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Frutanos em calos de Smallanthus sonchifolius (Poepp.) H. Rob

Fructans in calli of Smallanthus sonchifolius (Poepp.) H. Rob

Resumos

Smallanthus sonchifolius, Asteraceae originária dos Andes, possui rizóforos e raízes tuberosas que armazenam frutanos do tipo inulina. Explantes de raízes tuberosas dão origem a calos de linhagem amarela que, espontaneamente, originaram a linhagem vermelha. O conteúdo de frutanos foi semelhante nas duas linhagens, enquanto a atividade de síntese foi mais elevada na linhagem vermelha e a de hidrólise foi mais elevada na amarela. Análises por HPAEC/PAD demonstraram a presença, em ambos os calos, de frutooligossacarídeos com grau de polimerização inferior ao encontrado em plantas cultivadas sob condições naturais, indicando que esta característica é mantida em células indiferenciadas. A presença de frutanos e as diferenças entre as atividades de frutosiltransferases e hidrolases em calos vermelhos e amarelos possibilitam a aplicação desse material em estudos de regulação do metabolismo desses compostos em condições controladas.

cultivo in vitro; frutanos; inulina; yacon


Smallanthus sonchifolius is an Asteraceae native from the Andes Mountains that accumulates inulin-type fructans in the underground reserve organs, the tuberous roots and the rhizophores. Yellow callus was obtained from tuberous roots, giving origin, spontaneously to red callus. Fructans and their metabolizing enzymes were analyzed in calli of both types, showing similar fructan contents in both lineages. However, synthesizing activity was higher in red callus, while hydrolyzing activity was higher in yellow callus. HPAEC/ PAD analyses revealed the presence of fructo-oligosaccharides in both calli with degrees of polymerization lower than those found in plants cultured ex vitro, indicating that this characteristic was maintained in undifferentiated cells. The presence of fructans and the differences between the activities of fructosyltransferases and hydrolases found in red and yellow calli indicate this material as suitable for studies of fructan metabolism under controlled conditions.

fructan; in vitro conditions; inulin; yacon


Frutanos em calos de Smallanthus sonchifolius (Poepp.) H. Rob

Fructans in calli of Smallanthus sonchifolius (Poepp.) H. Rob

Vanessa Fátima de OliveiraI; Nair Massumi ItayaII; Eny Iochevet Segal FlohIII; Maria Angela Machado de CarvalhoI,* * Autor para correspondência: mam.carvalho@gmail.com

IInstituto de Botânica, Caixa Postal 3005, 01061-970 São Paulo, SP, Brasil

IIUniversidade do Grande ABC, Av. Industrial, 3330, 09080-511 Santo André, SP, Brasil

IIIUniversidade de São Paulo, Instituto de Biociências, Caixa Postal 11461, 05422-970 São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

Smallanthus sonchifolius, Asteraceae originária dos Andes, possui rizóforos e raízes tuberosas que armazenam frutanos do tipo inulina. Explantes de raízes tuberosas dão origem a calos de linhagem amarela que, espontaneamente, originaram a linhagem vermelha. O conteúdo de frutanos foi semelhante nas duas linhagens, enquanto a atividade de síntese foi mais elevada na linhagem vermelha e a de hidrólise foi mais elevada na amarela. Análises por HPAEC/PAD demonstraram a presença, em ambos os calos, de frutooligossacarídeos com grau de polimerização inferior ao encontrado em plantas cultivadas sob condições naturais, indicando que esta característica é mantida em células indiferenciadas. A presença de frutanos e as diferenças entre as atividades de frutosiltransferases e hidrolases em calos vermelhos e amarelos possibilitam a aplicação desse material em estudos de regulação do metabolismo desses compostos em condições controladas.

Palavras-chave: cultivo in vitro, frutanos, inulina, yacon

ABSTRACT

Smallanthus sonchifolius is an Asteraceae native from the Andes Mountains that accumulates inulin-type fructans in the underground reserve organs, the tuberous roots and the rhizophores. Yellow callus was obtained from tuberous roots, giving origin, spontaneously to red callus. Fructans and their metabolizing enzymes were analyzed in calli of both types, showing similar fructan contents in both lineages. However, synthesizing activity was higher in red callus, while hydrolyzing activity was higher in yellow callus. HPAEC/ PAD analyses revealed the presence of fructo-oligosaccharides in both calli with degrees of polymerization lower than those found in plants cultured ex vitro, indicating that this characteristic was maintained in undifferentiated cells. The presence of fructans and the differences between the activities of fructosyltransferases and hydrolases found in red and yellow calli indicate this material as suitable for studies of fructan metabolism under controlled conditions.

