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Comparação dos stents farmacológicos vs. stents convencionais para o tratamento do infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST: resultados do Registro EINSTEIN

Long-term outcomes of drug-eluting stents compared to bare-metal stents for acute ST-elevation myocardial infarction: results from the EINSTEIN Registry

Resumos

FUNDAMENTOS: Os estudos randomizados que testaram os stents farmacológicos no infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMSST) demonstraram resultados conflitantes. Além disso, a trombose do stent e o seguimento tardio pouco reportado permanecem como os grandes limitantes à expansão da aplicação desses dispositivos no IAMSST. OBJETIVO: Comparar as taxas de eventos cardíacos adversos maiores combinados (ECAM) e as taxas de trombose do stent em pacientes não-selecionados tratados com stents convencionais ou farmacológicos no IAMSST e alocados de forma não-randômica. MÉTODO: Entre janeiro de 2001 e julho de 2007, 251 pacientes consecutivos com IAMSST foram submetidos a angioplastia primária ou de resgate com implante de stent convencional (n = 112) ou farmacológico (n = 139), no Hospital Israelita Albert Einstein - São Paulo, SP. Investigamos a incidência de ECAM (óbito, infarto do miocárdio e revascularização do vaso-alvo [RVA]) e as taxas de RVA e trombose do stent. RESULTADOS: No total, a média das idades foi de 63 ± 13 anos, sendo 77% dos pacientes do sexo masculino. No seguimento mediano de 2,8 anos (1,3-4,4), a incidência de ECAM foi maior nos pacientes tratados com stents convencionais, em comparação com os tratados com stents farmacológicos (25,2% vs. 10,1%; p < 0,01), fundamentalmente pela maior mortalidade tanto global (17,8% vs. 5,1%; p < 0,01) como cardíaca (15,9 vs. 4,3; p < 0,01) no grupo dos stents convencionais. A taxa de RVA foi de 7,5% no grupo dos stents convencionais e de 3,6% no grupo dos stents farmacológicos (p = 0,25). Não observamos diferenças significativas na incidência de trombose do stent (3,7% vs. 2,2%; p = 0,7). CONCLUSÕES: Nessa série observacional, o uso dos stents farmacológicos no IAMSST apresentou menor taxa de ECAM em comparação aos stents convencionais no seguimento clínico tardio.

Infarto do miocárdio; Contenedores; Stents farmacológicos; Angioplastia transluminal percutânea coronária; Avaliação de resultados


BACKGROUND: Randomized clinical trials comparing drug-eluting stents (DES) with bare metal stents (BMS) in the setting of ST-segment elevation myocardial infarction (STEMI) have been showing conflicting results. Additionally, issues regarding stent thrombosis and the lack of long-term clinical outcomes have limited the widespread use of DES in STEMI. OBJECTIVE: To compare the rates of major adverse cardiac events (MACE) and stent thrombosis in unselected patients who underwent primary or rescue percutaneous coronary intervention with BMS implantation with those treated with DES. METHODS: Between January 2001 and July 2007, 251 consecutive patients with STEMI underwent PCI with BMS (n = 112) or DES (n =139). We investigated the incidence of MACE, including death, myocardial infarction and target vessel revascularization (TVR), as well as stent thrombosis rates. RESULTS: Overall, the mean age was 63 ± 13 years-old and 77% were male. The median clinical follow-up was 2.8 years (1.3-4.4). The cumulative incidence of MACE was higher in patients who received BMS as compared with DES (25.2% vs. 10.1%; p < 0.01) driven by a higher incidence of all-cause mortality (17.8% vs. 5.1%; p < 0.01), mainly cardiac death (15.9 vs. 4.3; p < 0.01). TVR was detected in 8 patients (7.5%) with BMS and in 5 patients (3.6%) with DES (p = 0.25). The incidence of stent thrombosis was similar between groups (3.7% vs. 2.2%; p = 0.7). CONCLUSIONS: In this observational series, the use of DES in the setting of STEMI showed lower rates of MACE compared to BMS at the long-term follow-up.

