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Considerações sobre saúde indígena no Brasil a partir de alguns estudos antropológicos fundadores

Considerations on indigenous health in Brazil from some founding anthropological studies

Resumo

O artigo aborda um conjunto de pesquisas etnográficas, realizadas sobretudo nos anos 1980, que marcaram indelevelmente uma vertente dos estudos antropológicos sobre saúde e doença entre os povos indígenas no Brasil. Parte da categoria ‘doença de branco’ para apresentar como esses estudos, embasados em construtos teóricos da etnologia indígena, deslocaram os debates cristalizados em torno da lógica das etnomedicinas e sua eficácia para as diferenças ancoradas nas teorias ameríndias de substancialidade. Nesta abordagem, os debates sobre a política de saúde, envolvendo a política indígena e o diálogo interdisciplinar, já estão dados inicialmente na produção antropológica e convergem para o caráter implicado do fazer etnográfico.

Palavras-chave
Saúde indígena; Relações de substância; Saúde e doença; Políticas públicas

Abstract

The article addresses a set of ethnographic research, carried out mainly in the 1980s situated within anthropological studies on health and illness among Brazilian indigenous peoples. Based on the theoretical constructs of indigenous ethnology, it departs from the category ‘doença de branco’ (white people’s illness) to argue that these studies displaced the crystallized debates around the logic of the ethnomedicines and their efficacy in favor of differences anchored in the Amerindian theories of substantiality. In this approach, the health policy debates involving indigenous politics and an interdisciplinary dialogue are initially already given in the anthropological production and converge upon the implicated character of the ethnographic practices themselves.

Keywords
Indigenous health; Substance relationships; Health and illness; Public policies

INTRODUÇÃO

O campo de estudos da saúde indígena consolidou-se no Brasil em função das mudanças históricas decorrentes da abertura democrática pós-ditadura, que culminaram na aprovação da atual Constituição brasileira. Para os povos indígenas, a Constituição Federal de 1988 foi um marco significativo, uma vez que reconheceu importantes reivindicações do movimento indígena e garante até hoje aos índios que habitam o país o estatuto de cidadãos plenos, com direitos diferenciados. Este foi um momento significativo da história brasileira, também no sentido de estabelecer novas bases para a política nacional de assistência à saúde. No âmbito da reforma sanitária, os princípios de universalidade, integralidade e equidade de acesso aos serviços públicos de saúde, regulamentados no texto constitucional, juntamente com a queda do dispositivo tutelar, propiciaram as condições para a criação de um Subsistema de Atenção à Saúde Indígena como parte do Sistema Único de Saúde (SUS). Estruturou-se,desde 1999, uma rede de atenção básica nas terras indígenas1 1 Outra diferença é a proposta de prestar um tipo de atenção diferenciada, articulada às práticas locais de saúde. Para mais detalhes sobre a política de atenção à saúde indígena, ver, entre outros, Cardoso (2015), Garnelo (2014), Buchillet (2007) e Langdon (2004). , cujo modelo federalizado de gestão, organizado em distritos sanitários, difere dos demais serviços de saúde do SUS, os quais têm a gestão municipalizada. Os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) correspondem à distribuição territorial, bem como a particularidades socioculturais, demográficas e epidemiológicas dos mais de 300 povos indígenas que vivem no país, não se atendo às divisões geopolíticas dos municípios e estados brasileiros.

A implantação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena foi impulsionada por debates públicos, em instâncias de participação política, sobre os variados problemas de saúde que acometiam (e ainda acometem) as populações indígenas, decorrentes sobretudo do contato com a sociedade nacional. A 1a Conferência Nacional de Saúde do Índio, ocorrida em 1986 como um desdobramento da 8a Conferência Nacional de Saúde, foi um evento fundamental para a articulação do movimento indígena e agentes indigenistas ao movimento de reforma sanitária. De modo que, ao se propor os princípios constitucionais do SUS, foram lançadas as bases para o atual modelo de atenção à saúde dos povos indígenas (Buchillet, 2007Buchillet, D. (2007). Bibliografia crítica da saúde indígena no Brasil (1844-2006). Abya-Yala.; Teixeira & Dias da Silva, 2013Teixeira, C. C., & Dias da Silva, C. (2013). Antropologia e saúde indígena: mapeando marcos de reflexão e interfaces de ação. Anuário Antropológico, 38(1), 35-57. https://doi.org/10.4000/aa.374
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; Pontes et al., 2019Pontes, A. L. M., Machado, F. R. S., Santos, R. V., & Gomes de Brito, C. R. (2019). Diálogos entre indigenismo e Reforma Sanitária: bases discursivas da criação do subsistema de saúde indígena. Saúde em Debate, 43(8), 146-159. https://doi.org/10.1590/0103-11042019S811
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). Até aquele período, a política de assistência à saúde das populações indígenas se pautara num modelo verticalizado e campanhista, com ações pontuais e regionalizadas, orientado, inclusive, pela necessidade de evitar que as doenças epidêmicas que acometiam os indígenas não se espalhassem entre as populações regionais (Hochman & Silva, 2014Hochman, G., & Silva, R. (2014). Campanhas públicas, populações (quase) invisíveis: endemias rurais e indígenas na saúde pública brasileira. In C. C. Teixeira & L. Garnelo (Orgs.), Saúde INDÍGENA EM PERSPECTIVA: explorando suas matrizes históricas e ideológicas (pp. 85-105). Ed. Fiocruz.; Arouca & Lima, 2014Arouca, C., & Lima, N. T. (2014). Antropologia e medicina: a saúde no Serviço de Proteção aos Índios (1942-1956). In C. C. Teixeira & L. Garnelo (Orgs.), Saúde indígena em perspectiva: explorando suas matrizes históricas e ideológicas (pp. 59-83). Ed. Fiocruz.).

A ocorrência de uma grave epidemia de malária originada do garimpo ilegal no território yanomami, na virada para os anos 1990 (Garnelo, 2014Garnelo, L. (2014). O SUS e a saúde indígena: matrizes políticas e institucionais do subsistema de saúde indígena. In C. C. Teixeira & L. Garnelo (Orgs.), Saúde Indígena em Perspectiva: explorando suas matrizes históricas e ideológicas (pp. 107-142). Ed. Fiocruz.; Ramos, 1993Ramos, A. (1993). O papel político das epidemias: o caso Yanomami (Série Antropologia, n. 153). UnB.), foi um evento que mobilizou atenção e esforços do movimento indígena, como também de acadêmicos e agentes ligados a organizações não governamentais, governo, instituições religiosas, entre outras esferas, para garantir os direitos civis dos Yanomami. Além do elevado número de mortes na população yanomami, a invasão e a destruição da floresta amazônica gerou fortes pressões e denúncias internacionais, que levaram à homologação da Terra Indígena Yanomami, em 1991, bem como à criação do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami. Assim, este distrito sanitário foi uma primeira experiência do novo modelo em discussão, implantado antes mesmo da criação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena.