Key words: fructan, in vitro conditions, inulin, yacon

Introdução

A maioria das plantas armazena amido ou sacarose como carboidrato de reserva, porém, aproximadamente 15% das angiospermas armazenam frutanos, incluindo as ordens mais evoluídas como Poales e Asterales (Hendry & Wallace 1993). Muitas das plantas que contém frutanos, como o trigo, a cebola, o alho-poró, a alcachofra, a chicória, a alface, a bardana e o aspargo, têm sido utilizadas há séculos para fins medicinais ou alimentares (Fuchs 1993). Os frutanos consistem de séries homólogas de oligo-e polissacarídeos de frutose originados da sacarose. Diferentes frutanos podem ser encontrados, dependendo da ligação entre as unidades de frutose. Nas inulinas, comumente presentes em Asteraceae, o tipo de ligação predominante é 6 (2-1) (Pollock et al. 1996).

Os frutanos são sintetizados pela sacarose: sacarose 1-frutosiltransferase (1-SST - EC 2.4.1.99), que catalisa irreversivelmente a formação do trissacarídeo 1-cestose a partir de duas moléculas de sacarose, liberando uma molécula de glucose, e pela frutano: frutano frutosiltransferase (1-FFT - EC 2.4.1.100), que catalisa a transferência reversível de resíduos terminais de frutose de uma molécula doadora para uma receptora. A despolimerização dos frutanos é catalisada por uma frutano-exohidrolase (1-FEH - EC 3.2.1.153), que atua na remoção seqüencial dos resíduos terminais de frutose (Edelman & Jefford 1968, Van den Ende et al. 2002).

O interesse crescente no uso de inulina na alimentação levou a um aumento de 1.000 para mais de 100.000 toneladas na sua produção na última década, a partir de raízes de Cichorium intybus L. (chicória) (Van den Ende et al. 2002). Quando misturada à água, a inulina forma uma emulsão de baixo teor calórico com textura similar à da gordura e adequada à fabricação de iogurtes, sorvetes, mousses, chocolates e produtos de panificação (Ritsema & Smeekens 2003). Os frutooligossacarídeos (FOS), por sua vez, são fibras solúveis dietéticas não digeridas na parte superior do trato gastrointestinal (Carabin & Flamm 1999) e fermentados seletivamente no intestino grosso, estimulando o crescimento de bifidobactérias (Hidaka et al. 1986, Wang & Gibson 1993). Neste processo são liberados compostos que aumentam a resistência imunológica do hospedeiro e a absorção de minerais, particularmente o cálcio, diminuem a síntese de triglicérides e ácidos graxos no fígado e conseqüentemente o nível desses compostos no sangue (Kaur & Gupta 2002).

Smallanthus sonchifolius (Poepp.) H. Rob. (= Polymnia sonchifolia), popularmente conhecida por yacon, é uma espécie herbácea, da família Asteraceae, nativa dos vales andinos da Colômbia, Equador, Peru, Bolívia e noroeste da Argentina, de altitudes que variam de 2.000 a 3.100 m. O sistema subterrâneo desta planta é constituído de rizóforos, utilizados na propagação vegetativa, e de raízes tuberosas, que são os principais órgãos de armazenamento (Grau & Rea 1998, Vilhena et al. 2000). Ambas as estruturas acumulam frutanos do tipo inulina, porém, diferentemente de C. intybus ou Helianthus tuberosus L. (alcachofra-de-jerusalém), que apresentam frutanos com grau de polimerização (GP) médio de aproximadamente 35, os frutanos em yacon são FOS com GP de 3-15 (Goto et al. 1995, Itaya et al. 2002).

As plantas de yacon apresentam alta produtividade, podendo atingir 70 t ha-1 de raízes tuberosas por ano, segundo Nieto (1991), embora Kakihara et al. (1997) tenham relatado rendimentos de até 100 t ha-1 de raízes tuberosas e 1 t ha-1 de folhas frescas. Introduzida no Brasil por volta de 1989 na região de Capão Bonito (SP), esta planta vem sendo cultivada atualmente em várias cidades do estado de São Paulo (Vilhena et al. 2000).

Os conteúdos elevados de frutose livre e de FOS nas raízes tuberosas constituíram forte motivo para a indicação de yacon como fonte de matéria prima para a produção de xaropes de frutose e de FOS (Ohyama et al. 1990). Suas raízes são utilizadas na medicina popular, principalmente devido à atividade anti-diabética presente nas folhas e nas raízes tuberosas (Kakihara et al. 1997).

