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Utilização off-label dos stents farmacológicos nas intervenções coronárias percutâneas: registro da Clínica São Vicente

Off-label utilization of drug-eluting stents in percutaneous coronary intervention: clínica São Vicente registry

Resumos

FUNDAMENTOS: Estudos clínicos randomizados indicam que os stents farmacológicos reduzem a taxa de reestenose e a necessidade de procedimentos de revascularização. OBJETIVO: Avaliar o desempenho dos stents farmacológicos no mundo-real, comparando a evolução dos pacientes elegíveis nos estudos randomizados (on-label) com aqueles inelegíveis para intervenção coronária percutânea com stents farmacológicos (off-label). MÉTODO: Entre junho de 2002 e dezembro de 2007, 653 pacientes foram tratados por intervenção coronária percutânea somente com stents farmacológicos: 309 pacientes com stents farmacológicos em indicações on-label (309 stents) e 344 pacientes com presença de ao menos uma indicação off-label (654 stents). Foram consideradas indicações off-label: fração de ejeção < 25%, múltiplos stents, oclusão crônica, tronco não protegido, bifurcação, ponte de safena, infarto agudo, lesão ostial e lesão reestenótica. Avaliamos a evolução hospitalar e no período médio de 23,2 meses após o procedimento. RESULTADOS: Sucesso angiográfico elevado, com maior ocorrência de no-reflow (0% vs. 1,5%; p = 0,04) e mionecrose (1,9% vs. 5,2%; p = 0,02), foi observado nos pacientes off-label, porém sem diferença na mortalidade (0,3% vs. 0,9%; p = 0,3). No seguimento tardio de 80% dos pacientes por 23,2 meses, foram observadas reduzida incidência de eventos cardíacos maiores (8% vs. 8,1%; p = 0,5) e de revascularização da lesão-alvo (6,8% vs. 5,1%; p = 0,2). CONCLUSÃO: O implante off-label do stent farmacológico é seguro, com baixa mortalidade. Apesar da maior complexidade, não verificamos aumento do risco de eventos cardíacos ad-versos tardios ou revascularização da lesão-alvo quando comparado com o implante on-label.

Stents farmacológicos; Contenedores; Angioplastia transluminal percutânea coronária; Avaliação de resultados


BACKGROUND: Randomized clinical trials indicate that drug-eluting stents (DES) reduce the rates of restenosis and need for subsequent revascularization procedures. OBJECTIVE: This study examined the performance of DES in a 'real world' setting comparing the outcomes of trial-eligible (on-label) versus ineligible (off-label) patients undergoing percutaneous coronary interventions. METHODS: From June 2002 to December 2007, 653 patients underwent percutaneous coronary intervention exclusively using DES: 309 patients (309 stents) with on-label indications, and 344 patients (654 stents) with at least one off-label indication. Off-label indications were considered ejection fraction < 25%, multiple DES, chronic total occlusions, unprotected left main coronary artery, bifurcations, saphenous vein grafts, acute myocardial infarction, ostial or restenotic lesions. We evaluated in-hospital as well as late follow-up events. RESULTS: A high angiographic success, but with higher in-hospital myonecrosis (1.9% vs 5.2%; p = 0.02) and noreflow phenomenon (0% vs 1.5%; p = 0.04), was observed with off-label use; the incidence of death (0.3% vs 0.9%; p = 0.3) was not statistically different between groups. Data obtained from 80% of the patients over an average 23.2-month follow-up period showed a low incidence of major adverse cardiac events (8% vs. 8.1%; p = 0.5) and target vessel revascularization procedures (6.8% vs. 5.1%; p = 0.2). CONCLUSION: Off-label implantation of DES is safe, with a low mortality rate. DES use in this complex cohort of patients does not confer a higher risk of late adverse cardiac events or repeat revascularizations when compared to on-label indications.

Drug eluting stents; Stents; Angioplasty, transluminal, percutaneous, coronary; Outcome assessment


ARTIGO ORIGINAL

Utilização off-label dos stents farmacológicos nas intervenções coronárias percutâneas: registro da Clínica São Vicente

Off-label utilization of drug-eluting stents in percutaneous coronary intervention: Clínica São Vicente registry

José Ary Boechat e SallesI,II,III; Júlio César Machado AndréaI,II; Leandro Assumpção CortesII; Filipe GoldbergII; Lilian CarestiatoI; Felipe CamillisI; Hélio Roque FigueiraI,II,III

IClínica São Vicente - Rio de Janeiro, RJ

IIHospital Cardiotrauma - Rio de Janeiro, RJ

III Hospital de Clínicas de Niterói - Rio de Janeiro, RJ

Correspondência Correspondência: José Ary Boechat e Salles Rua João Borges, 204 - Gávea Rio de Janeiro, RJ - CEP 22451-100 E-mail: josearyboechat@gmail.com

RESUMO

FUNDAMENTOS: Estudos clínicos randomizados indicam que os stents farmacológicos reduzem a taxa de reestenose e a necessidade de procedimentos de revascularização.

