCHI, 2004HIRSCHI, Travis. “Self-Control and Crime”. In: BAUMEISTER, Roy F.; VOHS, Kathleen D. (orgs). Handbook of Self-Regulation: Research, Theory, and Applications. Nova York: Guilford, 2004, pp. 537-552.; RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.).

O desemprego de jovens mostrou associação positiva e significativa, tanto no modelo simples como na análise multivariada de efeitos fixos, perdendo eficácia apenas no painel dinâmico. O resultado apoia parcialmente a hipótese que relaciona o crime violento ao bloqueio de oportunidades e, no modelo multivariado de efeitos fixos, com o controle pela renda domiciliar, a hipótese que explica o crime violento pela privação de oportunidades legítimas em comparação a um maior padrão médio de consumo (MERTON, 1938MERTON, Robert K. “Social Structure and Anomie”. American Sociological Review, vol. 3, n. 5, pp. 672-682, 1938.; CLOWARD e OHLIN, 2011CLOWARD, Richard A.; OHLIN, Lloyd E. Delinquency and Opportunity. Nova York: Taylor & Francis, 2011.; AGNEW, 1992AGNEW, Robert. “Foundation for a General Strain Theory of Crime and Delinquency”. Criminology, vol. 30, n. 1, pp. 47-88, 1992., 2008AGNEW, Robert et al. “Socioeconomic Status, Economic Problems, and Delinquency”. Youth & Society, vol. 40, n. 2, pp. 159-181, 2008., 2015AGNEW, Robert. “Strain, Economic Status, and Crime”. In: PIQUERO, Alex R. (org). The Handbook of Criminological Theory. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015, pp. 209-229.).

Um mercado de trabalho restrito cria obstáculos consideráveis para uma parcela dos jovens lograr inserção por meio do emprego, gerando situações de tensão estrutural que favorecem condutas desviantes, pois bloqueiam vias legítimas para a transição entre a menoridade e a maturidade, sobretudo em relação à inserção profissional e, indiretamente, à sustentação econômica de núcleos familiares estáveis. Mercados ilícitos, sobretudo o narcotráfico e a receptação, aparecem então como uma alternativa viável para a obtenção da renda e a realização das aspirações ao consumo, da mesma forma que a posse de armas de fogo impõe o respeito desejado e o consumo de psicoativos oferece uma solução escapista para as tensões sociais. A conexão empírica entre desemprego e homicídio juvenis resistiu ao controle das demais variáveis, apontando que a dinâmica do mercado de trabalho está ligada à criminalidade violenta mesmo quando controlada pelas proxies do consumo de drogas e da presença econômica estatal. Isso pode ser lido como a existência de processos de tensão e desorganização sociais ligados ao desemprego, que podem ou não ser canalizadas para a atuação em mercados ilícitos ou moderados por dispositivos de apoio e controle social públicos. A evidência, portanto, apoia alguns dos argumentos mais comentados em relação à juventude: a questão do trabalho, sobretudo os efeitos que o bloqueio de oportunidades legítimas pode gerar na formação de uma identidade juvenil, e o quanto a privação socioeconômica em uma sociedade de mercado, em que há pressão onipresente pelo sucesso, pode ser um precipitador da frustração socioemocional e do envolvimento dos jovens na criminalidade, produzindo fortes vulnerabilidades juvenis à violência (RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.; MACHADO e NORONHA, 2002MACHADO, Eduardo Paes; NORONHA, Ceci Vilar. “A polícia dos pobres: violência policial em classes populares urbanas”. Sociologias, Porto Alegre, n. 7, pp. 188-221, 2002.; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.; PAIVA, 2014PAIVA, Luiz Fábio Silva. Contingências da violência em um território estigmatizado. Campinas: Pontes, 2014.; GROPPO, 2010GROPPO, Luís Antonio. “Condição juvenil e modelos contemporâneos de análise sociológica das juventudes”. Ultima Década, Santiago, vol. 18, n. 33, pp. 11-26, 2010.; MAUGER, 2013MAUGER, Gérard. “Juventude: Idades da vida e gerações”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 56, n. 1, pp. 169-183, 2013.; GUIMARÃES, 2011GUIMARÃES, Roberta. “O papel do desemprego nas altas taxas de homicídio entre os jovens no Brasil Metropolitano”. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Segurança, Justiça e Cidadania. O panorama dos homicídios no Brasil. Ano 3, n. 6. Brasília: Senasp, 2011, pp. 183-204.). O resultado não significativo no painel dinâmico, por outro lado, sugere que o desemprego pode ter uma forte sobreposição com a própria história local da violência, atuando no sentido de reforçar as tendências prévias.

Inversamente, a desigualdade de renda mostrou associação negativa e significativa com a vitimização letal juvenil na regressão simples e insignificante nas regressões multivariadas. Isso contraria a hipótese da frustração induzida pela autocomparação dos jovens desfavorecidos com os mais privilegiados, a não ser que consideremos que a privação relativa se dá pela comparação não com o topo da distribuição de renda, mas com padrões médios de consumo, mantendo o desemprego e os serviços públicos constantes.

