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Georg Fuchs e a Função Social do Teatro: apontamentos sobre o livro A revolução do teatro

RESUMO

O artigo apresenta e discute algumas das propostas do pensador do teatro alemão Georg Fuchs (1868-1949) contidas no seu livro A revolução do teatro: conclusões sobre o Teatro dos Artistas de Munique, publicado em 1909. Para isso, destaca-se alguns dos interlocutores de Fuchs, tanto para sua elaboração teórica, como para a circulação de suas ideias na época. Como eixo central, a discussão identifica em cada uma das propostas estéticas de Fuchs a sua perspectiva de entendimento da arte, a partir do papel que ela deveria exercer na sociedade. Busca-se, portanto, não só identificar as propostas estéticas de Fuchs, mas também enfatizar, para além delas, seus objetivos políticos.

Palavras-chave:
Revolução do Teatro; Georg Fuchs; Espaço Cênico; Teatro Alemão; Teatro Moderno

ABSTRACT

The article presents and discusses some of the proposals of German theater thinker Georg Fuchs (1868-1949) contained in his book The revolution of the theater: conclusions about the Munich Artists’ Theater, published in 1909. Some of Fuch’s interlocutors during his process of creating the theater are presented. As a central axis, the discussion identifies in each of Fuchs’ aesthetic proposals his perspective of understanding art based on the role it should play in society. We thus seek to not only to identify Fuchs’ aesthetic proposals, but also to emphasize, in addition to them, his political objectives.

Keywords:
Theater Revolution; Georg Fuchs; Scenic Space; German Theater; Modern Theater

RÉSUMÉ

L’article présente et discute certaines des propositions du penseur de théâtre allemand Georg Fuchs (1868-1949) maîtrisé dans son livre The Theatre Revolution: Conclusions on the Munich Artists’ Theatre, publié en 1909. Pour cela, on mit en évidence certains des interlocuteurs majeurs de Fuchs dans son processus de création du théâtre. Comme axe central, la discussion identifie dans chacune des propositions esthétiques de Fuchs sa perspective de comprendre l’art en fonction du rôle qu’il devrait jouer dans la société. On cherche donc non seulement à identifier les propositions esthétiques de Fuchs, mais aussi à souligner ses objectifs politiques.

Mots-clés:
Révolution du Théâtre; Georg Fuchs; Espace Scénique; Théâtre Allemand; Théâtre Moderne

Introdução

O presente artigo tem como objetivo apresentar e discutir as principais propostas do encenador alemão Georg Fuchs contidas em seu livro A revolução do teatro: conclusões sobre o Teatro dos Artistas de Munique1 1 Tradução minha do título em alemão: Die Revolution des Theater: Ergebnisse aus dem Münchener Künstler-theater. (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909.). A ênfase aqui será na relação entre suas propostas estéticas e seus ideais de transformação social, o aspecto espacial do teatro de Fuchs aparece, nesse sentido, como um ponto fundamental para a análise. Como nos mostram Bernard Dort (2010)DORT, Bernard. O teatro e sua realidade. Tradução de Fernando Peixoto. Revisão de texto de J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva , 2010. e Denis Guénoun (2003)GUÉNOUN, Denis. A exibição das palavras: uma ideia (política) do teatro. Tradução de Fátima Saadi. Rio de Janeiro: Teatro do Pequeno Gesto, 2003., cada um a seu modo, o espaço teatral é característica fundamental para a compreensão do aspecto político do teatro. É o espaço arquitetônico que organiza o encontro entre cena e público e é justamente nessa reunião de pessoas que está a “[...] vocação política do teatro” (Dort, 2010, p. 366).

Vale a pena ressaltar que este artigo foi elaborado a partir do primeiro capítulo da dissertação de mestrado da autora, realizada no Programas de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), sob orientação da Profa. Dra. Vanessa Teixeira de Oliveira. A dissertação teve como tema central o espaço cênico proposto por Georg Fuchs no seu livro, já mencionado. Por se tratar de uma primeira publicação, após a conclusão da pesquisa de mestrado, e devido à escassez de material em língua portuguesa sobre o tema, o presente artigo possui um caráter muito mais panorâmico do que analítico do pensamento de Fuchs. A proposta é que os demais resultados obtidos com a pesquisa de mestrado possam ser publicados em artigos futuros, que terão sempre, nesta publicação, uma importante referência.

Georg Fuchs e seus Contemporâneos

Georg Fuchs (1868-1949) foi um crítico de arte e diretor de teatro alemão (Figura 1). Durante os primeiros anos do século XX, ele escreveu livros que pensavam a arte e o teatro na Alemanha, seus livros de maior circulação foram O teatro do futuro, de 1905, e A revolução do teatro, de 1909. Inseridas nos debates trazidos pelo Teatro Moderno, as questões trazidas por Fuchs também repensavam a arte do teatro enquanto uma arte autônoma e o surgimento da figura do encenador enquanto o artista criador dessa cena moderna (Roubine, 1998ROUBINE, Jean-Jacques. Linguagem da encenação teatral. Tradução de Yan Michalski. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar , 1998.). É possível encontrar referências ao trabalho de Fuchs em escritos de outros teóricos da época, como do encenador russo Vsévolod Meyerhold (1874-1940) em seu texto Contribuição à montagem da ópera wagneriana Tristão e Isolda no teatro Mariínski publicado no livro Do teatro (Meyerhold, 2012MEYERHOLD, Vsévolod. Do teatro. Tradução de Diego Moschkovich. São Paulo: Iluminuras, 2012.). Nesse texto, Meyerhold apresenta Fuchs como alguém que pretendia retomar algumas características espaciais dos palcos elisabetanos, como, por exemplo, a utilização do proscênio como uma região fundamental do palco (Meyerhold, 2009MEYERHOLD, Vsévolod. Sobre o teatro. Tradução de Maria Thais e Roberto Mallet. In: THAIS, Maria. Na cena do Dr. Dapertutto: poética e pedagogia em V. E. Meierhold: 1911 a 1916. São Paulo: Perspectiva ; Fapesp, 2009. P. 179-442.).

Figura 1
Fotografia de Georg Fuchs (1901).

Outro artista contemporâneo a Fuchs e que dialogou com seu trabalho foi Edward Gordon Craig (1872-1966). Em seu texto O teatro na Alemanha, na Rússia e na Inglaterra de 1908, que integra o livro Da arte do teatro, Craig (1964) descreve sua visita ao teatro fundado por Fuchs. No trecho a seguir, Craig demonstra sua admiração tanto com relação aos aspectos físicos do teatro, elogiando a arquitetura e o maquinário cênico, quanto com relação ao sucesso de público do espetáculo de estreia dirigido por Fuchs:

Sai completamente do usual, de todas as maneiras e, no entanto, vemos príncipes dar o seu apoio ao empreendimento e não lhe chamar ‘excêntrico’ e, o que é mais, o povo encorajá-lo. Tentei inutilmente arranjar um lugar para o espetáculo dessa mesma noite: não havia um único, apesar de se estar no final da temporada. Graças à amabilidade do prof. Littmann, pude ver, de dia, o palco, a sala e a maquinaria dos cenários e da iluminação. São diferentes de tudo o que já vi até hoje. [...] É muito pequeno, mas muito completo. Nada foi fiado ao acaso; os cabos, os cenários, os aparelhos de iluminação parecem todos escondidos. Dir-se-ia que tudo foi metido num armário. Todos os cenários que estão a ser utilizados ficam suspensos da maneira mais cuidadosa, mais engenhosa que possa imaginar-se. O palco estava pronto para a representação da noite, com os móveis cobertos de panos. Ainda que estivessem a servir a meses, os cenários estavam impecáveis e nem mesmo os ângulos de reunião mostravam vestígios de fadiga. Tudo parecia maravilhosamente conservado (Craig, 1964CRAIG, Edward Gordon. Da arte do teatro. Tradução de Redondo Júnior. Lisboa: Editora Arcádia , 1964., p. 150).

A partir das observações desses dois consagrados artistas do Teatro Moderno sobre o espaço cênico proposto por Fuchs, o presente artigo tem como objeto de estudo o livro A revolução do teatro2 2 Todas as citações presentes neste artigo, que não possuem publicação em português, foram traduzidas livremente pela autora e os trechos originais se encontram em nota de rodapé. , publicado por Georg Fuchs um ano após a abertura do Teatro dos Artistas de Munique (Munchen Kunstler-theater) (Figura 2). Apesar da proximidade das propostas de Fuchs com as de seus contemporâneos simbolistas e de seus escritos terem tido uma circulação na época, atualmente, poucos são os trabalhos inteiramente voltados para a obra dele3 3 No Brasil, até onde se sabe não existe publicação dedicada a sua obra, nenhum resultado é encontrado ao buscar Georg Fuchs nos sítios eletrônicos do Banco de Teses da Capes e na Plataforma Scielo do CNPQ. . Apesar disso, seu nome frequentemente é mencionado em títulos que fazem referência a esse período específico da história do teatro europeu4 4 Me refiro aqui especificamente aos títulos: Teorias do teatro, do pesquisador norte americano Marvin Carlson (1997); O teatro pós dramático, do teórico alemão Hans-Thies Lehmann (2007); Vsévolod Meierhold ou A invenção da encenação, de Gérard Abensour (2011); Meierhold e A arte do teatro: entre tradição e vanguarda, ambos da pesquisadora Béatrice Picon-Vallin (2013a; 2013b). Dentre as publicações brasileiras posso mencionar: História da literatura e do teatro alemão, de Anatol Rosenfeld (1993); a dissertação de mestrado da pesquisadora Cibele Forjaz Simões (2008) intitulada À luz da linguagem e a tese de Luiz Cláudio Cajaiba Soares (2005) intitulada A encenação dos dramas de língua alemã na Bahia. Destaco ainda três obras estrangeiras inteiramente dedicadas ao trabalho de Fuchs, são elas: o artigo de Eloisa Perone (2015) intitulado L’avvenimento teatrale come festa: la prima teoria teatrale di Georg Fuchs e a tese de Juliet Koss (2000) intitulada Empathy Abstracted: Georg Fuchs and the Munich Artists’ Theater. .

Figura 2
Fachada do Teatro dos Artistas de Munique (1908).

