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A guerra das scatolettas: cultura material e comidas enlatadas entre os soldados da Força Expedicionária Brasileira na Itália

The war of the scatolettas: material culture and canned food among the soldiers of the Brazilian Expeditionary Force in Italy

RESUMO

Este artigo busca, sobretudo através de uma revisão bibliográfica e do uso de obras memorialísticas, discutir o uso dos alimentos enlatados entre os brasileiros, em particular os soldados da Força Expedicionária Brasileira, em campanha na Itália durante a Segunda Guerra Mundial. Mais do que isso, procura mostrar que o objeto em si, a lata, recebeu novos e diferentes usos pelas tropas, atestando o seu poder de agenciamento material. Para tanto, este texto faz uso principalmente - embora não apenas - do trabalho da arqueóloga Nicole Boivin acerca da fisicalidade das coisas e da teoria do agenciamento da matéria, buscando demonstrar que os objetos podem exercer influências sobre a sociedade e a evolução humana. Ele ainda tenciona historicizar o cotidiano alimentar desses homens, mostrando a abrangência dos enlatados em sua dieta - quando esse tipo de alimento era ainda pouco difundido no Brasil -, bem como os usos que eram dados a tais objetos, por vezes diferentes do intuito original. Nesse sentido, é apresentado um panorama breve da trajetória dos enlatados, com foco no Brasil e nos Estados Unidos, onde eles simbolizaram, em parte, a abundância alimentar e o poderio industrial deste último país. O recorte temporal utilizado foi predominantemente curto, dentro da noção de evento pensada por Braudel. Finalmente, empregou-se considerável iconografia relacionada aos enlatados norte-americanos utilizados pelos brasileiros durante a guerra.

PALAVRAS-CHAVE:
Enlatados; Brasil; Estados Unidos; Segunda Guerra Mundial; Alimentação

ABSTRACT

This article utilizes a bibliographic review and memorial works to discuss the use of canned foods among Brazilians, especially soldiers of the Brazilian Expeditionary Force campaigning in Italy during World War II. More than that, it shows that the object itself, the tin can, received new and different uses by the troops, attesting to its material agency power. For such, this paper used mainly the work of archeologist Nicole Boivin concerning the physicality of things and the theory of agency of matter, demonstrating that objects may exert influence over society and human evolution. This paper also historicizes the daily life of these men, showing the comprehensiveness of canned foods in their diets at a time when this type of food still had limited use in Brazil, as well as the uses that were attributed to such objects, sometimes different from the ones originally intended. Thus, a brief overview of the trajectory of cannery is traced, focusing on Brazil and on the United States, where they (at least partially) symbolized food abundance and the industrial power of this latter country. The selected period was predominantly short, following the notion of event as thought out by Braudel. Lastly, considerable iconography related to the American cannery used by Brazilians during the war was employed.

KEYWORDS:
Cannery; Brazil; United States; World War II; Food

INTRODUÇÃO

Este artigo buscará debater os enlatados alimentares e a importância da sua fisicalidade, enquanto objetos capazes de, até certo ponto, exercer um agenciamento sobre o mundo ao seu redor, inclusive sobre aqueles que os manipulam. Para tanto, procurou-se estudar o caso específico da participação brasileira na Segunda Guerra Mundial, quando chegou à Itália um contingente de mais de 25 mil pessoas (em sua maioria soldados, mas também equipes médicas, formadas por muitas enfermeiras), ainda em 1944, ali permanecendo até o fim do conflito, no ano seguinte. Embora o Brasil devesse, em teoria, cuidar da alimentação do seu pessoal acantonado na Europa, a falta de organização do governo e problemas nas linhas de suplementos, próprios do conflito, fizeram com que os soldados brasileiros - popularmente conhecidos como “pracinhas” - dependessem quase inteiramente da intendência do exército dos Estados Unidos para a sua alimentação. Esta acontecia, quando possível, em refeitórios e na retaguarda, sendo preparada em cozinhas de campo e servida quente em bandejas. Para os que se encontravam em movimento, na ofensiva ou em locais de difícil acesso, a realidade diária era de uma subsistência baseada em latas de comida. Estas, portanto, faziam parte do cotidiano dos soldados, que dependiam desses objetos e para eles pensavam novos usos, diversos do original.

Para compreender a importância dos enlatados norte-americanos na vida dos pracinhas, optou-se por utilizar o conceito de agenciamento da matéria, sobretudo - mas não somente - a partir do trabalho da arqueóloga canadense Nicole Boivin. Seu livro Material cultures, material minds é uma das principais obras a tratar da questão, trazendo estudos e conclusões acerca da fisicalidade dos objetos e de seu papel surpreendentemente ativo na evolução humana. Assim, a autora parte dessa premissa e de suas pesquisas envolvendo materiais - alguns desenvolvidos pelo homem, como ferramentas em geral; outros naturais, como a argila - para discutir o agenciamento da matéria em áreas diversas, tais como antropologia cultural, biologia evolucionária, história, ciência cognitiva e a própria arqueologia.2 2 Boivin (2008). Para além de Boivin, trabalhos de pesquisadores como Beaudry, Hicks, e outros mais foram utilizados para matizar a discussão acerca das coisas e de seu agenciamento sobre a sociedade.3 3 Cf. Beaudry; Hicks (2018).

Este artigo buscou realizar uma revisão bibliográfica da temática dos enlatados em geral, a fim de compreender sua trajetória no mundo e no Brasil, abordando livros e trabalhos acadêmicos (artigos, teses etc.) que tratassem do assunto. Para além disso, fez-se uso de obras de cunho memorialístico, quase sempre escritas por militares que participaram ativamente da campanha da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália. Estes são trabalhos de difícil acesso, tendo muitos deles sido lançados em edições comemorativas, de pouca circulação e baixa tiragem, de modo que raramente são encontrados em bibliotecas que não sejam militares e muito menos à venda em livrarias ou mesmo sebos. É o caso dos livros de Castello Branco4 4 Branco (1960). e Silveira,5 5 Silveira (1989). consultados em coleções particulares, que trazem informações essenciais acerca do serviço de intendência do Exército brasileiro durante o conflito. Dessas obras veio parte das imagens que ilustram este artigo, mas outra parcela foi obtida através de pesquisa realizada nos National Archives, em Maryland (EUA) - maior repositório de documentos históricos norte-americanos, inclusive daqueles que dizem respeito à sua participação na Segunda Guerra.

