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Caracterização de padrões do comportamento espacial de veículos (monitorados) em movimento - PCEVM

Resumo

No Brasil existe a perspectiva de crescimento expressivo do volume de dados a ser processado pelas prestadoras de serviços de rastreamento de veículos em decorrência do aumento natural do uso de sistemas de rastreamento. Esse crescimento gera a necessidade da incorporação de ferramentas analíticas nos sistemas de gerenciamento do rastreamento e monitoramento de veículos e na gestão de risco, para aumentar a sua eficiência e atender ao crescimento do mercado. O presente estudo tem como objetivo o desenvolvimento de um modelo para identificação do Padrão de Comportamento Espacial de Veículos em Movimento – PCEVM, utilizando uma ferramenta de análise espacial para auxiliar o processo de tomada de decisão no monitoramento de veículos e na gestão do sistema de transporte urbano. Embora os resultados obtidos sejam válidos para a particular configuração apresentada neste artigo, a metodologia de análise proposta permite a caracterização de padrões espaciais de movimentação de veículos na área e no período considerados, o que é útil, por exemplo, para planejadores municipais, empresas de logística e empresas seguradoras. Conclui-se que o resultado da comparação entre o posicionamento coletado em tempo real com o modelo de distribuição espacial obtido na caracterização dos padrões de comportamento espaciais é capaz de detectar anormalidades do comportamento de movimentação do veículo e oferecer subsídios para a tomada de decisão em sistemas de monitoramento e gerenciamento de veículos, que visem à segurança patrimonial e pessoal, identificando comportamentos de movimentação não esperados ou de comportamentos de risco.

Palavras-chave:
monitoramento de veículos; mobilidade urbana; padrões de trajetórias; sistemas de informações geográficas; estimador de densidade kernel

Abstract

In Brazil there is the perspective of significant growth in the volume of data being processed by vehicle tracking services companies as a result of natural increase in the use of tracking systems. This growth generates the need for the incorporation of analytical tools in the management of vehicle tracking systems and risk managing, in order to increase their efficiency and cater to the market growth. This paper aims to develop a model for identifying the Spatial Behavior Patterns of Monitoring Vehicles (SBPMV) using a spatial analysis tool to aid the process of decision making in vehicle monitoring and the urban transportation system management. Although the results obtained are valid for the particular configuration presented in this article, the proposed methodological analysis allows the characterization of spatial patterns of vehicle movements in the study area during the considered period, which is useful, for instance, for city planners, enterprise logistics and insurance companies. The conclusion is that the result of the comparison between the collected real-time positioning data with the spatial distribution model obtained through the characterization of the spatial behavior patterns is able to detect abnormalities in the vehicle movement behavior and provide subsidies to decision-making process for vehicle monitoring and management systems, which aim the patrimonial and personal safety, and the identification of unexpected movement or risky behaviors.

Key words:
Vehicle Monitoring; Urban Mobility; Trajectory Pattern Analysis; Geographic Information Systems; Kernel Density Estimator

Introdução

O presente estudo tem como objetivo o desenvolvimento de um modelo para identificação do Padrão de Comportamento Espacial de Veículos em Movimento – PCEVM. O estudo insere-se no contexto da mineração de dados espaço-temporais de mobilidade, e a finalidade é apresentar uma ferramenta de análise espacial para auxiliar o processo de tomada de decisão no monitoramento de veículos e na gestão do sistema de transporte urbano, de modo a abordar algumas questões fundamentais do estudo da mobilidade urbana (quais os padrões espaciais das viagens urbanas; dos diferentes tipos de veículos; como se associam aos diferentes ramos de atividades econômicas; etc.), tais como as apresentadas em Giannotti et al. (2011)Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D., Pinelli, F., Renso, C., Rinzivillo, S., & Trasarti, R. (2011) Unveiling the complexity of human mobility by querying and mining massive trajectory data. The VLDB Journal, vol. 20, pp. 695–719..