O livro A revolução do teatro é dividido em nove capítulos5 5 Os títulos dos capítulos são: I. O teatro como um problema cultural (Das Theater als Kulturproblem); II. A função e o estilo do palco (Vom Zweck und Stil der Schaubühne); III. O ator (Die Schauspieler); IV. Palco e casa de espetáculo (Bühne und Haus); V. Drama (Drama); VI. Ópera (Oper); VII. Teatro de variedades (Variétè); VIII. A história do Teatro dos Artistas (Aus der Vorgeschichte des Künstlertheaters); IX. A nova arte do palco e o teatro comercial (Neue Bühnenkunst und Theatergeschäft). , nos quais o autor desenvolve suas principais ideias para uma transformação do teatro alemão da época e aponta como as colocou em prática na criação de seu teatro. A epígrafe do livro é Rethéâtraliser le théâtre! cuja tradução literal seria Reteatralizar o teatro!. No prefácio, ele afirma que esse é o mote do livro e é com essa finalidade que são pensadas as transformações que ocasionariam o que ele chama de revolução no teatro.

Pode-se pensar duas propostas que fundamentariam essa revolução: a primeira seria referente a trazer de volta ao teatro as antigas tradições do teatro de rua, das festas populares, dos ditirambos dionisíacos, ao mesmo tempo em que são incorporados elementos estéticos modernos e de bom gosto; para que isso pudesse ser atingido, o palco e o edifício teatral foram repensados a essa nova espacialidade Fuchs nomeou de cena relevo6 6 Em alemão: Reliefbühne . Essas duas vertentes do pensamento fuchsiano buscam apenas um objetivo: tornar o teatro um lugar que seja capaz de aproximar palco e plateia, de gerar uma emoção arrebatadora e uma experiência estética de unidade harmônica para toda a comunidade teatral. Assim, ao longo do livro, o autor discute como suas propostas foram implementadas na criação do Teatro dos Artistas e como esse novo teatro deveria trabalhar suas diversas áreas.

Sobre a Função Social do Teatro

Já em seu primeiro capítulo, Fuchs apresenta, mesmo que brevemente, todos os assuntos que buscará abordar ao longo do livro. Dentre eles, a transformação arquitetônica do edifício teatral e da cenografia, com a finalidade de gerar um sentimento de arrebatamento do público; menciona seu entendimento do teatro como um empreendimento comercial e que por isso seria necessário agradar ao público que não estava sendo atraído pelo teatro de seu tempo. Ele deixa clara a sua admiração por Johann Wolfgang von Goethe e justifica suas preocupações no teatro como legítimas pelo fato de que também Goethe refletiu sobre elas.

Assim, Fuchs retoma as trupes itinerantes e o teatro do Renascimento que faziam uso de poucos elementos cênicos e de convenções teatrais para realizar suas peças. Para ele, esse modo de fazer teatro foi perdido com a popularização da ópera. A influência de estrangeiros é colocada como um atraso para a arte teatral alemã. Nesse sentido, a guerra dos trinta anos, no século XVII, é pensada como uma interrupção na cultura teatral alemã, pois seu território havia sido ocupado por outros povos, principalmente os franceses. A partir daí, ocorreria o aumento da incorporação das regras do teatro clássico francês ao repertório alemão e promovidas por intelectuais das letras como Johann Christoph Gottsched (1700-1766) (Saadi, 2018SAADI, Fátima. A configuração da cena moderna: Diderot e Lessing. Rio de Janeiro: Teatro do Pequeno Gesto , 2018.).

Como os objetivos de todos os movimentos culturais na Alemanha atual, os do Teatro dos Artistas não devem ser entendidos como uma revolta contra a tradição, mas, ao contrário, como um despertar da boa tradição. Nós restabelecemos onde nosso desenvolvimento orgânico foi interrompido pela Guerra dos Trinta Anos e outras turbulências culturais. Naturalmente, seria um arcaísmo empobrecedor se - como alguns românticos o exigiam - reintroduzirmos as relações primitivas do palco dos tempos de Hans Sachs e Shakespeare. Isso não corresponderia à nossa cultura geral. Em vez disso, devemos nos esforçar para criar o espetáculo que agora existiria se o desenvolvimento desde o começo muito simples até o presente nunca tivesse sido interrompido e se, ao longo do caminho, houvesse sido feito uso de todas as descobertas artísticas e técnicas à medida em que elas se desenvolvessem7 7 No original em alemão: Wie alle Ziele der kulturellen Bewegung im gegenwärtigen Deutschland, so sind auch die des Künstlertheaters nicht als eine Revolte gegen die Tradition aufzufassen, sondern ganz im Gegenteile als ein Wiedererwachen der guten Ueberlieferung. Wir knüpfen da wieder an, wo unsere organische Entwicklung durch den dreißigjährigen Krieg und andere kulturelle Wirren unterbrochen wurde. Selbstverständlich wäre es ein verarmender Archaismus, wenn man - wie es manche Romantiker gefordert - die primitiven Bühnenverhältnisse aus den Zeiten des Hans Sachs und Shakespeares ohne weiteres wieder einführen wollte. Das würde unserer allgemeinen Kultur nicht entsprechen. Vielmehr müssen wir bestrebt sein, die Schaubühne zu schaffen, welche jetzt vorhanden sein würde, wenn die Entwicklung von jenen einfachsten Anfängen her niemals durch unorganische Abirrungen unterbrochen worden wäre und also alle Errungenschaften der Kunst und Technik sich zunutzen gemacht hätte (Fuchs, 1909, p. 37-38). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 37-38).

O livro de Fuchs inicia com a pergunta: Por que nós vamos ao teatro?, e ele a responde: o público vai ao teatro para se divertir e se entreter. Para o autor, o dramaturgo pode atingir diferentes objetivos notáveis, tocar a alma do público, explorar a experiência humana etc., porém, se o público fica entediado o autor não é perdoado. A principal motivação que levaria o público aos teatros seria a necessidade de sentir uma emoção poderosa e profunda, relacionada com a necessidade humana de se sentir pertencente a uma multidão, a um coletivo, como acontecia em grandes ritos religiosos e em grandes eventos coletivos. É esse sentimento de comunhão que daria ao teatro a sua especificidade artística em relação aos outros gêneros artísticos e o tornaria uma arte em si mesma.

Mas, nos tempos modernos, raramente temos a oportunidade de participar de atos suntuosos ou de nos apressar no tumulto de festividades desenfreados, ou, com um bastão em punhos, de nos enfurecer contra as barreiras de um poder injusto, buscamos novas formas mais gananciosas, em parte burguesas, em parte também mais refinadas, espiritualizadas, nas quais poderíamos provar a velha e forte mágica. Nós nos reunimos em casas suntuosas, nos vestimos festivamente, olhamos e nos deixamos olhar. Nós atravessamos corredores cheios de gente e inundamos nossos sentidos em quantidade, diversidade, esplendor, barulho, humor, luz, fragrâncias inconstantes e o calor da multidão8 8 No original em alemão: Weil wir nun aber in modernen Verhältnissen nur selten Gelegenheit haben, uns an prunkvollen Aufzügen zu beteiligen oder im Tumult zügelloser Feste einherzustürmen oder, den Knüttel in der Faust, anzutoben gegen die Schranken einer ungerechten Macht, so suchen wir um so gieriger neue Formen, teils bürgerlichere, teils auch feinere, vergeistigte, in denen wir den alten starken Zauber kosten könnten. Wir versammeln uns in prunkvollen Häusern, wir kleiden uns festlich, wir schauen und lassen uns beschauen, wir fluten durch wimmelnde Hallen und weiden unsere Sinne an Menge, Mannigfaltigkeit, Pracht, Lärm, Laune, Licht, an schweifenden Wohlgerüchen und an dem erhitzenden Gedränge (Fuchs, 1909, p. 5). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 5).

Esse trecho é particularmente interessante, pois mostra o viés social do teatro proposto por Fuchs, ou seja, ele busca um teatro que faz com que o público sinta a emoção de fazer parte de um evento coletivo, porém, ele não propõe um teatro popular. Pelo contrário, a busca é tentar fazer com que um teatro elegante e burguês possa proporcionar sentimentos arrebatadores semelhantes ao que se sente em grandes eventos populares.

Na versão em inglês do livro, a tradutora Constance Connor Kuhn, em nota, atenta que Fuchs reflete o temperamento de seu tempo, pois naquele momento histórico, início do século XX, a Alemanha estava há quarenta anos em paz e a pompa imperial militar, que sempre foi importante e presente na cultura alemã, havia se tornado apenas um estereótipo. E afirma ainda: “A suscetibilidade do público alemão à excitação emocional da pompa, que mais tarde foi explorada por Hitler, tem sido discutida com frequência”9 9 No original em inglês: The susceptibility of the German public to the emotional excitement of pageantry as it was later exploited by Hitler has been frequently discussed (Kuhn apud Fuchs, 1909, p. 205). (Kuhn apud Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 205). A proposta de Fuchs, como aconteceu também com o pensamento de Richard Wagner (1813-1883), de alguma maneira, já tocava em pontos que foram importantes para a veiculação e consolidação da ideologia nazista anos mais tarde. Apesar de não ser tema do presente trabalho, esse assunto abre caminho para possíveis objetos de pesquisas futuras, principalmente sobre o papel do teatro e do espetáculo para veiculação de ideologias.