Myocardial infarction; Stents; Drug-eluting stents; Angioplasty, transluminal, percutaneous coronary; Outcome assessment


ARTIGO ORIGINAL

Comparação dos stents farmacológicos vs. stents convencionais para o tratamento do infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST: resultados do Registro EINSTEIN

Long-term outcomes of drug-eluting stents compared to bare-metal stents for acute ST-elevation myocardial infarction: results from the EINSTEIN Registry

Marco Aurélio de Magalhães; Fábio Sandoli de Brito Jr.; Breno Oliveira Almeida; Alexandre Abizaid; Ivanise Gomes; Teresa Cristina Nascimento; Marco Antonio Perin

Hospital Israelita Albert Einstein - São Paulo, SP

Correspondência Correspondência: Marco Aurélio de Magalhães. Rua Xavier da Veiga, 81 - apto. 194 - Santana São Paulo, SP - CEP 02021-040 E-mail mademagalhaes@yahoo.com.br

RESUMO

FUNDAMENTOS: Os estudos randomizados que testaram os stents farmacológicos no infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMSST) demonstraram resultados conflitantes. Além disso, a trombose do stent e o seguimento tardio pouco reportado permanecem como os grandes limitantes à expansão da aplicação desses dispositivos no IAMSST.

OBJETIVO: Comparar as taxas de eventos cardíacos adversos maiores combinados (ECAM) e as taxas de trombose do stent em pacientes não-selecionados tratados com stents convencionais ou farmacológicos no IAMSST e alocados de forma não-randômica.

MÉTODO: Entre janeiro de 2001 e julho de 2007, 251 pacientes consecutivos com IAMSST foram submetidos a angioplastia primária ou de resgate com implante de stent convencional (n = 112) ou farmacológico (n = 139), no Hospital Israelita Albert Einstein - São Paulo, SP. Investigamos a incidência de ECAM (óbito, infarto do miocárdio e revascularização do vaso-alvo [RVA]) e as taxas de RVA e trombose do stent.

RESULTADOS: No total, a média das idades foi de 63 ± 13 anos, sendo 77% dos pacientes do sexo masculino. No seguimento mediano de 2,8 anos (1,3-4,4), a incidência de ECAM foi maior nos pacientes tratados com stents convencionais, em comparação com os tratados com stents farmacológicos (25,2% vs. 10,1%; p < 0,01), fundamentalmente pela maior mortalidade tanto global (17,8% vs. 5,1%; p < 0,01) como cardíaca (15,9 vs. 4,3; p < 0,01) no grupo dos stents convencionais. A taxa de RVA foi de 7,5% no grupo dos stents convencionais e de 3,6% no grupo dos stents farmacológicos (p = 0,25). Não observamos diferenças significativas na incidência de trombose do stent (3,7% vs. 2,2%; p = 0,7).

CONCLUSÕES: Nessa série observacional, o uso dos stents farmacológicos no IAMSST apresentou menor taxa de ECAM em comparação aos stents convencionais no seguimento clínico tardio.

Descritores: Infarto do miocárdio. Contenedores. Stents farmacológicos. Angioplastia transluminal percutânea coronária. Avaliação de resultados.

SUMMARY

BACKGROUND: Randomized clinical trials comparing drug-eluting stents (DES) with bare metal stents (BMS) in the setting of ST-segment elevation myocardial infarction (STEMI) have been showing conflicting results. Additionally, issues regarding stent thrombosis and the lack of long-term clinical outcomes have limited the widespread use of DES in STEMI.

OBJECTIVE: To compare the rates of major adverse cardiac events (MACE) and stent thrombosis in unselected patients who underwent primary or rescue percutaneous coronary intervention with BMS implantation with those treated with DES.

METHODS: Between January 2001 and July 2007, 251 consecutive patients with STEMI underwent PCI with BMS (n = 112) or DES (n =139). We investigated the incidence of MACE, including death, myocardial infarction and target vessel revascularization (TVR), as well as stent thrombosis rates.

RESULTS: Overall, the mean age was 63 ± 13 years-old and 77% were male. The median clinical follow-up was 2.8 years (1.3-4.4). The cumulative incidence of MACE was higher in patients who received BMS as compared with DES (25.2% vs. 10.1%; p < 0.01) driven by a higher incidence of all-cause mortality (17.8% vs. 5.1%; p < 0.01), mainly cardiac death (15.9 vs. 4.3; p < 0.01). TVR was detected in 8 patients (7.5%) with BMS and in 5 patients (3.6%) with DES (p = 0.25). The incidence of stent thrombosis was similar between groups (3.7% vs. 2.2%; p = 0.7).