Aqui é preciso comentar que, ao contrário de outros países, como os próprios Estados Unidos, a iconografia brasileira em relação ao conflito mundial é escassa. Por um lado, não havia na FEB os mesmos recursos de que os exércitos norte-americano e de outras nacionalidades dispunham; por outro, havia uma política de censura instituída pelo Estado Novo acerca das ações dos brasileiros no front. Assim, as fotografias que mostram os pracinhas vêm, muitas vezes, de registros realizados por seus colegas de armas, mas não do mesmo país. É o caso do acervo mantido pelos National Archives e outros. Como o Brasil pouco tem se debruçado sobre sua participação na guerra, a iconografia a ela relacionada costuma aparecer em livros bastante específicos, quase sempre editados pelo próprio Exército brasileiro, figurando em suas bibliotecas ou em acervos privados, cuja circulação, como já mencionado, é bastante restrita. Dentre estes, o trabalho da pesquisadora Maria Izabel Branco Ribeiro,6 6 Ribeiro (2006). aqui utilizado, é essencial para todos que decidirem estudar os objetos utilizados pela FEB em sua campanha italiana, sejam eles uniformes, armamentos ou latas de comida. Assim, de um universo de poucas dezenas de imagens, foram selecionadas seis que pudessem mostrar, com qualidade, os objetos referenciados neste artigo, bem como a importância da sua fisicalidade. Dessa forma, buscou-se trazer fotografias que retratassem da melhor forma possível seus tamanhos, formatos, por vezes cores e, quando possível, até mesmo a maneira como eram manipulados. Todas as fotografias são acompanhadas por legendas que discriminam a obra ou o acervo a que pertencem, além de explicações que detalham e aprofundam os usos e a importância dos objetos. Para além da iconografia, há ainda o uso de outra fonte primária: um arquivo em áudio de reportagem feita em 1944 pelo repórter brasileiro Francis Hallawell em um dos acampamentos de pracinhas na Itália,7 7 AER111 - Com a FEB na Itália, nº 3 e nº 4 (sem data). que foi trabalhado, junto a outros, pela historiadora Rosamary Esquenazi em suas pesquisas.8 8 Esquenazi (2013).

Finalmente, o recorte empregado foi bastante específico. Embora, como já se falou, seja abordada a história dos enlatados no mundo e no Brasil (uma trajetória, portanto, de muitas décadas), o foco principal foi a Segunda Guerra Mundial, que durou de 1939 a 1945,9 9 Isso dentro de uma abordagem historiográfica clássica. Contudo, já há algum tempo que pesquisadores defendem que o conflito teria se iniciado antes, ainda em 1937, com a invasão do Japão à China, conhecida como Segunda Guerra Sino-Japonesa. com a participação da FEB na Itália se limitando aos anos de 1944 e 1945. Dessa forma, este artigo se concentra em processos de curta duração, bem como naqueles que, na definição de Braudel, poderiam ser considerados eventos.10 10 Braudel (1965). Assim, as transformações aceleradas, de rápida sucessão e que produzem novidades ou significados diferentes para o homem - duráveis ou não -, seja em sua experiência individual ou coletiva, são mais trabalhadas aqui. Para Braudel, a história tem diversas velocidades, sendo formada por meio de processos de durações variadas - menos como uma dimensão e mais como uma arquitetura.11 11 Ibid. Enquanto as mentalidades operam necessariamente em um tempo mais longo, é possível afirmar que um conjunto ou uma sucessão de eventos políticos, como uma eleição ou mesmo um conflito militar (a Segunda Guerra Mundial e a participação da FEB, por exemplo), pode se caracterizar como de curta duração.

DISCUSSÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

Os enlatados norte-americanos que sustentaram os soldados brasileiros durante a campanha na Itália, já no final da Segunda Guerra Mundial, foram tratados pelos homens de diferentes formas. Significavam um ideal de abundância alimentar dos Estados Unidos e deslumbravam por sua higiene e praticidade, além da farta quantidade. Por outro lado, a comida em si era muitas vezes considerada estranha, de sabor desacostumado e porções insatisfatórias. De uma forma ou de outra, impressionavam enquanto objeto tecnológico, isto é, um invólucro de metal capaz de conservar, por muito tempo e em condições adversas, o alimento cotidiano. As latinhas eram ocasionalmente malvistas, dada a repetição das refeições, muitas vezes frias, mas também eram tratadas com afeto: serviam como porta-joias, onde se podia guardar aquilo que fosse valioso. Eram, enfim, um objeto de reconhecida complexidade e uma parte da cultura material que se desenvolvia cada vez mais.

Assim sendo, a própria fisicalidade das latas era capaz de interferir no mundo ao seu redor, incluindo mesmo as pessoas que as produziam e manipulavam. Os objetos, portanto, não são inteiramente passivos, como se poderia imaginar, mas possuem sua própria capacidade de agenciamento. Em outras palavras, são capazes de moldar nossos pensamentos, sentimentos, relacionamentos e, em certos casos, até corpos.12 12 Boivin, op. cit. A compreensão dessa capacidade de agência das coisas, contudo, passa necessariamente pela conceituação do que é, afinal, um objeto físico, de suas definições possíveis e de seus limites, em diversas interpretações. Uma delas, aqui utilizada, é trazida pelo filósofo norte-americano Ned Markosian, que entende que as coisas não precisam, necessariamente, de uma fisicalidade para existir. É o caso das ideias, das propostas, dos sentimentos e mesmo daquilo que é difícil - se é que é possível - comprovar, como a alma humana. Pensados e debatidos, todos eles existem, porém de forma imaterial, apenas dentro de um conceito de tempo. Já outros elementos, tais como um livro, uma árvore, um rio, um relógio ou uma lata, possuem uma existência que conjuga tanto tempo quanto espaço (spatial location account), podendo ser percebidos pelos sentidos e manipulados.13 13 Markosian (2000). Para o estudo dos objetos dentro da ciência da história, contudo, interessam aqueles que possuem não apenas uma fisicalidade, como definida por Markosian. Nesse sentido, é preciso apropriar-se do conceito arqueológico de cultura material, ou seja, de coisas que foram e são culturalmente determinadas - em outras palavras, de tudo aquilo cuja fisicalidade possui ao menos o potencial de agenciar as formas pelas quais as pessoas organizam sua vida social.14 14 Cf. Costa; Viana (2019). Estudar a relação da sociedade com sua cultura material a partir da análise de objetos ligados à cultura alimentar implica compreender os usos que grupos fizeram desses materiais, identificando formas de apropriação e a convivência de tecnologias e corpos construídos por práticas específicas, como defendem Michel de Certeau, Luce Giard e Pierre Mayol,15 15 Certeau; Giard; Mayol (2013). apesar da internacionalização dos objetos industriais.