Fuchs evidencia seus principais objetivos na criação do Teatro dos Artistas e na elaboração de um novo palco. Ele acredita que a arte nada mais é do que “[...] uma satisfação ritmicamente ordenada desse desejo orgástico de intensificar a vida”10 10 No original em alemão: [...] eine irgendwie rhythmisch geordnete Befriedigung jener orgiastischen Begierde nach Lebenssteigerung (Fuchs, 1909, p. 5-6). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 5-6). E, para ele, o teatro de sua época não atinge esse objetivo, por isso seria necessária a revolução do teatro. A partir daí, ele tece uma forte crítica ao modelo de palco tradicional e ao drama literário, pois ambos colocam cena e espectador em uma relação de oposição, o que dificulta que a experiência teatral aconteça de maneira unificada e harmônica. No segundo capítulo, Fuchs aborda um pouco mais sobre a função do teatro:

Como já reconhecemos, o objetivo do teatro é excitar e descarregar uma tensão exuberante. Se estamos tão entusiasmados não conseguimos conter essa emoção dentro dos limites da convenção. Devemos nos elevar acima da convenção, acima da realidade, em um cosmos em que o ‘mundo’, que na realidade nunca é percebido como uma unidade, mas sempre como uma ‘obra fragmentada’, de repente se manifeste de maneira harmoniosa e equilibrada. Se esse é o objetivo da arte em geral, então é o objetivo do teatro em particular11 11 No original em alemão: Der Zweck der Schaubühne ist, wie wir bereits erkannt, eine überschwängliche Spannung zu erregen und wieder zu entladen. Wenn wir so überschwänglich erregt sind, daß uns innerhalb der einengenden Konvention keine Möglichkeit mehr ist, diesen Ueberschwang voll auszuleben, so müssen wir uns über diese Konvention, über die Wirklichkeit hinauf erheben in einen Kosmos, in dem uns die „Welt”, die in „Wirklichkeit” nie als Einheit, immer nur als „Stückwerk" empfundene, plötzlich als in sich ausgerundete und ausgewuchtete Harmonie offenbar wird. Ist das der erlösende Zweck der Kunst überhaupt, so ist es in festlicher Weise der bühne ganz besonders (Fuchs, 1909, p. 54). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 54).

O trecho destaca o sentimento de entusiasmo que extrapolaria a cena fechada do teatro à italiana, a convenção teatral e, ainda, seria por meio da arte que o espectador conseguiria perceber o mundo em sua harmonia. Esse sentimento, segundo ele, está relacionado com o fato de o teatro reunir uma grande quantidade de pessoas em um mesmo espaço, e é esse encontro a principal característica do evento teatral. Não se deve esquecer, porém, de que para Fuchs essa grande reunião não inclui as camadas mais populares da sociedade, é uma reunião coletiva repleta de pompa e bom gosto; tais características seriam importantes para de fato arrebatar o público que o autor desejava atingir. “[...] quando vamos ao teatro, nos reunimos com o maior número possível de pessoas para juntos sentir uma elevação coletiva”12 12 No original em alemão: [...] wenn wir in das Theater gehen, als uns mit möglichst vielen anderen in einer Erhebung zusammen zu finden, zusammen zufühlen (Fuchs, 1909, p. 55). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 55). Essa elevação coletiva é colocada por Fuchs como equivalente ao que Aristóteles definiu como a catarse: “[...] purificação, relaxamento das forças da vida por meio de uma atuação completa e implacável do coro superior” (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 55).

A partir desse momento, é inserida na discussão a noção grega de Coro para abordar as origens da arte do teatro, que teria surgido inicialmente enquanto dança, experiência rítmica do corpo no espaço e vinculada ao acontecimento de um ritual. Gradualmente foram aparecendo a música, a poesia, o drama, com a finalidade de elevar essas sequências de movimentos rítmicos, ou seja, o teatro seria uma forma mais elevada da dança ritualística.

O surgimento da orquestra grega aparece como prova da importância do poder da catarse para a criação de uma multidão festiva no teatro.

Agora, não quero continuar descrevendo como a multidão festiva movida pelo ator gradualmente se sente impelida a criar um círculo de um movimento particularmente emocionante. Esse grupo mais emocionado entra em uma correspondência mais íntima com ele, como um coro, e o aplaude com palmas e gritos. Por fim, recorrendo a instrumentos musicais para animá-lo cada vez mais, a orquestra se desenvolve. Finalmente, desse círculo estreito, os indivíduos são novamente puxados para o ator pela força da sua atração rítmica e são atraídos para sua ação como companheiros de jogo. O que importa para nós aqui é estabelecer que o drama, mesmo em sua forma complicada e espiritualizada, se torna nada mais do que era no início: movimento rítmico do corpo humano no espaço, cultivado organicamente a partir do movimento de uma multidão festiva13 13 No original em alemão: Ich will nun nicht weiter schildern, wie sich allmählich aus der festlichen, von dem Darsteller bewegten Menge ein Kreis besonders stark bewegter loslöst, der sich getrieben fühlt, mit ihm in engere Korrespondenz zu treten als Chor, der ihn anfeuert durch Händeklatschen und Schreien, der endlich zu Musikinstrumenten greift, um ihn mehr und mehr anzufeuern, woraus das Orchester erwächst, und wie endlich aus diesem engeren Kreise wieder einzelne durch die Gewalt der rhythmischen Anziehungskraft des Akteurs ganz zu diesem hinübergerissen und als Mitspielende in seine Aktion hineingezogen werden. Uns kommt es hier nur darauf an, festzustellen, daß das Drama auch in seiner komplizierten und vergeistigten Form nichts anderes wird, als es in seinen Uranfängen war: rhythmische Bewegung des menschlichen Körpers im Raum, organisch erwachsen aus der Bewegung einer festlichen Menge (Fuchs, 1909, p. 57). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 57).

A multidão festiva está relacionada à ideia de unidade e possui consequências diretas na elaboração de um novo espaço cênico (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909.). A noção de festa aparece como uma possibilidade de criação de uma unidade entre palco e plateia há muito tempo perdida no teatro ocidental (Dort, 2010DORT, Bernard. O teatro e sua realidade. Tradução de Fernando Peixoto. Revisão de texto de J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva , 2010. ). A consequência disso foi o afastamento das pessoas de gosto do teatro, pois elas não encontravam mais satisfação nele, e, segundo o autor, isso ocorreu devido ao teatro não exercer mais o que seria sua real função. A função do teatro está relacionada, portanto, à ideia de um festival, um local de encontro para celebrar uma cultura em comum a toda comunidade. O teatro seria um lugar de poesia, música, pintura e arquitetura sob uma regulação dramática, mas sem que fossem repudiados os princípios inatos de cada arte.

Sobre a Função do Dramaturgo

Para Fuchs, o drama precisa deixar de ser literário e tornar-se teatral. O dramaturgo precisa frequentar o teatro, pensar na cena, compreender as atividades teatrais e pensar na ação rítmica da cena, precisa ter consciência do seu papel enquanto artista da cena, e não apenas da escrita. O autor atribui ao drama literário o principal motivo de distanciamento da arte teatral da sua verdadeira função. Fuchs não define um conceito de drama literário, ele trata o termo como habitual, porém, suas principais características são criticadas do início ao fim de seu livro, e o teatro proposto por ele é apresentado, a todo momento, em contraposição a essa ideia.

O autor destaca que no teatro de seu tempo o texto dramático é construído distante do teatro e toda a cena visa ilustrá-lo, colocando-o como elemento principal e gerador de toda a encenação. O autor critica também o caráter psicológico desse texto, que não se utiliza de todas as potencialidades do teatro e tem como característica a separação evidente entre cena e espectadores. O drama literário teria esquecido das origens do teatro enquanto festa, ritual; compreendido a plateia enquanto uma massa homogênea e voltado todas as suas atenções apenas ao que é dito no palco.

Para Fuchs, os autores que escrevem esses dramas seriam homens da literatura, que querem tirar o drama de dentro do teatro, ou seja, não seriam homens de teatro, e por isso, não estariam preocupados com os efeitos produzidos pelos textos em uma encenação. O trecho a seguir, destaca a importância do aspecto organizador da cena no trabalho do dramaturgo, ou seja, existiria um trabalho de encenador intrínseco à função de dramaturgo.

Para a grande multidão, portanto, o drama só se torna a experiência que eles buscam quando o dramaturgo se levanta de sua escrivaninha, quando ele se lembra de que não tem nada em comum com o escritor, e que ele tem apenas algumas coisas em comum com o poeta. O dramaturgo deve voltar sua mão para o palco. Assim como o construtor pertence aos locais de suas construções, o dramaturgo pertence ao teatro14 14 No original em alemão: Es wird das Drama also für die große Menge nur dann das Erlebnis, welches sie suchen, wenn der Dramatiker vom Schreibtisch aufsteht, wenn er sich besinnt, daß er mit dem Literaten gar nichts, mit dem Dichter nur manches gemein hat, und daß er selbst Hand anlegen muß auf der Schaubühne. Wie der Baumeister auf die Baustelle gehört, so gehört der Dramatiker in das Theater (Fuchs, 1909, p. 135). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 135).

Na crítica, Fuchs apresenta o teatro da época como de mau gosto, frequentado por pessoas sem educação, os textos das peças seriam escritos de maneira vulgar e as personagens seriam pessoas comuns. Tais características podem se identificar com o teatro naturalista, muito difundido nesse período, que buscava apresentar em suas peças a realidade e os conflitos do povo e dos trabalhadores. Na busca da semelhança com a realidade, era utilizada a linguagem popular, o texto era escrito em prosa e os cenários e figurinos retratavam os ambientes hostis, pois nenhum aspecto da realidade poderia ser deixado de fora (Roubine, 2003ROUBINE, Jean-Jacques. Introdução às grandes teorias do teatro. Tradução de André Telles. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.). Além disso, Fuchs afirmava que suas propostas teatrais o separavam claramente do teatro de Meiningen - cujo teatro inspirou diretores naturalistas por toda a Europa no final do século XIX.

Vale a pena ressaltar aqui a semelhança do pensamento de Fuchs com o do cenógrafo suíço Adolphe Appia (1862-1928). Appia propõe que a dramaturgia deve surgir a partir do movimento e para o movimento. Nesse sentido, o dramaturgo deveria se afastar da escrita naturalista e se aproximar, o máximo possível, de uma escrita da cena:

Quanto menos o autor dramático tornar as suas personagens dependentes do meio, mais será dramaturgo; porque, quem diz dramaturgo diz também encenador; é sacrilégio especializar as duas funções. Temos, portanto, de estabelecer que se o autor não as acumula em si próprio, não será capaz nem de uma nem de outra, pois é da sua penetração recíproca que deve nascer a arte viva. Com muito raras excepções, ainda não temos essa arte, como não temos esse artista. Deslocando o centro de gravidade, temo-lo como que dividido; a nossa arte dramática repousa, por um lado, sobre o autor e, por outro, sobre o encenador, apoiando-se ora num ora noutro. Deveria repousar, clara e simplesmente, sobre uma e a mesma pessoa (Appia, 1963APPIA, Adolphe. A obra de arte viva. Tradução de notas de ensaio de Redondo Júnior. Lisboa: Editora Arcádia, 1963. , p. 136-137).