Além disso, anteriormente, no Parque Indígena do Xingu, já havia um projeto de saúde com um modelo mais adequado às necessidades locais. Os indígenas que estavam vivendo naquela área não tinham acesso a serviços de saúde e estavam morrendo de infecções simples, então, poucos anos após a criação do parque, em 1965, estabeleceu-se um programa de cooperação com a Escola Paulista de Medicina. Esta foi a primeira proposta de atendimento a povos indígenas orientada à assistência de saúde integral e continuada, objetivando a prevenção de doenças, e a articular práticas médicas com as práticas terapêuticas indígenas. Essa iniciativa no Xingu é representativa, ainda, do modo como se entrelaçam as ações em saúde e as pesquisas no campo da saúde indígena no Brasil (Baruzzi & Junqueira, 2005Baruzzi, R., & Junqueira, C. (2005). (Orgs.). Parque Indígena do Xingu - SAúDE, CULTURA E HISTÓRIA. Terra Virgem.; Mendonça et al., 2019Mendonça, S. B. M., Rodrigues, D., & Pereira, P. P. G. (2019). Modelo de atenção à saúde indígena: o caso do DSEI Xingu. Cadernos de Saúde Pública, 35(Supl. 3), e00008119. https://doi.org/10.1590/0102-311X00008119
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).

Cabe ressaltar que o processo de elaboração das diretrizes da política de saúde indígena, no influxo do movimento indígena, do movimento de reforma sanitária e do indigenismo, constituiu-se com a participação de acadêmicos de diversas áreas da saúde e das ciências sociais. No histórico da implementação desta política pública, uma característica recorrente é que as intervenções em saúde tenham se valido da colaboração direta ou indireta de antropólogos (Langdon, 2004Langdon, E. J. (2004). Uma avaliação crítica da atenção diferenciada e a colaboração entre antropologia e profissionais de saúde. In E. J. Langdon & L. Garnelo (Orgs.), Saúde dos povos indígenas: reflexões sobre antropologia participativa (pp. 25-45). Contracapa/ABA.). Por outro lado, deve-se levar em conta que o despontar de novos objetos de investigação decorrente de mudanças históricas e sociais é próprio da produção de conhecimento em antropologia, o que explica, em parte, o interesse antropológico neste tema.

Se o crescente volume de publicações sobre saúde indígena, a partir dos anos 2000, torna evidente sua inserção interdisciplinar, pode-se considerar, por outro lado, que saúde indígena é um adensamento temático na antropologia brasileira. As análises de Teixeira e Dias da Silva (2013)Teixeira, C. C., & Dias da Silva, C. (2013). Antropologia e saúde indígena: mapeando marcos de reflexão e interfaces de ação. Anuário Antropológico, 38(1), 35-57. https://doi.org/10.4000/aa.374
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e de Kabad et al. (2020)Kabad, J. F., Pontes, A. L. M., & Monteiro, S. (2020). Relações entre produção cientifica e políticas públicas: o caso da área da saúde dos povos indígenas no campo da saúde coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, 25(5), 1653-1665. https://doi.org/10.1590/1413-81232020255.33762019
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, fundamentadas na produção acadêmica neste tema, apontam para o predomínio da produção da saúde coletiva nessa área e para a diversidade crescente de disciplinas envolvidas com a temática. Kabad et al. (2020)Kabad, J. F., Pontes, A. L. M., & Monteiro, S. (2020). Relações entre produção cientifica e políticas públicas: o caso da área da saúde dos povos indígenas no campo da saúde coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, 25(5), 1653-1665. https://doi.org/10.1590/1413-81232020255.33762019
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produziram um mapeamento temporal dos artigos sobre saúde indígena, da década de 1950 até o presente, demonstrando uma associação entre questões políticas e sociais emergentes em relação ao relevo temático e disciplinar de cada período. Ambos os trabalhos evidenciam a inter-relação entre a implantação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena no SUS e a consolidação dessa linha de investigação no Brasil. É o que Teixeira e Dias da Silva (2013)Teixeira, C. C., & Dias da Silva, C. (2013). Antropologia e saúde indígena: mapeando marcos de reflexão e interfaces de ação. Anuário Antropológico, 38(1), 35-57. https://doi.org/10.4000/aa.374
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referem como interfaces de ação, em que se produz engajamento reflexivo entre disciplinas, particularmente a antropologia e a saúde coletiva, concomitante às ações e às relações propiciadas pela política pública.

Na produção antropológica atual, Teixeira e Dias da Silva (2013)Teixeira, C. C., & Dias da Silva, C. (2013). Antropologia e saúde indígena: mapeando marcos de reflexão e interfaces de ação. Anuário Antropológico, 38(1), 35-57. https://doi.org/10.4000/aa.374
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não identificam uma abordagem teórica englobante, porém destacam duas vertentes não excludentes de estudos: aqueles mais enfocados na dinâmica das práticas estatais, isto é, na dimensão política da saúde indígena, e aqueles relacionados aos estudos da etnologia, voltados aos processos de adoecimento e práticas terapêuticas indígenas. A vasta produção acadêmica sobre saúde indígena, incluindo publicações, debates e grupos de pesquisa, teve essa confluência de abordagens analisada pelas autoras, o que não será desenvolvido neste texto.

O presente ensaio põe em foco a produção antropológica da saúde indígena cuja ênfase é associada à etnologia. Sem pretender uma revisão abrangente da produção acadêmica, das várias inserções teóricas e metodológicas na antropologia, bem como de seus desdobramentos temáticos2 2 Estudos relativos ao perspectivismo e a regimes ontológicos indígenas têm se destacado na produção antropológica mais recente, nessa ênfase ligada à etnologia – ver, por exemplo, Pereira (2012), McCallum (2014) e Cabral de Oliveira (2020) –, trazendo novas indagações para o campo da saúde indígena. , toma-se ‘doença de branco’ como um fato etnográfico que estimulou o acercamento aos aportes teóricos da etnologia, na saúde indígena. Desta perspectiva, as análises relativas às concepções indígenas de saúde e doença, cuidados com o corpo, práticas e conhecimentos terapêuticos, medicina tradicional, assistência à saúde de populações indígenas, por exemplo, podem ser consideradas tributárias das pesquisas etnográficas produzidas sobre os povos indígenas no Brasil.

Um dos marcos para se pensar a saúde indígena como um tema de reflexão antropológica foi a realização do encontro “Medicinas tradicionais e política de saúde na Amazônia”, em 1989, no Museu Paranaense Emílio Goeldi, quando a atual Constituição Federal recém-vigorava. No encontro, foram apresentadas pesquisas sobre medicinas tradicionais, etnobotânica, como também foram discutidas as premissas de um novo modelo de assistência à saúde, tendo em vista as propostas defendidas pelo movimento de reforma sanitária, inspiradas na Declaração de Alma Ata3 3 Neste encontro, promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1978, firmou-se a necessidade de organizar serviços de saúde desde a atenção primária, para garantir a saúde de todos os povos. Entre as diretrizes aprovadas, está o enfoque comunitário, representado na figura do agente de saúde. , e as particularidades geográficas e demográficas da região amazônica. Esses trabalhos foram publicados, dois anos depois, em uma coletânea organizada por Dominique Buchillet, a qual segue como uma das referências indispensáveis sobre saúde indígena no Brasil (Buchillet, 1991aBuchillet, D. (1991a). (Org.). Medicinas TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA Amazônia. MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP.).