Para tanto, é preciso compreender a centralidade dos estudos de cultura material, que são a um só tempo campo, temática e abordagem metodológica, para se proceder à pesquisa histórica. Isso só é possível pela alteração de certas noções calcificadas acerca de imagens e objetos, por muito tempo tratados como meras ilustrações ou substitutos da palavra escrita, da mídia tradicional e das ciências sociais. Historiadores sentem-se confortáveis ao trabalhar com documentações logocêntricas, sejam recortes de jornais, relatórios governamentais, boletins policiais, diários pessoais, cartas e tudo o que é relativo à escrita. Bibliotecas e arquivos têm sido - e ainda são - os locais de pesquisa mais confiáveis para o historiador que ainda considera que sua profissão trata majoritariamente de palavras. Essa noção começou a mudar com a Nova História francesa, na primeira metade do século XX, quando estudiosos como Marc Bloch passaram a se debruçar sobre fontes mais diversas. Assim, campos cultivados e trajes camponeses passaram a integrar o manancial cada vez mais variado ao qual os pesquisadores tinham acesso, sendo por eles “lidos”, interpretados e pensados tal qual se fazia com os arquivos mais tradicionais.16 16 Cf. Auslander (2005).

Essa diversidade decorre, necessariamente, de uma maior interdisciplinaridade, essencial no campo da cultura material, que intersecciona ciências como a história, a antropologia e a arqueologia, principalmente a partir da década de 1980, provocando uma mudança que se reflete até mesmo no vocabulário empregado por diversas disciplinas. Assim, geógrafos humanos, tais como Sarah Whatmore e Jonathan Murdoch, passaram a forjar e utilizar termos como o “mundo além do humano” e “parceiros sociais não humanos” para se referir aos objetos e à sua importância enquanto campo de estudos. Já pesquisadores da literatura, como Bill Brown, propuseram uma “teoria das coisas”, ao passo que a filósofa Jane Bennett desenvolveu a ideia do “materialismo encantado”. A sociologia, por sua vez, passou a interrogar a “qualidade elusiva do material no pensamento feminista”, enquanto vários historiadores têm se voltado para o tema das commodities na história moderna, muitas vezes representadas por alimentos e por seu papel na história. Assim, pesquisadores como Mark Kurlansky vêm estudando a materialidade do bacalhau e do sal, enquanto Sophie e Michael Coe se voltaram ao chocolate, ao passo que Roy Moxham se debruçou sobre o chá. Esses são apenas alguns exemplos de trabalhos acadêmicos que trazem os objetos - ou, de maneira mais precisa, as coisas - para a centralidade dos seus estudos, nas mais variadas áreas e disciplinas.17 17 Cf. Beaudry; Hicks, op. cit, p. 02 e 03). As arqueólogas Louise Steel e Katharina Zinn explicam bem a importância desse crescente e interdisciplinar campo de pesquisa:

Objetos são essenciais para a produção, a distribuição e o consumo de alimentos, sejam eles moendas de pedra, recipientes (cestaria, cerâmica, latas e Tupperware), utensílios e equipamentos de cozinha, ou embalagens alimentares de marca, para ficar em alguns poucos exemplos. Esses artefatos estão entrelaçados em experiências cotidianas de alimentação; eles medeiam os - tanto quanto são mediados pelos - engajamentos incorporados pelas pessoas em relação aos alimentos por elas consumidos, bem como os locais onde esses alimentos são produzidos, preparados, permutados e consumidos.18 18 Steel; Zinn (2016, p. 3, tradução minha). Trecho original: Objects are central to the production, distribution and consumption of foodstuffs, be they grinding stones, containers (basketry, pottery, cans and Tupperware), cooking equipment and implements, or branded food wrappings, to name just a few examples. These artefacts are entangled within daily experiences of foodways; they mediate - as much as they are mediated by - people’s embodied engagements with the food consumed and the places where these foodstuffs are produced, prepared, exchanged and consumed.

Por muito tempo, contudo, historiadores se referiram à materialidade, dentro do seu campo de estudos, simplesmente no que concerne aos “objetos”, embora o conceito já englobe também - e principalmente - os significados que esses objetos possuem para as pessoas. Ele abarca, portanto, tudo aquilo que é produzido, utilizado, apropriado, vendido, comprado, presenteado, tomado, admirado, desprezado e amado pelo homem, em termos materiais. Em suma, a cultura material se ocupa não só das coisas, mas das relações que as coisas mantêm com as pessoas, não apenas na esfera individual e privada, mas também coletiva e pública.19 19 Cf. Gerristen; Riello (2014).

Nesse sentido, é importante compreender que o objeto pode e deve ser encarado para além de sua existência material e da funcionalidade a ele atribuída. As coisas possuem uma força material e simbólica também, não se limitando exclusivamente a um ou outro desses aspectos. Embora o simbolismo seja considerado pela maioria dos estudiosos como algo dependente da posição de quem interpreta e do contexto da interpretação, os objetos podem, frequentemente, parecer alheios a tais considerações - como se sua fisicalidade resolvesse suas funções e usos de forma final e indiscutível, quando eles, na verdade, convidam a respostas variáveis e interpretações diversas. Dessa forma, diferentes indivíduos e grupos sociais compreendem os objetos de maneiras distintas.20 20 Cf. Miller (1987).

Utensílios e equipamentos em uma cozinha podem, em um nível superficial, aparentar ter os mesmos usos tanto para uma empregada doméstica quanto para a sua patroa. Mas cada uma dessas mulheres, dadas suas vivências e contextos sociais, enxergará esses objetos de uma forma diferente. Como indica a historiadora Elizabeth Bortolaia Silva, o trabalho doméstico brasileiro se desenvolveu em torno de uma relação considerada afetuosa entre a casa a ser cuidada e a mulher, sendo a esta atribuído o papel de mantenedora da organização do lar. Contudo, o século XIX consolidou esses afazeres como um trabalho manual socialmente baixo, indigno e, portanto, malvisto, sendo evitado sempre que possível, primeiro através da escravidão negra feminina e depois com empregadas domésticas - pobres, quase sempre negras ou pardas, assalariadas, porém mal pagas e, muitas vezes, em condições de trabalho precárias. Uma maior abrangência do uso de eletrodomésticos começou a ser registrada a partir do final da década de 1940, principalmente nos centros urbanos mais desenvolvidos do país, alterando algumas dessas relações. Ainda assim, por muito tempo a indústria de utensílios domésticos nacional operou - e talvez seja possível dizer que vem operando - dentro de uma clara divisão das tarefas do lar entre masculinas e femininas, ficando este último grupo ainda responsabilizado pela sua boa manutenção. Em suma, desenvolveu-se uma cultura material entre esses objetos e, principalmente, as mulheres que os manipulavam, em suas diversas realidades sociais.21 21 Silva (1998).