CONCLUSIONS: In this observational series, the use of DES in the setting of STEMI showed lower rates of MACE compared to BMS at the long-term follow-up.

Descriptors: Myocardial infarction. Stents. Drug-eluting stents. Angioplasty, transluminal, percutaneous coronary. Outcome assessment.

A intervenção coronária primária é a estratégia de escolha para o tratamento do infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMSST), quando realizada precocemente por operadores experientes1,2. O implante de stent na angioplastia primária ou de resgate está associado a menor taxa de revascularização do vaso-alvo (RVA)3,4 e, possivelmente, a mortalidade em subgrupos selecionados em comparação com a angioplastia convencional com balão5,6. A primeira geração de stents farmacológicos, que vem sendo recentemente testada no IAMSST, tem apresentado resultados conflitantes quanto a sua eficácia, em comparação com os stents convencionais7,8. Além disso, questionamentos acerca do incremento tardio das taxas de trombose e a pouca disponibilidade de dados referentes ao seguimento tardio desses pacientes constituem os grandes limitantes à expansão do uso desses dispositivos no universo da prática clínica do tratamento do IAMSST.

Dessa forma, avaliamos os resultados muito tardios de pacientes não-selecionados com IAMSST tratados com stents farmacológicos em comparação com aqueles submetidos a implante de stents convencionais num único centro.

MÉTODO

População

No período compreendido entre janeiro de 2001 e julho de 2007, no Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP, foram admitidos 251 pacientes consecutivos com IAMSST tratados por intervenção coronária primária ou de resgate e implante de stent na artéria relacionada ao evento. Destes, 139 receberam ao menos um stent farmacológico e fazem parte do Registro EINSTEIN, que reúne todos os pacientes tratados com esses dispositivos desde 16 de maio 2002. Foram comparados com 112 pacientes tratados com stents convencionais, no período imediatamente anterior à disponibilidade dos stents farmacológicos ou posteriormente, por decisão do operador, em geral quando o diâmetro do vaso tratado era > 4 mm. Comparamos, retrospectivamente, a taxa de eventos cardíacos adversos maiores combinados (ECAM) nos dois grupos. Os critérios de exclusão deste estudo foram a angioplastia convencional e os pacientes admitidos com sintomas há mais de 24 horas.

Definições

Considerou-se infarto agudo do miocárdio a presença de dor torácica prolongada, associada a supradesnivelamento do segmento ST > 1 mm em pelo menos duas derivações contíguas ou bloqueio de ramo esquerdo agudo ou presumivelmente novo. Os pacientes foram estratificados na sua admissão e evolução conforme a classificação de Killip. Definiu-se choque cardiogênico (Killip IV) como hipotensão persistente (pressão arterial sistólica < 90 mmHg por no mínimo trinta minutos) ou necessidade de se utilizar drogas vasoativas. Doença coronária multiarterial foi definida como a presença de pelos menos dois vasos epicárdicos com estenose superior a 50% por estimativa visual.

Os ECAM incluíram óbito cardíaco, reinfarto e RVA, agrupados de forma hierárquica. O óbito foi classificado como não-cardíaco somente após comprovação inequívoca da causa, enquanto a óbito cardíaco foram imputados os casos definidos bem como os de causa desconhecida. O reinfarto foi definido como a presença de novos sintomas anginosos acompanhados por elevação enzimática, sendo também considerados reinfarto os casos comprovadamente não relacionados ao vaso-alvo. RVA foi definida como qualquer reintervenção no vaso-alvo por reestenose ou trombose, tanto cirúrgica como percutânea. Revascularização da lesão-alvo (RLA) foi definida como reintervenção no seguimento tratado, incluindo os 5 mm proximais e distais ao implante do stent.

A trombose do stent foi classificada de acordo com os critérios adotados pelo Academic Research Consortium9, que classifica a trombose de stents como definitiva, provável ou possível e, de acordo com o intervalo de tempo, como precoce (0 a 30 dias), tardia (31 a 365 dias) e muito tardia (> 365 dias).