Nas primeiras publicações a respeito das práticas indígenas de cuidados de saúde em contextos interétnicos, a categoria ‘doença de branco’ apareceu, recorrentemente, incorporada à linguagem de vários povos vitimados pelas epidemias advindas do contato interétnico (Buchillet, 1988Buchillet, D. (1988). Interpretaçaão da doença e simbolismo ecológico entre os índios Desana. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi: Série Antropologia, 4(1), 27-42.; Gallois, 1991Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP.; Morgado, 1994Morgado, P. (1994). O pluralismo médico Wayana-Aparai: a intersecção entre a tradição local e a global. Cadernos de Campo, 4(4), 41-69. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v4i4p41-69
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; Athias, 1998Athias, R. (1998). Doença e cura: sistema médico e representação entre os hupdë-maku da região do rio negro, amazonas. Horizontes Antropológicos, 4(9), 237-261. https://doi.org/10.1590/S0104-71831998000200012
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; Wiik, 2001Wiik, F. B. (2001). Contato, epidemias e corpo como agentes de transformação: um estudo sobre a AIDS entre os Índios Xokléng de Santa Catarina, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, 17(2), 397-406. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2001000200014
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). Darcy Ribeiro (1993)Ribeiro, D. (1993). As compulsões ecológicas e bióticas. In Autor, Os índios e a civilização - A integração das populações indígenas no Brasil moderno (6. ed., pp. 263-316). Vozes., em um artigo publicado originalmente na década de 19504 4 O conteúdo deste artigo foi republicado em duas partes, “Convívio e contaminação” e “Efeitos dissociativos da depopulação”, em um dos capítulos do livro “Os índios e a civilização” (Ribeiro, 1993). , considerado também seminal nesse campo (Teixeira & Dias da Silva, 2013Teixeira, C. C., & Dias da Silva, C. (2013). Antropologia e saúde indígena: mapeando marcos de reflexão e interfaces de ação. Anuário Antropológico, 38(1), 35-57. https://doi.org/10.4000/aa.374
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), comenta dados sobre epidemias ocorridas entre vários povos indígenas, especialmente de gripe e sarampo. Mostra que as doenças provenientes do contato interétnico produzem alterações demográficas, com impactos profundos na vida social, causando um tipo de efeito cascata, que coletiviza e intensifica a morbidade das epidemias. Neste texto, Ribeiro (1993)Ribeiro, D. (1993). As compulsões ecológicas e bióticas. In Autor, Os índios e a civilização - A integração das populações indígenas no Brasil moderno (6. ed., pp. 263-316). Vozes. já mencionara relatos de alguns indígenas sobre o fato de as doenças provocadas pelos brancos poderem ser curadas somente pela medicina dos brancos, de acordo com suas observações de que as epidemias eram muito menos letais entre os brancos.

A preocupação com categorizações autóctones de doença foi muito explorada nos estudos clássicos de etnomedicina, com o intuito de compreender a lógica envolvida nos processos terapêuticos, num período em que o paradigma evolucionista era dominante. No início do século XX, as práticas terapêuticas indígenas foram tomadas como expressão do pensamento primitivo, sendo discutidas em termos das diferenças entre magia, religião e ciência5 5 Sobre isso, ver Langdon (2014) e Martínez Hernáez (2008). . Nesta abordagem, inaugurada por Rivers (1924)Rivers, W. H. R. (1924). Medicine, Magic and Religion. Kegan Paul, Trench, Trubner., estabeleceu-se a dicotomia entre um pensamento do tipo empírico-racional e outro do tipo mágico-religioso, fundada na premissa de que as doenças são eventos naturais e, portanto, qualquer tratamento de saúde sob escrutínio antropológico deveria ser compreendido em termos de uma eficácia objetiva. Nesses estudos, que buscaram identificar elementos racionais difundidos nas culturas primitivas, a ciência médica serviu de parâmetro para analisar as etnomedicinas. A partir deste recorte analítico, as terapias mágico-religiosas remetiam às etiologias das doenças com explicações sobrenaturais, e as terapias empiríco-racionais eram as que guardavam semelhança com a racionalidade científica no reconhecimento dos sintomas físicos.

Os debates em torno da eficácia das práticas etnomédicas evidenciaram um viés interpretativo limitante para compreender o que ocorre desde as perspectivas indígenas. Atualmente, a abordagem antropológica sobre processos de doença tem como básicas as premissas de que uma desordem física remete à composição de forças sociais, da qual a pessoa doente faz parte, e que a eficácia dos tratamentos tem mais a ver com a ordem política do que com a ordem biológica (Augé, 1984Augé, M. (1984). Ordre biologique, ordre social: la maladie, forme elementaire de l’evenement. In M. Augé & C. Herzlich (Orgs.), Le sens du mal. Anthropologie, histoire, sociologie de la maladie (pp. 35-91). Éditions des Archives Contemporaines.).

Nos trabalhos publicados nos anos 1990, momento em que um modelo de assistência à saúde das populações indígenas esteve em debate no bojo da reforma sanitária, as ‘doenças de branco’ apareceram como um dado etnográfico com potencial para legitimar o poder dos brancos em espaços e relações assistenciais, tendendo a reificar aquela dicotomia instaurada nos estudos de etnomedicina. Esses antropólogos, posicionados que estavam nos debates, não ignoraram os efeitos que suas interpretações poderiam assumir diante dos dilemas embutidos na oferta de serviços de saúde para as populações indígenas.

Outro aspecto relevante para a constituição dessa abordagem em saúde indígena foi a emergência de novas categorias conceituais a partir das etnografias desenvolvidas nas Terras Baixas da América do Sul, nas décadas anteriores, especialmente nos anos 1970 e 1980, como apontado por Langdon (2014)Langdon, E. J. (2014). Os diálogos da antropologia com a saúde: contribuições para as políticas públicas. Ciência & Saúde Coletiva, 19(4), 1019-1029. https://doi.org/10.1590/1413-81232014194.22302013
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. A produção etnográfica em expansão levou ao questionamento de modelos teóricos africanistas, de tradição britânica, que vinham sendo aplicados aos ameríndios, e ocasionou reformulações em que o idioma simbólico do corpo e a concepção de pessoa se tornaram centrais para compreender seu modo de viver (Seeger et al., 1979Seeger, A., Da Matta, R., & Viveiros de Castro, E. B. (1979). A construção da pessoa nas sociedades indígenas brasileiras. Boletim do Museu Nacional, 32, 2-19.).

O panorama teórico na antropologia daquele período favoreceu o deslocamento do foco de nosologias indígenas para a corporalidade, trazendo ao primeiro plano as concepções e os conhecimentos indígenas sobre cuidados de saúde. Além disso, as práticas biomédicas haviam se tornado objeto de observação etnográfica desde os anos 1980, quando o conhecimento científico passou a ser tomado como um modo de conhecimento cultural, tal como os demais conhecimentos, tradicionais e populares, sobre saúde e doença (Langdon et al., 2012Langdon, E. J., Foller, M. L., & Maluf, S. W. (2012). Um balanço da antropologia da saúde no Brasil e seus diálogos com as antropologias mundiais. Anuário Antropológico, 37(1), 51-89. https://doi.org/10.4000/aa.254
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; Lock, 2012Lock, M. (2012). Antropologia médica: indicações para o futuro. In F. Saillant & S. Genest (Orgs.), Antropologia MÉDICA: ANCORAGENS LOCAIS, DESAFIOS GLOBAIS (pp. 19-36). Editora Fiocruz.; Martínez Hernáez, 2008Martínez Hernáez, Á. (2008). Medicina, ciencia y creencia. Una Historia de la antropología médica. In Autor, Antropología médica. Teorías sobre la cultura, el poder y la enfermedad (pp. 11-44). Anthropos.).