O crescente interesse pelo estudo das coisas se deve, em parte, a uma maior compreensão acerca das formas pelas quais essa matéria impacta a sociedade, levando os estudiosos a reconhecer sua capacidade de agenciamento própria. Nesse sentido, trabalhos como o de Nicole Boivin são essenciais por traçar a relação da humanidade com as coisas - não apenas aquelas construídas pelo homem - desde épocas ditas pré-históricas. De fato, a arqueóloga demonstra como o acúmulo de objetos, cada vez mais complexos, tem ajudado, ao longo do tempo, a formar e transformar o ser humano, sobre ele exercendo uma influência própria. Dessa maneira, as pessoas estabelecem relações com as coisas que as rodeiam, tornadas essenciais por sua função e presença, em número cada vez maior nas sociedades de consumo pós-industriais. Assim, celulares tornam-se itens básicos do cotidiano, enquanto utensílios de cozinha cada vez mais específicos exigem novos usos, alterando até mesmo hábitos alimentares arraigados. Os objetos, em suma, agem sobre os indivíduos que os manipulam, transformando a relação em uma via de mão dupla em que as coisas também exercem papel ativo. Essa materialidade agiu e tem agido sobre a evolução humana, tanto no nível cognitivo como no biológico, o que pode ser observado mesmo - ou principalmente - na contemporaneidade. Boivin traz à tona um “mundo material” que, ainda que inanimado, não é passivo, cujas propriedades estéticas, emocionais e sensuais vêm dando forma à experiência humana por milhares de anos.22 22 Boivin, op. cit.

Nesse sentido, retirar dos utensílios e equipamentos de cozinha a condição de objetos históricos e torná-los documentos23 23 Interessa aqui uma explicação, ainda que breve, acerca desse processo. Para Ulpiano Meneses (1994), o objeto histórico é uma categoria social, conforme o objeto é entendido e utilizado socialmente. No caso do museu, o objeto histórico é o memento, o fetiche. Transformar o objeto em documento significa utilizá-lo não mais como parte do social ou categoria social, mas como categoria cognitiva, meio de conhecimento. Assim, é o trabalho do historiador que torna objeto em documento, não o fazendo falar, mas por ele e dele falando, ao empregar sobre ele uma metodologia de estudos. para a compreensão do passado implica desconstruir a trajetória desses objetos transformados em itens de coleção. Isso significa recontextualizá-los, traçando sua biografia a partir do meio social em que estavam inseridos. O documento, nos lembra Jacques Le Goff, “é antes de mais nada o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver”.24 24 Le Goff (1996, p. 537). As latas, portanto, são também documentos que podem e devem ser lidos pelos historiadores e demais cientistas sociais. A cultura dos enlatados é uma intersecção da cultura alimentar e material, e seu estudo pode levar a questionamentos mais aprofundados acerca da sociedade e de sua evolução ao longo do tempo.

O IMPÉRIO DAS LATAS

As comidas enlatadas foram criadas pelos britânicos, ainda no século XVIII, em sua contínua expansão marítima em busca de novos territórios para anexar ao seu crescente império. Surgiram como uma alternativa para as longas viagens de navio, quando os mantimentos eram particularmente vulneráveis às incertezas da jornada, pondo em risco toda a tripulação. Industrializadas e produzidas em larga escala, logo passariam a ser comercializadas como uma alternativa barata para a alimentação dos mais pobres, mas também como um produto fino de exportação.25 25 Cf. O’Connell (2015). Salmão, carnes, frutas e doces eram vendidos a outros países, o Brasil entre eles, como iguarias encontradas a altos preços em empórios e casas de importados, em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro e Recife.26 26 Cf. Freyre (1977).

Os enlatados não foram imediatamente aceitos nem usados de forma abrangente no país, mas algumas marcas, como a suíça Moça, acabariam angariando a confiança e simpatia do público ainda no início do século XX.27 27 Cf. Oliveira (2013). Empresas nacionais começaram a surgir, e algumas dominaram certos setores do mercado, como a Peixe, de Pernambuco, com seus doces - sendo a goiabada o carro-chefe - e principalmente seu molho de tomate.28 28 Cf. Galindo (2007). Ainda assim, as opções eram poucas e não muito variadas, ao menos até a Segunda Guerra Mundial. Os pracinhas da FEB tiveram que suportar uma dieta de latas e preparações estranhas ao paladar durante seu tempo na Itália, mas, com o fim do conflito, os brasileiros passariam a ter mais contato com a comida enlatada em geral. Empresas como a Swift e a Wilson começariam a produzir, principalmente no Sudeste do Brasil, uma grande variedade de enlatados, alguns deles até trazendo iguarias já consideradas típicas e simbolicamente brasileiras, como a feijoada. A partir da década de 1950, a propaganda em jornais e revistas retrataria os enlatados como opções práticas, baratas, nutritivas, higiênicas e gostosas para serem adquiridas nas prateleiras dos supermercados que iam surgindo no país. Saltando dos carrinhos de compras para as despensas das donas de casa brasileiras, as latas foram aos poucos se tornando emblemas de modernidade e poderio industrial, com seus rótulos chamativos e infinitas variações de preparo e serviço.29 29 Cf. Toscano (2019).

Se a produção de enlatados no Brasil demorou a deslanchar, contando inicialmente apenas com opções importadas e pouca variedade de produtos, o mesmo não se pode dizer dos Estados Unidos. Já a partir da segunda metade do século XIX, os norte-americanos tomaram gosto por esse tipo de alimento, tendo as grandes indústrias de carne de Chicago adotado a tecnologia, enquanto os produtores da Costa Leste desenvolviam mercados para salmão e atum enlatados. O aparecimento de novas empresas fez os preços caírem ainda mais - junto com a qualidade, muitas vezes -, e marcas fortes começaram a surgir entre o final do século XIX e o início do XX, tais como Heinz, Libby e Campbell’s. Uma vez que era impossível enxergar o conteúdo das embalagens metálicas, essas empresas começaram a investir pesadamente em publicidade e na beleza dos seus rótulos, ajudando a influenciar as escolhas dos consumidores. Por outro lado, o governo passou a exigir padrões de segurança alimentar dos fabricantes através do Pure Food and Drug Act, de 1906, o que resultou em produtos mais confiáveis.30 30 Cf. O’Connell, op. cit.

Os enlatados eram fáceis de transportar e podiam durar meses, em alguns casos até mesmo anos, fazendo com que fossem empregados também em restaurantes e instituições. Com o advento da Segunda Guerra Mundial, contudo, o metal necessário à sua produção passou a ser racionado, e os enlatados foram quase totalmente restringidos ao vasto consumo dos militares.31 31 Cf. Smith (2009). Aos civis norte-americanos, principalmente às donas de casa, restou dedicar-se a uma economia doméstica em tempos de guerra: programas de rádio, jornais e revistas estimulavam a produção de conservas caseiras de frutas e legumes, alguns deles obtidos em hortas próprias, plantadas em quintais; ou coletivas, em pátios de igrejas e escolas públicas, denominadas Jardins ou Hortas da Vitória. Ainda assim, havia algum racionamento e escassez temporária de certos produtos, principalmente da carne, que em sua maior parte, como se pode imaginar, era direcionada às necessidades das forças armadas.32 32 Cf. Bentley (1998).