OBJETIVO: Avaliar o desempenho dos stents farmacológicos no mundo-real, comparando a evolução dos pacientes elegíveis nos estudos randomizados (on-label) com aqueles inelegíveis para intervenção coronária percutânea com stents farmacológicos (off-label).

MÉTODO: Entre junho de 2002 e dezembro de 2007, 653 pacientes foram tratados por intervenção coronária percutânea somente com stents farmacológicos: 309 pacientes com stents farmacológicos em indicações on-label (309 stents) e 344 pacientes com presença de ao menos uma indicação off-label (654 stents). Foram consideradas indicações off-label: fração de ejeção < 25%, múltiplos stents, oclusão crônica, tronco não protegido, bifurcação, ponte de safena, infarto agudo, lesão ostial e lesão reestenótica. Avaliamos a evolução hospitalar e no período médio de 23,2 meses após o procedimento.

RESULTADOS: Sucesso angiográfico elevado, com maior ocorrência de no-reflow (0% vs. 1,5%; p = 0,04) e mionecrose (1,9% vs. 5,2%; p = 0,02), foi observado nos pacientes off-label, porém sem diferença na mortalidade (0,3% vs. 0,9%; p = 0,3). No seguimento tardio de 80% dos pacientes por 23,2 meses, foram observadas reduzida incidência de eventos cardíacos maiores (8% vs. 8,1%; p = 0,5) e de revascularização da lesão-alvo (6,8% vs. 5,1%; p = 0,2).

CONCLUSÃO: O implante off-label do stent farmacológico é seguro, com baixa mortalidade. Apesar da maior complexidade, não verificamos aumento do risco de eventos cardíacos ad-versos tardios ou revascularização da lesão-alvo quando comparado com o implante on-label.

Descritores: Stents farmacológicos. Contenedores. Angioplastia transluminal percutânea coronária. Avaliação de resultados.

SUMMARY

BACKGROUND: Randomized clinical trials indicate that drug-eluting stents (DES) reduce the rates of restenosis and need for subsequent revascularization procedures.

OBJECTIVE: This study examined the performance of DES in a 'real world' setting comparing the outcomes of trial-eligible (on-label) versus ineligible (off-label) patients undergoing percutaneous coronary interventions.

METHODS: From June 2002 to December 2007, 653 patients underwent percutaneous coronary intervention exclusively using DES: 309 patients (309 stents) with on-label indications, and 344 patients (654 stents) with at least one off-label indication. Off-label indications were considered ejection fraction < 25%, multiple DES, chronic total occlusions, unprotected left main coronary artery, bifurcations, saphenous vein grafts, acute myocardial infarction, ostial or restenotic lesions. We evaluated in-hospital as well as late follow-up events.

RESULTS: A high angiographic success, but with higher in-hospital myonecrosis (1.9% vs 5.2%; p = 0.02) and noreflow phenomenon (0% vs 1.5%; p = 0.04), was observed with off-label use; the incidence of death (0.3% vs 0.9%; p = 0.3) was not statistically different between groups. Data obtained from 80% of the patients over an average 23.2-month follow-up period showed a low incidence of major adverse cardiac events (8% vs. 8.1%; p = 0.5) and target vessel revascularization procedures (6.8% vs. 5.1%; p = 0.2).

CONCLUSION: Off-label implantation of DES is safe, with a low mortality rate. DES use in this complex cohort of patients does not confer a higher risk of late adverse cardiac events or repeat revascularizations when compared to on-label indications.

Descriptors: Drug eluting stents. Stents. Angioplasty, transluminal, percutaneous, coronary. Outcome assessment.

Os stents farmacológicos reduziram a ocorrência de reestenoses angiográfica e clínica nos pacientes tratados por intervenção coronária percutânea, quando comparados com stents convencionais. No entanto, os tipos de lesões selecionadas para estudo nos ensaios randomizados não refletem inteiramente o largo espectro da doença coronária que é tratada rotineiramente nos laboratórios de Hemodinâmica. A utilização de stents farmacológicos pelos intervencionistas expandiu-se, com o uso dos stents em indicações não especificadas pelos fabricantes (indicações off-label).