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE OS APORTES CONCEITUAIS DA ETNOLOGIA

As pesquisas etnográficas iniciadas no Brasil associadas ao Projeto Harvard-Brasil Central6 6 Há importantes desdobramentos dessas pesquisas nos estudos de parentesco, na etnologia, que fogem ao escopo desta contribuição. Ver Coelho de Souza (2004). , na década de 1960, colocaram em evidência aspectos simbólicos da corporalidade ameríndia até então pouco valorizados conceitualmente. Esses estudos, realizados entre diversos povos da família lingüística jê, relacionando mitos, rituais e organização social, foram motivados por debates teóricos a respeito do dualismo jê (Laraia, 1987Laraia, R. B. (1987). Etnologia INDÍGENA BRASILEIRA - UM BREVE LEVANTAMENTO (Série Antropologia, n. 60). UnB.; Seeger, 1981Seeger, A. (1981). Sociedades dialéticas. As sociedades Jê e seus antropólogos. Anuário Antropológico, 5(1), 305-312.). As etnografias realizadas no escopo desse projeto mostraram que as teorias indígenas sobre corpo envolvem manipulação de atributos pessoais, materiais e imateriais, que equivalem à produção de familiaridade ou distanciamento no campo do parentesco. Umas das contribuições centrais destas pesquisas para a etnologia regional foi a noção pan-ameríndia de substancialidade como operador de identidade social e cosmológica.

Roberto DaMatta (1976)DaMatta, R. (1976). Um mundo dividido. A estrutura social dos índios Apinayé. Vozes. foi um dos primeiros a ressaltar, em seu estudo sobre os Apinayé, a existência do ‘grupo de substância’, fundado na ideia de que, a partir do contato e da mistura de secreções corporais e alimentos, na vida diária, se desenvolve um processo de identificação física entre um casal e seus filhos, cujo exemplo mais evidente são as práticas de resguardo ao redor da gestação e do parto. Terence Turner (2012 [1980])Turner, T. (2012 [1980]). The social skin. HAU: Journal of Ethnographic Theory, 2(2), 86-504. https://www.journals.uchicago.edu/doi/pdfplus/10.14318/hau2.2.026
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desenvolveu uma análise sobre ornamentação corporal kayapó como um modo de socialização do corpo, que parte da ideia de consubstancialidade. Para ele, a constituição de uma ‘pele social’ por meio da ornamentação corporal envolve não apenas a manipulação de códigos estéticos, partilhados para diferenciar pessoas por status social, como também o controle ou a canalização das forças corporais através do efeito das substâncias usadas na decoração. Essa produção estética do corpo tem como fim estimular capacidades corporais valorizadas entre os Kayapó, ligadas à reprodução, ao trabalho e à oratória. Na pesquisa com os Yawalapiti, Eduardo Viveiros de Castro (1979)Viveiros de Castro, E. (1979). A fabricação do corpo na sociedade xinguana. Boletim do Museu Nacional, (32), 40-49. enfatiza a noção de fabricação corporal em períodos de reclusão. A ideia de que o corpo humano precisa ser submetido a processos periódicos de intervenção, correlatos a mudanças de posição social ao longo da vida, é associada estruturalmente às explicações míticas de processos metamórficos, narrativas em que humanos são transformados em animais ou espíritos. Esse ‘fazer corpo’ como produção ordenada e intencional de transformações a partir de substâncias, como alimentos, tabaco, eméticos, tinturas vegetais etc., além dos fluidos corporais, articula os planos corporal, social e cosmológico.

Esses são alguns conceitos que afirmam a noção ameríndia de que o corpo não se desenvolve naturalmente (McCallum, 1998McCallum, C. (1998). O corpo que sabe - da epistemologia kaxinawá para uma antropologia médica das terras baixas sul-americanas. In P. C. Alves & M. C. Rabelo (Orgs.), Antropologia da saúde: traçando identidade e explorando fronteiras (pp. 215-245). Editora Fiocruz/Relume Dumará, 1998.); pelo contrário, uma corporalidade propriamente humana se mantém mediante intervenções e relações adequadas, com base na ideia de que as trocas de substâncias que ocorrem entre os seres humanos e com os demais seres que povoam o mundo devem ser continuamente controladas.

A CATEGORIA ‘DOENÇA DE BRANCO’ NAS ETNOGRAFIAS SOBRE POVOS INDÍGENAS

As ‘doenças de branco’ permanecem nos discursos indígenas até os dias de hoje. São usadas, sobretudo, como um dispositivo para articular-se politicamente diante de condições de vida decorrentes de mudanças ecológicas, econômicas e sociais que requerem acesso a novos recursos e tecnologias de cuidados de saúde. Contudo, nas etnografias mais recentes sobre saúde indígena, são raras as problematizações nessa direção. A ideia de que o uso da expressão ‘doença de branco’ pelos indígenas é indício de adesão à maior validade empírica e lógica dos conhecimentos biomédicos foi completamente refutada pela abordagem antropológica. Esse dado corrobora, de certo ângulo, o argumento de que os estudos sobre saúde indígena se alinham às perspectivas teóricas que norteiam as pesquisas antropológicas de modo geral, sem se ater às questões oriundas da biomedicina enquanto prática legitimada pelo conhecimento científico.

Apesar da especificidade da saúde indígena – um campo de estudos temático e interdisciplinar, com a tônica das políticas de Estado, da política indígena e da pesquisa implicada –, como foi delineado antes, não dá para definir esse campo de estudos como uma linhagem da etnomedicina simplesmente pela afinidade temática. Os artigos mencionados a seguir, selecionados por se fundamentarem na noção de substancialidade ao problematizarem o entendimento do que seriam as ‘doenças de branco’, ilustram este argumento.

A partir de pesquisa etnográfica, Gallois (1991)Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP. analisou criticamente a categoria ‘doença de branco’, mostrando que a interpretação das doenças entre os Wajãpi se orienta pela lógica social, e não a partir de um modelo etiológico fixo. Essa lógica abarca um modo amplo de relações entre seres humanos e não humanos, em que todos esses seres dos cosmos compartilham substâncias que contêm forças xamanísticas (-paie). Um caso de doença grave e outras adversidades da vida são pensados em termos de relações inadequadas que podem se dar nos planos social, ecológico ou cosmológico. Uma aproximação entre uma pessoa wajãpi e entidades, como espectros, donos ou inimigos, por exemplo, corresponde a um desequilíbrio nessas forças, que pode desencadear uma agressão xamânica, com necessária reparação. Assim, a princípio, qualquer doença pode resultar da agressão dos ajã, seres espirituais que afetam o corpo wajãpi por inserção de objetos ou esvaziamento de suas partes. De acordo com a autora, a contaminação é pensada pelos Wajãpy como uma variação desta modalidade de doença intrusiva. Essas são chaves interpretativas que levam a avaliar um conjunto de causas prováveis de adoecimento individual. O diagnóstico sempre é contextualizado e coletivo, de modo a determinar a origem da agressão corporal no campo social e, ao mesmo tempo, orientar o tratamento.