ALIMENTAÇÃO E GUERRA

Havia um enorme esforço por parte do comando norte-americano de providenciar a melhor alimentação possível para seus soldados, estabelecendo cozinhas capazes de preparar grandes quantidades de refeições quentes. Isso ocorria desde o treinamento nas bases, ainda nos Estados Unidos, em que os recrutas eram servidos de frutas, cereais, bacon, ovos, torradas e manteiga no café da manhã. Para o almoço, havia legumes, peru assado com molho, purê, aspargos amanteigados, couve-flor ao creme, tortas de limão, bolos, conservas, sorvetes, café e chá. Se ao final do dia ainda estivessem com fome, era possível jantar bifes, batatas, ervilhas, sorvete de morango, pão com manteiga e mais café ou leite, tudo não apenas com qualidade, mas em quantidades gigantescas. Muitos dos rapazes - filhos da Grande Depressão (1920-1933), moradores de periferias ou vindos do interior - jamais haviam comido tanto e tão bem em sua vida e, mesmo com o treinamento vigoroso do exército, se viram ganhando entre quatro e nove quilos cada um, por mês.33 33 Cf. Collingham (2013).

Com novas descobertas no campo da nutrição, além de uma população que cobrava ferozmente o governo em relação ao tratamento dado às tropas, o comando militar colocava em prática uma política de abundância alimentar com a qual os próprios recrutas norte-americanos não estavam acostumados. Contudo, nem sempre era possível reunir os soldados em refeitórios, especialmente os que estavam na linha de frente e efetivamente combatendo o inimigo, de forma que as refeições regulares eram muitas vezes substituídas por rações. Estas eram organizadas de acordo com o tipo de ação esperado para os dias seguintes, sendo catalogadas por letras e tendo conteúdos diferentes. A ração B contava com três tipos de carne diferentes, quatro vegetais, uma sobremesa e fruta enlatada ou suco de frutas, totalizando pouco mais de dois quilos de alimento alocados para cada soldado por dia. A ideia era que a ração B fosse preparada em cozinhas de campo e servida quente, o que nem sempre era possível. Assim, não era raro que seu conteúdo fresco fosse todo ou em parte substituído por equivalentes enlatados, que eram comidos frios ou, quando possível, aquecidos, usando equipamento apropriado para este fim, como mostra a imagem 03.34 34 Ibid.

A ração do tipo C foi criada tendo uma política de subsistência em mente, para locais onde havia considerável risco de o abastecimento ser comprometido, a ponto de não ser possível fazer os suprimentos chegarem até os homens. Cada pacote consistia em três latas contendo carne guisada, porco com feijão e picadinho de carne, biscoitos, café e açúcar, em quantidade suficiente para durar, em teoria, até uma semana. Já os soldados diretamente envolvidos em combates no front recebiam a chamada K Rations, mostrada na Figura 2, cuja funcionalidade merece uma explicação mais demorada: a parte da frente das caixinhas trazia as instruções de uso, lembrando o soldado de que o invólucro interno era à prova d’água e podia ser utilizado para manter secos fósforos, cigarros e outros itens. Também se recomendava que, após o uso, a embalagem fosse escondida, por medida de segurança, para que sua presença não denunciasse o movimento das tropas. O avesso do pacote trazia um menu indicando o que os homens encontrariam dentro da latinha e sugestões de uso. A carne com ovos do desjejum, por exemplo, deveria ser consumida fria, bem como a barrinha de frutas, mas esta poderia ser transformada em uma espécie de geleia quando aquecida por três a cinco minutos em cerca de quatro colheres de água.35 35 Cf. Ribeiro, op. cit.

Figura 1
O capitão Daniel Cristóvão, do Rio de Janeiro, discute as necessidades alimentares da Força Expedicionária Brasileira (FEB) junto com os colegas norte-americanos, o tenente Kunz e o capitão Kirst, em novembro de 1944, com o inverno à espreita. Atrás deles, uma verdadeira parede de caixas contendo a ração enlatada “10 por 1”.

Figura 2
Kit de cocção para quando os soldados conseguiam acesso a um fogareiro e era possível ao menos esquentar a comida. A panela possui um cabo dobrável, que age também para selar o conjunto. A tampa serve ainda de marmita, com uma divisão simples no meio, separando os itens do cardápio.

O conjunto todo proporcionava apenas 3 mil calorias em três refeições, contando com carne enlatada, vitela, salsichas, barrinha de frutas, bolachas, queijo e um cubinho para preparar caldo de legumes. Havia ainda tabletes de adoçante, cristais de limão para dissolver em água, chicletes, cigarros, papel higiênico, sabonete, tabletes purificadores de água e, claro, um abridor de latas.36 36 Cf. Collingham, op. cit.

Figura 3
A famosa ração K do exército norte-americano, em três versões: café da manhã, ceia, e jantar - a primeira refeição mostrando o verso da embalagem, com uma breve descrição do seu conteúdo.

As rações norte-americanas totalizavam uma ingesta diária de 4.748 calorias, em média (com exceção da K), superior à que era proporcionada por todos os outros exércitos envolvidos no conflito, inclusive dos Aliados. No ápice do seu poderio, a Alemanha conseguia garantir um consumo diário de 4 mil calorias para seus soldados, mas outros combatentes, como os japoneses no Pacífico, por exemplo, não chegavam a metade desse valor, ao passo que os soviéticos muitas vezes lutavam de estômago praticamente vazio. Enquanto isso, os norte-americanos frequentemente rejeitavam os itens que não lhes apeteciam ou que já estavam enjoados de comer, como flocos de repolho e os tais cristais de limão, tão ácidos que eram praticamente intragáveis. Junto às comidas recusadas, eram descartadas incontáveis latas, que deixavam uma trilha atrás das tropas norte-americanas por onde quer que passassem. Eram em quantidades tão absurdas que, por vezes, seu brilho metálico era capaz de entregar os movimentos e a posição dos soldados a aeronaves inimigas. O uso de enlatados foi tão generalizado e a guerra tão longa que houve tempo para escutar as queixas dos homens e desenvolver invólucros mais eficientes, que podiam ser abertos com mais facilidade e eram até capazes de esquentar seu conteúdo por conta própria. Outra reclamação frequente era a pouca variedade do cardápio, de modo que novos alimentos começaram a surgir: rosbife, almôndegas, espaguete, bacon, batatas desidratadas, cebolas e sopa de vegetais, além de leite em pó, tudo acondicionado em latas.37 37 Ibid.

