Acessibilidade / Reportar erro

Dor aguda no paciente crítico: revisitando a literatura

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Conforme redefinição, a dor aguda é uma experiência somática, com percepção individual de ameaça física ou existencial, compreendendo componentes afetivos, cognitivos e comportamentais. Em pacientes críticos, a dor representa um sintoma frequente e mal controlado, ocasionando piores desfechos. O objetivo deste estudo foi explorar a temática da dor aguda nos pacientes críticos adultos, com enfoque em alguns aspectos de fisiopatologia, além de atualizações em relação a diagnóstico, terapêutica multimodal e discussão de seu controle como um marcador de boa prática assistencial.

CONTEÚDO:

Foi realizada estratégia de busca com os descritores previamente definidos nos portais Pubmed e Cochrane, no período de 2011 a 2021, sem filtro de restrição para idioma. A dor aguda representa uma resposta fisiológica a um estímulo nociceptivo, tendo alta relevância por sua capacidade de ativar vias complexas (inflamatórias, hormonais e imunes), com repercussões sistêmicas. A avaliação da dor é frequentemente realizada através de escalas reconhecidas, porém com validação limitada em pacientes com trauma cranioencefálico, queimados e portadores de delirium e/ou demência acentuados. Os estudos considerando esses pacientes apontam para o uso de novas tecnologias na tentativa de objetivar esse diagnóstico, como a pupilometria à beira leito e o uso de plataformas capazes de integrar medidas multiparamétricas. Em relação à terapêutica, o conceito de analgosedação, objetivando priorização de analgesia nos pacientes críticos, apresenta abordagem capaz de melhorar desfechos clínicos. Além disso, há preferência da terapêutica multimodal como boa prática médica através da associação de diferentes fármacos com diversos mecanismos de bloqueio nociceptivo como estratégia para alcançar controle álgico e facilitar a redução do consumo de opioides.

CONCLUSÃO:

Por seus efeitos sistêmicos e sua prevalência, a dor aguda ainda é problemática relevante nas unidades de terapia intensiva. Novos métodos diagnósticos estão sendo comercializados com a proposta de objetivar essa avaliação em pacientes complexos. A abordagem da dor aguda deve priorizar o emprego de técnicas multimodais, que apresentam respostas clínicas mais consistentes, além de redução no consumo de opioides. A existência de equipes multidisciplinares especializadas no controle da dor no ambiente hospitalar é capaz de auxiliar em casos difíceis e ajudar nas auditorias de qualidade.

Descritores:
Analgesia; Cuidados críticos; Dor aguda; Manejo da dor; Qualidade da assistência à saúde

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

According to the redefinition, acute pain is a somatic experience, with individual perception of physical or existential threat, comprising affective, cognitive and behavioral components. In critically ill patients, pain is a frequent and poorly controlled symptom, causing worse outcomes. The objective of this study was to explore the topic of acute pain in critically ill adult patients, focusing on some aspects of pathophysiology, in addition to updates regarding diagnosis, multimodal therapy and discussion of its control as a marker of good care practice.

CONTENTS:

A search strategy was performed with the descriptors previously defined in the Pubmed and Cochrane portals, in the period from 2011 to 2021, without a language restriction filter. Acute pain represents a physiological response to a nociceptive stimulus, with high relevance due to its ability to activate complex pathways (inflammatory, hormonal and immune), with systemic repercussions. Pain assessment is often performed using recognized scales, but with limited validation in patients with traumatic brain injury, burns and patients with severe delirium and/or dementia. Studies considering these patients point to the use of new technologies in an attempt to target this diagnosis, such as bedside pupillometry and the use of platforms capable of integrating multiparametric measurements. Regarding therapy, the concept of analgosedation, aiming at prioritizing analgesia in critically ill patients, presents an approach capable of improving clinical outcomes. In addition, there is a preference for multimodal therapy as a good medical practice through the association of different drugs with different mechanisms of no-ciceptive blockade as a strategy to achieve pain control and facilitate the reduction of opioid consumption.

CONCLUSION:

Due to its systemic effects and prevalence, acute pain is still a relevant problem in intensive care units. New diagnostic methods are being marketed with the aim of targeting this evaluation in complex patients. The approach to acute pain should prioritize the use of multimodal techniques, which present more consistent clinical responses, in addition to reducing the consumption of opioids. The existence of multidisciplinary teams specialized in pain control in the hospital environment is able to assist in difficult cases and help in quality audits.