Desde seu material sobre as terapêuticas xamânicas wajãpi, Gallois (1991)Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP. questionou o uso que profissionais de saúde e outros agentes faziam do reconhecimento das ‘doenças de branco’ para justificar suas intervenções mais drásticas. Ela mostra que essa expressão não deve ser entendida como uma ruptura no esquema etiológico wajãpi, mas sim indica uma abertura e um posicionamento político frente aos brancos. Argumenta que ‘doença de branco’ não pode ser considerada uma categoria nosológica, uma vez que os brancos não têm acesso ao repositório de força xamânica a que são imputadas as agressões que explicam as desordens corporais. Essa expressão apenas indica o reconhecimento de que as terapias dos brancos são eficazes para certas doenças. Como bem colocado por Buchillet (1991b)Buchillet, D. (1991b). A Antropologia da doença e os sistemas oficiais de Saúde. In Autor (Org.), Medicinas TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA Amazônia (pp. 21-44). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP., a biomedicina é um recurso disponível e acessado por seu resultado pragmático; seu valor é reconhecido por atuar no registro dos efeitos, e não das causas. Para Gallois (1991)Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP., o uso da expressão ‘doença de branco’, englobada em uma dinâmica de variações diagnósticas orientada para o reequilíbrio das relações comunitárias, é uma estratégia acionada pelos Wajãpi para controlar os efeitos da presença ambígua dos brancos em seu território.

O tópico das negociações envolvidas na interpretação variável e contextual dos processos de doença é central para entender de que modo os diversos recursos terapêuticos disponíveis são combinados, como tentativas de resolução, durante o tratamento. Langdon (1994)Langdon, E. J. (1994). Representações de doenças e itinerários terapêuticos dos Siona da Amazônia colombiana. In R. V. Santos & C. E. A. Coimbra Jr. (Orgs.), Saúde e povos indígenas (pp. 115-142). Editora Fiocruz. explora a fundo um episódio de doença que aconteceu com uma mulher siona, mostrando que a busca de terapias da medicina popular ou de fármacos não implica mudanças em suas concepções etiológicas, mas indica uma experiência social relativa a efeitos terapêuticos, constatados em sintomas corporais. Nos casos graves de doença, o que é considerado fundamental entre os Siona é o tratamento xamânico, apesar de poderem ser usados vários recursos simultaneamente. Os motivos considerados decisivos para levarem a um estado de doença se encontram enraizados nas concepções cosmológicas sobre as relações envolvendo os Siona, o ambiente físico e outros seres que habitam o mundo. Assim, relatos contraditórios a respeito das causas de doença e morte são concatenados a partir de sua cosmologia, o que não quer dizer que negociações de sentido e conflitos terminem por confluir em uma única explicação. No caso desta mulher, mesmo após sua morte, permaneceram entre os Siona duas versões do que tinha ocorrido a ela no campo social.

As escolhas terapêuticas entre os indígenas não seguem simplesmente uma espécie de racionalidade médica incipiente, como a ênfase em categorias de doenças pode dar a entender, mas são balizadas também por contingências, disputas de sentido e experimentações. Pensar unicamente em termos de classificações tende a dirigir a compreensão das concepções indígenas de saúde às premissas evolucionistas e funcionalistas que guiaram os primeiros estudos sobre medicinas indígenas e equivale a desconsiderar suas teorias sobre a natureza do ser humano.

Morgado (1994)Morgado, P. (1994). O pluralismo médico Wayana-Aparai: a intersecção entre a tradição local e a global. Cadernos de Campo, 4(4), 41-69. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v4i4p41-69
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, ao tratar da relação dos Wayana-Aparai com a medicina ocidental, questiona essa herança teórica desde seu materiais etnográficos, assim como Gallois (1991)Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP. e Langdon (1994)Langdon, E. J. (1994). Representações de doenças e itinerários terapêuticos dos Siona da Amazônia colombiana. In R. V. Santos & C. E. A. Coimbra Jr. (Orgs.), Saúde e povos indígenas (pp. 115-142). Editora Fiocruz., apontando para um pluralismo terapêutico, mais do que um pluralismo médico. Embora os Wayana-Aparai se refiram às ‘doenças de branco’, os saberes e práticas de cuidados adquiridos dos caboclos, missionários, agentes da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), entre outros, são acionados segundo sua percepção de ciclos de vendeta que é, ao mesmo tempo, subjetiva e social. Assim como para os Wajãpi (Gallois, 1991Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP.), são as agressões xamânicas que, em última instância, explicam os casos de doença entre os Wayana, de modo que a cura corporal restabelece não apenas a saúde, mas a ordem cosmológica. Nesse sentido, só opera a medicina wayana-aparai.

Além disso, Morgado (1994)Morgado, P. (1994). O pluralismo médico Wayana-Aparai: a intersecção entre a tradição local e a global. Cadernos de Campo, 4(4), 41-69. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v4i4p41-69
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salienta que a incorporação dos recursos biomédicos não ocorre somente em função dos efeitos positivos observados nos casos de doença, mas se insere no quadro mais amplo das relações com os brancos. Há um histórico de contato interétnico em jogo, bem como interesses contextuais em manter alianças com determinados segmentos da sociedade envolvente, que podem se traduzir na aceitação dos recursos da biomedicina.

No período em que essas antropólogas realizaram suas pesquisas, os refinamentos teóricos alcançados a partir de conceitos desdobrados de materiais etnográficos que vinham sendo produzidos sobre os povos indígenas, imbricados aos avanços nos conhecimentos em estudos arqueológicos, históricos e ecológicos, possibilitaram redimensionar as relações sociedade-natureza na esfera da organização social (Viveiros de Castro, 1996Viveiros de Castro, E. (1996). Images of nature and society in Amazonian ethnology. Annual Review of Anthropology, 25, 179-200. https://doi.org/10.1146/annurev.anthro.25.1.179
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). As contribuições do estruturalismo e da antropologia simbólica na etnologia (Seeger et al., 1979Seeger, A., Da Matta, R., & Viveiros de Castro, E. B. (1979). A construção da pessoa nas sociedades indígenas brasileiras. Boletim do Museu Nacional, 32, 2-19.; Durham, 1982Durham, E. (1982). Os problemas atuais da pesquisa antropológica no Brasil. Revista de Antropologia, 25, 159-170.; Taylor, 1984Taylor, A. (1984). L’Américanisme tropical: une frontière fossile de l’Ethnologie? In B. Rupp-Eisenreich (Org.), Histoires de l´Anthropologie (XVIe-XXe siècles) (pp. 213-233). Tradução de Beatriz Perrone Moisés. Klincksieck.) evidenciaram processos de troca simbólica, que atravessam os planos corporal, sociopolítico, cosmológico e ontológico. Albert (1992)Albert, B. (1992). A fumaça do metal: história e representações do contato entre os Yanomami. Anuário Antropológico, (89), 151-188. denomina como filosofias sócio-ontológicas a esses modos de apreensão da realidade em que todas as relações se fundamentam em termos de identidade e alteridade, de proximidade e distância social. Essa maneira de conhecer o mundo, onde transitam diversos seres, forças, potências e espíritos, também torna inteligível a realidade vivida, pois contém os princípios explicativos para a vida, a saúde, a doença e a morte.

