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TRILHA AUTO GUIADA: PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO E INTERPRETAÇÃO NA FLORESTA NACIONAL MÁRIO XAVIER SANDRA REGINA DA COSTA

ECOLOGICAL TRIAL: A PROPOSAL OF INTERPRETATION AND IMPLEMENTATION ON MÁRIO XAVIER NATIONAL FOREST

RESUMO

O uso de trilhas interpretativas em Unidades de Conservação permite uma maior aproximação com os elementos da natureza e a realização de atividades de educação ambiental dinâmica. Através destas, indivíduos, grupos escolares ou outros grupos de afinidade podem desvendar o ambiente, conhecê-lo melhor e atuar com maior consístência na sua preservação. A crescente expansão urbana e a deterioração da qualidade de vida das grandes cidades, vêm despertando uma demanda por espaços naturais. A proposta de implantação de uma trilha interpretativa na Floresta Nacional Mário Xavier, localizada no Km 50 da antiga Estrada Rio-São Paulo, surge com a constatação do uso desta Unidade, pelas comunidades de Seropédica e circunvizinhas, carentes de áreas verdes para lazer. Para levantamento do percurso, realizou-se excursões a área observando a paisagem e suas alterações de nuanças e texturas, bem como aspectos de topografia e clima. O trajeto marcado foi escolhido por ser representativo e abranger áreas de significativa beleza. Foi confeccionado croquis descritivo da trilha destacando: percurso e distância, paradas para observações da flora e fauna, tipo e estrutura da vegetação local. Como resultado final, a implantação da trilha visa estabelecer o uso público dos recursos naturais, através de programas de educação ambiental, visitas de grupos escolares. Visa consorciar recreação e educação, de modo que o visitante compreenda, por si só, a necessidade e importância de sua conservação.

Palavras-chaves:
Trilha ecológica; Educação ambiental; FLONA Mário Xavier

ABSTRACT

The FLONA Mário Xavier is a conservation area with natural and planted forests. It is located in a deforested region near Rio de Janeiro suburbs and small country cities with low number of public abactions and natural entertenaiments. This article proposes a more intensive use of this area with the location of natural trial, description of landscapes attractions and preparation of basic structure for environmental education by local communities. Some relevants species are decribed and maintenance recommendations are listed. Five interesting points are described to increase peoples knowledge and interactions with natural elements

Key words:
Ecological trial; Environment education; Flona Mário Xavier

INTRODUÇÃO

Na concepção atual, a paisagem deixou de ser apenas uma fonte de inspiração artística ou meramente um cenário, adquirindo uma dimensão ambiental. Considerada como um recurso, vem ganhando importância e preocupação por parte da sociedade.

A principal função das trilhas sempre foi suprir a necessidade de deslocamento. No entanto, verifica-se que ao longo dos anos há uma alteração de valores em relação às mesmas. De simples meio de deslocamento, as trilhas surgem como novo meio de contato com a natureza. A caminhada passa a ter um novo sentido, incorpora esse sentido em si própria e recebe um grande número de adeptos.

Andar, caminhar, passear, escalar, excursionar; longe do atropelo, da aglomeração, do ruído e do tráfego de veículos é, hoje em dia, um dos passatempos favoritos da maior parte das pessoas. É a forma de recreação mais econômica, mais sadia e que maiores oportunidades oferece de observação, pesquisa, tranqüilidade e lazer. O uso de trilhas interpretativas em unidades de conservação permite uma maior aproximação com os elementos da natureza e a realização de uma educação ambiental dinâmica. Através destas, indivíduos, grupos escolares ou outros grupos de afinidade podem desvendar um ambiente, conhecê-lo melhor e atuar com maior consistência em sua preservação (Belart, 1978BELART, J. L. Trilhas para o Brasil. Boletim FBCN, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.49 - 51, 1978.).

A implantação de trilhas vem a contribuir para um melhor relacionamento da população local com os recursos naturais de sua região, tomando conhecimento de sua importância através de programas de educação ambiental.