A FEB E AS SCATOLETTAS

Eram as latas que atendiam às necessidades também dos brasileiros enviados para lutar na Itália, fazendo uso, em sua maior parte, de armas, equipamentos e materiais fornecidos pelos Estados Unidos. Aos pracinhas eram distribuídas as mesmas rações consumidas pelos norte-americanos, sendo a K denominada de “assalto”, a C de “combate”, e a B de “operacional”, de consumo diário, salvo durante patrulhas ou ataques. Esta última abrangia as três refeições do dia, começando com o “café, pela manhã, com leite, pão, geleia ou manteiga de amendoim e extrato de tomate”. Em seguida, vinham o “almoço e o jantar, com carne, às vezes galinha e o peru, como no Natal, em que todas as forças aliadas, em operações na Europa, serviram-se desta ave tão apreciada, feijão, arroz, frutas ou suco de frutas, ovos, pão, doces, café, cigarros e fósforos”,38 38 Branco, op. cit., p. 311. conforme explica o tenente-coronel Manoel Thomaz Castello Branco em obra memorialística publicada apenas em 1960. Além das rações citadas, havia a designada “de emergência”, composta por uma barra de chocolate concentrado,39 39 Lizzie Collingham (op. cit.) conta que esses chocolates eram tratados mais como barras energéticas do que como uma sobremesa pelos estadunidenses. Eram fabricados pela Hershey’s, sendo altamente calóricos e propositalmente criados para serem pouco apetitosos, de forma que os soldados só os consumissem durante uma necessidade real. Eram apelidados de D Rations pelos homens, que os detestavam e não se importavam em distribuí-los à população de cidades libertadas, especialmente entre as crianças, ajudando a cimentar a fama de generosidade dos norte-americanos e, provavelmente, a dos brasileiros também. Já Joaquim Xavier da Silveira (op. cit.), autor de A FEB por um soldado, afirma que esses doces eram muito desejados e, portanto, desapareciam rapidamente, mesmo quando não havia uma emergência que justificasse seu consumo. É possível que os brasileiros, desacostumados com o chocolate, o tratassem como uma iguaria, diferentemente dos colegas norte-americanos, que já o consumiam há muito mais tempo. e a denominada “10 por 1”, contendo dez refeições em um único recipiente, para uso coletivo, como se pode ver na Figura 1. No inverno, distribuíram-se ainda cápsulas multivitamínicas - duas ao dia para cada homem em posição -, além de tabletes de sal no verão. As unidades buscavam cumprir a diretriz de fornecer aos seus homens ao menos uma refeição quente por dia, mesmo que se encontrassem em plena ofensiva. Quando possível, montavam-se cozinhas de campo, mas muitas vezes era preciso improvisar, como mostra a figura 4.40 40 Cf. Branco, op. cit.

Figura 4
Sentado em um caixote e improvisando uma bancada, o soldado Antônio Martins, de Itatiba (SP), prepara uma grande quantidade de galinhas na cidade italiana de Ponte San Pietro, em setembro de 1944, ajudando a alimentar os civis locais. A felicidade de todos é bastante compreensível, já que a ave vai proporcionar uma refeição quente e fresca, possivelmente com um tempero mais à brasileira, bem diferente dos enlatados norte-americanos.

Compreensivelmente, o momento da “boia” era um dos mais esperados no cotidiano dos pracinhas, não apenas pela comida em si, mas também pela oportunidade de relaxar e socializar em meio ao conflito. Esse cotidiano foi cronizado pelo correspondente da BBC Francis Hallawell, brasileiro de pais britânicos que mostrou, através de suas entrevistas e transmissões radiofônicas, um lado mais íntimo da campanha da FEB na Itália, em difusão realizada para o Brasil:

A segunda parte do nosso programa descreve a hora do rancho. É natural que homens moços e em ótima forma sintam fome na sagrada hora do rancho. É natural também que acorram à bicha que se estende diante da cozinha de campanha, cada soldado empunhando sua marmita e contando ansioso os segundos, os minutos, os quartos de hora que o separam da meta: o caldeirão sob a guarda do pessoal da cozinha. Nosso correspondente especial manda nos contar que esta fila, onde a inatividade é forçada, funciona como uma espécie de fórum da tropa. Mas não se discutem nem ventilam coisas graves e profundas. Ganham-se apelidos, contam-se anedotas, desprende-se naqueles instantes todo o bom humor, às vezes cáustico, sempre pitoresco, dos homens que amanhã vão lutar.41 41 O Onze…, op. cit.

A chamada servia de introdução para Hallawell, o “Chico da BBC”, como era conhecido, que teve a oportunidade de conviver com os soldados e gravar suas declarações, muitas vezes perceptivelmente ensaiadas para as entrevistas. Afirmando que os homens estavam ansiosos pela gororoba e que, afinal de contas, nem jipe funciona sem gasolina, o engenheiro transformado em repórter dava a palavra ao pessoal da cozinha. O menu daquele dia, segundo um sargento, consistia em canja, arroz, feijão, carneiro assado e sobremesa. Já a dificuldade mais grave do serviço era quando o fogão “dava para trás”, enquanto a maior vantagem para os cozinheiros era estar em alta conta com as “pequenas” locais, deixando implícito que era com eles que as italianas preferiam se relacionar, por motivos evidentes. Em tom de brincadeira, um cabo esclarecia que, mesmo com o inverno se aproximando, não poderia ter o calor do fogão apenas para si, posto que os regulamentos estritos o proibiam de levar o equipamento para dentro de uma barraca.42 42 Ibid. Mas nem sempre era possível servir uma refeição fresca preparada por cozinheiros, de modo que os brasileiros frequentemente precisavam se resignar aos enlatados, como fazem os soldados da Figura 5.

Figura 5
Protegida por uma elevação, uma companhia de fuzileiros da FEB faz uma pausa para a alimentação, com equipamentos e rifles repousando na relva. O caixote de madeira na parte inferior da foto continha a ração tipo C distribuída entre os homens, que dessa vez não tiveram o luxo de receber uma refeição quente: todos eles comem direto das latas.

As latas norte-americanas eram uma constante no cotidiano dos pracinhas, por eles apelidadas de scatolettas (literalmente “caixinhas” em italiano). Produzidas em massa nos Estados Unidos e levadas ao front onde quer que lutassem norte-americanos e seus aliados, eram uma inevitabilidade para os soldados. Os enlatados, criados para serem relativamente leves e portáteis, eram de fácil transporte, estocagem e distribuição, além de apresentarem grande durabilidade. Se, por um lado, os brasileiros frequentemente se alimentavam a contragosto do seu conteúdo, por outro, logo encontraram novos usos para as embalagens metálicas. Tiravam proveito de sua resistência e impermeabilidade para, quando esvaziadas, nelas guardar objetos de valor ou mesmo dinheiro vivo, no intuito de negociar com a população local. As liras italianas, contudo, possuíam pouco ou nenhum valor para os camponeses próximos demais do front, que preferiam que os brasileiros recheassem os cartuchos metálicos com algo mais útil naqueles tempos.43 43 Cf. Silveira, op. cit.