Tendo em vista as concepções cosmológicas que dão sentido aos processos de doença, tanto quanto organizam o espaço social, Albert (1992)Albert, B. (1992). A fumaça do metal: história e representações do contato entre os Yanomami. Anuário Antropológico, (89), 151-188. argumenta que, entre os Yanomami, o próprio modelo etiológico para as ‘doenças de branco’ variou ao longo do tempo. Para esse autor, trata-se de um mecanismo de resistência cultural diante da história do contato. As epidemias desconhecidas, o aparecimento dos brancos em seu território e a aquisição dos objetos manufaturados foram associados, nas narrativas yanomami, a novas versões etiológicas de doenças. Para os Yanomami, as categorias de doença/agressão se diferenciam conforme a distância social entre os grupos locais, que variam de alianças a inimizades. Geralmente, a distância social equivale ao afastamento geográfico entre suas malocas. Assim, quanto menor a identidade entre vítima e agressor, maior o grau de alteridade e de inimizade, tornando mais intensos os poderes patogênicos e a gravidade da doença. A mesma lógica de alteridade que organiza o espaço social multicomunitário explica as doenças. No caso das ‘doenças de branco’, conforme o tipo de relação e a posição atribuída aos brancos no espaço social yanomami, o que foi variando ao longo do tempo, as explicações foram se estruturando neste modelo de alteridade canibal. Se, nos primeiros contatos, os efeitos patogênicos das epidemias foram atribuídos ao cheiro ou à fumaça das ferramentas de metal, foram surgindo posteriormente novas classes de espíritos canibais ligados às casas e às coisas dos brancos.

Buchillet (1988) mostra que, também entre os Desana, as teorias etiológicas não levam a classificações dicotômicas, embora eles se refiram às ‘doenças de branco’. Cruzando dados históricos, epidemiológicos, ecológicos e antropológicos sobre epidemias de sarampo, varíola, gripe e malária, ela mostra que essa categorização se fundamenta na observação minuciosa das manifestações dessas doenças. Há certas características pertencentes a esse tipo de doença, como o fato de serem altamente contagiosas e o modo seletivo com que acometem indígenas, enquanto os brancos permanecem, aparentemente, imunes. A longa experiência social dos Desana com as doenças advindas da colonização e cristianização possibilitou que a malária, diferentemente das outras enfermidades, fosse concebida como resultante de feitiçaria xamânica. Buchillet (1988)Buchillet, D. (2007). Bibliografia crítica da saúde indígena no Brasil (1844-2006). Abya-Yala. descreve alguns aspectos que levaram a essa significação. Um deles foi a febre intermitente da malária ter sido associada ao efeito da intoxicação por curare, já que ambos produzem um estado de apatia. Outro foi o fato de que alguns surtos ocorreram no período em que foram destruídas grandes pedras das cachoeiras, para facilitar a navegação fluvial, as quais são um elemento central da cosmografia e da agência xamânica desana.

Esses antropólogos, envolvidos em maior ou menor grau com proposições e iniciativas para minimizar o processo de vulnerabilização da saúde dos povos indígenas, associado ao processo colonial, exploraram as etiologias e terapias indígenas, talvez, a fim de recolocar o problema em nova chave de compreensão. Cabe dizer que no Brasil, assim como no Peru (Greene, 1998Greene, S. (1998). The shaman’s needle: development, shamanic agency, and intermedicality in Aguaruna Lands, Peru. American Ethnologist, 25(4), 634-658. https://doi.org/10.1525/ae.1998.25.4.634
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), desde que as instituições religiosas se acercaram dos povos indígenas, no período colonial, a expansão das práticas biomédicas em comunidades indígenas segue atrelada à lógica do desenvolvimento e da integração destes povos à civilização. Assim, ao trazerem para debate as ‘doenças de branco’, esses trabalhos abriram caminho para retirar o foco das análises das classificações indígenas de doença, cujo pressuposto implícito é tratar-se de uma epistemologia encerrada em fundamentos mágicos, em ideias fixadas na tradição. Conforme Ackerknecht (1971)Ackerknecht, E. (1971). Diagnostico y tratamientos naturales y sobrenaturales. In Autor, Medicina y Antropologia Social (pp. 139-166). Akal., essas concepções expressariam um modo de racionalidade impermeável à experiência do mundo natural. Contudo, o que mostram as etnografias exploradas aqui são concepções de ser humano distintas, as quais remetem a modos próprios de conhecimento do mundo.

O QUE A CATEGORIA ‘DOENÇA DE BRANCO’ NOS ENSINA SOBRE SAÚDE INDÍGENA?

Ao serem tecidos comentários sobre parte da produção da etnologia que marca uma ênfase teórica na saúde indígena, procurou-se ressaltar uma mudança paradigmática que posiciona esse campo de estudos, sem a preocupação de apresentar seus aportes mais recentes. A escolha de algumas reflexões sobre ‘doenças de branco’ como fio condutor não foi aleatória, pois a legitimação de categorias nosológicas continua repercutindo embates em torno do valor conferido a práticas e conhecimentos indígenas e biomédicos na assistência à saúde.

No que diz respeito à abordagem teórico-metodológica, os trabalhos citados ao longo deste artigo, entre outros pioneiros, apontam eixos orientados para a intersecção entre fabricação corporal, noção de pessoa e cosmologia, que permanecem norteando pesquisas em saúde indígena. Nesta vertente, três enquadramentos sobre doença e cura são consensuais.

Primeiro, a utilização de recursos terapêuticos plurais deve ser entendida e investigada de acordo com o sentido dado à situação a ser enfrentada por parte do doente e de seu grupo de parentesco. Como explicitam Gallois (1991)Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP., Langdon (1994)Langdon, E. J. (1994). Representações de doenças e itinerários terapêuticos dos Siona da Amazônia colombiana. In R. V. Santos & C. E. A. Coimbra Jr. (Orgs.), Saúde e povos indígenas (pp. 115-142). Editora Fiocruz., Morgado (1994)Morgado, P. (1994). O pluralismo médico Wayana-Aparai: a intersecção entre a tradição local e a global. Cadernos de Campo, 4(4), 41-69. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v4i4p41-69
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e Buchillet (1991b)Buchillet, D. (1991b). A Antropologia da doença e os sistemas oficiais de Saúde. In Autor (Org.), Medicinas TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA Amazônia (pp. 21-44). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP., entre vários outros, os curadores indígenas, como os pajés, não são requisitados para tratar todo tipo de doença. Muitas vezes, são os próprios familiares que aplicam tratamentos baseados em conhecimentos disseminados entre gerações, tanto quanto avaliam os efeitos de todo o conjunto dos recursos terapêuticos empregados para curar. Os arranjos são inúmeros, a depender das circunstâncias, do jogo político local e das opções terapêuticas predominantes.