Keywords:
Acute pain; Critical care; Analgesia; Opioids analgesics; Pain management; Quality of health care

INTRODUÇÃO

Em pacientes críticos internados em unidade de terapia intensiva (UTI), a dor representa um sintoma frequente, adquirindo relevância na prática clínica diária a partir da década de 199111 Puntillo KA. Pain experiences of intensive care unit patients. Heart Lung. 1990;19(5 Pt 1):526-33.. Em 1995, a Sociedade Americana da Dor instituiu o sintoma como 5° sinal vital e, desde então, a necessidade de avaliação da dor e de seu melhor manuseio se tornou uma medida de qualidade da prática médica22 Morone NE, Weiner. DK. Pain as the 5th vital sign: exposing the vital need for pain education. Clin Ther. 2013;35(11):1728-32.. Além disso, apesar da percepção atual de magnitude, a dor ainda é mal controlada em grande parte das UTI em todo o mundo33 Gan TJ. Poorly controlled postoperative pain: prevalence, consequences and prevention. J Pain Res. 2017;10:2287-98..

Em redefinição conceitual, a sensação dolorosa aguda deve ser interpretada como uma experiência individual somática com percepção de ameaça à integridade física ou existencial capaz de envolver os componentes afetivos, cognitivos e comportamentais44 Cohen M, Quintner J, van Rysewyk S. Reconsidering the International Association for the Study of Pain definition of pain. Pain Rep. 2018;(2):e634.. Nesse contexto, o consenso atualizado sobre o manejo da dor aguda sugere avaliação e reavaliação sistemáticas, com tratamento focado em personalização e uso de terapêutica multimodal otimizada55 Devlin JW, Skrobik Y, Vice-chair F, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJC, et al. Clinical practice guidelines for the prevention and management of pain, agitation / sedation, delirium, immobility, and sleep disruption in adult patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e873..

O objetivo deste estudo foi explorar a temática da dor aguda nos pacientes críticos adultos, abordando alguns aspectos de fisiopatologia, porém com enfoque nas atualizações em relação a diagnóstico, terapêutica multimodal e discussão de seu controle como um marcador de boa prática assistencial.

CONTEÚDO

Foi realizada estratégia de busca com os descritores “dor aguda”, “cuidados intensivos”, “manejo da dor”, “opioides” e “qualidade assistencial” nos portais Pubmed e Cochrane. As referências dos artigos incluídos também foram pesquisadas quando consideradas relevantes. Foram selecionados artigos no período de 2011 a 2021, com enfoque em pesquisas observacionais e ensaios clínicos sobre o assunto, sendo aceitos artigos mais antigos se relacionados à temática de fisiopatologia ou publicações-chave no tema descrito (exemplo: avaliação de dor com escalas). Também foram incluídos consensos e revisões sobre o tema “dor aguda” quando publicados a partir de 2018. Não foram utilizados filtros de restrição a idioma.

DISCUSSÃO

A dor aguda representa uma resposta fisiológica a um estímulo nociceptivo, sendo percebida nas terminações periféricas e interpretada no sistema nervoso central. Além das vias neurais, a dor ativa vias inflamatórias e o sistema imune. As conexões centrais com o hipotálamo promovem a ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, ocorrendo secreção hormonal de cortisol, hormônio antidiurético, angiotensina II e glucagon, que promovem a resposta metabólica ao estresse, com hiperglicemia, retenção de água e sódio e aumento do consumo proteico e lipídico. Não é surpreendente, portanto, imaginar as consequências sistêmicas da resposta à dor aguda, haja vista a ativação de vias tão complexas e intrinsecamente relacionadas66 Basbaum AI, Bautista DM, Scherrer G, Julius D. Cellular and molecular mechanisms of pain. Cell. 2009;139(2):267-84. (Figura 1).