As ferramentas tradicionais de análise da engenharia de transporte se valem das informações extraídas, por exemplo, das matrizes origem e destino, que se baseiam em dados coletados em pesquisas de campo e entrevistas, como utilizado por Alves et al., (2012)Alves, V. F. B., Silva, A. N. R., & Waerden, P. (2012) Técnicas exploratórias para localizar potenciais usuários de transporte público urbano. Journal of Transport Literature, 6(3) 180-203. para a localização de identificar potenciais usuários de transporte público e por Lima et al., (2012)Lima, R. S., Lima, J. P., & Silva, T. V. V. (2012) Roteirização em arcos com um sistema de informações geográficas para transportes: aplicação em coleta de resíduos sólidos urbanos. Journal of Transport Literature, vol. 6, n. 2, pp. 180-196. para a roteirização da coleta de resíduo solido, possuem uma série de limitações como a identificação da movimentação efetivamente realizada, com informações temporais e espaciais. Alternativamente, o presente estudo prevê que grandes volumes de dados ("big data") de mobilidade, mesmo em estado bruto, podem ser usados para superar as restrições das pesquisas de campo, como os altos custos envolvidos, baixa periodicidade de realização (frequência), rápida obsolescência, não são completas nem exatas. Por outro lado, os dados de mobilidade coletados remotamente são verdades de campo, pois descrevem atividades móveis reais, e desta forma são considerados dados confiáveis e podem ser continuamente coletados em tempo real (Giannotti et al., 2011Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D., Pinelli, F., Renso, C., Rinzivillo, S., & Trasarti, R. (2011) Unveiling the complexity of human mobility by querying and mining massive trajectory data. The VLDB Journal, vol. 20, pp. 695–719.).

Foram utilizados dados de uma série histórica de 3 (três) meses de 30 (trinta) veículos monitorados por Global Positioning System - GPS na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), Brasil. Foram desenvolvidas análises espaciais que permitiram a caracterização de padrões espaciais de trajetórias para a RMSP. A metodologia proposta pode ser replicada para outras regiões ou para tipos de veículos (modos de transportes) ou usuários específicos.

O estudo identifica as regiões da área de estudo com as maiores probabilidades de conter as trajetórias dos veículos. Com base nesses resultados apresentam-se 4 (quatro) padrões de trajetórias: difusa, unifocal, bifocal e multifocal. Esses padrões podem ser usados como indicadores do tipo de utilização do veículo (veículo particular individual, veículo de carga, etc.), e ajudar a definir as localidades com a maior probabilidade de abrigarem as rotas preferenciais desses veículos específicos.

1. Padrões de trajetórias – o método de Kernel

Segundo Schönfelder et al. (2002)Schönfelder, S., Axhausen, K., Antille, N., & Bierlaire, M. (2002) Exploring the potentials of automatically collected GPS data for travel behaviour analysis – A swedish data source. In: Möltgen, J.; Wytzisk, A. (Eds.), GI-Technologien für Verkehr und Logistik, nº 13, Institut fur Geoinformatik, Universität Münster, Münster: IfGIprints, pp. 155–179. o entendimento da regularidade e da variabilidade do comportamento individual das viagens urbanas ao longo do tempo é uma das questões-chave na investigação dos padrões de movimentações de pessoas e veículos. No entanto, o conhecimento mais profundo desses padrões de mobilidade é, ainda hoje, limitado pela disponibilidade de dados espaço-temporais de deslocamentos.

Um dos objetivos do monitoramento e rastreamento de veículos é possibilitar a análise de comportamentos, para que seja possível detectar anomalias e prever comportamentos futuros. Na grande maioria das vezes, os veículos não se deslocam aleatoriamente, mas seguem padrões de trajetórias. O conhecimento desses padrões e o desenvolvimento de metodologias automáticas para extração de informações pertinentes aos deslocamentos são importantes, por exemplo, para ações de planejamento do sistema de transporte (Hu et al., 2006Hu, W., Xiao, X., Fu, Z., Xie, D., Tan, T. & Maybank, S. (2006) A system for learning statistical motion patterns. IEEE Transactions on Pattern Analysis and Machine Intelligence, vol. 28, n.9, pp. 1450-1464.).