Desfechos clínicos primários e secundários

O desfecho primário do estudo foi a comparação da taxa de ECAM no seguimento clínico entre os pacientes tratados com stents convencionais e aqueles tratados com stents farmacológicos. Como desfechos secundários, compararam-se as taxas de RVA e de trombose do stent. Além disso, avaliamos o tempo de distribuição de todos os eventos individuais e combinados, de acordo com sua ocorrência, em intra-hospitalar até trinta dias, primeiro, segundo, terceiro, quarto e quinto anos de seguimento clínico. Todos os eventos foram adjudicados por dois cardiologistas intervencionistas.

Intervenção coronária primária

Os procedimentos foram realizados de acordo com as recomendações vigentes formalizadas nas diretrizes de intervenção coronária primária. Os procedimentos foram realizados exclusivamente pela via femoral e todos os pacientes receberam 300 mg de clopidogrel antes ou imediatamente após o procedimento. Após o diagnóstico, administrou-se heparina não-fracionada na dose de 100 U/kg ou 70 U/kg no caso de uso concomitante de abciximab (ReoPro, Eli Lilly - Indianápolis, Indiana, Estados Unidos; Centocor - Horsham, Pensilvânia, Estados Unidos). O nível de anticoagulação foi monitorado utilizando-se o tempo de coagulação ativada (TCA) medido pelo equipamento Hemocron 801. Doses adicionais de heparina foram administradas quando necessário, objetivando-se atingir TCA entre 250 s e 350 s ou entre 200 s e 250 s quando se fez uso concomitante de abciximab.

A escolha do stent ocorreu de acordo com o período, sendo utilizados exclusivamente stents convencionais de 5 de janeiro de 2001 a 10 de julho de 2002, quando houve o primeiro implante de stent farmacológico nesse contexto. A partir dessa data, a opção por stent convencional ou farmacológico ocorreu a critério do operador, exceto nos casos de vasos de grande calibre (> 4,0 mm), em que a preferência se manteve pelos stents convencionais. Deve-se mencionar também que a escolha entre os stents farmacológicos foi influenciada pela disponibilidade comercial desses stentes na instituição (Cypher, 16 de maio de 2002; Taxus, 2 de maio de 2003; e CoStar, 27 de abril de 2006).

O uso adjuvante de dispositivos de trombectomia também ocorreu de acordo com a opção do operador, sendo utilizados o cateter Pronto V3 (Vascular Solutions - Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos) ou X-sizer (EV3 - Plymouth, Minnesota, Estados Unidos). O tempo de manutenção do clopidogrel foi definido pelo cardiologista de referência.

Análise angiográfica quantitativa

Realizou-se análise angiográfica quantitativa com o sistema validado de detecção de bordas CASS II (Pie Medical - Maastricht, Holanda)10. Nos casos em que a artéria relacionada ao infarto se apresentava ocluída, foram utilizadas as primeiras projeções após o restabelecimento do fluxo coronário anterógrado, conseguido pela passagem do fio-guia 0,014" ou após a pré-dilatação, para medir o comprimento da lesão. Definiu-se como sucesso angiográfico a presença de estenose angiográfica residual menor que 30% e fluxo anterógrado normal (TIMI 3).

Seguimento clínico

O seguimento clínico foi obtido de forma retrospectiva por meio de contato telefônico ou eletrônico (e-mail) com o próprio paciente, familiares ou com o médico de referência e pela consulta de arquivos hospitalares. Obteve-se informação quanto ao seguimento clínico em 97,6% dos pacientes. Não obtivemos informações quanto ao seguimento clínico em 5 (4,4%) pacientes do grupo dos stents convencionais e em apenas 1 (0,7%) paciente do grupo dos stents farmacológicos.

Análise estatística

As variáveis contínuas são representadas pela sua média ± 1 desvio padrão, enquanto as variáveis categóricas são representadas pela freqüência absoluta ou porcentual. A comparação das variáveis categóricas entre os grupos foi realizada pelo teste do qui-quadrado ou exato de Fisher. As variáveis contínuas foram comparadas com teste t de Student. As estimativas da sobrevida livre de eventos foram geradas pelo método produto-limite de Kaplan-Meier e as diferenças entre os grupos, testadas por log-rank. Todos os resultados reportados são bicaudais e considerou-se p < 0,05 indicativo de significância estatística. Utilizou-se o software SPSS 13.0 Inc. (Chicago, Illinois, Estados Unidos).