Também sugere que o inesperado resultado do modelo bivariado - desigualdade “reduzindo” os homicídios de jovens - deveu-se à confusão com a renda média, negativamente associada à desigualdade e com efeitos positivos e significativos sobre a violência criminal na regressão multivariada. Atente-se, ainda, que assim como a proporção de homens na população, o Índice de Gini de distribuição de renda mostrou alta estabilidade e baixa dispersão em seus parâmetros descritivos, o que talvez torne difícil a avaliação dos efeitos conjunturais da desigualdade sobre a formação e difusão de disposições violentas.

Considerações finais

Neste artigo, abordamos a questão empírica da variação, entre metrópoles brasileiras, da vitimização letal de jovens por agressões, genericamente considerada homicídio intencional. Na legislação brasileira, na verdade, essas ações incluem uma série de categorias de crimes dolosos, como homicídio, lesão corporal, latrocínio e homicídio com excludente de ilicitude por legítima defesa ou cumprimento do dever legal.

O objeto, no entanto, respondia à questão teórica da criminalidade violenta e da juventude como categoria social, que exprime uma fase do ciclo de vida nas sociedades modernas tardias - e periféricas, no caso brasileiro. A configuração de um cenário macro-histórico de altas taxas de vitimização por crimes dolosos, e especificamente de mortalidade juvenil por agressões, responde a uma série de macrodeterminantes mediados por mecanismos causais subjacentes.

Esses postulados presidiram a construção do modelo descritivo, simples e multivariado. Ao revisar a literatura, constatamos que algumas questões relativas à teorização geral sobre as juventudes ligam-se a categorias e mecanismos também estabelecidos por argumentos da sociologia criminológica: tensão social como atrito entre as metas de sucesso individual generalizadas na ordem cultural hegemônica e a estrutura de oportunidades legítimas e ilegítimas de realização disponíveis aos atores (MERTON, 1938MERTON, Robert K. “Social Structure and Anomie”. American Sociological Review, vol. 3, n. 5, pp. 672-682, 1938.; CLOWARD e OHLIN, 2011CLOWARD, Richard A.; OHLIN, Lloyd E. Delinquency and Opportunity. Nova York: Taylor & Francis, 2011.; AGNEW, 1992AGNEW, Robert. “Foundation for a General Strain Theory of Crime and Delinquency”. Criminology, vol. 30, n. 1, pp. 47-88, 1992., 2008AGNEW, Robert et al. “Socioeconomic Status, Economic Problems, and Delinquency”. Youth & Society, vol. 40, n. 2, pp. 159-181, 2008., 2015AGNEW, Robert. “Strain, Economic Status, and Crime”. In: PIQUERO, Alex R. (org). The Handbook of Criminological Theory. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015, pp. 209-229.), desorganização social como fragilidade, ausência ou instabilidade das redes de laços e apoios sociais pela família, associações e Estado (HIRSCHI, 2004HIRSCHI, Travis. “Self-Control and Crime”. In: BAUMEISTER, Roy F.; VOHS, Kathleen D. (orgs). Handbook of Self-Regulation: Research, Theory, and Applications. Nova York: Guilford, 2004, pp. 537-552.; CULLEN, 1994), além de abordagens integradas, como a anomia institucional (MESSNER, THOME e ROSENFELD, 2008MESSNER, Steven F.; THOME, Helmut; ROSENFELD, Richard. “Institutions, Anomie, and Violent Crime: Clarifying and Elaborating Institutional-Anomie Theory”. International Journal of Conflict and Violence (IJCV), vol. 2, n. 2, pp. 163-181, 2008.; CURRIE, 1997).

As teorias da juventude também identificavam nas transformações do mercado de trabalho, na retração de provisões sociais públicas e na fragmentação e instabilidade dos laços sociais características que definiam a problemática da juventude (GROPPO, 2011; MAUGER, 2013MAUGER, Gérard. “Juventude: Idades da vida e gerações”. Dados, Rio de Janeiro, vol. 56, n. 1, pp. 169-183, 2013.). No entanto, Hirschi e Gottfredson (1983)HIRSCHI, Travis; GOTTFREDSON, Michael R. “Age and the Explanation of Crime”. American Journal of Sociology, vol. 89, n. 3, pp. 552-584, 1983. consideraram a associação entre juventude e delinquência um dado natural e universal, e por isso não merecedor de explicação sociológica.