Figura 1
Fisiopatologia da dor

A prevalência exata da dor nas UTI é difícil de avaliar, dada a variabilidade dos estudos, porém, uma revisão sistemática apontou que aproximadamente 50% dos pacientes críticos referem dor e mais de 35% experimentam dor intensa em algum momento durante sua permanência hospitalar77 Gregory J, McGowan L. An examination of the prevalence of acute pain for hospitalised adult patients: a systematic review. J Clin Nurs. 2016;25(5-6):583-98.. A UTI é claramente um ambiente de múltiplos potenciais para dor e, embora avanços tenham ocorrido nos últimos anos, sua abordagem ainda é um desafio, especialmente em pacientes do sexo feminino, em ventilação mecânica, críticos crônicos, jovens com baixa resiliência, doenças psiquiátricas (depressão, ansiedade, bulimia e abuso de álcool) e usuários prévios de benzodiazepínicos88 Puntillo KA, Max A, Timsit J, Vignoud L, Chanques G, Robleda G, et al. Determinants of procedural pain intensity in the intensive care unit. Am J Respir Crit Care Med. 2014;189(1):39-47.,99 Puntillo KA, Max A, Timsit J F, Ruckly S, Chanques G, Robleda G, et al. Pain distress: the negative emotion associated with procedures in ICU patients. Intensive Care Med. 2018;44(9):1493-501..

Além disso, existe na literatura crescente evidência associando o mau controle da dor a piores desfechos clínicos1010 Olsen B F, Rustøen T, Sandvik L, Jacobsen M, Valeberg BT. Results of implementing a pain management algorithm in intensive care unit patients: the impact on pain assessment, length of stay, and duration of ventilation. J Crit Care. 2016;(36):207-11.. A dor mal controlada na UTI já está sabidamente associada a tempo maior de ventilação mecânica, internação e delirium1111 Hoc A P. Pain Assessment is associated with decreased duration of mechanical ventilation in the intensive care unit. Crit Care Med. 2009;111(6):1308-16.,1212 Sebbane M, Perrigault P, Mann C. Impact of systematic evaluation of pain and agitation in an intensive care unit. 2006;34(6):1691-9.,1313 Vaurio LE, Sands L P, Wang Y, Mullen EA, Leung JM. Postoperative delirium: the importance of pain and pain management. Anesth Analg. 2006;102(4):1267-73.. Em revisão sistemática publicada em 2015, pacientes críticos avaliados para dor tiveram analisados desfechos relativos ao tempo de UTI, complicações, eventos adversos, duração da ventilação mecânica e mortalidade1414 Georgiou E, Hadjibalassi M, Lambrinou E, Andreou P, Papathanassoglou ED. The impact of pain assessment on critically ill patients outcomes: a systematic review. Bio-med Res Int. 2015:2015:503830.. Apesar de diferenças metodológicas, o estudo confirma que a avaliação sistemática da dor parece ter impacto favorável em curto prazo. Em longo prazo, é sabido que os pacientes também podem evoluir com dor crônica e síndrome do estresse pós-traumático1515 Puntillo KA, Naidu R. Chronic pain disorders after critical illness and ICU-acquired opioid dependence. Curr Opin Crit Care. 2016;22(5):506-12.. Se a dor é responsável por esses piores desfechos, em contrapartida, seu adequado controle com o uso de analgesia peridural, por exemplo, pode reduzir eventos cardiovasculares, tromboembolismo pulmonar e promover recuperação mais rápida das funções orgânicas em pacientes críticos selecionados1616 Pöpping D. Impact of epidural analgesia on mortality and morbidity after surgery - systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Ann Surg. 2014;259(6):1056-67..

Avaliação da dor na unidade de terapia intensiva – das escalas conhecidas às novas tecnologias

O uso de escalas de dor na UTI advém de um processo de implementação heterogêneo, com validação e treinamento de escalas em perfis diferentes de pacientes. Como a experiência sensorial da dor é absolutamente pessoal, a própria percepção do profissional de saúde normalmente é falha, tendendo a subestimar a dor, enquanto os cuidadores e/ou familiares desses pacientes tendem a superestimá-la1717 Seers T, Derry S, Seers K, Moore RA. Professionals underestimate patients’ pain: a comprehensive review. Pain. 2018;195(5):811-8.. Em estudo multicêntrico, prospectivo e observacional, foi relatado que mais de 50% das UTI analisadas apresentavam instrumentos de aferição de dor e protocolos de analgesia, mas a aplicação de ambos chegava a ser inferior a 30% das coortes1818 Burry LD, Williamson DR, Perreault MM, Rose L, Cook DJ, Ferguson ND, et al. Analgesic, sedative, antipsychotic, and neuromuscular blocker use in Canadian intensive care units: a prospective, multicentre, observational study. Can J Anesth. 2014;61(7):619-30..