De acordo com Morris e Trivedi (2009)Morris, B. T., & Trivedi, M. (2009) Learning trajectory patterns by clustering: Experimental studies and comparative evaluation. IEEE Conference on Computer Vision and Pattern Recognition, Miami, FL, USA, pp. 312-319., a realização das atividades está condicionada às características de movimentação, que são representadas por suas trajetórias. Por sua vez, essas trajetórias são coletadas e agrupadas para determinar comportamentos típicos. Os padrões de trajetória representam um conjunto de deslocamentos individuais que compartilham a propriedade de visitar a mesma sequência de lugares com tempos de viagem similares. Portanto, duas noções são essenciais: (1) as regiões de interesse de uma área geográfica específica (destinos preferenciais), e (2) o tempo típico de viagem dos objetos se movimentando de uma região para outra (de um local de origem para um local de destino) (Giannotti et al., 2007Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D. & Pinelli, F. (2007) Trajectory Pattern Mining. Proceedings of the 13th ACM SIGKDD International conference on Knowledge discovery and data mining, San Jose, California, USA, pp. 330-339.).

Dentre os estudos de análise de distribuição espacial, estão aqueles desenvolvidos com o auxílio do módulo Home Range Analysis, concebido por Hooge et.al. (2000), onde diversos algoritmos são usados para mostrar o padrão de movimentação. Esses exemplos de padrões estão representados na Figura 1. No método do mínimo polígono convexo – MPC (Mohr, 1947Mohr, C. (1947). Table of equivalent populations of North American small mammals. American Midland Naturalist, vol. 37, n.1, pp. 223-249.), constrói-se o menor polígono onde estão contidos todos os pontos que foram detectados. No método Jennrich-Turner (Jennrich e Turner, 1969Jennerich, D. L., & Turner F. B. (1969) Measurement of non-circular home range. Theoretical Biology, vol. 22, n. 2, pp. 227-237.) define-se um elipsoide que represente, com certa confiabilidade, o espalhamento espacial dos pontos detectados. O terceiro método, denominado de Estimador de Densidade Kernel (EDK) é uma técnica de análise espacial que segundo Câmara e Carvalho (2004)Câmara, G., & Carvalho, M. S. Análise de eventos pontuais (2004) In: Druck, S., Carvalho, M. S., Câmara, G. e Monteiro, A. V. M. (Eds.) Análise Espacial de Dados Geográficos. Brasília, EMBRAPA, cap. 2, 1-15. Disponível em: www.dpi.inpe.br.
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, estuda fenômenos expressos através de ocorrências identificadas como pontos localizados no espaço, denominados "processos pontuais".

Figura 1
Exemplos de análise de envoltórias – Região Metropolitana de São Paulo – SP – Brasil (Fonte: os autores).

Como exemplo, foram geradas análises utilizando os 3 (três) métodos acima mencionados, com dados referentes ao monitoramento de 1 (um) único veículo durante 1 (um) mês, e que se deslocou pelo município de São Paulo e seus vizinhos. A partir dessas análises conclui-se que o método de Kernel apresentou os melhores resultados, como pode ser visualizado na Figura 1.

Denominaram-se os resultados da aplicação do método EDK, neste estudo, de envoltórias, termo adequado ao resultado mostrado na Figura 1. Ao analisar a distribuição espacial de pontos (envoltórias), procura-se identificar se os eventos observados formam algum padrão sistemático, observando a existência de conglomerados espaciais (clusters).