Segundo, deve-se ter em vista o caráter relacional intrínseco dos processos de doença, que envolve tanto as relações das pessoas entre si, como aquelas entre seres humanos e não humanos (Barcelos Neto, 2006Barcelos Neto, A. (2006). “Doença de índio”: o princípio patogênico da alteridade e os modos de transformação em uma cosmologia amazônica. Campos, 7(1), 9-34. http://dx.doi.org/10.5380/cam.v7i1.5451
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; Garnelo & Buchillet, 2006Garnelo, L., & Buchillet, D. (2006). Taxonomias das doenças entre os índios Baniwa (arawak) e Desana (tukano oriental) do Alto Rio Negro (brasil). Horizontes Antropológicos, 12(26), 231-260. https://doi.org/10.1590/S0104-71832006000200010
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; Greene, 1998; Vanzolini, 2013Vanzolini, M. (2013). Ser e não ser gente: dinâmicas da feitiçaria no Alto Xingu. Mana, 19(2), 341-370. https://doi.org/10.1590/S0104-93132013000200005
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). Assim, a dimensão política (ou cosmopolítica) é central para entender as concepções ameríndias sobre saúde e doença. Tendo em vista que a biomedicina é hegemônica no contexto brasileiro, estudos sobre políticas de saúde precisam considerar as zonas de disputas de poder envolvidas em polarizações epistêmicas, do tipo medicina ocidental versus medicinas tradicionais. Na esfera dos serviços de assistência à saúde, em geral, as categorizações utilizadas pelos profissionais de saúde são ratificadas como naturais e, portanto, mais reais do que as do doente (Taussig, 1980Taussig, M. (1980). Reification and the consciousness of the patient. Social Science &; Medicine. Part B: Medical Anthropology, 14(1), 3-13. https://doi.org/10.1016/0160-7987(80)90035-6
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).

E, terceiro, para entender o sentido das terapêuticas adotadas, é necessário acompanhar os eventos no tempo, seja para descrever processos de doença singulares, e como operam as relações de substância, seja para perceber a historicidade que denota experiências coletivas a respeito da dinâmica de certas morbidades, bem como de experimentações e improvisos em técnicas terapêuticas suscitadas como resposta social. Como os estudos sobre xamanismo nos mostram, nas terapias indígenas, a cura é orientada por conhecimentos caracterizados, sobretudo, por sua abertura às contingências do presente, incluídos aí os variados recursos e conhecimentos terapêuticos outros possíveis de ser acessados. As cosmologias manifestadas nas formas terapêuticas indígenas e nos cuidados com o corpo oferecem espaço à criatividade, à experimentação e, acima de tudo, expressam um modo de resistência ao histórico colonial (Chaumeil, 2012Chaumeil, J. (2012). Una manera de viver y de actuar en el mundo: estudios de chamanismo en la Amazonía. In C. I. Degregori, P. F. Sendón & P. Sandoval (Eds.), No hay país más diverso (pp. 411-432). Instituto de Estudios Peruanos.; Langdon, 2016Langdon, E. J. (2016). A performance da diversidade: o xamanismo como modo performático. GIZ - Gesto, Imagem e Som, 1(1), 9-40. https://doi.org/10.11606/issn.2525-3123.gis.2016.116460
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; Saez, 2018Saez, O. C. (2018). Xamanismos nas terras baixas: 1996-2016. BIB, 87(3), 15-40.).

Por outro lado, ao desentranhar a categoria ‘doença de branco’ da polarização linear inaugurada pelos estudos de etnomedicina, Gallois (1991)Gallois, D. T. (1991). A categoria “doença de branco”: ruptura ou adaptação de um modelo etiológico indígena? In D. Buchillet (Orgs.), MEDICINAS TRADICIONAIS E MEDICINA OCIDENTAL NA AMAZÔNIA (pp. 175-205). MPEG/CNPq/SCT/PR/CEJUP/UEP., Langdon (1994)Langdon, E. J. (1994). Representações de doenças e itinerários terapêuticos dos Siona da Amazônia colombiana. In R. V. Santos & C. E. A. Coimbra Jr. (Orgs.), Saúde e povos indígenas (pp. 115-142). Editora Fiocruz., Morgado (1994)Morgado, P. (1994). O pluralismo médico Wayana-Aparai: a intersecção entre a tradição local e a global. Cadernos de Campo, 4(4), 41-69. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v4i4p41-69
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, Albert (1992)Albert, B. (1992). A fumaça do metal: história e representações do contato entre os Yanomami. Anuário Antropológico, (89), 151-188. e Buchillet (1988)Buchillet, D. (2007). Bibliografia crítica da saúde indígena no Brasil (1844-2006). Abya-Yala. não deixaram de situar os processos históricos genocidas, concomitantes ao surgimento das epidemias, que afetam os grupos indígenas com quem trabalharam. E este histórico nos coloca diante de um dado extensivo a toda América Latina: a nítida desigualdade imputada aos índios nesses países (Silveira, 2017Silveira, N. H. (2017). Saúde indígena: políticas comparadas na América Latina. Resenha. Estudos Ibero-Americanos, 43(1), 135-138. http://dx.doi.org/10.15448/1980-864X.2017.1.25391
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). Tal desigualdade passa pela herança colonial, partilhada e atualizada na forma de usurpação territorial, de exposição a violências, de discriminação, de invisibilização social, de subordinação política, entre outros. Esse fato não é menos relevante na constituição do que chamamos de saúde indígena. É plausível que tenha concorrido para que esta seja uma arena de investigação marcada por uma ética de responsabilidade sobre a produção de conhecimento em relação aos sujeitos pesquisados (Albert, 1997Albert, B. (1997). Ethnographic Situation’ and Ethnic Movements: Notes on post-Malinowskian fieldwork. Critique of Anthropology, 17(1), 53-65. https://doi.org/10.1177%2F0308275X9701700104
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).

No Brasil, desde os anos 1970, os antropólogos que trabalham com povos indígenas frequentemente somaram uma ação política à sua atuação acadêmica, mesmo que nem sempre isso tenha aparecido de forma explícita em suas etnografias (Durham, 1982Durham, E. (1982). Os problemas atuais da pesquisa antropológica no Brasil. Revista de Antropologia, 25, 159-170.; Melatti, 1984Melatti, J. C. (1984). A antropologia no Brasil: um roteiro. BIB, (17), 123-211.). Essas iniciativas engajadas, precursoras à redemocratização do país, procuraram estimular a participação indígena no enfrentamento das questões candentes ligadas à sua sobrevivência, segundo Durham (1982)Durham, E. (1982). Os problemas atuais da pesquisa antropológica no Brasil. Revista de Antropologia, 25, 159-170.. Quando a política de saúde entrou na pauta de debates, já havia se constituído um movimento indígena7 7 Esse movimento se articulou durante a ditadura para fazer frente à expansão de projetos de desenvolvimento nos territórios indígenas. O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) teve papel fundamental na constituição desse movimento no Brasil, além do indigenismo protagonizado por antropólogos citados no texto (Neves, 2003). O movimento indígena foi instituinte da política de saúde indígena e tem sido um dos pontos de força para a manutenção do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. , na época representado sobretudo pela União das Nações Indígenas (UNI) (Pontes et al., 2019Pontes, A. L. M., Machado, F. R. S., Santos, R. V., & Gomes de Brito, C. R. (2019). Diálogos entre indigenismo e Reforma Sanitária: bases discursivas da criação do subsistema de saúde indígena. Saúde em Debate, 43(8), 146-159. https://doi.org/10.1590/0103-11042019S811
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), que se articulou ao movimento de reforma sanitária, a fim de propor um modelo de atenção à saúde pautado no reconhecimento de direitos civis. Assim, as condições dadas nesse campo de estudos, de partida, demandaram um posicionamento dos antropólogos, no horizonte de elaborações de uma problemática com raízes sociais e históricas.