RESULTADOS

No total, a média aritmética das idades foi de 63 ± 13 anos, sendo 77% homens e 22,7% diabéticos. As características basais e clínicas, expostas na Tabela 1, foram semelhantes entre os grupos, com exceção das pressões sistólica (123 ± 35 mmHg vs. 133 ± 28 mmHg; p = 0,03) e diastólica (77 ± 24 mmHg vs. 84 ± 19 mmHg; p = 0,03) na admissão, significantemente inferiores no grupo do stent convencional.

Dentre as características angiográficas e do procedimento, representadas na Tabela 2, 58,8% dos vasos relacionados ao infarto apresentavam fluxo TIMI 0, 2,4% das intervenções envolveram enxertos venosos e 43% envolveram a artéria descendente anterior. A taxa de sucesso global foi de 90%. O abciximab adjunto foi utilizado em 64,5% dos casos. Entre os pacientes que receberam stent farmacológico, 55% receberam stent eluidor de sirolimus, 37% receberam stent eluidor de paclitaxel na plataforma do stent Taxus e 8%, do stent CoStar. Destacamos a presença do maior diâmetro dos stents convencionais implantados em comparação com os stents farmacológicos (3,4 ± 0,5 mm vs. 3,1 ± 0,3 mm; p < 0,01). Por outro lado, os stents farmacológicos foram implantados com maior pressão de liberação (14,7 ± 2,4 atm vs. 16,9 ± 2,9 atm; p < 0,01) e mais freqüentemente pós-dilatados (19,0% vs. 32,8%; p = 0,02). O comprimento total dos stents bem como o uso de dispositivos de trombectomia adjunto não diferiu significativamente entre os grupos. O tamanho do infarto, estimado pelo pico da enzima CK-MB, foi semelhante entre os grupos (206 ± 178 UI/ml vs. 203 ± 170 UI/ml; p = 0,92).

O tempo de manutenção da dupla antiagregação plaquetária no grupo dos stents farmacológicos foi de 1,3 ± 0,8 ano.

Desfechos clínicos primário e secundário: resultados cumulativos

No seguimento clínico tardio (seguimento media-no de 2,8 anos [1,3-4,4]; amplitude de 0 a 6,6 anos), detectamos 41 ECAM (16,7%) nessa população (Tabela 3). Observamos maior incidência de ECAM nos pacientes submetidos a implante de stents convencionais em comparação com os pacientes tratados com stents farmacológicos (25,2% vs. 10,1%; p < 0,01), em decorrência, fundamentalmente, de redução da incidência de óbito cardíaco (15,9% vs. 4,3%; p < 0,01). Na população global, documentamos, de forma conclusiva, como óbito não-cardíaco apenas 3 casos: 2 casos na coorte de stent convencional (1 paciente com neoplasia de reto e 1 paciente com neoplasia de bexiga), enquanto na coorte dos stents farmacológicos documentamos apenas 1 óbito não-cardíaco (1 paciente com traumatismo cranioencefálico com marcadores enzimáticos normais e eletrocardiograma sem novas ondas Q patológicas). Observamos tendência de menor taxa de revascularização por reestenose clínica nos pacientes tratados com stents farmacológicos em comparação com os stents convencionais, embora sem atingir significância estatística (6,5% vs. 2,9%; p = 0,18). As curvas das estimativas da sobrevida livre de ECAM e de revascularização do vaso-alvo estão representadas nas Figuras 1 e 2, respectivamente.



Trombose dos stents

As taxas de trombose relacionadas ao stent, avaliadas pelo critério amplo ou restringindo-se aos quadros definitivos, não foram estatisticamente diferentes entre os stents convencionais e farmacológicos (4 [3,7%] vs. 3 [2,2%], p = 0,70; 1 [0,9%] vs. 2 [1,4%], p = 1,0). Todos os 7 (2,9%) eventos trombóticos foram adjudicados e analisados detalhadamente quanto às características clínicas e angiográficas do procedimento índice, tempo de ocorrência, manifestação clínica e terapia antiplaquetária vigente no momento do evento, e en-contram-se resumidos na Tabela 4. Observa-se que somente 2 pacientes estavam em regime de dupla antiagregação no momento do evento.