A micropropagação de plantas através das técnicas de cultura de tecidos in vitro tem sido utilizada como alternativa para a produção comercial de espécies ornamentais e medicinais com valor farmacológico reconhecido, além da manutenção de espécies em bancos de germoplasma (Chu & Kurtz 1990). A cultura in vitro é, portanto, uma alternativa para a propagação de yacon, por possibilitar sua rápida multiplicação e manutenção das características genéticas das plantas selecionadas como matrizes (Grau & Rea 1998).

A cultura de tecidos também é apontada como um instrumento valioso para o estudo do metabolismo primário e secundário, além de ser um sistema apropriado para a produção de compostos importantes como carboidratos solúveis e enzimas (Abou-Mandour et al. 1987, Veramendi et al. 1999). Por outro lado, a presença de frutanos em calos tem sido relatada de forma esparsa na literatura. Estudos pioneiros mostraram a presença de frutanos e suas características estruturais em calos de Symphytum officinale L. (Abou-Mandour et al. 1987), Phleumpratense L. (Hale et al. 1987) e Gomphrena macrocephala A. St.-Hil. (Vieira et al. 1995). Mais recentemente, Itaya et al. (2005) demonstraram a ocorrência de frutanos e a presença de atividade das enzimas SST e FFT em extratos de calos de Viguiera discolor Baker, Asteraceae do cerrado, ampliando o conhecimento sobre o metabolismo de frutanos em tecidos cultivados in vitro.

Considerando a elevada concentração de FOS nas raízes tuberosas de S. sonchifolius, a vasta aplicação desses compostos na indústria e a escassez de estudos sobre o metabolismo de frutanos em culturas de calos, o presente trabalho teve como objetivo investigar a presença de frutanos e das enzimas envolvidas no seu metabolismo em duas linhagens de calos (amarela e vermelha), obtidas a partir de raízes tuberosas de S. sonchifolius.

Material e métodos

Material vegetal - Calos de Smallanthus sonchifolius obtidos de explantes de raízes tuberosas de plantas coletadas em canteiros experimentais da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus Botucatu, foram cultivados no Laboratório de Biologia Celular do Departamento de Botânica da Universidade de São Paulo (USP). O material foi mantido em frascos do tipo "Wheaton", contendo 30 mL do meio básico MS62 (Murashige & Skoog 1962), pH 5,8, suplementado com ácido naftalenoacético (3 mg -1), benzilaminopurina (1 mg L-1), Phytagel® (1,8 g L-1) e sacarose (2%). As culturas foram mantidas a 25 ± 2 ºC em fotoperíodo de 16 h, sob um fluxo de luz de 45 µmol m -2 s-1. Três semanas após a inoculação, os primeiros calos apresentaram crescimento vigoroso e cor amarelada. Após 18 meses de cultivo, com repicagens sucessivas a cada três semanas, estes passaram a exibir regiões de coloração avermelhada, que foram isoladas e inoculadas sob as mesmas condições descritas acima. Sucessivamente, em subculturas destas porções, foi obtida a linhagem de cor vermelha (figura 1). Para manutenção das culturas, pequenos fragmentos de calos de ambas as linhagens foram inoculados a cada 21 dias em meio de cultura e mantidos sob as mesmas condições, sendo descartadas porções que apresentavam sinais de oxidação. Amostras de calos de ambas as linhagens foram congeladas em nitrogênio líquido e mantidas a -80 ºC até a realização das análises bioquímicas. Extração e análise de frutanos - as extrações de frutanos foram realizadas em triplicata, conforme Carvalho et al. (1998), com as seguintes modificações. As frações aquosas e etanólicas foram reunidas, concentradas constituindo o extrato de carboidratos solúveis. Os conteúdos de frutose livre e ligada foram determinados pelo método de antrona modificado (Jermyn 1956), utilizando-se frutose (Sigma) (200 µg mL-1) como padrão. Amostras dos carboidratos solúveis foram neutralizadas em colunas de troca iônica utilizando-se resinas Dowex na forma catiônica (50X8 - 200) e aniônica (1X8 - 200) e analisadas por cromatografia de troca aniônica de alta resolução e detector de pulso amperométrico (HPAEC/PAD) em sistema Dionex (modelo DX-300) e coluna Carbo Pac PA1 (4 X 250 mm) a concentração de 400 µg mL-1, em equivalentes de frutose. A eluição foi realizada utilizando-se o gradiente de mistura do eluente A (150 mM de hidróxido de sódio) e eluente B (500 mM de acetato de sódio em 150 mM de hidróxido de sódio) conforme Portes & Carvalho (2006).


