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A Eficiência Ventilatória Seria a Chave para Revelar o Potencial Máximo do Teste Cardiopulmonar de Exercício?

Palavras-chave
Ergoespirometria; Troca Gasosa; Marcadores

Se o Professor Jorge Pinto Ribeiro estivesse vivo, sem dúvida seria quem que estaria escrevendo esse minieditorial em vez de nós. Infelizmente, nós o perdemos em 2013, mas sua memória, e palavras e artigos inspiradores continuam presentes. O Professor Ribeiro era um defensor obstinado do Teste Cardiopulmonar de Exercício (TCPE). Ele escreveu vários artigos sobre o tema, incluindo um com título instigante: "Beyond Peak Oxygen Uptake: New Prognostic Markers from Gas Exchange Exercise Tests in Chronic Heart Failure".11 Ribeiro JP, Stein R, Chiappa GR. Beyond Peak Oxygen Uptake: New Prognostic Markers from Gas Exchange Exercise Tests in Chronic Heart Failure. J Cardiopulm Rehabil. 2006;26(2):63-71. doi: 10.1097/00008483-200603000-00001.
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É uma honra mencionar que o Professor Chiappa e o Professor Stein tiveram a sorte de colaborar com ele nesse artigo.

O que aconteceu há 18 anos11 Ribeiro JP, Stein R, Chiappa GR. Beyond Peak Oxygen Uptake: New Prognostic Markers from Gas Exchange Exercise Tests in Chronic Heart Failure. J Cardiopulm Rehabil. 2006;26(2):63-71. doi: 10.1097/00008483-200603000-00001.
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está diretamente relacionado ao que houve em seguida: apesar da riqueza de dados valiosos disponíveis, o TCPE continua sendo subutilizado. Tal subutilização deve-se não à falta de capacidade, e sim à pouca exploração dos dados que ele gera. Com os avanços da obtenção de dados e da analítica, estamos no limiar de uma nova era, em que o potencial máximo do TCPE, tanto para o prognóstico quanto para o diagnóstico, poderá ser revelado.

A eficiência ventilatória exemplifica uma área específica em que a total exploração dos dados do TCPE poderia revolucionar a maneira como tratamos a doença cardiopulmonar e cuidamos do paciente.22 Song L, Qu H, Luo J, Wang W, Zheng L, Xue M, et al. Cardiopulmonary Exercise Test: A 20-Year (2002-2021) Bibliometric Analysis. Front Cardiovasc Med. 2022;9:982351. doi: 10.3389/fcvm.2022.982351.
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Uma análise mais detalhada do TCPE revela que a inclinação VE/VCO2 (razão entre a ventilação minuto e a produção de dióxido de carbono) é uma ferramenta valiosa para navegar entre as complexidades de várias condições cardiopulmonares. Essa métrica, ao quantificar a eficiência ventilatória, serve como um importante indicador clínico para doenças como insuficiência cardíaca crônica (ICC), doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), hipertensão arterial pulmonar, e doença pulmonar intersticial. Ainda, considerando a relação entre ventilação e demanda metabólica, a inclinação VE/VCO2 auxilia na classificação da gravidade da doença e na predição de risco de morbidade e de mortalidade. Assim, essa variável fornece informações importantes tanto sobre a eficiência do sistema respiratório quanto sobre a interação entre as funções pulmonar e cardíaca, levando ao direcionamento de estratégias personalizadas de manejo dos pacientes com condições cardiopulmonares.33 Phillips DB, Collins SÉ, Stickland MK. Measurement and Interpretation of Exercise Ventilatory Efficiency. Front Physiol. 2020;11:659. doi: 10.3389/fphys.2020.00659.
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A inclinação VE/VCO2 exibe um comportamento variável entre as diferentes condições clínicas. Na DPOC, a obstrução das vias aéreas e as limitações mecânicas podem evitar a elevação esperada na inclinação com a progressão da doença.44 Neder JA, Arbex FF, Alencar MC, O’Donnell CD, Cory J, Webb KA, et al. Exercise Ventilatory Inefficiency in Mild to End-Stage COPD. Eur Respir J. 2015;45(2):377-87. doi: 10.1183/09031936.00135514.
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Por outro lado, na ICC, o valor da inclinação é geralmente mais alto devido à ineficiência metabólica e ao desequilíbrio entre a ventilação e a perfusão. Esses comportamentos contrastantes requerem uma interpretação cuidadosa da inclinação VE/VCO2 para assegurar a avaliação precisa da função cardiopulmonar e do estado de saúde do paciente, já que refletem mecanismos fisiopatológicos distintos de cada condição. É importante destacar que, embora tanto a DPOC como a ICC tenham um impacto sobre a eficiência ventilatória, seus mecanismos diferem-se significativamente. A DPOC exibe uma diminuição paradoxal na inclinação VE/VCO2 devido às limitações mecânicas e distúrbios de troca gasosa. Por outro lado, na ICC, o valor da inclinação é bem elevado, refletindo sua própria fisiopatologia.55 Teopompi E, Tzani P, Aiello M, Ramponi S, Visca D, Gioia MR, et al. Ventilatory Response to Carbon Dioxide Output in Subjects with Congestive Heart Failure and in Patients with COPD with Comparable Exercise Capacity. Respir Care. 2014;59(7):1034-41. doi: 10.4187/respcare.02629.
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Orro et al.,66 Orro GG, Goelzer LS, Augusto TRL, Barbosa GW, Chiappa GR, van Iterson EH MP. Ineficiência Ventilatória Comparável no Desempenho Máximo e Submáximo em Indivíduos com DPOC e ICC: Uma Abordagem Inovadora. Arq Bras Cardiol. 2024; 121(4):e20230578. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20235078
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em um artigo fascinante publicado nesta edição dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, apresentam uma nova abordagem para avaliar a eficiência ventilatória: o ηVE. Os autores destacam várias vantagens associadas a esse método:

Melhor análise comparativa:

o método permite comparações mais diretas da eficiência ventilatória entre pacientes com ICC e pacientes com DPOC, acomodando as diferenças na fisiopatologia dessas condições.

Útil na doença obstrutiva avançada:

ηVE é particularmente benéfico para avaliar pacientes com superposição de DPOC e ICC, em que métodos tradicionais como a inclinação VE/VCO2 podem ser menos eficaz dada à complexa interação entre as doenças.

Supera limitações de métodos tradicionais:

Na DPOC, em que os mecanismos respiratórios e as doenças das vias aéreas afetam significativamente a eficiência ventilatória, a inclinação VE/CO2 pode levar a falsas interpretações. O ηVE oferece uma avaliação mais precisa nesses cenários.

O ηVE, conforme apresentado por Orro et al.,66 Orro GG, Goelzer LS, Augusto TRL, Barbosa GW, Chiappa GR, van Iterson EH MP. Ineficiência Ventilatória Comparável no Desempenho Máximo e Submáximo em Indivíduos com DPOC e ICC: Uma Abordagem Inovadora. Arq Bras Cardiol. 2024; 121(4):e20230578. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20235078
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é uma ferramenta potencialmente mais refinada e precisa para avaliar a eficiência ventilatória no contexto das doenças cardiopulmonares. Isso é particularmente relevante quando métodos tradicionais podem ser inadequados pela complexidade inerente dessas condições. Os dados multifacetados obtidos pelo TCPE, incluindo variáveis bem estabelecidas, tais como a inclinação VE/VCO2 bem como o recentemente apresentado ηVE, parecem promissores na identificação de novos marcadores prognósticos.

Finalmente, a capacidade do TCPE em avaliar de maneira abrangente os diversos aspectos da saúde cardiopulmonar destaca seu valor significativo nos cenários clínicos. Ele transcende métricas convencionais como o consumo de oxigênio de pico – VO2 pico – ao fornecer insights mais profundos sobre a capacidade funcional e a progressão da doença dos pacientes.

  • Minieditorial referente ao artigo: Ineficiência Ventilatória Comparável no Desempenho Máximo e Submáximo em Indivíduos com DPOC e ICC: Uma Abordagem Inovadora

Referências

  • 1
    Ribeiro JP, Stein R, Chiappa GR. Beyond Peak Oxygen Uptake: New Prognostic Markers from Gas Exchange Exercise Tests in Chronic Heart Failure. J Cardiopulm Rehabil. 2006;26(2):63-71. doi: 10.1097/00008483-200603000-00001.
    » https://doi.org/10.1097/00008483-200603000-00001
  • 2
    Song L, Qu H, Luo J, Wang W, Zheng L, Xue M, et al. Cardiopulmonary Exercise Test: A 20-Year (2002-2021) Bibliometric Analysis. Front Cardiovasc Med. 2022;9:982351. doi: 10.3389/fcvm.2022.982351.
    » https://doi.org/10.3389/fcvm.2022.982351
  • 3
    Phillips DB, Collins SÉ, Stickland MK. Measurement and Interpretation of Exercise Ventilatory Efficiency. Front Physiol. 2020;11:659. doi: 10.3389/fphys.2020.00659.
    » https://doi.org/10.3389/fphys.2020.00659
  • 4
    Neder JA, Arbex FF, Alencar MC, O’Donnell CD, Cory J, Webb KA, et al. Exercise Ventilatory Inefficiency in Mild to End-Stage COPD. Eur Respir J. 2015;45(2):377-87. doi: 10.1183/09031936.00135514.
    » https://doi.org/10.1183/09031936.00135514
  • 5
    Teopompi E, Tzani P, Aiello M, Ramponi S, Visca D, Gioia MR, et al. Ventilatory Response to Carbon Dioxide Output in Subjects with Congestive Heart Failure and in Patients with COPD with Comparable Exercise Capacity. Respir Care. 2014;59(7):1034-41. doi: 10.4187/respcare.02629.
    » https://doi.org/10.4187/respcare.02629
  • 6
    Orro GG, Goelzer LS, Augusto TRL, Barbosa GW, Chiappa GR, van Iterson EH MP. Ineficiência Ventilatória Comparável no Desempenho Máximo e Submáximo em Indivíduos com DPOC e ICC: Uma Abordagem Inovadora. Arq Bras Cardiol. 2024; 121(4):e20230578. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20235078
    » https://doi.org/10.36660/abc.20235078

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    19 Mar 2024
  • Revisado
    20 Mar 2024
  • Aceito
    20 Mar 2024
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