Muitos estudos foram realizados utilizando o EDK para o rastreamento e monitoramento de veículos e para identificação dos padrões de movimentos. Dentre esses estudos destaca-se os conduzidos por Giannotti et al. (2007)Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D. & Pinelli, F. (2007) Trajectory Pattern Mining. Proceedings of the 13th ACM SIGKDD International conference on Knowledge discovery and data mining, San Jose, California, USA, pp. 330-339., Agamennoni et al. (2009)Agamennoni, G., Nieto, J., & Nebot, E. (2009) Mining GPS data for extracting significant places. IEEE International Conference on Robotics and Automation, Kobe, Japan, 855-862., Chen et al. (2011a)Chen, J., Shaw, S. L., Yu, H., Lu, F., Chai, Y., & Jia, Q. (2011a) Exploratory data analysis of activity diary data: a space–time GIS approach. Journal of Transport Geography, vol. 19, n. 3, 394–404., Li et al. (2011)Li, Q., Zhang, T., Wang, H., & Zeng, Z. (2011) Dynamic accessibility mapping using floating car data: a network-constrained density estimation approach. Journal of Transport Geography, vol. 19, n. 3, pp. 379–393., Downs e Horner (2012)Downs, J. A., & Horner, M. W. (2012) Probabilistic potential path trees for visualizing and analyzing vehicle tracking data. Journal of Transport Geography, vol. 23, pp. 72–80. e Abinaya et al. (2013)Abinaya, P., Ravichandran, K. S., & Santhi, B. (2013) Watershed Segmentation for Vehicle Classification and Counting. International Journal of Engineering and Technology, 5(2), 770-775..

A função densidade do estimador Kernel realiza uma contagem de todos os eventos dentro de uma região de influência de raio τ, ponderando-os pela distância de cada um à localização de interesse (hi), ou seja, a distância entre a localização em que se deseja calcular a função (S) e o evento observado (Si) (Carvalho e Câmara, 2004Câmara, G., & Carvalho, M. S. Análise de eventos pontuais (2004) In: Druck, S., Carvalho, M. S., Câmara, G. e Monteiro, A. V. M. (Eds.) Análise Espacial de Dados Geográficos. Brasília, EMBRAPA, cap. 2, 1-15. Disponível em: www.dpi.inpe.br.
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).

A densidade é calculada utilizando a seguinte fórmula matemática descrita em (1):

Onde:

s): Kernel na área inserida num raio de interesse τ em relação ao ponto S(

I é a função de distribuição de probabilidades, e é escolhida de forma adequada para construir uma superfície contínua sobre os dados.

O parâmetro τ é denominado "largura de faixa" ou "raio de interesse".

S representa uma localização qualquer na área de estudo e Si são as localizações dos eventos observados (neste estudo é a localização dos objetos móveis)

n representa o número de eventos.

2. Descrição da metodologia

O fluxo metodológico se inicia com a aplicação de tecnologias de aquisição de localização para a construção de uma abrangente base de dados espaço-temporais que são usados para analisar as trajetórias dos veículos em movimentos (Giannotti et al., 2007Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D. & Pinelli, F. (2007) Trajectory Pattern Mining. Proceedings of the 13th ACM SIGKDD International conference on Knowledge discovery and data mining, San Jose, California, USA, pp. 330-339.). A exemplo do estudo conduzido por Chen et al. (2011a)Chen, J., Shaw, S. L., Yu, H., Lu, F., Chai, Y., & Jia, Q. (2011a) Exploratory data analysis of activity diary data: a space–time GIS approach. Journal of Transport Geography, vol. 19, n. 3, 394–404., desenvolveu-se uma metodologia em ambiente SIG (Sistema de Informações Geográficas) para oferecer suporte às análises exploratórias dos dados de movimentação no nível individual (isto é, os deslocamentos que ocorrem no sistema de transporte e que viabilizam a realização das atividades), em um contexto espaço-temporal.