Três velas e um pedaço de sabão poderiam persuadir uma mulher local a lavar a roupa da semana, enquanto uma barra de chocolate e alguma goma de mascar compravam meia dúzia de ovos frescos. Havia também um outro tipo de escambo, ainda mais escamoteado, porém praticado por norte-americanos e brasileiros: eles se valiam do conteúdo de suas scatolettas para obter favores sexuais de italianas desesperadas que, muitas vezes, só conseguiam alimentar suas famílias - marido incluso - se prostituindo para a soldadesca.44 44 Cf. Esquenazi, op. cit. Essas negociações não eram bem vistas pelo comando do Exército brasileiro, mas os soldados seguiam realizando suas trocas com os civis, de modo que “scatoletta” passou a ser sinônimo desse escambo, quase cotidiano, praticado até pelos oficiais mais graduados, como pode ser visto na Figura 6. Era a ração de assalto (ou seja, a K) que costumava ser oferecida aos italianos, que em troca disponibilizavam um pouco de comida local - qualquer tanto que fosse para quebrar a monotonia dos enlatados norte-americanos.45 45 Cf. Silveira, op. cit.

Figura 6
A arte do escambo era uma realidade cotidiana e inescapável na Itália ocupada. Aqui, duas camponesas carregam frutas - peras, ao que parece - e as oferecem ao comandante da FEB, general Mascarenhas de Moraes, em visita ao front. Ele as aceita, presenteando as mulheres com cigarros brasileiros, à guisa de pagamento.

Os doces, tais como biscoitos, chocolates, caramelos e gomas de mascar, junto com os cigarros, eram o que a população mais buscava entre as tropas dos Aliados. Homens, mulheres e crianças emaciadas compareciam em massa ao desembarque de soldados nos portos, mendigando scatolettas com mãos estendidas e vozes chorosas.46 46 Cf. Esquenazi, op. cit. Apartados daquela fome europeia e bem servidos pela intendência do exército dos Estados Unidos, os brasileiros chegariam a se fartar dessa comida que era disputada pelos civis reduzidos à miséria alimentar pela guerra. As latas foram, portanto, um dos elementos mais marcantes do tempo dos pracinhas na Itália, enquanto objetos que se encontravam presentes de forma quase incontornável em seu cotidiano. Seu uso ajudou a moldar os gestos, pensamentos e sentimentos daqueles homens, e em alguns casos até mesmo o seu linguajar, tanto quanto as armas que carregavam ou os uniformes que vestiam. Diferentemente destes últimos, contudo, os enlatados continuariam em suas vidas após o fim do conflito, surgindo com mais frequência atrás dos balcões das mercearias e nas prateleiras dos futuros supermercados, de onde, mesmo nos dias atuais, continuam exercendo uma forma própria de agenciamento da matéria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os enlatados foram uma inovação tecnológica que permitiu maior durabilidade e portabilidade de certos alimentos, sendo de início explorados comercialmente ainda no século XIX, principalmente em países mais industrializados, como a Inglaterra e os Estados Unidos. As facilidades obtidas com essa nova forma de processamento acabariam se mostrando essenciais durante a Segunda Guerra Mundial, quando era necessário alimentar milhares de combatentes de forma eficiente, higiênica e nutritiva, em diversas partes do mundo, por vezes em plena ofensiva. As latas, contudo, exerceram seu próprio poder de agenciamento sobre os soldados que as manipulavam, levando-os a desenvolver para elas novos usos, por vezes bastante diversos dos originalmente pensados. Eram objetos, portanto, inanimados, mas nem por isso passivos em sua relação com os soldados da FEB em campanha na Itália entre 1944 e 1945, lutando ao lado dos Aliados. As latas, enfim, foram ressignificadas pelos pracinhas e afetuosamente apelidadas pela sua denominação em italiano, “scatolettas”, de modo que eles as transformaram e foram por elas transformados também.

REFERÊNCIAS ARQUIVOS SONOROS

  • AER111 - Com a FEB na Itália, nº 3 e nº 4. A Hora do rancho, a Hora da mala postal, sem data. Collector’s. Rio de Janeiro.