MÉTODO

População estudada

Estudo retrospectivo de uma série consecutiva de pacientes tratados por intervenção coronária percutânea exclusivamente com implante de stents farmacológicos, realizado em três instituições (Clínica São Vicente, Hospital Cardiotrauma e Hospital de Clínicas de Niterói), localizadas no Rio de Janeiro. Entre junho de 2002 e dezembro de 2007, foram catalogadas 2.369 angioplastias no banco de dados de nossa instituição, sendo 653 com implante exclusivo de stents farmacológicos. A essa coorte de casos deu-se o nome de Registro da Clínica São Vicente. Para o estudo em questão, foram excluídos os pacientes com implante simultâneo de stents farmacológico e convencional.

Segundo os critérios utilizados em estudos randomizados iniciais com stents farmacológicos, foram definidos como on-label os portadores de doença coronária sintomática decorrente de lesão de novo em vasos nativos, com estenoses com comprimento inferior a 30 mm em vasos de diâmetro de 2,5 mm a 3,5 mm, e como pacientes off-label aqueles com ao me-nos uma das indicações a seguir: fração de ejeção < 25%, múltiplos stents, oclusão crônica, tronco não protegido, bifurcação, ponte de safena, infarto agudo, lesão ostial e tratamento de lesão reestenótica.

Procedimento de intervenção

Os pacientes receberam terapia antiplaquetária dupla pré-intervenção, com aspirina 200 mg/dia e clopidogrel 75 mg/dia ou ticlopidina 250 mg/dia, iniciada pelo menos três dias antes nos casos eletivos. Pacientes com síndromes coronárias agudas receberam dose de ataque de 600 mg de clopidogrel pelo menos duas a seis horas antes do procedimento, com uso, em casos selecionados e a critério do operador, de inibidores intravenosos da glicoproteína IIb/IIIa (casos de trombo angiográfico e infarto agudo do miocárdio).

O procedimento intervencionista padrão foi realizado por punção arterial femoral ou radial, tendo sido realizada pré-dilatação a critério do operador, seguida do implante de stent adequado ao tamanho do vaso e ao comprimento da lesão por análise visual. Impactação pós-implante foi realizada, preferencialmente, com balão não complacente acima de 12 atm. O uso de ultrasom intracoronário foi determinado pelo operador, com vistas ao implante ótimo do stent (segundo critérios definidos no estudo MUSIC). Após o procedimento, todos os pacientes receberam orientação para uso de aspirina 200 mg/dia indefinidamente e clopidogrel 75 mg/dia ou ticlopidina 250 mg/dia por seis a doze meses. Acompanhamento clínico foi realizado pósprocedimento, com eletrocardiograma, dosagem enzimática (CK-total, fração MB e troponina), hematócrito e creatinina sérica.

Definição das variáveis intra-hospitalares

As variáveis intra-hospitalares foram definidas da seguinte forma: sucesso angiográfico, como lesão residual intra-stent inferior a 10% e fluxo distal normal; sucesso clínico, como sucesso angiográfico na ausência de infarto, fenômeno de no-reflow, trombose de stent e óbito; infarto pós-procedimento, como elevação do segmento ST no eletrocardiograma evolutivo, desenvolvimento de nova onda Q em duas derivações eletrocardiográficas contíguas ou novo bloqueio de ramo esquerdo e/ou evidência bioquímica de infarto do miocárdio com elevação da creatina quinase acima de duas vezes o valor normal, associada a aumento da fração MB três vezes acima do limite da normalidade e/ou elevação sérica da troponina acima do valor de 0,5 ng/ml; trombose aguda de stent, como documentação angiográfica de trombo intra-stent, com fluxo distal TIMI 0 ou 1 nas primeiras 24 horas pósprocedimento; e trombose subaguda de stent, como documentação angiográfica de trombo intra-stent, com fluxo distal TIMI 0 ou 1 entre 24 horas e 30 dias pósprocedimento.

Acompanhamento tardio foi feito por meio de seguimento clínico e questionário telefônico anual, com apuração do quadro clínico e verificação da ocorrência de eventos cardíacos maiores (óbito, infarto do miocárdio e novas intervenções).