Em oposição ao drama literário e ao naturalismo, o poeta dramático deveria atuar no teatro quase como um diretor, utilizando da essência teatral e jogando com ela, nunca a negando. Pois, como poderia uma encenação ser satisfatória se ela nega seu próprio meio de expressão? Apesar de Fuchs não falar no termo teatralidade ao longo do livro, ele de alguma maneira aponta que essa essência teatral deva estar presente na dramaturgia. A poesia dramática real buscaria desenvolver um organismo vivo, rítmico e completo, que poderia surgir dos menores temas, mais simples e mais cotidianos da humanidade. Quando o ritmo físico é feito presente no drama, assim sendo possível também na cena, o público seria tão absorvido pelos eventos do palco que essas experiências se tornariam de todos, ou seja, se tornariam comuns. Para Fuchs, esse é o motivo pelo qual se frequenta o teatro em primeiro lugar.

O que os literatos conhecem como ‘conhecimento de palco’ é conhecimento não dos recursos e da natureza da arte teatral, mas dos truques e práticas que devem ser utilizadas para drenar os elementos teatrais da literatura e fazê-los utilizáveis no teatro. Por essa razão, a maioria dos homens de letras são incapazes de julgar atores e suas realizações. A grande maioria dos bons críticos em uma análise de um romance ou de uma pintura mostra tanto perspicácia intelectual quanto gosto distinto, mas quando julgam um ator ficam completamente perdidos e erram da forma mais surpreendente. Isso acontece porque eles não são acostumados a pensar no ator e no teatro como partes de uma arte independente, mas apenas como instrumentos da literatura15 15 No original em alemão: Das, was der Literat unter „Bühnenkenntnis" versteht, ist nicht das Wissen um Mittel und Wesen der theatralischen Kunst, sondern um die Kniffe und Praktiken, die man anzuwenden hat, um die theatralischen Kunstmittel zum Verzapfen von Literaturprodukten brauchbar zu machen. Daher auch die Unfähigkeit der meisten Literaten, Schauspieler und deren Leistungen zu beurteilen. Es gibt sehr kluge, geistvolle Kritiker, die in der Analyse eines Romanes, eines Stückes, eines Bildes nicht nur Verstandesschärfe, sondern auch verfeinerten Geschmack bekunden, und die doch dem Schauspieler gegenüber hilflos sind und sich in der erstaunlichsten Weise verhauen. Das kommt daher, daß sie nicht gewohnt sind, Schauspieler und Theater aus dem besonderen Wesen ihrer Kunst und ihres Form-Materiales zu begreifen, sondern nur als Mitteilungsinstrument für Literatur (Fuchs, 1909, p. 149). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 149).

O dramaturgo deve conhecer a humanidade em suas mais diversas manifestações para ser capaz de criar suas personagens. Quanto maior seu conhecimento sobre os dilemas humanos, suas características, personalidades, maior a possibilidade de o autor criar personagens complexas e interessantes. Além disso, ter um entendimento delicado das possibilidades das formas, as quais são inerentes das personalidades dos atores, saber identificar ator e personagem, suas características comuns e as que precisam ser trabalhadas. As transformações na estrutura do palco e da cenografia propõem um novo drama, e mais do que isso, propiciam o espaço ideal para que ele possa surgir.

Não foi por acaso que a estreia do Teatro dos Artistas de Munique foi com a peça Fausto de Goethe, para Fuchs, além dela ser a melhor obra dramática em língua alemã, a primeira parte da peça possui uma estrutura caótica que apresentaria mais possibilidades para a cena. Os estilos clássico e naturalista não seriam, portanto, apropriados para a sua encenação e, por isso, a peça de Goethe foi considerada pouco dramática e pouco encenada até então. Fausto não foi escrita de acordo com as regras do teatro clássico, ela possui inúmeras mudanças de cenário e efeitos que dificilmente seriam reproduzidos com exatidão na cena naturalista. Por tais motivos, Fuchs afirma ter tido dificuldade de convencer os outros artistas envolvidos no projeto do teatro a encenar tal peça.

Para esse moderno estilo de drama nos dado por Goethe em Fausto, tanto o classicismo quanto o naturalismo eram inapropriados. O Fausto era considerado ‘não dramático’, e mesmo depois de tanto tempo, foi com grande esforço que realizei sua apresentação no Teatro dos Artistas de Munique16 16 No original em alemão: Für diesen, den eigentlich modernen Stil des Dramas, den uns Goethe im „Faust" wieder gegeben, war das Theater, das uns nach Klassizismus und Naturalismus überkommen war, am allerungeeignetsten. Der „Faust" galt daher als „undramatisch", und das so sehr, daß ich später seine Aufführung auf dem Münchener Künstlertheater nur mit Mühe erkämpfen konnte (Fuchs, 1909, p. 193). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 193).

O autor descreve que na sua montagem de Fausto, mesmo um espectador que não compreende o idioma alemão é capaz de se deleitar esteticamente com a encenação. Os seus ritmos e harmonias poéticas dariam a ver a unidade completa e inteligível da peça (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909.). Para conseguir esse efeito, ele afirma ter criado uma cena relevo que sempre enfatiza o todo da cena e a sequência de eventos rítmicos realizada pelo ator. A cena relevo é descrita sempre em contradição com o palco da ópera e do teatro naturalista.

Sobre a Cena Relevo

Fuchs apresenta as diferenças entre um espetáculo de ópera e de teatro, principalmente com relação aos seus espaços de palco e as suas arquiteturas. O teatro requer um palco raso, enquanto a ópera precisa de um palco profundo, para que seja possível alocar todo o coro. Na ópera, o coro não deve apenas sugerir uma impressão óptica de multidão como nas peças, a ilusão de multidão é criada pelo som, por isso o tamanho do coro depende das tarefas musicais que ele vai realizar em cena. Ou seja, enquanto no teatro é possível reduzir a quantidade de atores e mesmo assim gerar uma percepção de multidão em cena, na ópera, esse artifício não seria possível, os cantores precisam estar de fato em cena com seu canto.

Outra questão fundamental na definição do conceito de cena relevo é a crítica ao palco tradicional ou à italiana. O autor questiona a necessidade de um palco profundo, o uso das vestimentas de palco17 17 Chama-se de vestimentas de palco as pernas e as bambolinas, feitas em tecidos pretos esticados nas laterais e no alto do palco. Esses panejamentos revestem a caixa cênica tradicional com a finalidade de esconder os elementos que estão fora de cena. e o ilusionismo teatral. Fuchs considera que devido a profundidade do palco, os atores parecem muito pequenos em cena, além de ser necessário o uso de muitos objetos para que o palco seja preenchido, o que dificultaria a movimentação dos atores. Para justificar sua crítica, ele trata da experiência de Wagner na Casa de Festivais de Bayreuth (Bayreuth Festspielhaus), no qual mesmo com toda a maquinaria e um bom pintor de cena, não foi possível chegar ao nível de ilusionismo desejado.

Mesmo que o equipamento da cena não seja o mais essencial, ainda nos dá a evidência mais tangível da necessidade de um novo palco. Na média dos teatros de hoje, o design da cena é, na melhor das hipóteses, reminiscente das pinturas históricas e de gênero dos anos sessenta e setenta [1860 e 1870] - e deve permanecer nesse nível. A perspectiva impossível das caixas cênicas tradicionais, a iluminação de ribalta que falseia tudo, o material artificial exclui completamente a intervenção da arte genuína da pintura18 18 No original em alemão: Wenn nun auch die Ausstattung der Szene nicht das Wesentlichste ist, so gibt sie uns aber doch die greifbarsten Beweismittel an die Hand für die Notwendigkeit einer neuen Schaubühne. In den heutigen Durchschnitts-Theatern steht die Ausgestaltung der Szene im besten Falle auf dem Niveau der Historien- und Genremalerei der 60er und 70er Jahre - und sie muß auf diesem Niveau stehen bleiben. Die unmögliche Perspektive des Guckkastens, die alles verzeichnende Rampenbeleuchtung, das unechte Material schließen das Eingreifen echter malerischer Kunst vollständig aus (Fuchs, 1909, p. 48). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 48).

Para Fuchs, o problema era que Wagner desejava um nível de imitação da realidade impossível de se atingir com as tecnologias da época. A solução estética seria utilizar da sugestão artística e do simbolismo para gerar no espectador um sentimento próximo do desejado pela encenação. Fuchs reconhece que a cena relevo é apenas uma das diferentes maneiras de solucionar o problema da ilusão cênica. Criar uma unidade cênica utilizando técnicas que não se relacionam entre si, parecia impossível: as luzes artificiais, as luzes da ribalta, uma pintura em perspectiva impossível e o corpo do ator pequeno demais em meio ao grande palco. Como poderia ser possível que o cenógrafo pudesse criar uma unidade visual como tantos elementos díspares?

Wagner, como Ostini relata, levantou ‘exigências técnicas que Böcklin considerou artisticamente inalcançáveis’. E Böcklin19 19 Böcklin foi o pintor responsável pela cenografia de diferentes encenações de óperas Wagnerianas. estava absolutamente certo em sua opinião. Wagner agarrou-se à caixa cênica com seus holofotes e maquinarias, excluindo assim a intervenção do pintor no sentido verdadeiro e artístico da palavra. Wagner não conseguiu mais nada com essa impertinência com Böcklin além da convicção, que mais tarde foi expressa com frequência: Wagner não entendia a pintura. Böcklin, como todo verdadeiro pintor, razoavelmente sensível aos valores pictóricos, teve que tentar chegar a um efeito espacial unificado utilizando de uma iluminação completamente falsa e perspectivas contraditórias. Para não falar da relação desse efeito espacial fictício com o tamanho real e invariável da figura humana que aparece nele!20 20 No original em alemão: Denn Wagner erhob, wie Ostini berichtet, „technische Ansprüche, die Böcklin für künstlerisch unerfüllbar hielt". Und Böcklin hatte mit seiner Ansicht unbedingt recht. Wagner hielt an der Guckkastenbühne mit Rampenlicht und Maschinerie fest, und schloß damit das Eingreifen des Malers im echten und künstlerisch anständigen Sinne des Wortes aus. Wagner erzielte mit dieser Zumutung bei Böcklin weiter nichts, als daß dieser zu der späterhin oft geäußerten Ueberzeugung gelangte: Wagner verstehe nichts von Malerei. Es mußte Böcklin, wie jedem wirklichen Maler, wie jedem für malerische Werte einigermaßen empfindlichen Menschen als ein Unding erscheinen, in durchaus falscher Beleuchtung, bei sich widersprechenden Perspektiven zu einer einheitlichen Raumwirkung gelangen zu wollen, ganz zu schweigen von dem Verhältnisse dieser fiktiven Raumwirkung zu der faktischen und konstanten Größe der darin erscheinenden menschlichen Figur! (Fuchs, 1909, p. 49). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 49).