ARTIGOS, LIVROS E TESES

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  • 2
    Boivin (2008)BOIVIN, Nicole. Material cultures, material minds: the impact of things on human thought, society and evolution. Cambridge: Cambridge University Press, 2008..
  • 3
    Cf. Beaudry; Hicks (2018)BEAUDRY, Mary C.; HICKS, Dan (eds.). The Oxford handbook of material culture studies. Oxford: Oxford University Press, 2018..
  • 4
    Branco (1960)BRANCO, Manoel Thomaz Castello. O Brasil na II Grande Guerra. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1960..
  • 5
    Silveira (1989)SILVEIRA, Joaquim Xavier. A FEB por um soldado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989..
  • 6
    Ribeiro (2006)RIBEIRO, Maria Izabel Branco (org.). O Brasil e Monte Castelo: memória do Exército Brasileiro e do Jornal do Brasil. São Paulo: Fundação Álvares Penteado, 2006..
  • 7
    AER111 - Com a FEB na ItáliaAER111 - Com a FEB na Itália, nº 3 e nº 4. A Hora do rancho, a Hora da mala postal, sem data. Collector’s. Rio de Janeiro., nº 3 e nº 4 (sem data).
  • 8
    Esquenazi (2013)ESQUENAZI, Rosamary. “Aqui fala Francis Hallawell, o Chico da BBC”: o correspondente na imprensa e no rádio na Segunda Guerra Mundial. 2013. Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013..
  • 9
    Isso dentro de uma abordagem historiográfica clássica. Contudo, já há algum tempo que pesquisadores defendem que o conflito teria se iniciado antes, ainda em 1937, com a invasão do Japão à China, conhecida como Segunda Guerra Sino-Japonesa.
  • 10
    Braudel (1965)BRAUDEL, Fernand. História e ciências sociais: a longa duração. Revista de História, São Paulo, v. 30, n. 62, p. 261-294, 1965..
  • 11
    Ibid.
  • 12
    Boivin, op. cit.BOIVIN, Nicole. Material cultures, material minds: the impact of things on human thought, society and evolution. Cambridge: Cambridge University Press, 2008.
  • 13
    Markosian (2000)MARKOSIAN, Ned. What are physical objects? Philosophy and Phenomenological Research, Providence, v. 61, n. 2, p. 375-395, 2000..
  • 14
    Cf. Costa; Viana (2019)COSTA, Diogo Menezes; VIANA, Sibeli A. Materializando a história: o passado humano através da cultura material. Revista Mosaico, Goiânia, v. 12, p. 3-13, 2019..
  • 15
    Certeau; Giard; Mayol (2013)CERTEAU, Michel de; GIARD, Luce; MAYOL, Pierre. A invenção do cotidiano: morar, cozinhar. Rio de Janeiro: Vozes, 2013. v. 2..
  • 16
    Cf. Auslander (2005)AUSLANDER, Leora. Beyond words. The American Historical Review, Washington, DC, v. 110, n. 4, p. 1015-1045, 2005..
  • 17
    Cf. Beaudry; Hicks, op. citBEAUDRY, Mary C.; HICKS, Dan (eds.). The Oxford handbook of material culture studies. Oxford: Oxford University Press, 2018., p. 02 e 03).
  • 18
    Steel; Zinn (2016STEEL, Louise; ZINN, Katharina (eds.). Exploring the materiality of food ‘stuffs’: transformations, symbolic consumption and embodiments. Abingdon: Routledge, 2016., p. 3, tradução minha). Trecho original: Objects are central to the production, distribution and consumption of foodstuffs, be they grinding stones, containers (basketry, pottery, cans and Tupperware), cooking equipment and implements, or branded food wrappings, to name just a few examples. These artefacts are entangled within daily experiences of foodways; they mediate - as much as they are mediated by - people’s embodied engagements with the food consumed and the places where these foodstuffs are produced, prepared, exchanged and consumed.
  • 19
    Cf. Gerristen; Riello (2014)GERRISTEN, Anne; RIELLO, Giorgio (orgs.). Writing material culture history. London: Bloomsbury Publishing, 2014..
  • 20
    Cf. Miller (1987)MILLER, Daniel. Material culture and mass consumption. Oxford: Basil Blackwell, 1987..
  • 21
    Silva (1998)SILVA, Elizabeth Bortolaia. Tecnologia e vida doméstica nos lares. Cadernos Pagu, Campinas, n. 10, p. 21-52, 1998..
  • 22
    Boivin, op. cit.BOIVIN, Nicole. Material cultures, material minds: the impact of things on human thought, society and evolution. Cambridge: Cambridge University Press, 2008.
  • 23
    Interessa aqui uma explicação, ainda que breve, acerca desse processo. Para Ulpiano Meneses (1994)MENESES, Ulpiano T. Bezerra de. Do teatro da memória ao laboratório da história: a exposição museológica e o conhecimento histórico. Anais do Museu Paulista, São Paulo, v. 2, n. 1, p. 9-42, 1994., o objeto histórico é uma categoria social, conforme o objeto é entendido e utilizado socialmente. No caso do museu, o objeto histórico é o memento, o fetiche. Transformar o objeto em documento significa utilizá-lo não mais como parte do social ou categoria social, mas como categoria cognitiva, meio de conhecimento. Assim, é o trabalho do historiador que torna objeto em documento, não o fazendo falar, mas por ele e dele falando, ao empregar sobre ele uma metodologia de estudos.
  • 24
    Le Goff (1996LE GOFF, Jacques. Documento/monumento. In: LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas: Editora da Unicamp, 1996. p. 535-553., p. 537).
  • 25
    Cf. O’Connell (2015)O’CONNELL, Libby Haight. The American plate: a culinary history in 100 bites. Naperville: Sourcebooks, 2015..
  • 26
    Cf. Freyre (1977)FREYRE, Gilberto. Ingleses no Brasil: aspectos da influência britânica sobre a vida, a paisagem e a cultura do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1977..
  • 27
    Cf. Oliveira (2013)OLIVEIRA, Débora. Dos cadernos de receitas às receitas de latinha: indústria e tradição culinária no Brasil. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2013..
  • 28
    Cf. Galindo (2007)GALINDO, Betânia Flávia Cavalcanti. A Cidade das Chaminés: história da industrialização de Pesqueira. 2007. Dissertação (Mestrado em Administração) - Faculdade Boa Viagem, Recife, 2007..
  • 29
    Cf. Toscano (2019)TOSCANO, Frederico de Oliveira. Yes, nós temos Coca-Cola: o ideal da fartura norte-americana na mesa do Nordeste (1930-1964). 2019. Tese (Doutorado em História Social) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019..
  • 30
    Cf. O’Connell, op. cit.O’CONNELL, Libby Haight. The American plate: a culinary history in 100 bites. Naperville: Sourcebooks, 2015.
  • 31
    Cf. Smith (2009)SMITH, Andrew F. Eating history: 30 turning points in the making of American cuisine. New York: Columbia University Press, 2009..
  • 32
    Cf. Bentley (1998)BENTLEY, Amy. Eating for victory: food rationing and the politics of domesticity. Champaign: University of Illinois Press, 1998..
  • 33
    Cf. Collingham (2013)COLLINGHAM, Lizzie. The taste of war: World War II and the battle for food. New York: Penguin Books, 2013..
  • 34
    Ibid.
  • 35
    Cf. Ribeiro, op. cit.RIBEIRO, Maria Izabel Branco (org.). O Brasil e Monte Castelo: memória do Exército Brasileiro e do Jornal do Brasil. São Paulo: Fundação Álvares Penteado, 2006.
  • 36
    Cf. Collingham, op. cit.COLLINGHAM, Lizzie. The taste of war: World War II and the battle for food. New York: Penguin Books, 2013.
  • 37
    Ibid.
  • 38
    Branco, op. cit.BRANCO, Manoel Thomaz Castello. O Brasil na II Grande Guerra. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1960., p. 311.
  • 39
    Lizzie Collingham (op. cit.)COLLINGHAM, Lizzie. The taste of war: World War II and the battle for food. New York: Penguin Books, 2013. conta que esses chocolates eram tratados mais como barras energéticas do que como uma sobremesa pelos estadunidenses. Eram fabricados pela Hershey’s, sendo altamente calóricos e propositalmente criados para serem pouco apetitosos, de forma que os soldados só os consumissem durante uma necessidade real. Eram apelidados de D Rations pelos homens, que os detestavam e não se importavam em distribuí-los à população de cidades libertadas, especialmente entre as crianças, ajudando a cimentar a fama de generosidade dos norte-americanos e, provavelmente, a dos brasileiros também. Já Joaquim Xavier da Silveira (op. cit.)SILVEIRA, Joaquim Xavier. A FEB por um soldado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989., autor de A FEB por um soldado, afirma que esses doces eram muito desejados e, portanto, desapareciam rapidamente, mesmo quando não havia uma emergência que justificasse seu consumo. É possível que os brasileiros, desacostumados com o chocolate, o tratassem como uma iguaria, diferentemente dos colegas norte-americanos, que já o consumiam há muito mais tempo.
  • 40
    Cf. Branco, op. cit.BRANCO, Manoel Thomaz Castello. O Brasil na II Grande Guerra. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1960.
  • 41
    O Onze…, op. cit.
  • 42
    Ibid.
  • 43
    Cf. Silveira, op. cit.SILVEIRA, Joaquim Xavier. A FEB por um soldado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.
  • 44
    Cf. Esquenazi, op. cit.ESQUENAZI, Rosamary. “Aqui fala Francis Hallawell, o Chico da BBC”: o correspondente na imprensa e no rádio na Segunda Guerra Mundial. 2013. Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013.
  • 45
    Cf. Silveira, op. cit.SILVEIRA, Joaquim Xavier. A FEB por um soldado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.
  • 46
    Cf. Esquenazi, op. cit.ESQUENAZI, Rosamary. “Aqui fala Francis Hallawell, o Chico da BBC”: o correspondente na imprensa e no rádio na Segunda Guerra Mundial. 2013. Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    13 Abr 2020
  • Aceito
    13 Jul 2020
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