Eventos após três anos de seguimento

Conforme exposto na Tabela 5, observamos a quase totalidade dos eventos combinados (78%) no primeiro e no segundo anos de seguimento clínico. Após o terceiro ano de seguimento, nota-se significativa redução da taxa de eventos em ambos os grupos de stents.

DISCUSSÃO

Os principais achados deste estudo são: 1) segundo nosso conhecimento, esta foi a primeira vez em que foi reportado, na literatura, o seguimento muito tardio (após três anos) de pacientes não-selecionados e tratados com stents farmacológicos na fase aguda do IAMSST; 2) menor taxa de ECAM combinados observada no grupo de pacientes tratados com stents farmacológicos; e 3) ausência de fenômenos trombóticos além do primeiro ano (muito tardios) nos pacientes tratados com stents farmacológicos.

As taxas de reestenose e de RVA no contexto da angioplastia primária provenientes de estudos randomizados situam-se em cerca de 10% em doze meses3. Cabe ressaltar que a maioria desses estudos apresentou critérios rígidos de inclusão, dificultando a transposição desses resultados para a prática clínica diária, em que as taxas de reestenose no infarto podem superar 30% nos casos de reestudo angiográfico sistemático de pacientes não-selecionados11. Esse aspecto é relevante, pois, além da necessidade de nova intervenção, a reestenose intra-stent se manifesta freqüentemente como síndrome coronária aguda e infarto12,13, o que determina grande impacto na morbidade e possivelmente na mortalidade14. Assim, também no IAMSST encontra-se uma lacuna oportuna para a aplicação dos stents farmacológicos, objetivando-se a redução das taxas de reestenose. Os estudos randomizados que testaram o stent eluidor de sirolimus em comparação com os stents convencionais atingiram significância estatística com relação a seus desfechos primários pré-especificados: TYPHOON8, falência do vaso-alvo aos doze meses (7,3% vs. 14,3%; p = 0,004); SESAMI15, reestenose binária aos doze meses (9,3% vs. 21,3%; p = 0,03); STRATEGY16, eventos adversos combinados ou reestenose binária aos oito meses (19% vs. 50%; p < 0,01); e MULTISTRATEGY17, ECAM aos oito meses (7,8% vs. 14,5%; p = 0,004). Por outro lado, o estudo randomizado envolvendo stent com paclitaxel em comparação com o stent convencional não demonstrou diferença estatisticamente significante na taxa de eventos combinados aos doze meses (8,8% vs. 12,8%; p = 0,09)7. Entretanto, é importante ressaltar que, ao contrário dos estudos anteriores, esse estudo não apresentou reestudo angiográfico sistemático, o que pode ter influenciado, em parte, os resultados em decorrência do conhecido fenômeno óculo-estenótico. Em nosso estudo, também baseado em seguimento clínico, observamos baixas taxas de reestenose clínica em ambos os grupos, no total em 5,3% dos pacientes, e de acordo com o total global do estudo PASSION, de aproximadamente 6%7, o que demonstra que as taxas de reestenose clínica no infarto são afetadas de maneira conspícua pelo reestudo sistemático. Não obstante, observamos, nesses estudos, que as taxas de nova intervenção no vaso-alvo no IAMSST tratados com stents farmacológicos se situam ao redor de 5%18, o que significa que houve redução expressiva em comparação com os estudos clássicos envolvendo stents convencionais3. Essa melhora indica que o mecanismo de ação dos stents farmacológicos está presente de forma inconteste, mesmo no IAMSST, e de fato recente estudo comprova que a perda tardia aos nove meses do stent eluidor de sirolimus foi de 0,12 ± 0,43 mm, em comparação com a perda tardia de 0,68 ± 0,57 mm no grupo dos stents convencionais (p < 0,001)19. Ao analisarmos os eventos individuais no presente estudo, porém, observamos que a redução dos eventos combinados em favor dos stents farmacológicos decorreu, principalmente, da diminuição da taxa de óbito cardíaco (15,9% vs. 4,3%; p < 0,01). Esse achado está de acordo com estudo recentemente publicado20. Inúmeras hipóteses, embora especulativas, podem ser aventadas para justificar esses achados, desde problemas relacionados à seleção dos pacientes, das dificuldades do ajuste nos modelos freqüentistas (que, por sua vez, afetam principalmente estudos não-randômicos), até diferenças temporais na terapia antiplaquetária.