Definição das variáveis pós-hospitalares

As variáveis pós-hospitalares foram definidas da seguinte forma: infarto tardio, como reinternação com diagnóstico médico de infarto do miocárdio; revascularização do vaso-alvo, como necessidade de reintervenção para tratamento do vaso previamente tratado por nova angioplastia ou cirurgia de revascularização do miocárdio; e evento cardíaco adverso maior (dados cumulativos), como ocorrência de qualquer desfecho clínico desfavorável, quer seja infarto tardio, nova intervenção percutânea ou cirúrgica, ou óbito.

Análise estatística

A comparação entre as variáveis quantitativas foi feita com o teste t de Student. As comparações referentes às variáveis qualitativas foram feitas com o teste estatístico do qui-quadrado, utilizando programa SPSS para Windows, versão 15.1 (SPSS Inc., Chicago, IL, Estados Unidos). Consideraram-se significantes variáveis com valor de p < 0,05.

RESULTADOS

No período de junho de 2002 a dezembro de 2007, 2.369 pacientes foram tratados por angioplastia em nosso Serviço, dos quais 762 somente com stents farmacológicos. Após aplicação dos critérios de exclusão previamente descritos, foram selecionados 653 pacientes.

Na Tabela 1 estão apresentadas as características clínicas dos pacientes, observando-se maior número de homens, de insuficiência renal e de história de intervenção coronária prévia no grupo off-label, caracterizando um segmento de pacientes com doença coronária mais extensa e grave. Na Tabela 2 estão descritas as características angiográficas dos dois grupos, com presença de múltiplos fatores angiográficos desfavoráveis no grupo off-label, com estenoses mais longas e complexas, bem como presença de trombo, angulação acentuada e calcificação, reduzindo a incidência de implante direto de stent e aumentando o uso de múltiplos stents e inibidores de glicoproteína.

A maior complexidade clínica e angiográfica no grupo off-label se traduziu pela maior ocorrência de fenômeno de no-reflow e infarto pós-procedimento, com menor sucesso clínico. No entanto, apesar da maior ocorrência de eventos adversos, não houve diferença na mortalidade intra-hospitalar (Tabela 3).

No seguimento tardio, realizado em 80% dos pacientes por um período médio de 23,2 meses (Figura 1), foram registrados os eventos cardíacos adversos maiores (8% vs. 8,1%; p = 0,5) e a revascularização do vaso-alvo (6,8% vs. 5,1%; p = 0,2), não tendo sido observada diferença entre os grupos.


DISCUSSÃO

Os stents farmacológicos reduziram a incidência de reestenoses clínica e angiográfica nos pacientes tratados por intervenção coronária percutânea nos estudos randomizados. Foram inicialmente implantados em populações altamente selecionadas, visando ao tratamento de lesões não complexas1,2, com benefício clínico e angiográfico mantido por até quatro anos3. A indicação inicial do fabricante (on-label) do stent revestido com sirolimus (Cypher®) foi para o implante nas lesões de novo em vasos nativos com comprimento inferior a 30 mm em vasos de diâmetro de 2,5 mm a 3,5 mm. A indicação do fabricante do stent revestido com paclitaxel (Taxus®) diferia somente no comprimento do stent (< 28 mm) e no limite superior do diâmetro do vaso (até 3,75 mm).

As lesões selecionadas nos ensaios randomizados, entretanto, não refletem o largo espectro da doença coronária que é tratada rotineiramente nos laboratórios de Hemodinâmica. Assim, a utilização dos stents farmacológicos pelos intervencionistas expandiu-se, com implante em indicações não contidas na "bula" do fabricante, denominadas assim "indicações off-label". A generalização do uso dos stents farmacológicos foi então o passo seguinte, com uso indiscriminado do stent farmacológico.

No entanto, dados preliminares e controversos de alguns estudos sugerem que o stent farmacológico pode estar associado a pior evolução clínica, principalmente pelo aumento do risco de trombose do stent, com aumento da mortalidade e do infarto do miocárdio, quando comparado ao stent não-farmacológico4-6, particularmente em pacientes que não estão recebendo clopidogrel7. Em 2006, por causa da preocupação com eventos adversos tardios com o uso de stents farmacológicos, o Food and Drug Administration (FDA) convocou um painel para rever os dados dos estudos randomizados e dos registros8,9. Com base na revisão desses dados, esse painel concluiu que o risco de trombose dos stents farmacológicos, quando utilizados nas indicações on-label, é semelhante ao dos stents não-farmacológicos10. Em contraste, o painel concluiu que os eventos tardios ocorrem com incidência crescente nas indicações off-label, suscitando preocupação quanto a sua segurança10.