Apesar de nenhuma escala isoladamente ser sensível o bastante para avaliar corretamente a dor, a recomendação é de que pacientes capazes de reportar sua dor verbalmente devem ser avaliados pela escala numérica verbal (ENV zero – 10)1919 Ahlers SJ, van Gulik L, van der Veen AM, van Dongen H P, Bruins P, Belitser S V, et al. Comparison of different pain scoring systems in critically ill patients in a general ICU. Crit Care. 2008;12(1):R15.. O maior desafio reside nos pacientes críticos com dificuldades de autoexpressão. Na literatura, já se sabe que as flutuações isoladas dos sinais vitais são pouco preditivas para a avaliação da dor e devem ser encaradas como um evento adverso associado à dor intensa2020 Arbour C, Gélinas C. Are vital signs valid indicators for the assessment of pain in postoperative cardiac surgery ICU adults? Intensive Crit Care Nurs. 2010;26(2):83-90.. Nesses casos, a escala comportamental de dor (Behavior Pain Scale)2121 Payen J, Bru O, Bosson J, Lagrasta A. Assessing pain in critically ill sedated patients by using a behavioral pain scale. Crit Care Med. 2001;29(12):2258-63. e a Critical-Care Pain Observational Tool (CPOT)2222 Fillion L, Puntillo KA, Viens C, Fortier M, City Q. Validation of the critical-care pain observation tool in adult patients. Am J Crit Care. 2006;15(4):420-7. são ambas validadas, possuindo propriedades psicométricas robustas e reprodutibilidades similares nos estudos publicados, tanto para pacientes clínicos, quanto cirúrgicos e politraumatizados.

É importante considerar que a avaliação da dor em pacientes com trauma cranioencefálico, queimados, pacientes com delirium e/ou demência acentuados é ainda um desafio. Os estudos considerando esse perfil de pacientes, principalmente os comatosos ou profundamente sedados, apontam para o uso do índice bispectral e o uso de pupilometria na tentativa de objetivar essa avaliação2323 Lukaszewicz A, Dereu D, Gayat E, Payen D. The relevance of pupillometry for evaluation of analgesia. Anesth Analg. 2015;120(6):1297-300.. Em estudo com 100 pacientes de pós-operatório (PO) imediato, foi encontrada alta correlação (0,88 p<0,001) entre a intensidade de dor medida por meio da ENV de dor e o reflexo pupilar aferido com pupilômetro à beira leito como guia para a titulação de morfina por via intravenosa2424 Aubrun F, Beaussier M. Objective assessment of the immediate postoperative analgesia using pupillary reflex measurement. a prospective and observational study. Anes-thesiology. 2012;116(5):1006-12..

Recentemente, foi publicado o uso de uma nova monitorização da analgesia (Analgesia Nociception Index), utilizando eletrodos de eletrocardiograma integrados a um modelo computacional de interpretação de dados, incluindo as funções subcorticais, os reflexos de receptores brônquicos, o núcleo do nervo vago e os estímulos do nó sinoatrial2525 Daccache G, Jeanne M, Fletcher D. The analgesia nociception index: tailoring opioid administration. Anesth Analg. 2017;125(1):15-7.. Estudos têm sido publicados na tentativa de validar essa nova modalidade para reduzir o consumo de opioides no PO2626 Upton HD, Hons B, Ludbrook GL, Wing A, Hons B, Hons B, et al. Intraoperative “analgesia nociception index”– guided fentanyl administration during sevoflurane anesthesia in lumbar discectomy and laminectomy: a randomized clinical trial. Anesth Analg. 2017;125(1):81-90.. Utilizando tecnologia semelhante, foi desenvolvido um monitor que integra os dados de variabilidade cardíaca à temperatura, pletismografia e resposta de condutância da pele numa plataforma multiparamétrica (Nociception Level Index), via dispositivo colocado em um quirodácilo. Através de algoritmos avançados de inteligência artificial, a nocicepção é apresentada numa escala de zero a 100, variando de nenhuma dor até dor intensa. Sua validação também vem sendo realizada em pacientes no perioperatório2727 Edry R, Recea V, Dikust Y, Sessler D. Preliminary intraoperative validation of the nociception level index. Anesthesiology. 2016;125(1):193-203., com perfis mais graves. Ainda utilizando inteligência artificial, uma publicação recente descreveu a idealização de algoritmos especializados em análise de imagens de expressão facial, configurando uma potencial ferramenta na detecção e análise à beira leito da dor e sua intensidade2828 Bargshady G, Zhou X, Deo RC, Soar J, Whittaker F, Wang H. Enhanced deep learning algorithm development to detect pain intensity from facial expression images. Expert Syst Appl. 2020;149. em pacientes incapazes de expressar sua dor.