A definição de cena relevo não seria de caráter técnico, mas estilístico. Ou seja, existem diferentes maneiras para atingir o efeito de relevo, os mecanismos do Teatro dos Artistas seria apenas uma das maneiras. O objetivo da cena relevo seria de intensificar a experiência dramática. Esse fenômeno não ocorreria sobre o palco, mas na mente e no espírito do espectador em resposta ao que acontece no palco. O espectador seria maravilhado por impressões que o alcançariam por meio de seus sentidos.

Segundo Fuchs, é natural do ser humano se destacar de um grupo, ir a frente, para comunicar algo. Tal ato seria uma descoberta da humanidade quase tão antiga quanto o próprio teatro. Para ele, qualquer pessoa se desloca para a região à frente do público, para o proscênio, quando quer se comunicar com ele, com o ator não seria diferente. Com essa justificativa, o proscênio é considerado a característica mais importante da arquitetura teatral, por ser a linha divisória entre o público e o palco.

O ator sente instintivamente e sabe por experiência que ao se posicionar no proscênio ele é mais efetivo: tanto por que ele tem menos chance de ser coberto por algum parceiro, ou por alguma parte do palco; quanto porque ele deixa o fundo longe o suficiente atrás dele, assim o fundo tem menos poder de atrair a atenção do público21 21 No original em alemão: Der Darsteller fühlt instinktiv und weiß aus Erfahrung, daß er so am stärksten wirkt - schon weil er von keinem Mitdarsteller oder Requisit gedeckt wird und zugleich den Hintergrund weit hinter sich läßt, so daß dieser die Aufmerksamkeit weniger von der figürlichen Erscheinung ablenkt (Fuchs, 1909, p. 96). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 96).

O autor coloca uma questão importante sobre a iluminação e a utilização do proscênio: Nos palcos tradicionais, a iluminação era predominantemente feita com a ribalta, a fileira de luzes frontais tem como efeito chapar e ofuscar a imagem do ator se ele estiver muito próximo dela, além de aproximar a sua imagem a uma caricatura pelo efeito causado pelas luzes vindas de baixo. Assim, Fuchs afirma que o próprio uso da iluminação de ribalta desestimulou uma tendência natural do ator de se posicionar no proscênio. Com o advento da luz elétrica, o palco, as luzes e o proscênio devem se adaptar para receber o ator, não o contrário. Essa foi a tendência do Teatro dos Artistas de Munique, com toda a sua maquinaria cênica e seu sistema de iluminação elétrico.

A essência do teatro de arte, portanto, não é procurar inovações técnicas, invenções de máquinas, truques e aparelhos, mas utilizar soluções arquitetônicas, pelas quais as artes plásticas podem criar o quadro mais favorável para o drama e para o ator, e as condições de recepção mais favoráveis ao espectador22 22 No original em alemão: Das Wesentliche des Künstlertheaters ist demnach nicht zu suchen in technischen Neuerungen, maschinellen Erfindungen, Tricks und Apparaten, sondern einzig in den architektonischen Lösungen, durch welche es der bildenden Kunst gestattet wird, dem Drama und dem Darsteller den günstigsten Rahmen zu schaffen und dem Zuschauer die günstigsten Aufnahmebedingungen (Fuchs, 1909, p. 109). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 109).

Assim, Fuchs buscou criar uma arquitetura teatral propícia à criação de uma cena em relevo. À frente do palco do Teatro dos Artistas havia o fosso da orquestra, que quando não estava sendo usado era coberto e utilizado como uma ampliação do proscênio. O palco era raso em relação à sua profundidade, a boca de cena era proporcionalmente mais larga do que de costume. No Teatro dos Artistas não se buscava nem uma caixa italiana, nem um panorama, mas em vez disso uma cenografia mais favorável ao movimento dos corpos, os quais se uniriam em um padrão rítmico. Ou seja, a cena era deixada livre de muitos objetos cênicos, a ênfase era no movimento rítmico do ator, assim, a cenografia era elaborada principalmente utilizando os recursos da iluminação cênica.

Ao fundo do palco um telão com uma pintura não realista se modificava de acordo com a incidência de luz. O objetivo não era uma pintura com profundidade em perspectiva, mas um plano em relevo, o telão como o fundo do relevo e os atores destacados em relação a esse fundo. Por meios puramente arquitetônicos foram criados três planos no palco: um proscênio, um palco médio, que geralmente era usado como espaço de cena, e um palco interior onde ficava localizado o telão. Sobre a iluminação desses espaços, Fuchs (1909, p. 112)FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909. afirma:

Os palcos dianteiro e médio são iluminados frontalmente por refletores localizados na região superior do palco. O fundo do palco tem suas próprias fontes de luz independentes, configuradas de tal maneira que todos os níveis de iluminação e, acima de tudo, a atmosfera possam ser gerados pela própria luz, de acordo com as leis da estética da pintura. A exploração desse aparato de luz de cinco cores, no entanto, não só permite sugerir valores colorísticos, mas também tons de claro-escuro e, ao mesmo tempo, alteração do palco etc., representações espaciais monumentais e amplas, e às vezes bastante íntimas23 23 No original em alemão: Die Vorder- und Mittelbühne empfangen ihr Licht von vorn-oben. Die Hinterbühne hat ihre eigenen, unabhängigen Lichtquellen, welche so eingerichtet sind, daß alle Lichtstufen und vor allem auch Luft-stimmungen nach den Gesetzen strenger malerischer Stilistik durch das Licht selbst erzeugt werden können. Durch die Ausbeutung dieses mit fünf Farben ausgestatteten Lichtapparates können jedoch nicht allein koloristische Werte, sondern auch Hell- Dunkel Abstufungen und damit bei gleichzeitiger Veränderung des Bühnenausschnittes etc. bald monumentale und weite, bald ganz intime Raumvorstellungen suggeriert werden (Fuchs, 1909, p. 112). .

Em seu livro, Fuchs apresenta as plantas e cortes do Teatro dos Artistas (Figura 3 e Figura 4), o palco com pouca profundidade, o ciclorama ao fundo do palco para rebatimento da luz, o proscênio sobre o fosso da orquestra, a plateia em formato de auditório para que todos os espectadores pudessem ter uma visão completa da cena. Sua principal referência a esse respeito são as propostas wagnerianas para a Casa de Festivais de Bayreuth que também propõe uma plateia una, sem divisões por classes, sem camarotes ou frisas, apenas a plateia frontal na qual todos os espectadores possuem boa visibilidade do palco.

Figura 3
Planta Baixa do Teatro dos Artistas de Munique.

Figura 4
Corte Lateral do Teatro dos Artistas de Munique (1908).

Como nos afirma o arquiteto Max Littmann responsável pela construção do Teatro dos Artistas, em seu livro sobre o processo de construção do teatro:

O palco em si, com uma abertura de proscênio de 10m, tinha 18,70 m de largura e apenas 8,70 m de profundidade. Não apenas por causa da disposição totalmente nova do espaço devido à exclusão do plano alto do palco, mas sobretudo por causa do princípio artístico, uma configuração de palco completamente diferente se mostrou necessária aqui do que costumamos ver24 24 No original em alemão: Die Bühne selbst mit einer Proszeniums- Öffnung von 10 m erhielt bei einer Breite von 18,75 m nur eine Tiefe von 8,70 m. Nicht allein durch die infolge Vermeidung der Oberbühne bedingte, völlig neue Raumdisposition, sondern vor allem durch das künstlerische Prinzip erwies sich hier eine ganz andere Bühneneinrichtung nötig, als wir sie sonst zu sehen gewohnt sind (Littmann, 1908, p. 31). (Littmann, 1908LITTMANN, Max. Das Münchner Künstlertheater. München: L. Werner, 1908., p. 31).

Tais características do novo palco buscam propiciar um espaço livre para que as artes que contribuem à arte do teatro possam se desenvolver. O teatro não atingiria a perfeição somente como síntese de todas as artes, mas como uma arte em si mesma. O drama seria possível sem palavra ou tom, sem cenário ou figurino, simplesmente como movimento rítmico do corpo humano; mas a arte do palco poderia enriquecer esses ritmos e essas formas com a riqueza das outras artes. “Arte dramática é essencialmente dança, isto é, movimento rítmico do corpo humano no espaço”25 25 No original em alemão: Die dramatische Kunst ist ihrem Wesen nach Tanz, d. h. rhythmische Bewegung des menschlichen Körpers im Raum (Fuchs, 1909, p. 55-56). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 55-56).

Sobre o Trabalho do Ator

A partir dessa ideia de que o teatro é fundamentalmente o movimento do ator, Fuchs critica o ator de teatro naturalista, com suas caretas e poucas movimentações. Para ele, a arte do ator foi originada na dança, ou seja, deve ser o movimento rítmico do corpo do ator no espaço. Dessa maneira, o ator de music hall e os bufões seriam mais bem preparados fisicamente do que os atores de teatro da época. Fuchs relembra o curioso fato do surgimento do teatro grego ter ocorrido no mesmo período do surgimento da ginástica grega, o que justificaria uma aproximação entre o trabalho do ator e do ginasta, ambos ligados ao corpo e ao movimento.