Para a caracterização do padrão de comportamento de movimentação (trajetórias) foi desenvolvido um método para geração de um modelo de comportamento do veículo, baseado nos estudos de análises de trajetórias e dados de mobilidade, como descritos em Renso et al. (2013)Renso, C., Spaccapietra, S., & Zimányi, E. (2013) Mobility Data: Modeling, Management, and Understanding. New York: Cambridge University Press, 378p.. Portanto, faz-se necessário compreender o comportamento de movimentação de um objeto móvel a partir de uma série histórica dos dados de rastreamento, como realizado em Giannotti et al. (2007)Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D. & Pinelli, F. (2007) Trajectory Pattern Mining. Proceedings of the 13th ACM SIGKDD International conference on Knowledge discovery and data mining, San Jose, California, USA, pp. 330-339., Giannotti et al. (2009)Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D., & Pinelli, F. (2009) Trajectory pattern analysis for urban traffic. IWCTS '09 Proceedings of the Second International Workshop on Computational Transportation Science, Seattle, Washington, USA, pp. 43-47., Andrienko et al. (2010)Andrienko, G., Andrienko, N., Giannotti, F., Monreale, A., Pedreschi, D., & Rinzivillo, S. (2010) A Generalisation-based Approach to Anonymising Movement Data. 13th AGILE - International Conference on Geographic Information Science 2010, Guimarães, Portugal, 1-10., Chen et al. (2011b)Chen, L., Lv, M., Ye, Q., Chen, G., & Woodward, J. (2011b) A personal route prediction system based on trajectory data mining. Information Sciences, vol. 181, n.7, pp. 1264–1284., Giannotti et al. (2011)Giannotti, F., Nanni, M., Pedreschi, D., Pinelli, F., Renso, C., Rinzivillo, S., & Trasarti, R. (2011) Unveiling the complexity of human mobility by querying and mining massive trajectory data. The VLDB Journal, vol. 20, pp. 695–719.. Com este modelo de comportamento é possível identificar os períodos e os locais de utilização habituais (origens, destinos e tempos médios de viagens).

O presente estudo sobre o comportamento de movimentação dos veículos baseou-se na análise de uma série histórica dos dados de rastreamento de um veículo obtido por equipamentos embarcados que possuem tecnologia de posicionamento GPS e utilizam sistema de comunicação com tecnologia de telefonia celular. Os dados coletados contendo-se referem às datas e horários da coleta e a sua posição espacial. Os dados coletados são utilizados para a caracterização dos padrões diários de movimentação, que dependem do estilo de vida e das atividades realizadas pelos usuários do veículo.

O GPS usado para determinar o posicionamento possui um erro nominal de 15 metros, significando que não é possível distinguir diferenças de posições se as coletas de dados forem realizadas a uma distância menor que 15 metros. Por esta razão é necessário, para a estimação do Kernel, considerar que para uma vizinhança de até 15 metros as características dos dados coletados são similares. Desta forma consideramos o erro nominal do equipamento de GPS como sendo a largura de faixa (vizinhança) utilizada no calculo do estimador de Kernel.

Para a delimitação das regiões onde a probabilidade de encontrar o veículo, determina-se o valor de Kernel de forma a gerar um polígono que contenha a proporção desejada dos posicionamentos coletados durante o período de análise, no caso foram arbitradas probabilidades de 50%, 75% e 95%.

3. Resultados obtidos

Como resultado do cálculo estimador de densidade Kernel, identificamos as regiões nas quais há uma maior probabilidade do veículo estar (Figura 2). Na figura 4 as regiões delimitadas representam as probabilidades de 50 %, 75% e 95% dessas regiões conterem um veículo posicionado.

Figura 2
Mapa de probabilidade de ocorrência do evento (Fonte: os autores)

Dependendo das características de utilização do veículo, temos distintas distribuições espaciais do estimador de Kernel. Avaliando a distribuição espacial dos veículos monitorados, foi possível identificar alguns padrões de movimentação espacial, que contem informações sobre o comportamento espacial desses veículos. Para esses padrões, que não estão formalizados na bibliografia consultada, sugere-se a seguinte terminologia, exemplificada na Figura 3, utilizando dados da série histórica de 3 (três) meses de 30 (trinta) veículos monitorados na Região Metropolitana de São Paulo - SP - Brasil.

Figura 3
Padrões de distribuição espacial da movimentação de veículos (Fonte: os autores)

Para a obtenção desses PCEVM e correspondente terminologia, além dos padrões de distribuição espacial, a forma de distribuição dos deslocamentos realizados também foi levada em consideração, e são descritos e representados a seguir:

  • Distribuição difusa: neste padrão (Figura 3a) observamos um centro bem marcado e a ocorrência de outras concentrações de menor significância em várias regiões no entorno. Este padrão sugere a movimentação de veículos comerciais de entrega, que executam as tarefas de distribuição de mercadorias a partir de um centro de distribuição, sem preferência na seleção da área atendida.