No entanto, o grande questionamento ao implante rotineiro dos stents farmacológicos no IAMSST ainda é a questão da trombose do stent, pois, além do ambiente mais propício à ocorrência desse fenômeno, particularmente na presença de lesões complexas21 e com alta carga trombótica22, é também difícil acessar a aderência do paciente à terapia antiplaquetária no momento da intervenção primária. A importância do clopidogrel no IAMSST é reforçada pelos dados do registro PREMIER, em que foram demonstradas elevadas taxas de mortalidade nos pacientes tratados no contexto do IAMSST com stents farmacológicos e que suspenderam o medicamento precocemente (antes de trinta dias)23. Em linha com esses achados, em nosso estudo, dos 7 casos classificados como trombose pelo critério amplo do Academic Research Consortium, apenas 2 pacientes estavam em regime antiplaquetário duplo por ocasião do evento. Esses questionamentos e achados encontram bases biológicas, como endotelização tardia24 e fenômenos mecânicos como a má aposição, inerentes ao mecanismo de ação dos stents farmacológicos de primeira geração. Particularmente, a má aposição vem sendo freqüentemente reportada no IAMSST19,25. Entretanto, o impacto clínico desses achados ainda é controverso. Nos registros RESEARCH e T-SEARCH, observaram-se fenômenos trombóticos após o primeiro e o segundo anos nos pacientes com IAMSST (4 casos)26, resultando na eliminação do benefício do stent eluidor de sirolimus em comparação com o stent convencional, no tocante à RVA. Em nossa série, apesar do número limitado de pacientes, não observamos fenômenos trombóticos muito tardios, mesmo estendendo o seguimento clínico até o quinto ano. Atribuímos esse achado, de forma especulativa, à terapia antiplaquetária dupla prolongada no grupo dos stents farmacológicos. Entretanto, devemos ressaltar que não há dados conclusivos com relação ao impacto e à duração da terapêutica antiplaquetária nesses pacientes. Recentemente, uma meta-regressão, avaliando conjuntamente mais de 4 mil pacientes em 12 estudos comparando stent farmacológico vs. convencional no infarto, não demonstrou interação entre o tempo de uso da terapia antiplaquetária e os desfechos clínicos óbito (p = 0,16), reinfarto (p = 0,91), RVA (p = 0,38) e trombose do stent (p = 0,26)27. Por conseguinte, ainda não está definido o tempo de antiagregação plaquetária adequado nesses pacientes. Ensaios prospectivos com seguimento clínico tardio apropriado e desenhados com esse propósito poderão fornecer as respostas clínicas necessárias para uma recomendação formal da terapêutica antiplaquetária após implante de stent farmacológico no IAMSST.

Limitações

É imperativo reconhecer todas as limitações inerentes a estudos observacionais, retrospectivos e com pequeno número de pacientes.

CONCLUSÕES

Este estudo observacional documenta o seguimento clínico tardio de pacientes pertencentes à prática clínica diária tratados por intervenção coronária primária ou de resgate no IAMSST, em que se demonstrou redução de eventos cardíacos combinados nos pacientes tratados com stents farmacológicos em comparação com os tratados com stents convencionais. No entanto, apesar de não corresponder a uma comparação randomizada "asséptica" com um grupo controle perfeitamente equilibrado, consideramos ser a informação mais relevante do estudo a ausência de eventos e de fenômenos trombóticos muito tardios (após três anos de seguimento) no grupo de pacientes tratados com stents farmacológicos. Embora atraentes, esses resultados necessitam de confirmação por outros estudos, como o HORIZONS, desenhados especificamente para responder, e formalizar de forma definitiva, às questões sobre o uso dos stents farmacológicos no IAMSST.

Recebido em: 25/5/2008

Aceito em: 1º/8/2008

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  • Correspondência:

    Marco Aurélio de Magalhães.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Aceito
      01 Ago 2008
    • Recebido
      25 Maio 2008
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