As FLONAS são unidades de conservação de uso direto, destinadas à utilização sustentável dos recursos naturais renováveis e têm como filosofia o manejo integrado. Os objetivos desse manejo são obter, através do uso múltiplo, um rendimento sustentado de água, madeira, fauna, frutos, etc. Além de proteger os valores recreativos e estéticos, proporcionar educação e recreação ao ar livre e desenvolver atividades técnico-científicas (Silva, 1996SILVA, L. L. da. Ecologia: manejo de áreas silvestres. Santa Maria: MMA, FNMA, FATEC, p.160-175, 1996.).

A proposta de estabelecimento de uma trilha interpretativa na FLONA Mário Xavier, surge com a constatação do uso desta unidade de conservação pela comunidade de Seropédica, que carece de áreas de lazer e de espaços naturais. A sua interpretação, instalação de sinalizadores e manutenção poderá trazer um grande benefício para as comunidades locais, escolas, grupos de afinidade e outros.

MÉTODOS

A FLONA Mário Xavier, situada no Estado do Rio de Janeiro, compreende 493 hectares do município de Seropédica. A entrada da FLONA está situada na antiga estrada Rio-São Paulo, Km 50; possuindo limites com a rodovia Presidente Dutra, para qual há saída. Está localizada junto à região urbana do município e próxima de outras cidades, como Paracambi, Itaguaí, Queimados, Japeri e os bairros de Campo Grande e Santa Cruz, no Rio de Janeiro.

A FLONA possui área plantada com espécies nativas interessantes como: Basyloxilon brasiliensis (pau rei); Pithecolobium saman (Saman); Ceiba petandra (Sumaúma) e Carapa guianensis (andiroba). As espécies nativas ocupam menor abrangência em percentual, sendo o maior, o da área reflorestada com a espécie exótica Eucalyptus sp. Essa área para uso múltiplo e sustentável, era antes reconhecida como estação experimental Mário Xavier. Foi criada como FLONA pelo poder executivo em 1986, tendo o IBAMA como órgão responsável.

A FLONA também é riquíssima quanto à fauna, principalmente no que se refere a avifauna. Também são encontrados tapitis, tatus, gambás, preás e vários grupos de sagüís que despertam a atenção dos visitantes.

Esta unidade de conservação está localizada na região bioclimática 4, segundo classificação de Golfari (1980)GOLFARl, L. & MOOSMAYER, H. Manual de reflorestamento do estado do Rio de Janeiro, governo do estado do Rio de Janeiro, 1980., com altitude entre 0 e 800 m. A região apresenta inverno seco, com temperatura média anual de 18 a 24ºC e precipitação média anual de 1200 a 2000 mm; caracterizada por déficit hídrico de 0 a 30 mm/ano. As precipitações estão bem distribuídas, com predomínio no semestre mais quente.

Caracterização da trilha interpretativa:

A trilha foi marcada a partir do próprio caminho já aberto, provavelmente pelos operários da FLONA, aproveitando os aceiros que separam determinados talhões e que formam passagens abertas.

O percurso marcado foi interpretado em duas estações: no verão e no inverno. Observou-se que no período mais quente, há uma variedade de cores e nuanças mais intensas e, na estação seca, algumas espécies caducifólias conferem à paisagem uma tonalidade diferenciada. A trilha tem uma variação cênica sazonal, o que enriquece o seu uso.

Este trajeto foi escolhido por ser representativo e abranger áreas de beleza significativa e ter seu trajeto definido; evitando assim, a conseqüente eliminação da vegetação para a abertura de um novo trajeto.

Esta trilha apresenta curta distância, tem características passíveis de aproveitamento recreacional e educativo, com programação desenvolvida para interpretação do ambiente natural, podendo ser percorrida por todas as faixas de idade, de crianças à idosos, segundo os critérios de Andrade e Rocha (1990)ANDRADE, W. J. & ROCHA, L. M. Planejamento, implantação e manutenção de trilha. In: 6º Congresso Florestal Brasileiro, Campos de Jordão, 1990. Anais. São Paulo, p.786-793.. Praticamente todo o percurso é feito em paisagem sob abrigo das árvores...

Na Figura 1 pode-se ver uma planta esquemática do percurso.