Algumas argumentações e análises empíricas, por outro lado, problematizaram como a condição juvenil tardo-moderna-periférica se constituiu em uma afinidade eletiva com a criminalidade, ainda que não deixe de ser uma potencial fonte de renovação social (RUOTTI, MASSA e PERES, 2011RUOTTI, Caren; MASSA, Viviane Coutinho; PERES, Maria Fernanda Tourinho. “Vulnerabilidade e violência: Uma nova concepção de risco para o estudo dos homicídios de jovens”. Interface, Botucatu, vol. 15, n. 37, pp. 377-389, 2011.; PIMENTA, 2014PIMENTA, Melissa de Mattos. “Violência e vulnerabilidade social”. In: TAVARES DOS SANTOS, José Vicente; MADEIRA, Lígia Mori (orgs.). Segurança Cidadã. Porto Alegre: Tomo, 2014, pp. 217-248.; HEIMER e MATSUEDA, 1994HEIMER, Karen; MATSUEDA, Ross L. “Role-Taking, Role Commitment, and Delinquency: A Theory of Differential Social Control”. American Sociological Review, vol. 59, pp. 365-390, 1994.; MATSUEDA e HEIMER, 1997MATSUEDA, Ross L.; HEIMER, Karen. “A Symbolic Interactionist Theory of Role-Transitions, Role-Commitments and Deliquency”. In: THORNBERRY, Terence P. (org.). Developmental Theories of Crime and Delinquency. New Brunswick, NJ: Transaction, 1997, pp. 163-213.; ZILLI, 2015ZILLI, Luís Felipe. “O ‘mundo do crime’ e a ‘lei da favela’: aspectos simbólicos da violência de gangues na região metropolitana de Belo Horizonte”. Etnográfica: Revista do Centro em Rede de Investigação em Antropologia, vol. 19, n. 3, p. 463-487, 2015.; MACHADO e NORONHA, 2002MACHADO, Eduardo Paes; NORONHA, Ceci Vilar. “A polícia dos pobres: violência policial em classes populares urbanas”. Sociologias, Porto Alegre, n. 7, pp. 188-221, 2002.; PAIVA, 2014PAIVA, Luiz Fábio Silva. Contingências da violência em um território estigmatizado. Campinas: Pontes, 2014.).

Privados de meios legítimos de inserção, muitos jovens veriam nos mercados ilícitos oportunidades de retorno inacessíveis por meios convencionais, mas esse envolvimento criminal implica a exposição à violência armada, seja dos grupos criminosos rivais seja da polícia, em razão da “violência sistêmica” dos mercados ilícitos (GOLDSTEIN, 1985GOLDSTEIN, Paul J. “The Drugs/Violence Nexus: A Tripartite Conceptual Framework”. Journal of Drug Issues, vol. 15, n. 4, pp. 493-506, 1985.; MIETHE e REGOECZI, 2004MIETHE, Terance D.; REGOECZI, Wendy C. Rethinking Homicide: Exploring Structure and Process Underlying Deadly Situations. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.).

A análise empírica multivariada que desenvolvemos aqui corroborou a hipótese de que o bloqueio de oportunidades legítimas e a violência sistêmica constituída pelos mercados ilícitos, especialmente a demanda por drogas e a oferta de armas de fogo, contribuem para produzir altas taxas de homicídios intencionais contra e entre jovens. Receberam apoio misto, nos modelos multivariados, as ideias de que instituições públicas de apoio e controle social, juntamente com o avanço da socialização escolar, contribuem para proteger a juventude da criminalidade violenta. Por outro lado, as evidências relativas à urbanização e à monoparentalidade feminina, que enfraqueceriam apoios e controles interpessoais e comunitários, só foram corroborados na regressão simples, sendo não significativos na análise multivariada. Em suma, as evidências sugerem que a estrutura de oportunidades legítimas ou ilegítimas contribui amplamente para a explicação da criminalidade violenta contra jovens, ao passo que as formas institucionais e familiares de apoio e controle sociais e educação contribuem para inibir a violência.

No entanto, à exceção do consumo de álcool e de drogas ilícitas, houve diferença considerável entre o painel de efeitos fixos e o painel dinâmico, indicando a existência de fortes efeitos estruturais, ligados tanto às especificidades de cada região como à própria trajetória histórica da violência criminal. Ainda assim, podemos considerar os resultados dos modelos multivariados de efeitos fixos e dinâmicos como complementares, na medida em que contribuem para controlar os condicionantes regionais e históricos da criminalidade violenta e identificar causalidades mais gerais.

Nota

  • 1
    Autoregression (autorregressão, em português). Termo técnico de econometria/estatística de séries temporais.

Referências

  • AGNEW, Robert. “Foundation for a General Strain Theory of Crime and Delinquency”. Criminology, vol. 30, n. 1, pp. 47-88, 1992.
  • AGNEW, Robert et al “Socioeconomic Status, Economic Problems, and Delinquency”. Youth & Society, vol. 40, n. 2, pp. 159-181, 2008.
  • AGNEW, Robert. “Strain, Economic Status, and Crime”. In: PIQUERO, Alex R. (org). The Handbook of Criminological Theory Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015, pp. 209-229.
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Editor responsável: Michel Misse

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    23 Abr 2021
  • Aceito
    14 Mar 2022
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