  • Distribuição bifocal: neste padrão são observadas duas concentrações de pontos e uma região alongada entre estas duas concentrações, conforme observado na Figura 3b. Este tipo foi identificado em veículos que realizam um movimento rotineiro entre duas localidades, que pode ser chamado de pendular. Veículos que realizam transporte entre dois centros de distribuição ou entre empresas do mesmo grupo, possuem este tipo de movimento. Um veículo de transporte pessoal que é utilizado apenas para a movimentação da residência para o local de trabalho gera também este padrão de movimentação. Nesta distribuição de pontos as alterações dos padrões de movimentação são raras e detectadas facilmente. - Distribuição multifocal: a distribuição multifocal apresenta várias áreas de concentração de ocorrências dos pontos e uma distribuição espacial ampla, sendo observadas múltiplas regiões para a ocorrência dos pontos. O tipo de distribuição espacial multifocal (Figura 3c) foi observado na movimentação de veículos de uso pessoal utilizados para executar diversas atividades (ir ao trabalho, levar os filhos para a escola, ir ao clube ou à academia de ginástica, às compras no shopping) ou pode significar que existem diversos condutores. Outro tipo de veículo que apresenta este mesmo padrão é o de veículos de serviços ou socorro mecânico que tem várias bases de apoio e atendem em diversos locais.

  • Distribuição com um foco: esta distribuição é caracterizada pela concentração dos pontos em apenas um local e a distribuição espacial é restrita a uma porção do espaço, como pode ser observado na Figura 3d. Este tipo de distribuição é característico para veículos de entregas ou prestação de serviços que tem um centro de distribuição ou apoio e uma região bem definida para a realização das entregas ou serviços.

  • A forma da distribuição espacial que representa a movimentação do veículo pode ser utilizada como indicador do tipo de utilização do veículo, como exemplo, a distribuição bifocal pode apontar o uso pessoal, ou mesmo o uso de transporte de carga entre dois centros de distribuição.

Conclusões

As tipologias de distribuição espacial detectadas, cujas terminologias foram propostas pelo estudo, podem ser utilizadas para indicar a forma de utilização (deslocamentos) dos veículos e definir as localidades com maior probabilidade de encontrar o veículo. O resultado da comparação entre o posicionamento coletado em tempo real com o modelo de distribuição espacial obtido na caracterização dos padrões de comportamento espaciais detecta anormalidades do comportamento de movimentação do veículo. Estas anormalidades poderão ser utilizadas para subsidiar a tomada de decisão em sistemas de monitoramento e gerenciamento de veículos, que visem à segurança patrimonial e pessoal, identificando comportamentos de movimentação não esperados ou de comportamentos de risco.

Os resultados e padrões encontrados são válidos apenas para a RMSP e para a particular amostra de 30 veículos utilizada. Entretanto, a metodologia propõe análises espaciais simples, que permitiram a caracterização de alguns padrões espaciais para a RMSP, mas que podem ser facilmente realizadas para outras regiões ou para particulares tipos de veículos ou usuários de sistemas de monitoramento. O tipo de caracterização de padrões espaciais apresentado é útil, por exemplo, para planejadores municipais, empresas de logística e empresas seguradoras, sendo possível, dependendo da amostra disponível, incorporar aspectos temporais tais como o tempo de deslocamento entre os lugares, as variações semanais e sazonais associadas a eventos (jogos de futebol, Carnaval, inundações, etc.).

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Programa de Pós Graduação em Engenharia de Transportes da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - EPUSP; ao Departamento de Engenharia de Transportes da EPUSP e ao CNPq pelas bolsas concedidas aos pesquisadores.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2015

Histórico

  • Recebido
    15 Mar 2014
  • Revisado
    30 Out 2014
  • Aceito
    26 Dez 2014
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