DESCRIÇÃO DA TRILHA

Caracterização do método de interpretação da Trilha

O método de interpretação será o de caminhada auto dirigida com placas interpretativas. Em todo o percurso deve haver sinalização com auxílio de placas de madeira, destacando pontos importantes tais como pontos de parada (cinco paradas), as variantes do caminho principal e o tipo de vegetação local. O visitante receberá um folder explicativo com o croqui da trilha, contendo informações gerais de caráter paisagístico e ecológico, as paradas de observação, descrição das espécies mais importantes encontradas no local e recomendações.

A trilha começa com uma vegetação esparsa, onde se observao efeito de borda, que consiste em um conjunto de perturbações ligadas ao aumento de temperatura , maior grau de luminosidade, competição mais acirrada das espécies heliófitas (dependem de luz para seu desenvolvimento) e presença de plantas invasoras como o capim colonião (Panicum maximum); favorecidas por essas condições e caracterizando assim essa faixa de transição. Adentrando a trilha, é nítida a sensação de aumento de umidade e a temperatura torna-se mais amena. Verifica-se a intensificação da regeneração natural, não se encontrando mais plantas invasoras. Os diferentes extratos que compõem a floresta são notados com clareza.

A trilha é margeada por um canal de drenagem, onde são observados vários trechos em processos erosivos que devem ser recuperados, logo que possível.

Primeira parada

Na primeira interpretação, durante o verão, esta seria a parada do sabiá, com a presença de sabiás (Mimosa caesalpiniaeifolia) de grande porte. No entanto houve intervenção humana e os mesmos foram corlados, hoje existe um areal com apenas alguns remanescentes da espécie.

Figura 1
Planta esquemática da trilha proposta para a Flona Mario Xavier.

Olhando o caminho a percorrer, encontra-se uma paisagem sob abrigo. A seguir um talhão de jenipapo, sendo que todo caminho é margeado pelo Flamboyant (Delonix regia), que na época de inverno está caduco. No verão exibe sua exuberância com suas flores vermelhas e folhas bem verdes.

O caminho é largo e há uma variedade de cor e textura. As folhas grandes de Philodendron (Aráceae) contrastam com a bicolor {Zebrina sp} de delicadas flores lilás e a espada de São Jorge (Sansevieria trifasciata) apresentando textura lisa e verde intenso. Nesta parte do caminho é possível observar a regeneração natural que é bastante intensa.

Segunda parada - Parada do Tronco

Apesar de quase todo o subbosque ser coberto por Zebrina sp, além da regeneração natural, a atenção é totalmente voltada para os troncos de árvores repletos de epífitas, principalmente bromélias, que nesta época do ano estão floridas, e aráceas. A textura é graúda, devido às grandes folhas alternas de Philodendron.

Terceira parada - Parada do Córrego

Nesse trecho há um córrego de aproximadamente 2,5 m de largura, com presença de pedras. Apesar da vegetação densa, existe uma grande luminosidade. No inverno, devido a presença de muitas espécies caducifólias (que perdem as folhas no inverno), como é o caso do sombreiro (Clitoria fairchildiana ), o córrego se encontra com grande quantidade de folhas secas, o que confere tons amarelados à paisagem. No verão, a luminosidade é agradável e, fornece uma sensação de envolvimento e contemplação. Local de significativa beleza.

Com relação à ultrapassagem do córrego é possível solucionar o problema com blocos de pedra e/ou fatias de troncos dispostos estratégica e seqüencialmente.

Quarta parada - Parada do Sagüi

Nessa parada observamos um tapete de Zebrina, compondo praticamente todo o subbosque, que junto às folhas secas de Sombreiro caídas ao chão, se misturam harmoniosamente quebrando um pouco do verde da paisagem. As árvores são altas e fecham o estrato superior, intensificando uma variedade de estratos da vegetação. Os troncos são recobertos por musgos, liquens, aráceas e diversas epífitas. Encontramos um talhão de pau-mulato (Calycophyllun spruceanun}, onde toda atenção é voltada para o curioso tronco de textura lisa e coloração viva e forte. Além da exuberância da flora, também se pode apreciar a fauna do local, diversos pássaros e grupos de micos (sagüis) que aparecem eventualmente.

Quinta parada - Parada da Sapopema

Nesse trecho percebemos uma mudança brusca na vegetação, destacando-se as sapopemas na base das árvores e a paisagem encontrada sob abrigo. O piso é composto por uma intensa quantidade de folhas em decomposição (serapilheira), não existindo mais uma vegetação rasteira, o que muda totalmente a cor da paisagem de verde para marrom. Existe uma simetria perfeita entre as árvores devido ao espaçamento do plantio. É diferenciada do restante da paisagem não só por sua simetria, mas também por não apresentar regeneração natural.