Dor na unidade de terapia intensiva e o uso (excessivo) de opioides

Os opioides são os fármacos mais utilizados no manejo da dor nos pacientes críticos, apesar do conhecimento atual de seus efeitos adversos, como tolerância, dependência e síndrome de abstinência. A tolerância parece ser um problema ainda maior em pacientes queimados, com ventilação mecânica prolongada e pediátricos2929 Martyn JAJ, Mao J, Bittner EA. Opioid tolerance in critical illness. N Engl J Med. 2019;380(4):365-78.. Seu uso adquiriu dimensões tão significativas que se tornou uma questão de saúde pública nos EUA. Em 2017, analisando o impacto dessa situação nas UTI do país, foi observado que o número de mortes por abuso de opioides aumentou substancialmente nos últimos anos dentro das UTI3030 Stevens J P, Wall MJ, Novack L, Marshall J, Hsu DJ, Howell MD. The critical care crisis of opioid overdoses in the United States. Ann Am Thorac Soc. 2017;14(12):1803-9..

Os opioides ainda apresentam indicação formal para o controle da dor moderada à intensa55 Devlin JW, Skrobik Y, Vice-chair F, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJC, et al. Clinical practice guidelines for the prevention and management of pain, agitation / sedation, delirium, immobility, and sleep disruption in adult patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e873., sendo que a escolha do fármaco e a dose devem ser titulados de acordo com o perfil do paciente. Além da indução de íleo metabólico e hipotensão, o uso de opioides pode estar relacionado a delirium e imunossupressão2929 Martyn JAJ, Mao J, Bittner EA. Opioid tolerance in critical illness. N Engl J Med. 2019;380(4):365-78.,3131 Kosciuczuk U, Knapp P, Lotowska-Cwiklewska AM. Opioid-induced immunosuppression and carcinogenesis promotion theories create the newest trend in acute and chronic pain pharmacotherapy. Clinics. 2020;75:e1554.. Nos pacientes críticos, atenção particular deve ser dada aos que apresentam alteração do volume de distribuição corporal, polifarmácia e alterações renais e hepáticas.

O uso prolongado de opioides ocasiona estímulo persistente aos neuro receptores, promovendo dessensibilização e sinalização de vias pró-nociceptivas2929 Martyn JAJ, Mao J, Bittner EA. Opioid tolerance in critical illness. N Engl J Med. 2019;380(4):365-78., resultando em escalonamento de doses por tolerância. Além disso, o uso de opioides, em associação a estados inflamatórios, infecções e estresse, promove neuroinflamação pela ativação de receptores gliais no sistema nervoso central3232 Hutchinson MR, Shavit Y, Grace PM, Rice KC, Maier S F, Watkins LR. Exploring the neuroimmunopharmacology of opioids: an integrative review of mechanisms of central immune signaling and their implications for opioid analgesia. Pharmacol Rev. 2011;63(3):772-810., fator relacionado à indução de hiperalgesia. Conforme a literatura, esses eventos parecem ainda piores nos pacientes críticos quando comparados a outros pacientes.