Fuchs faz referência também ao ator de teatro japonês, que é elogiado por seu preparo físico e controle corporal, além da ausência de textos longos na cena, o que privilegiaria o movimento do ator. A arte do ator é uma arte em si mesma, independente do texto dramático e da encenação. Tal arte demandaria do ator a habilidade de entrega total de corpo e alma às leis do ritmo. Dessa maneira, se deveria retornar às tradições e ressuscitar a arte do ator que é o mais fundamental e essencial elemento do teatro. O pensamento de Fuchs sobre a função do ator no teatro em muito se relaciona com o pensamento de Appia (1963, p. 13)APPIA, Adolphe. A obra de arte viva. Tradução de notas de ensaio de Redondo Júnior. Lisboa: Editora Arcádia, 1963. sobre o mesmo assunto:

O corpo do actor, vivo e móvel, é o representante do movimento no espaço. O seu papel é, portanto, capital. Sem texto (com ou sem música), a arte dramática deixa de existir; o actor é o portador do texto; sem movimento, as outras artes não podem tomar parte na acção. Numa das mãos, o actor apodera-se do texto; na outra, detém, como num feixe, as artes do espaço; depois, reúne irresistivelmente as duas mãos e cria, pelo movimento, a obra de arte integral. O corpo vivo é, assim, o criador dessa arte e detém o segredo das relações hierárquicas que unem os diversos factores, pois é ele que está à cabeça. É do corpo, plástico e vivo, que devemos partir para voltar a cada uma das nossas artes e determinar o seu lugar na arte dramática.

No trecho citado, Appia apresenta a importância do trabalho do ator na arte do teatro. Ao propor uma obra de arte viva, ele atribui ao movimento e, consequentemente, ao ator a essência do teatro, por ser ele o elemento capaz de gerar e unir todos os outros gêneros artísticos que integram o teatro.

Fuchs reflete sobre o teatro de variedades, esse teatro consistia em diferentes formas artísticas reunidas em uma única apresentação, como músicas, acrobacias e monólogos. Ao longo do tempo, o teatro de variedades se aproximou mais de uma comédia ligeira sem pretensões intelectuais (Pavis, 2008PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro. Tradução sob direção de J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. 3. ed. São Paulo: Perspectiva , 2008.).

O drama em sua forma mais simples é ritmado misturando o movimento do corpo no espaço. O teatro de variedades é o lugar onde o drama em sua forma mais simples ainda hoje é cultivado como dança, acrobacia, técnica de malabarismo, corda bamba, ilusionismo, luta livre e boxer, jogos com animais treinados, números musicais (canções), mascaradas e tudo mais. O efeito dramático dessas apresentações dificilmente pode ser negado e, bem como sua possibilidade de um refinamento artístico16 26 No original em alemão: Das Drama in seiner einfachsten Gestalt ist rhythmische Bewegung des Körpers im Raum. Das „Variete" ist die Stätte, wo das Drama in dieser seiner einfachsten Form heute noch gepflegt wird als Tanz, Akrobatik, Jongliertechnik Seiltänzerei, Taschenspielerei, Ring- und Faustkampf, Spiel mit dressierten Tieren, Singspiel (Chanson), Maskenreigen und was sonst alles. Die dramatische Wirkung dieser Vorführungen ist ebensowenig zu leugnen als die Möglichkeit einer höchst künstlerischen Veredelung derselben (Fuchs, 1909, p. 179). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 179).

Para Fuchs, esse teatro não intelectualizado e popular conhece verdadeiramente as funções do drama, pois, os artistas de variedades entendem a alegria com a qual a humanidade deve despertar e deixar sua mente elevada e orgulhosa. O autor afirma que, em geral, os artistas de variedades são originados das classes mais baixas da sociedade e que por isso eles não teriam a preocupação com a qualidade estética cultivada nas classes mais altas. Dessa maneira, tais artistas poderiam desenvolver verdadeiramente suas habilidades físicas e artísticas. Esses seriam os pontos positivos e negativos do teatro de variedades, pois como os artistas desenvolveram boas técnicas e bom preparo físico, seria necessário apenas um tratamento de bom gosto para que os espetáculos de variedades pudessem agradar um público mais erudito.

Mas se nós nos propusermos a fazer um esquema perfeito por meio do qual variedade e arte possam ser unificados, nós precisamos ter certeza que o vaudeville não apenas não vai se resignar de qualquer um dos seus valores funcionais e técnicos, mas que vai abraçar certos princípios da arte que podem fortalecer a expressão de suas próprias características e seus próprios gestos27 27 No original em alemão: Wenn wir nun aber daran gehen, die Organi-durch welche Variete und sation auszubilden, Kunst zur Einheit im Großen verschmolzen werden, so müssen wir vor allem festhalten, daß das Variete von seinem Charakter, von seiner technischen, zweckentsprechenden und material gerecht - Wesenheit nicht nur nichts einbüßen darf, sondern durch Aufnahme des künstlerischen Schöpfergeistes in seinen Schoß noch gestärkt werden ten soll in der Ausprägung seines eigensten Wesens, seiner Geste (Fuchs, 1909, p. 184-185). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 184-185).

Sendo assim, o Teatro de Variedades precisaria abraçar certos princípios da arte que poderiam fortalecer sua expressão, suas características e suas qualidades. Se esse teatro não fez tanto sucesso na sua época seria devido à falta de gosto e de investimento em figurinos, cenários e maquiagens. Além disso, o autor apresenta uma das principais diferenças entre o edifício teatral e os espaços utilizados pelos shows de variedades, nos quais em geral são realizados em restaurantes e casas noturnas, onde o público pode desfrutar de bebidas e comidas. Ou seja, existiria no teatro de variedades uma dimensão social diferente do que é encontrado nos teatros e casas de ópera, e isso não faria dele menos importante. Ao contrário, é justamente nesse aspecto que residiria a sua importância para pensar um novo teatro.

Considerações Finais

Ao longo de seu livro, Fuchs descreve a história da construção do Teatro dos Artistas desde suas primeiras ideias, ainda em 1900, na cidade de Darmstadt. Fuchs e o seu amigo arquiteto Peter Behrens (1868-1940), no contexto da preparação da exposição da colônia de artistas de Darmstadt, começaram a pensar um modelo de palco alternativo que satisfizesse os desejos deles de transformação da arte teatral. A nova arquitetura deveria ser apresentada ao público com uma encenação que utilizasse bem seu espaço, para comprovar sua eficiência. Apesar da proposta de construção do teatro não ter se concretizado naquele momento, ainda em 1900, Fuchs publicou em um de seus panfletos o que veio a ser a origem do Teatro dos Artistas. Ele cita um trecho desse panfleto em seu livro, quase uma década depois:

De acordo com o espírito da arte aplicada recém despertada, o objetivo do teatro agora se tornaria a base da cenografia, não com o propósito da pintura, o conhecimento de antiquário ou o prazer de reproduzir coisas antigas. Seria tudo colorido, gráfico e arquitetonicamente simples, pessoalmente sentido, e desde o início, para que o trabalho e os artistas em um efeito incomparavelmente maior e mais puro entrem em vigor, como já foi considerado possível28 28 No original em alemão: Ganz im Sinne der neuerweckten angewandten Kunst würde jetzt der Zweck der Schaubühne die Grundlage der dekorativen Gestaltung werden, nicht eine malerische Absicht, antiquarisches Wissen oder die Freude an der Nachbildung altertümlicher Dinge. Es wäre alles koloristisch, zeichnerisch und architektonisch einfach, persönlich empfunden, und von vornherein so anzulegen, daß das werk und die Darsteller in einer unvergleichlich größeren und reineren Wirkung zur Geltung kämen, als man seither für möglich hielt (Fuchs, 1909, p. 199-200). (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 199-200).

O problema de dar ao teatro uma totalidade orgânica só poderia ser resolvido por designers cênicos ou, em português, cenógrafos. O uso no termo design aqui não é banal, nesse momento histórico, aconteciam discussões sobre os limites entre as artes aplicadas e as belas artes. Vale ressaltar que Behrens é considerado um dos criadores da arte do design, ou seja, ele estava preocupado com a criação de uma obra de arte que também possuísse valor de uso. Nesse sentido, Fuchs percebe a importância de se pensar a cenografia por essa mesma perspectiva, ou seja, uma cenografia que exercesse uma função na cena, assim como seu teatro buscou exercer uma função na sociedade. Desse modo, assim como outros simbolistas, Fuchs propõe para o trabalho do cenógrafo um distanciamento das profissões de pintor de teatro ou de decorador.

Desse modo, o contexto das artes em Munique foi fundamental, pois a aproximação entre os artistas de teatro e das belas artes facilitou a criação do Teatro dos Artistas. Foram feitas inúmeras experimentações cênicas no Teatro do Príncipe Regente (Prinzregententheater) e cooperações com o Teatro da Corte de Munique (Hofspielhaus München), sempre em conjunto com o arquiteto Max Littmann, para que ambos pudessem compreender cada um dos elementos da arquitetura teatral.

A partir de tudo o que foi discutido sobre a experiência de Fuchs no Teatro dos Artistas, é possível notar que suas propostas estéticas simbolistas, em muitos pontos se aproximam das de Appia, Craig e Meyerhold. Entretanto, dando continuidade à proposta de Wagner, Fuchs possui também ideais políticos que fundamentam toda a sua criação estética. Seus interesses em torno da construção do Teatro dos Artistas, as críticas ao teatro naturalista e seu posicionamento político, percebe-se que o que ele busca com o teatro é na realidade bem pouco revolucionário. Não por acaso, após a Primeira Guerra Mundial, Fuchs abandonou o teatro e se dedicou ao movimento separatista da Baviera que buscava a formação de um estado Austro-Bávaro, cuja capital seria Viena. O movimento pretendia manter um estado monárquico e anticomunista, para isso, recebeu apoio do príncipe herdeiro do trono da Baviera. Devido a esse envolvimento político é acusado de alta traição ao governo e foi condenado a doze anos de cadeia. Durante a prisão, escreveu um livro sobre a reforma do sistema prisional (Koss, 2000KOSS, Juliet. Empathy Abstracted: Georg Fuchs and the Munich Artists’ Theater. 2000. Thesis (Doctorate in Philosophy in Architecture) - Department of Architecture, History and Theory of Art, Massachusetts Institute of Technology, Massachusetts, 2000. Disponível em: <https://dspace.mit.edu/handle/1721.1/8832>. Acesso em: 04 nov. 2018.
https://dspace.mit.edu/handle/1721.1/883...
). Em oposição à consolidação de uma sociedade capitalista liberal e em prol de uma retomada conservadora, Fuchs desejou um teatro capaz de unir o povo alemão em torno de seus antigos mitos, e para esse fim, utilizou-se de recursos e estéticas modernas. O entendimento do teatro e da arte enquanto meios capazes de gerar transformações sociais irá reverberar no trabalho de muitos encenadores ao longo do século XX e, ainda hoje, desencadeia fervorosas discussões no meio artístico.