É relevante ainda considerar que, na visada indígena, a organização de serviços de saúde nos locais em que vivem qualifica formas políticas de atuação (Cardoso, 2015Cardoso, M. (2015). Políticas de saúde indígena no Brasil: do modelo assistencial à representação política. In E. J. Langdon & M. Cardoso (Orgs.), Saúde indígena: políticas comparadas na América Latina (pp. 83-103). Editora da UFSC.), nas quais a circunscrição da produção antropológica muitas vezes é dada na dinâmica estatal, não somente no plano acadêmico. Além disso, trata-se de uma arena de estudos interdisciplinar em que predominam abordagens da saúde coletiva, cuja tradição de produção de conhecimento não se funda na cisão entre pesquisa e intervenção, nem é, como a tradição da antropologia, orientada pela externalidade do olhar que se inclina a uma posição dissociada dos interesses em jogo (Oliveira, 2004Oliveira, J. P. (2004). Pluralizando tradições etnográficas: sobre um certo mal-estar na antropologia. In E. J. Langdon & L. Garnelo (Orgs.), Saúde dos povos indígenas: reflexões sobre antropologia participativa (pp. 6-24). Contracapa/ABA.). Com base nesses atributos envolvidos na produção de conhecimento, imbricados às práticas e aos feixes de relações interétnicas que conformam a política de saúde e seus arranjos organizacionais e assistenciais, é que se afirma o caráter implicado dos estudos antropológicos sobre saúde indígena.

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    Outra diferença é a proposta de prestar um tipo de atenção diferenciada, articulada às práticas locais de saúde. Para mais detalhes sobre a política de atenção à saúde indígena, ver, entre outros, Cardoso (2015)Cardoso, M. (2015). Políticas de saúde indígena no Brasil: do modelo assistencial à representação política. In E. J. Langdon & M. Cardoso (Orgs.), Saúde indígena: políticas comparadas na América Latina (pp. 83-103). Editora da UFSC., Garnelo (2014)Garnelo, L. (2014). O SUS e a saúde indígena: matrizes políticas e institucionais do subsistema de saúde indígena. In C. C. Teixeira & L. Garnelo (Orgs.), Saúde Indígena em Perspectiva: explorando suas matrizes históricas e ideológicas (pp. 107-142). Ed. Fiocruz., Buchillet (2007)Buchillet, D. (2007). Bibliografia crítica da saúde indígena no Brasil (1844-2006). Abya-Yala. e Langdon (2004)Langdon, E. J. (2004). Uma avaliação crítica da atenção diferenciada e a colaboração entre antropologia e profissionais de saúde. In E. J. Langdon & L. Garnelo (Orgs.), Saúde dos povos indígenas: reflexões sobre antropologia participativa (pp. 25-45). Contracapa/ABA..
  • 2
    Estudos relativos ao perspectivismo e a regimes ontológicos indígenas têm se destacado na produção antropológica mais recente, nessa ênfase ligada à etnologia – ver, por exemplo, Pereira (2012)Pereira, P. P. (2012). Variations around water: bodies, encounters and translation processes. Vibrant, 9(1), 154-180. https://doi.org/10.1590/S1809-43412012000100006
    https://doi.org/10.1590/S1809-4341201200...
    , McCallum (2014)McCallum, C. (2014). Cashinahua perspectives on functional anatomy: ontology, ontogenesis and biomedical education in Amazonia. American Ethnologist, 41(3), 504-517. http://dx.doi.org/10.1111/amet.12091
    https://doi.org/10.1111/amet.12091...
    e Cabral de Oliveira (2020)Cabral de Oliveira, J. (2020). As vicissitudes do matar. Conflitos ontológicos em um estudo sobre leishmaniose tegumentar americana na TI Wajãpi. Horizontes Antropológicos, 26(57), 177-205. https://doi.org/10.1590/S0104-71832020000200007
    https://doi.org/10.1590/S0104-7183202000...
    –, trazendo novas indagações para o campo da saúde indígena.
  • 3
    Neste encontro, promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1978, firmou-se a necessidade de organizar serviços de saúde desde a atenção primária, para garantir a saúde de todos os povos. Entre as diretrizes aprovadas, está o enfoque comunitário, representado na figura do agente de saúde.
  • 4
    O conteúdo deste artigo foi republicado em duas partes, “Convívio e contaminação” e “Efeitos dissociativos da depopulação”, em um dos capítulos do livro “Os índios e a civilização” (Ribeiro, 1993Ribeiro, D. (1993). As compulsões ecológicas e bióticas. In Autor, Os índios e a civilização - A integração das populações indígenas no Brasil moderno (6. ed., pp. 263-316). Vozes.).
  • 5
    Sobre isso, ver Langdon (2014)Langdon, E. J. (2014). Os diálogos da antropologia com a saúde: contribuições para as políticas públicas. Ciência & Saúde Coletiva, 19(4), 1019-1029. https://doi.org/10.1590/1413-81232014194.22302013
    https://doi.org/10.1590/1413-81232014194...
    e Martínez Hernáez (2008)Martínez Hernáez, Á. (2008). Medicina, ciencia y creencia. Una Historia de la antropología médica. In Autor, Antropología médica. Teorías sobre la cultura, el poder y la enfermedad (pp. 11-44). Anthropos..
  • 6
    Há importantes desdobramentos dessas pesquisas nos estudos de parentesco, na etnologia, que fogem ao escopo desta contribuição. Ver Coelho de Souza (2004)Coelho de Souza, M. (2004). Parentes de sangue: incesto, substância e relação no pensamento timbira. Mana, 10(1), 25-60. https://doi.org/10.1590/S0104-93132004000100002
    https://doi.org/10.1590/S0104-9313200400...
    .
  • 7
    Esse movimento se articulou durante a ditadura para fazer frente à expansão de projetos de desenvolvimento nos territórios indígenas. O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) teve papel fundamental na constituição desse movimento no Brasil, além do indigenismo protagonizado por antropólogos citados no texto (Neves, 2003Neves, L. J. O. (2003). Olhos mágicos do sul (do sul): lutas contra-hegemônicas dos povos indígenas no Brasil. In B. Sousa Santos (Org.), Reconhecer para libertar. Os caminhos do cosmopolitismo multicultural (pp. 113-151). Civilização Brasileira.). O movimento indígena foi instituinte da política de saúde indígena e tem sido um dos pontos de força para a manutenção do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena.

AGRADECIMENTOS

Ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) Brasil Plural e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela concessão de bolsa de pós-doutorado, o que possibilitou o aprofundamento neste tema e a vinculação ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Aos colegas pesquisadores da Rede Saúde: práticas locais, experiências e políticas públicas, do INCT Brasil Plural, especialmente Esther Jean Langdon, Sonia Maluf e Eliana Diehl, por partilharem experiências e reflexões.

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Editado por

Responsabilidade editorial: Priscila Faulhaber Barbosa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    19 Jan 2021
  • Aceito
    26 Ago 2021
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