Em função dessas evidências atuais, há um esforço acadêmico no uso estratégico de medidas analgésicas que poupam opioides. Quando necessário e imprescindível, os opioides devem ser utilizados nas menores doses possíveis e em curto período, com ajustes diários, e em associação ao uso de outros fármacos analgésicos. O remifentanil, por exemplo, deve ser evitado pela potente indução de hiperalgesia. Em pacientes críticos com histórico do uso abusivo de opioides e tolerância, pode ser necessária a rotação de opioides para subverter a dessensibilização dos receptores ou metabólitos ativos (por exemplo, o uso de metadona). Em pacientes com hiperalgesia, o uso de opioides pode ocasionar piora da dor, sendo necessário o uso de terapia multimodal, com ativação de outros receptores nociceptivos para controle álgico2929 Martyn JAJ, Mao J, Bittner EA. Opioid tolerance in critical illness. N Engl J Med. 2019;380(4):365-78..

Abordagem da dor aguda e terapêutica multimodal

Nos últimos anos, surgiu o conceito de analgosedação, objetivando analgesia em vez de sedação nos pacientes críticos agudos, permitindo sedação mínima ou ausente, inclusive durante ventilação mecânica, com melhores desfechos, tais como menor tempo de internação na UTI3333 Faust A, Rajan P, Sheperd LA. Impact of an analgesia-based sedation protocol on mechanically ventilated patients in a medical intensive care unit. Anesth Analg. 2016;123(4):903-9.. Esse processo também promoveu racionalização nos efeitos negativos dos sedativos, principalmente de benzodiazepínicos. O conceito mais amplo atual de boa prática é de cuidado centrado no paciente3434 Vincent JL, Shehabi Y, Walsh TS, Pandharipande PP, Ball JA, Spronk P, et al. Comfort and patient-centred care without excessive sedation: the eCASH concept. Intensive Care Med. 2016;42(9):962-71.,3535 Marra A, Ely E, Pandharipande P. The ABCDEF Bundle in Critical Care. Crit Care Clin. 2017;33(2):225-43., permitindo conforto com analgesia adequada, o mínimo de sedativos e o máximo de humanização (além de políticas abertas de visitação e protocolos de mobilização). O racional é personalizar o nível de conforto (dor total)3636 Rustam JS, Kongsuwan W, Kitrungrote L. Comfort in patients receiving mechanical ventilation : a literature review. Crit Care Nurs J. 2018;11(2):1-7., tentando avaliar o componente doloroso não de maneira numérica e isolada, mas englobando os componentes psicossocial e afetivo dos pacientes através de análise qualitativa e de funcionalidade.

A analgesia multimodal, que se caracteriza pelo controle álgico através da associação de diferentes fármacos com diversos mecanismos de bloqueio nociceptivo, deve ser valorizada por ser altamente eficiente no tratamento da dor, quando comparada ao uso de apenas um analgésico em alta dose, além de facilitar a estratégia poupadora de opioide, inclusive em pacientes de trauma3737 Hamrick KL, Beyer CA, Lee JA, Cocanour CS, Duby JJ. Multimodal analgesia and opioid use in critically ill trauma patients. J Am Coll Surg. 2019;228(5):769-775.e1.,3838 Frauenknecht J, Kirkham KR, Albrecht E. Analgesic impact of intra-operative opioids vs opioid-free anaesthesia: a systematic review and meta-analysis. Anaesthesia. 2019;(74):651-62.. A terapêutica multimodal inclui o uso combinado de analgésicos comuns (dipirona e paracetamol) e doses controladas de anti-inflamatórios não esteroides (AINES), além do uso adjuvante de demais fármacos, como os agonistas alfa-adrenérgicos (dexmedetomidina), assim como a cetamina e a lidocaína, em combinações personalizadas a depender do perfil do paciente e da necessidade analgésica apresentada3939 Wampole CR, Smith KE. Beyond opioids for pain management in adult critically ill patients. J Pharm Pract. 2019;32(3):256-70.,4040 Harvin JA, Kao LS. Pain management in the surgical ICU patient. Curr Opin Crit Care. 2020;26(6):628-33. (Tabela 1).

Tabela 1
Opções farmacológicas para manejo da dor aguda.

A dexmedetomidina é um agente alfa2-agonista central altamente seletivo de meia-vida curta que promove efeito sedativo sem depressão do sistema nervoso central e com potencial analgésico via modulação do corno posterior da medula espinhal, sendo atualmente um fármaco com bom perfil de titulação em pacientes críticos4141 Kaye AD, Chernobylsky DJ, Thakur P, Siddaiah H, Kaye RJ, Eng LK, et al. Dexmedetomidine in enhanced recovery after surgery (ERAS) protocols for postoperative pain. Curr Pain Headache Rep. 2020;24(5):21..