Descrição de algumas das espécies presentes (Lorenzi, 1992LORENZI, H. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. Nova Odessa, SP: ed. Plantarum, 1992.):

ABRICÓ DE MACACO{Courupita guianensis} (Lecytidaceae) - Ocorrência em toda região da Amazônia .A madeira pode ser empregada no fabrico de brinquedos. A árvore em florescimento é um dos espetáculos mais belos e curiosos da natureza, com o tronco virtualmente enchendo-se de flores.

FLAMBOYANT {Delonix regia} (Leguminosae Papilionoideae) - Árvore extremamente ornamental quando em plena floração, prestando-se admiravelmente bem para projetos de paisagismo.

JENIPAPO{ Genipa americana} (Rubiaceae) - Ocorrência em todo país. Madeira pesada, empregada na construção civil, cabos de ferramenta, etc. Seus frutos são comestíveis e quando verdes fornecem suco de cor azulada, utilizado como corante, após a maturação fornece polpa comestível aproveitada in natura e na forma de doces e fermentado transforma-se em vinho ou licor. Fornece alimentação para fauna em geral.

PAU-MULATO {Calycophyllun spruceanum} (Rubiaceae) - ocorrência na Floresta Amazônica. Madeira empregada para marcenaria, confecção de móveis, etc. Seus frutos são avidamente procurados por várias espécies de pássaros.

PAU-REI{ Pterígota brasiliensis} (Sterculiaceae) - tronco dotado de sapopemas basais, de 50 a 80 cm de diâmetro. Ocorrência na Floresta Atlântica no Rio e Janeiro, sul da Bahia e Espírito Santo. Sua madeira se presta para fabrico de forros e polpa celulósica. Árvore exuberante.

SABIÁ {Mimosa caesalpiniifolia} (Leguminosae Mimosoideae) - ocorrência na região do Nordeste até a Bahia na Caatinga. Madeira apropriada para uso de moirões, estacas, postes, dormentes e para lenha e carvão.

SOMBREIRO {Clitoria fairchildiana} (Leguminosae Papilionoideae) - Ocorrência na região norte do país. Madeira empregada em construção civil. A árvore proporciona ótima sombra, além de apresentar características ornamentais.

RECOMENDAÇÕES AO PÚBLICO

=> Caminhar somente na trilha demarcada, sem tomar atalhos, para evitar acidentes;

=> evitar fumar, para sentir melhor o ar puro e evitar incêndios;

=> evitar colocar as mãos em locais cheios de folhas ou buracos, cuidado com animais peçonhentos;

=> evitar retirar qualquer tipo de material (bromélias, flores, etc.), somente observar;

=> levar um saco para recolher seu lixo, evitar deixar vestígios;

=> usar calçados leves e antiderrapantes que ofereçam boa segurança.

A manutenção da trilha é necessária para prevenir e corrigir problemas, tais como focais escorregadios e com lama, erosão, aparecimento de caminhos múltiplos, placas de sinalização danificadas, a caída de árvores e galhos ou o \ fechamento da vegetação da trilha. Esta manutenção deverá aumentar a qualidade da trilha e facilitar seu uso.

LITERATURA CITADA

  • ANDRADE, W. J. & ROCHA, L. M. Planejamento, implantação e manutenção de trilha. In: 6º Congresso Florestal Brasileiro, Campos de Jordão, 1990. Anais. São Paulo, p.786-793.
  • BELART, J. L. Trilhas para o Brasil. Boletim FBCN, Rio de Janeiro, v.13, n.1, p.49 - 51, 1978.
  • GOLFARl, L. & MOOSMAYER, H. Manual de reflorestamento do estado do Rio de Janeiro, governo do estado do Rio de Janeiro, 1980.
  • LORENZI, H. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. Nova Odessa, SP: ed. Plantarum, 1992.
  • SILVA, L. L. da. Ecologia: manejo de áreas silvestres. Santa Maria: MMA, FNMA, FATEC, p.160-175, 1996.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Dec 1999
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