O uso off-label ocorre em aproximadamente 60% das angioplastias com implante de stents farmacológicos. Esses pacientes compõem uma população de maior risco, com numerosas co-morbidades, com lesões com morfologia desfavorável e apresentações clínicas instáveis.

Os resultados hospitalares e tardios com stents farmacológicos em situações off-label são controversos. Apesar dos inúmeros estudos disponíveis sobre stents farmacológicos nos últimos anos, não há registro, até o momento, de algum estudo randomizado comparando a evolução dos pacientes tratados com stents farmacológicos em situações on-label vs. off-label. Beohar et al.11 descreveram um registro multicêntrico com 5.541 pacientes tratados com stents farmacológicos, sendo 47% deles com indicações off-label ou não testadas. O risco de morte, infarto do miocárdio ou trombose de stent em trinta dias, bem como a taxa de revascularização do vaso-alvo em um ano, foram significativamente maiores quando os stents farmacológicos foram utilizados em situações off-label, comparativamente às indicações aprovadas. Entretanto, as taxas foram baixas nos dois grupos. Win et al.12, em um registro multicêntrico de 3.323 pacientes tratados com stents farmacológicos, dos quais 55% apresentavam ao menos uma indicação off-label, relataram ter observado letalidade semelhante, porém com aumento da ocorrência de infarto, trombose de stent e revascularização do vaso-alvo, em situações off-label, comparativamente às indicações aprovadas pelo FDA para stent farmacológico. Assim, concluíram que o risco associado ao uso off-label do stent farmacológico não está limitado ao período periprocedimento, mas continua no período após a alta hospitalar. A maior de todas as séries foi relatada por Rao et al.13, com 408.033 procedimentos utilizando stents farmacológicos, a partir de dados do National Cardiovascular Data Registry. Quando os stents farmacológicos foram utilizados em indicações off-label (limitadas a infarto agudo, reestenose intra-stent, pontes de safena e oclusão crônica, compreendendo 24,1% do total), as taxas de eventos intrahospitalares foram inferiores às esperadas pelo mode-lo validado. Nesse estudo, entretanto, não houve rigor na dosagem enzimática após os procedimentos, além de conter menos critérios off-label, sugerindo que a seleção dos casos e a decisão clínica do uso de stents farmacológicos em indicações off-label podem ser seguras e apropriadas.

Os achados com stents convencionais nas lesões off-label são, em contrapartida, inferiores, como comprovado por Marroquin et al.14, em que os pacientes tratados com stents farmacológicos demonstraram melhor evolução, com redução da necessidade de reintervenção, sem aumento da mortalidade e do infarto.

Nesta série, compreendendo uma população de mundo-real, notamos a expansão do uso do stent farmacológico, com implante off-label em mais de 50% dos casos. Verificamos maior gravidade, extensão e complexidade da doença coronária nesse grupo tradicionalmente associado a resultados desanimadores com stents convencionais, especialmente em lesões ostiais, em bifurcações e em lesões reestenóticas.

Apesar da maior gravidade da população descrita, encontramos resultados hospitalares favoráveis, com reduzida mortalidade, apesar da maior incidência de infarto periprocedimento, atingindo mesmo assim níveis reduzidos e aceitáveis em uma população tão complexa. Os achados no seguimento tardio foram animadores, com evidência de reduzida ocorrência de eventos cardíacos nos dois grupos, demonstrando a manutenção dos resultados intra-hospitalares. Nossa análise apresenta limitações, especialmente por se tratar de uma série não-multicêntrica, com perda de acompanhamento de aproximadamente 20% dos casos. Entretanto, os dados descritos, associados aos da literatura, demonstram que, na prática clínica corrente, o uso dos stents farmacológicos em situações off-label nos parece seguro e eficaz a curto e médio prazos, com necessidade de mais registros, especialmente em nosso País, para esclarecimento de dúvidas principalmente quanto à ocorrência de trombose tardia dos dispositivos.

CONCLUSÃO

O implante off-label do stent farmacológico é seguro, com baixa mortalidade. Apesar de sua maior complexidade, não verificamos aumento do risco de eventos cardíacos adversos tardios ou revascularização da lesãoalvo quando comparado com o implante on-label.

Recebido em: 29/7/2008

Aceito em: 17/9/2008

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  • Correspondência:

    José Ary Boechat e Salles
    Rua João Borges, 204 - Gávea
    Rio de Janeiro, RJ - CEP 22451-100
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Aceito
      17 Set 2008
    • Recebido
      29 Jul 2008
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