Especialmente em pacientes cirúrgicos, diversas publicações apontam para controle álgico durante adjuvância, com boa tolerabilidade (deve-se atentar para hipotensão e bradicardia, em especial). Em cirurgias laparoscópicas, o uso do fármaco reduz a dor intensa pós-cirúrgica, a necessidade analgésica e o tempo para uso de analgesia de resgate4242 Panchgar V, Shetti AN, Sunitha HB, Dhulkhed VK, Nadkarni AV. The effectiveness of intravenous dexmedetomidine on perioperative hemodynamics, analgesic requirement, and side effects profile in patients undergoing laparoscopic surgery under general anesthesia. Anesth Essays Res. 2017;11(1):72-7.. Há também referência na literatura do uso adjuvante da dexmedetomidina na modalidade de analgesia controlada pelo paciente (ACP) e como fármaco adjunto nos bloqueios regionais, propiciando bom controle álgico em pacientes de abordagem livre de opioides do protocolo de recuperação cirúrgica otimizada (ERAS)4141 Kaye AD, Chernobylsky DJ, Thakur P, Siddaiah H, Kaye RJ, Eng LK, et al. Dexmedetomidine in enhanced recovery after surgery (ERAS) protocols for postoperative pain. Curr Pain Headache Rep. 2020;24(5):21.. A cetamina é um fármaco que induz sedação e analgesia mediada pela inibição dos receptores N-methyl-D-aspartate (NMDA) e ativação de receptores opioides do tipo µ. Pode provocar taquicardia e hipertensão, com mínimo efeito depressor central, porém atenção deve ser dada aos seus efeitos dissociativos descritos na literatura4343 Brown K, Tucker C. Ketamine for acute pain management and sedation. Crit Care Nurse. 2020;40(5):26-33.. O último consenso de manejo da dor (2018) recomenda o uso da cetamina como fármaco adjuvante ao uso de opioides para o manejo da dor PO em pacientes críticos55 Devlin JW, Skrobik Y, Vice-chair F, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJC, et al. Clinical practice guidelines for the prevention and management of pain, agitation / sedation, delirium, immobility, and sleep disruption in adult patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e873.. Além disso, vem aumentando as publicações sobre o uso adjuvante de doses subanestésicas (~0,1mg/ kg/h) no manejo da ventilação mecânica4444 Lipscomb J. Subanesthetic ketamine for acute pain in critically ill patients. US Pharm. 2020;45(4):1-10. e seu uso no controle de hiperanalgesia induzida por opioides4343 Brown K, Tucker C. Ketamine for acute pain management and sedation. Crit Care Nurse. 2020;40(5):26-33.. Em revisão sistemática recente no âmbito cirúrgico, o uso da cetamina foi bem tolerada e reduziu de forma significativa o consumo de opioides e outros analgésicos em pacientes de PO geral, incluindo procedimentos ortopédicos4545 Brinck EC, Tiippana E, Heesen M, Bell R F, Straube S, Moore RA, et al. Perioperative intravenous ketamine for acute postoperative pain in adults (Review). Cochrane Database Syst Rev. 2018;(12):CD012033.. A lidocaína é um fármaco antiarrítmico e com efeito anestésico de mecanismo multimodal, sendo atualmente utilizada em administração intravenosa para controle da dor PO, além do uso em pacientes oncológicos e com HIO ou dor neuropática. Em concentrações terapêuticas, promove bloqueio dos canais de sódio, supressão de potenciais de ação em fibras neuronais lesadas e efeito anti-inflamatório; porém, em doses maiores, pode promover bloqueio em uma grande gama de receptores, podendo acarretar alto risco cardiovascular e neurotoxicidade. A correlação entre níveis plasmáticos adequados e sinais e sintomas de toxicidade não parece ser linear4646 Mo Y, Thomas MC, Antigua AD, Ebied AM, Karras GE Jr. Continuous lidocaine infusion as adjunctive analgesia in intensive care unit patients. J Clin Pharmacol. 2017;57(7):830-6..