Extração enzimática e determinação da atividade enzimática - amostras de calos das linhagens vermelha e amarela foram homogeneizadas em tampão citratofosfato 50 mM pH 5,5, contendo 2 mM de ácido etilenodiamino tetra-acético (EDTA), 5 mM de ácido ascórbico, 2 mM de P-mercaptoetanol e 5% de polivinilpolipirolidona (PVPP) (Itaya et al. 2002). Toda a manipulação do material durante a extração foi realizada a 5 ºC. O conteúdo de proteína foi determinado segundo Bradford (1976), utilizando-se albumina de soro bovino (Sigma) (1 ug µL-1) como padrão. A atividade enzimática foi determinada a partir da incubação do extrato com sacarose 0,4 M e 0,2 M para a medida da atividade de SST e inverta-se, respectivamente; 1-cestose 0,4 M para a atividade de FFT e inulina 10% de H. tuberosus para a atividade de FEH, todos na proporção de 1:1 (v/v). Os ensaios foram realizados em pH 5,5, a 30 ºC, conforme Itaya et al. (2002). A análise dos produtos de incubação de SST, FFT e invertase foi feita por HPAEC/PAD em sistema de cromatografia Dionex (DX-300) utilizando-se coluna CarboPac PA-1 (4 X 250 mm). Para SST e FFT, a eluição foi realizada utilizandose o gradiente de mistura do eluente A e eluente B, descrito anteriormente para a análise dos carboidratos. Para a invertase, foi utilizado um programa isocrático de 100 mM de hidróxido de sódio. Em ambos os casos, os potenciais aplicados ao PAD para E1 (480 ms), E2 (120 ms) e E3 (60 ms) foram 0,05, 0,60 e -0,60, respectivamente. As atividades de SST, FFT e invertase foram calculadas com base nas áreas dos picos referentes à 1-cestose, nistose e frutose, respectivamente, utilizando-se padrões externos. A atividade de FEH foi determinada pela quantidade de frutose liberada, através da quantificação do açúcar redutor (Somogyi 1945), utilizando-se frutose (200 µg mL-1) como padrão.

Resultados e Discussão

O teor de frutanos nos calos da linhagem vermelha foi de 8,1 mg g-1 massa fresca e nos da linhagem amarela foi de 8,8 mg g-1 massa fresca. Os teores desses compostos em órgãos de reserva de plantas cultivadas em campo obtidos por Fukai et al. (1997) e Itaya et al. (2002) foram de aproximadamente 85 mg g-1 massa fresca e 60 mg g-1 massa fresca, respectivamente e, portanto, muito superiores aos valores encontrados nos calos. Resultados com calos e plantas de V. discolor (Itaya et al. 2005) obtidas por micropropagação, e com plantas de G. macrocephala propagadas in vitro (Moreira et al. 1999) também indicaram conteúdos de frutanos inferiores aos detectados em plantas crescidas sob condições naturais. Esses resultados demonstram a preservação do metabolismo de frutanos em células menos diferenciadas e possibilitam estudos mais aprofundados visando à regulação do metabolismo desses compostos, ao aumento da produção de frutanos, bem como à obtenção de material em quantidades suficientes para estudos enzimáticos específicos.

Calos das linhagens amarela e vermelha apresentaram diferenças nas atividades das enzimas do metabolismo de frutanos, especialmente da SST e da invertase (figura 2).


A figura 3 apresenta os produtos de incubação do extrato enzimático dos calos da linhagem vermelha com sacarose, para determinação das atividades de SST (figura 3a, b) e invertase (figura 3e, f), e com 1-cestose, para atividade de FFT (figura 3c, d). A atividade da SST foi detectada pela formação do trissacarídeo 1-cestose e liberação de glucose, após 6 horas de incubação. Verifica-se ainda a presença de frutose que, juntamente com parte da glucose, representam os produtos de atividade da invertase.


 






Diferentemente dos calos vermelhos, os calos da linhagem amarela apresentaram atividade de SST próxima de zero (figuras 2, 4a , b ). Após 6 horas de incubação, a quantidade de 1-cestose formada foi muito inferior à observada nos calos vermelhos (figura 3a, b). A maior atividade de SST encontrada nos calos vermelhos (figura 2) não causou aumento no teor de frutanos nestes tecidos, uma vez que este teor foi semelhante ao encontrado nos calos amarelos. Atividade de SST elevada em plantas de S. sonchifolius (Itaya et al. 2002) e de Taraxacum officinale L. Weber ex F.H. Wigg (Van den Ende et al. 2000) cultivadas no campo foi associada a fases de crescimento e divisão celular intensos. Entretanto, como o crescimento dos calos não foi quantificado no presente estudo, não é possível correlacionar este parâmetro com a atividade diferencial da SST, de modo a confirmar esta associação em células indiferenciadas.