Notas

  • 1
    Tradução minha do título em alemão: Die Revolution des Theater: Ergebnisse aus dem Münchener Künstler-theater.
  • 2
    Todas as citações presentes neste artigo, que não possuem publicação em português, foram traduzidas livremente pela autora e os trechos originais se encontram em nota de rodapé.
  • 3
    No Brasil, até onde se sabe não existe publicação dedicada a sua obra, nenhum resultado é encontrado ao buscar Georg Fuchs nos sítios eletrônicos do Banco de Teses da Capes e na Plataforma Scielo do CNPQ.
  • 4
    Me refiro aqui especificamente aos títulos: Teorias do teatro, do pesquisador norte americano Marvin Carlson (1997)CARLSON, Marvin. Teorias do Teatro: estudo histórico-crítico, dos gregos à atualidade. Tradução de Gilson César Cardoso de Souza. São Paulo: Fundação Editora da Unesp, 1997.; O teatro pós dramático, do teórico alemão Hans-Thies Lehmann (2007)LEHMANN, Hans-Thies. O teatro pós-dramático. Tradução de Pedro Süssekind. São Paulo: Cosac Naify, 2007.; Vsévolod Meierhold ou A invenção da encenação, de Gérard Abensour (2011)ABENSOUR, Gérard. Vsévolod Meierhold ou A invenção da encenação. Tradução de J. Guinsburg et al. São Paulo: Perspectiva, 2011.; Meierhold e A arte do teatro: entre tradição e vanguarda, ambos da pesquisadora Béatrice Picon-Vallin (2013aPICON-VALLIN, Béatrice. A arte do teatro: entre tradição e vanguarda: Meyerhold e a cena contemporânea. Tradução de Claúdia Fares, Daise Vaudois e Fátima Saadi. 2. ed. Rio de Janeiro: 7Letras: Teatro do Pequeno Gesto, 2013a.; 2013b)PICON-VALLIN, Béatrice. Meierhold. Tradução de Fátima Saadi, Isa Kopelman, J. Guinsburg e Marcio Honorio de Godoy. São Paulo: Perspectiva , 2013b.. Dentre as publicações brasileiras posso mencionar: História da literatura e do teatro alemão, de Anatol Rosenfeld (1993)ROSENFELD, Anatol. História da literatura e do teatro alemães. São Paulo; Campinas: Perspectiva, Editora da Universidade de São Paulo; Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1993.; a dissertação de mestrado da pesquisadora Cibele Forjaz Simões (2008)SIMÕES, Cibele Forjaz. À luz da linguagem: A iluminação cênica: de instrumento da visibilidade à ‘Scriptura do visível’. 2008. Dissertação (Mestrado em Artes) - Programa de Pós-Graduação em Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. intitulada À luz da linguagem e a tese de Luiz Cláudio Cajaiba Soares (2005)SOARES, Luiz Cláudio Cajaíba. Encenação dos dramas de língua alemã na Bahia. 2005. Tese (Doutorado em Artes Cênicas) - Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2005. intitulada A encenação dos dramas de língua alemã na Bahia. Destaco ainda três obras estrangeiras inteiramente dedicadas ao trabalho de Fuchs, são elas: o artigo de Eloisa Perone (2015)PERONE, Eloisa. L’avvenimento teatrale come festa: la prima teoria teatrale di Georg Fuchs. Spazio Filosofico, Torino, n. 14, p. 221-232, ago. 2015. Disponível em: <http://www.spaziofilosofico.it/wp-content/uploads/2015/08/Eloisa-Perone.pdf>. Acesso em: 04 nov. 2018.
    http://www.spaziofilosofico.it/wp-conten...
    intitulado L’avvenimento teatrale come festa: la prima teoria teatrale di Georg Fuchs e a tese de Juliet Koss (2000)KOSS, Juliet. Empathy Abstracted: Georg Fuchs and the Munich Artists’ Theater. 2000. Thesis (Doctorate in Philosophy in Architecture) - Department of Architecture, History and Theory of Art, Massachusetts Institute of Technology, Massachusetts, 2000. Disponível em: <https://dspace.mit.edu/handle/1721.1/8832>. Acesso em: 04 nov. 2018.
    https://dspace.mit.edu/handle/1721.1/883...
    intitulada Empathy Abstracted: Georg Fuchs and the Munich Artists’ Theater.
  • 5
    Os títulos dos capítulos são:
    I. O teatro como um problema cultural (Das Theater als Kulturproblem);
    II. A função e o estilo do palco (Vom Zweck und Stil der Schaubühne);
    III. O ator (Die Schauspieler);
    IV. Palco e casa de espetáculo (Bühne und Haus);
    V. Drama (Drama);
    VI. Ópera (Oper);
    VII. Teatro de variedades (Variétè);
    VIII. A história do Teatro dos Artistas (Aus der Vorgeschichte des Künstlertheaters);
    IX. A nova arte do palco e o teatro comercial (Neue Bühnenkunst und Theatergeschäft).
  • 6
    Em alemão: Reliefbühne
  • 7
    No original em alemão: Wie alle Ziele der kulturellen Bewegung im gegenwärtigen Deutschland, so sind auch die des Künstlertheaters nicht als eine Revolte gegen die Tradition aufzufassen, sondern ganz im Gegenteile als ein Wiedererwachen der guten Ueberlieferung. Wir knüpfen da wieder an, wo unsere organische Entwicklung durch den dreißigjährigen Krieg und andere kulturelle Wirren unterbrochen wurde. Selbstverständlich wäre es ein verarmender Archaismus, wenn man - wie es manche Romantiker gefordert - die primitiven Bühnenverhältnisse aus den Zeiten des Hans Sachs und Shakespeares ohne weiteres wieder einführen wollte. Das würde unserer allgemeinen Kultur nicht entsprechen. Vielmehr müssen wir bestrebt sein, die Schaubühne zu schaffen, welche jetzt vorhanden sein würde, wenn die Entwicklung von jenen einfachsten Anfängen her niemals durch unorganische Abirrungen unterbrochen worden wäre und also alle Errungenschaften der Kunst und Technik sich zunutzen gemacht hätte (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 37-38).
  • 8
    No original em alemão: Weil wir nun aber in modernen Verhältnissen nur selten Gelegenheit haben, uns an prunkvollen Aufzügen zu beteiligen oder im Tumult zügelloser Feste einherzustürmen oder, den Knüttel in der Faust, anzutoben gegen die Schranken einer ungerechten Macht, so suchen wir um so gieriger neue Formen, teils bürgerlichere, teils auch feinere, vergeistigte, in denen wir den alten starken Zauber kosten könnten. Wir versammeln uns in prunkvollen Häusern, wir kleiden uns festlich, wir schauen und lassen uns beschauen, wir fluten durch wimmelnde Hallen und weiden unsere Sinne an Menge, Mannigfaltigkeit, Pracht, Lärm, Laune, Licht, an schweifenden Wohlgerüchen und an dem erhitzenden Gedränge (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 5).
  • 9
    No original em inglês: The susceptibility of the German public to the emotional excitement of pageantry as it was later exploited by Hitler has been frequently discussed (Kuhn apud Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 205).
  • 10
    No original em alemão: [...] eine irgendwie rhythmisch geordnete Befriedigung jener orgiastischen Begierde nach Lebenssteigerung (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 5-6).
  • 11
    No original em alemão: Der Zweck der Schaubühne ist, wie wir bereits erkannt, eine überschwängliche Spannung zu erregen und wieder zu entladen. Wenn wir so überschwänglich erregt sind, daß uns innerhalb der einengenden Konvention keine Möglichkeit mehr ist, diesen Ueberschwang voll auszuleben, so müssen wir uns über diese Konvention, über die Wirklichkeit hinauf erheben in einen Kosmos, in dem uns die „Welt”, die in „Wirklichkeit” nie als Einheit, immer nur als „Stückwerk" empfundene, plötzlich als in sich ausgerundete und ausgewuchtete Harmonie offenbar wird. Ist das der erlösende Zweck der Kunst überhaupt, so ist es in festlicher Weise der bühne ganz besonders (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 54).
  • 12
    No original em alemão: [...] wenn wir in das Theater gehen, als uns mit möglichst vielen anderen in einer Erhebung zusammen zu finden, zusammen zufühlen (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 55).
  • 13
    No original em alemão: Ich will nun nicht weiter schildern, wie sich allmählich aus der festlichen, von dem Darsteller bewegten Menge ein Kreis besonders stark bewegter loslöst, der sich getrieben fühlt, mit ihm in engere Korrespondenz zu treten als Chor, der ihn anfeuert durch Händeklatschen und Schreien, der endlich zu Musikinstrumenten greift, um ihn mehr und mehr anzufeuern, woraus das Orchester erwächst, und wie endlich aus diesem engeren Kreise wieder einzelne durch die Gewalt der rhythmischen Anziehungskraft des Akteurs ganz zu diesem hinübergerissen und als Mitspielende in seine Aktion hineingezogen werden. Uns kommt es hier nur darauf an, festzustellen, daß das Drama auch in seiner komplizierten und vergeistigten Form nichts anderes wird, als es in seinen Uranfängen war: rhythmische Bewegung des menschlichen Körpers im Raum, organisch erwachsen aus der Bewegung einer festlichen Menge (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 57).
  • 14
    No original em alemão: Es wird das Drama also für die große Menge nur dann das Erlebnis, welches sie suchen, wenn der Dramatiker vom Schreibtisch aufsteht, wenn er sich besinnt, daß er mit dem Literaten gar nichts, mit dem Dichter nur manches gemein hat, und daß er selbst Hand anlegen muß auf der Schaubühne. Wie der Baumeister auf die Baustelle gehört, so gehört der Dramatiker in das Theater (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 135).
  • 15
    No original em alemão: Das, was der Literat unter „Bühnenkenntnis" versteht, ist nicht das Wissen um Mittel und Wesen der theatralischen Kunst, sondern um die Kniffe und Praktiken, die man anzuwenden hat, um die theatralischen Kunstmittel zum Verzapfen von Literaturprodukten brauchbar zu machen. Daher auch die Unfähigkeit der meisten Literaten, Schauspieler und deren Leistungen zu beurteilen. Es gibt sehr kluge, geistvolle Kritiker, die in der Analyse eines Romanes, eines Stückes, eines Bildes nicht nur Verstandesschärfe, sondern auch verfeinerten Geschmack bekunden, und die doch dem Schauspieler gegenüber hilflos sind und sich in der erstaunlichsten Weise verhauen. Das kommt daher, daß sie nicht gewohnt sind, Schauspieler und Theater aus dem besonderen Wesen ihrer Kunst und ihres Form-Materiales zu begreifen, sondern nur als Mitteilungsinstrument für Literatur (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 149).
  • 16
    No original em alemão: Für diesen, den eigentlich modernen Stil des Dramas, den uns Goethe im „Faust" wieder gegeben, war das Theater, das uns nach Klassizismus und Naturalismus überkommen war, am allerungeeignetsten. Der „Faust" galt daher als „undramatisch", und das so sehr, daß ich später seine Aufführung auf dem Münchener Künstlertheater nur mit Mühe erkämpfen konnte (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 193).
  • 17
    Chama-se de vestimentas de palco as pernas e as bambolinas, feitas em tecidos pretos esticados nas laterais e no alto do palco. Esses panejamentos revestem a caixa cênica tradicional com a finalidade de esconder os elementos que estão fora de cena.
  • 18
    No original em alemão: Wenn nun auch die Ausstattung der Szene nicht das Wesentlichste ist, so gibt sie uns aber doch die greifbarsten Beweismittel an die Hand für die Notwendigkeit einer neuen Schaubühne. In den heutigen Durchschnitts-Theatern steht die Ausgestaltung der Szene im besten Falle auf dem Niveau der Historien- und Genremalerei der 60er und 70er Jahre - und sie muß auf diesem Niveau stehen bleiben. Die unmögliche Perspektive des Guckkastens, die alles verzeichnende Rampenbeleuchtung, das unechte Material schließen das Eingreifen echter malerischer Kunst vollständig aus (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 48).
  • 19
    Böcklin foi o pintor responsável pela cenografia de diferentes encenações de óperas Wagnerianas.
  • 20
    No original em alemão: Denn Wagner erhob, wie Ostini berichtet, „technische Ansprüche, die Böcklin für künstlerisch unerfüllbar hielt". Und Böcklin hatte mit seiner Ansicht unbedingt recht. Wagner hielt an der Guckkastenbühne mit Rampenlicht und Maschinerie fest, und schloß damit das Eingreifen des Malers im echten und künstlerisch anständigen Sinne des Wortes aus. Wagner erzielte mit dieser Zumutung bei Böcklin weiter nichts, als daß dieser zu der späterhin oft geäußerten Ueberzeugung gelangte: Wagner verstehe nichts von Malerei. Es mußte Böcklin, wie jedem wirklichen Maler, wie jedem für malerische Werte einigermaßen empfindlichen Menschen als ein Unding erscheinen, in durchaus falscher Beleuchtung, bei sich widersprechenden Perspektiven zu einer einheitlichen Raumwirkung gelangen zu wollen, ganz zu schweigen von dem Verhältnisse dieser fiktiven Raumwirkung zu der faktischen und konstanten Größe der darin erscheinenden menschlichen Figur! (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 49).
  • 21
    No original em alemão: Der Darsteller fühlt instinktiv und weiß aus Erfahrung, daß er so am stärksten wirkt - schon weil er von keinem Mitdarsteller oder Requisit gedeckt wird und zugleich den Hintergrund weit hinter sich läßt, so daß dieser die Aufmerksamkeit weniger von der figürlichen Erscheinung ablenkt (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 96).
  • 22
    No original em alemão: Das Wesentliche des Künstlertheaters ist demnach nicht zu suchen in technischen Neuerungen, maschinellen Erfindungen, Tricks und Apparaten, sondern einzig in den architektonischen Lösungen, durch welche es der bildenden Kunst gestattet wird, dem Drama und dem Darsteller den günstigsten Rahmen zu schaffen und dem Zuschauer die günstigsten Aufnahmebedingungen (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 109).
  • 23
    No original em alemão: Die Vorder- und Mittelbühne empfangen ihr Licht von vorn-oben. Die Hinterbühne hat ihre eigenen, unabhängigen Lichtquellen, welche so eingerichtet sind, daß alle Lichtstufen und vor allem auch Luft-stimmungen nach den Gesetzen strenger malerischer Stilistik durch das Licht selbst erzeugt werden können. Durch die Ausbeutung dieses mit fünf Farben ausgestatteten Lichtapparates können jedoch nicht allein koloristische Werte, sondern auch Hell- Dunkel Abstufungen und damit bei gleichzeitiger Veränderung des Bühnenausschnittes etc. bald monumentale und weite, bald ganz intime Raumvorstellungen suggeriert werden (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 112).
  • 24
    No original em alemão: Die Bühne selbst mit einer Proszeniums- Öffnung von 10 m erhielt bei einer Breite von 18,75 m nur eine Tiefe von 8,70 m. Nicht allein durch die infolge Vermeidung der Oberbühne bedingte, völlig neue Raumdisposition, sondern vor allem durch das künstlerische Prinzip erwies sich hier eine ganz andere Bühneneinrichtung nötig, als wir sie sonst zu sehen gewohnt sind (Littmann, 1908, p. 31).
  • 25
    No original em alemão: Die dramatische Kunst ist ihrem Wesen nach Tanz, d. h. rhythmische Bewegung des menschlichen Körpers im Raum (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 55-56).
  • 26
    No original em alemão: Das Drama in seiner einfachsten Gestalt ist rhythmische Bewegung des Körpers im Raum. Das „Variete" ist die Stätte, wo das Drama in dieser seiner einfachsten Form heute noch gepflegt wird als Tanz, Akrobatik, Jongliertechnik Seiltänzerei, Taschenspielerei, Ring- und Faustkampf, Spiel mit dressierten Tieren, Singspiel (Chanson), Maskenreigen und was sonst alles. Die dramatische Wirkung dieser Vorführungen ist ebensowenig zu leugnen als die Möglichkeit einer höchst künstlerischen Veredelung derselben (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 179).
  • 27
    No original em alemão: Wenn wir nun aber daran gehen, die Organi-durch welche Variete und sation auszubilden, Kunst zur Einheit im Großen verschmolzen werden, so müssen wir vor allem festhalten, daß das Variete von seinem Charakter, von seiner technischen, zweckentsprechenden und material gerecht - Wesenheit nicht nur nichts einbüßen darf, sondern durch Aufnahme des künstlerischen Schöpfergeistes in seinen Schoß noch gestärkt werden ten soll in der Ausprägung seines eigensten Wesens, seiner Geste (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 184-185).
  • 28
    No original em alemão: Ganz im Sinne der neuerweckten angewandten Kunst würde jetzt der Zweck der Schaubühne die Grundlage der dekorativen Gestaltung werden, nicht eine malerische Absicht, antiquarisches Wissen oder die Freude an der Nachbildung altertümlicher Dinge. Es wäre alles koloristisch, zeichnerisch und architektonisch einfach, persönlich empfunden, und von vornherein so anzulegen, daß das werk und die Darsteller in einer unvergleichlich größeren und reineren Wirkung zur Geltung kämen, als man seither für möglich hielt (Fuchs, 1909FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909., p. 199-200).