 

A atividade da FFT nos calos vermelhos foi inferior à da SST (FFT/SST <1), porém mais elevada do que a observada nos calos amarelos, que apresentaram uma razão FFT/SST >1 (figura 2). Em ambos os tipos de calos, a atividade da FFT foi detectada pelo aumento da área do pico referente à nistose, conforme ilustram as figuras 3c, d e 4c , d , respectivamente. Semelhantemente ao observado nos calos vermelhos, Itaya et al. (2002) detectaram uma razão FFT/SST <1 em plantas de yacon cultivadas no campo, durante todo o ciclo de crescimento. Contudo, calos de V. discolor mantiveram a mesma razão FFT/SST >1, encontrada em plantas cultivadas em condições naturais (Itaya et al. 2005). Porém, a manutenção dessa característica em tecidos cultivados in vitro parece não obedecer a um padrão, visto que os calos amarelos de yacon apresentaram razão FFT/SST >1, diferentemente do observado em plantas ex vitro e nos calos vermelhos.

Os calos da linhagem amarela apresentaram maior atividade de FEH do que os da linhagem vermelha (figura 2). Esta atividade é consistente com a maior proporção de frutose livre, produto da FEH, e menor proporção de sacarose, inibidora desta enzima, encontrada nos calos amarelos (figura 5b). Por outro lado, a atividade mais elevada de 1-SST nos calos vermelhos é consistente com a proporção de sacarose mais elevada nesses tecidos (figura 5a). Em geral, concentrações elevadas de sacarose favorecem a síntese de frutanos (Pollock & Cairns 1991) e inibem a FEH (Marx et al. 1997 a, b), favorecendo o controle temporal da atividade dessas enzimas que estão presentes em um mesmo compartimento celular, o vacúolo (Frehner et al. 1984).


A atividade da invertase foi maior nos calos da linhagem vermelha (figura 2), conforme demonstrado pelo aumento dos picos referentes à glucose e à frutose nas figuras 3e, f e 4e , f . Os valores encontrados em ambos os calos, entretanto, foram superiores aos obtidos em plantas cultivadas no campo (Itaya et al. 2002), nas quais a atividade da invertase manteve-se baixa durante todo o ciclo de crescimento. Isto se deve, possivelmente, à presença de sacarose bem como de outros componentes do meio de cultura que afetaram a atividade de invertase nos calos.

Embora os calos vermelhos tenham apresentado atividade de síntese de frutanos maior que os amarelos, a análise dos carboidratos por HPAEC/PAD de ambos os calos (figura 5) revelou, além de glucose, frutose e sacarose, a presença de fruto-oligossacarídeos com grau de polimerização (GP) < 5, inferior ao encontrado em raízes tuberosas de plantas sob condições naturais, que apresentam GP < 15 (Itaya et al. 2002). A linhagem vermelha apresentou maiores proporções de sacarose, 1-cestose e nistose, quando comparada à amarela, que apresentou maiores proporções de glucose e frutose. Essa diferença no perfil cromatográfico nas duas linhagens parece estar relacionada às enzimas que apresentaram maiores atividades: a de SST nos calos vermelhos, promovendo a síntese da 1-cestose com o conseqüente alongamento da cadeia, e a de FEH nos calos amarelos, atuando na redução do comprimento das cadeias, conforme já sugerido por Itaya et al. (2002) para plantas de yacon crescidas no campo.

Os resultados obtidos no presente trabalho demonstram inequivocamente a presença das enzimas do metabolismo de frutanos e de frutanos com baixo GP em ambas as linhagens de calos de S. sonchifolius. Esses calos constituem um material alternativo para o estudo específico de frutosiltransferases e hidrolases visando ao conhecimento da regulação do metabolismo de frutanos, devido à atividade diferencial dessas enzimas nas linhagens vermelha e amarela e ao potencial de rápida multiplicação desse material em larga escala.

Agradecimentos

À FAPESP (Proc. 98/05124-8 e Proc. 05/04139-7) e ao CNPq (Proc. 474674/04) pelo apoio financeiro. À Dra Rita de Cássia L. Figueiredo-Ribeiro pela leitura crítica do manuscrito e pelas sugestões valiosas. M.A.M.C. e V.F.O. agradecem ao CNPq pelas bolsas de Produtividade em Pesquisa e PIBIC.

Literatura citada

Recebido: 06.06.2008; aceito: 05.02.2009

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    Autor para correspondência:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Abr 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2009

    Histórico

    • Aceito
      05 Fev 2009
    • Recebido
      06 Jun 2008
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