References

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  • FUCHS, Georg. Die Revolution des Theaters: ergebnisse aus dem Münchener künstler-theater. München und Leipzig: Georg Müller, 1909.
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    » https://dspace.mit.edu/handle/1721.1/8832
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  • MEYERHOLD, Vsévolod. Sobre o teatro. Tradução de Maria Thais e Roberto Mallet. In: THAIS, Maria. Na cena do Dr. Dapertutto: poética e pedagogia em V. E. Meierhold: 1911 a 1916. São Paulo: Perspectiva ; Fapesp, 2009. P. 179-442.
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  • PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro Tradução sob direção de J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. 3. ed. São Paulo: Perspectiva , 2008.
  • PERONE, Eloisa. L’avvenimento teatrale come festa: la prima teoria teatrale di Georg Fuchs. Spazio Filosofico, Torino, n. 14, p. 221-232, ago. 2015. Disponível em: <http://www.spaziofilosofico.it/wp-content/uploads/2015/08/Eloisa-Perone.pdf>. Acesso em: 04 nov. 2018.
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  • PICON-VALLIN, Béatrice. A arte do teatro: entre tradição e vanguarda: Meyerhold e a cena contemporânea. Tradução de Claúdia Fares, Daise Vaudois e Fátima Saadi. 2. ed. Rio de Janeiro: 7Letras: Teatro do Pequeno Gesto, 2013a.
  • PICON-VALLIN, Béatrice. Meierhold Tradução de Fátima Saadi, Isa Kopelman, J. Guinsburg e Marcio Honorio de Godoy. São Paulo: Perspectiva , 2013b.
  • ROSENFELD, Anatol. História da literatura e do teatro alemães São Paulo; Campinas: Perspectiva, Editora da Universidade de São Paulo; Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1993.
  • ROUBINE, Jean-Jacques. Introdução às grandes teorias do teatro Tradução de André Telles. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.
  • ROUBINE, Jean-Jacques. Linguagem da encenação teatral Tradução de Yan Michalski. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar , 1998.
  • SAADI, Fátima. A configuração da cena moderna: Diderot e Lessing. Rio de Janeiro: Teatro do Pequeno Gesto , 2018.
  • SIMÕES, Cibele Forjaz. À luz da linguagem: A iluminação cênica: de instrumento da visibilidade à ‘Scriptura do visível’. 2008. Dissertação (Mestrado em Artes) - Programa de Pós-Graduação em Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
  • SOARES, Luiz Cláudio Cajaíba. Encenação dos dramas de língua alemã na Bahia 2005. Tese (Doutorado em Artes Cênicas) - Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2005.

Editado por

Editor-responsável: Gilberto Icle

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    21 Set 2020
  • Aceito
    23 Mar 2021
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