Conforme descrito em consenso internacional recente sobre eficácia e segurança no uso analgésico PO, deve-se utilizar até 1,5 mg/kg/h em infusão contínua por, no máximo, 24 h, sob monitorização e reavaliação, não concomitante ao uso em bloqueios regionais4747 Foo I, Macfarlane AJR, Srivastava D, Bhaskar A, Barker H, Knaggs R, et al. The use of intravenous lidocaine for postoperative pain and recovery: international consensus statement on efficacy and safety. Anaesthesia. 2021;76(2):238-50.. A revisão sistemática mais recente, com inclusão de diversos tipos de cirurgias abertas e laparoscópicas (4525 pacientes em 68 estudos), concluiu, devido à heterogeneidade dos estudos, que não houve significante efeito no uso da lidocaína em reduzir o consumo de opioides e nos escores de dor no uso acima de 24h4848 Weibel S, Jelting Y, Pace NL, Helf A, Eberhart LH, Hahnenkamp K, et al. Continuous intravenous perioperative lidocaine infusion for postoperative pain and recovery in adults. Cochrane Database Syst Rev. 2018;(6):CD009642..

Nas últimas décadas, ocorreu grande avanço nas técnicas intervencionistas para manejo da dor. Os bloqueios atuais, guiados por ultrassonografia, parecem seguros, mesmo em pacientes críticos com coagulopatia4949 Wiebalck A, Grau T. Ultrasound imaging techniques for regional blocks in intensive care patients. Crit Care Med. 2007;35(5 Suppl)S268-74.. Há benefício em analgesia, redução do consumo de opioides e de dor crônica pós-operatória através de modulação adrenérgica, inflamatória e imune, inclusive em pacientes de maior morbidade e cirurgias oncológicas, perfis bastante presentes nas UTI modernas5050 Albrecht E, Chin KJ. Advances in regional anaesthesia and acute pain management: a narrative review. Anaesthesia. 2020;75:(Suppl 1):e101-e110.,5151 Cata J P. Outcomes of regional anesthesia in cancer patients. Curr Opin Anaesthesiol. 2018;(31):593-600.. Nas cirurgias ortopédicas de quadril e joelho, já é bem estabelecido o papel da anestesia de neuroeixo em relação à anestesia geral na redução de piores desfechos, incluindo mortalidade5252 Perlas A, Chan VW, Beattie S. Anesthesia technique and mortality after total hip or knee arthroplasty: a retrospective. Propensity score-matched cohort study. Anesthesiology. 2016;125(4):724-31.. Especialmente em pacientes de cirurgias torácicas e abdominais complexas, o uso dos bloqueios regionais combinados à anestesia peridural são enfatizados na literatura para o melhor controle da dor PO55 Devlin JW, Skrobik Y, Vice-chair F, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJC, et al. Clinical practice guidelines for the prevention and management of pain, agitation / sedation, delirium, immobility, and sleep disruption in adult patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e873.,5050 Albrecht E, Chin KJ. Advances in regional anaesthesia and acute pain management: a narrative review. Anaesthesia. 2020;75:(Suppl 1):e101-e110.. Além disso, há emergência de bloqueios em planos fasciais, com boas evidências em manejo da dor aguda e menos efeitos adversos (retenção urinária e hipotensão), principalmente em abordagens toraco-abdominais5353 Shaker TM, Carroll JT, Chung MH, Koehler TJ, Lane BR, Wolf AM, et al. Efficacy and safety of transversus abdominis plane blocks versus thoracic epidural anesthesia in patients undergoing major abdominal oncologic resections: a prospective, randomized controlled trial. Am J Surg. 2018;215(3):498-501.,5454 Sari S, Kumar J, Turan A. New peripheral nerve blocks and local anesthetics. Curr Opin Crit Care. 2021;27(6):732-42., favorecendo satisfação, reabilitação precoce e menor tempo de internação. Apesar dos avanços atuais, ainda existe um amplo campo de pesquisas em andamento no assunto, principalmente em técnicas de aplicação e manejo de infusões diretamente em feridas mais complexas, uso de anestésicos de meia-vida mais prolongada (16 h x 72 h) e uso de fármacos intravenosos e perineurais adjuntas para potencialização dos efeitos analgésicos5555 Mudumbai SC, Auyong DB, Memtsoudis SG, Mariano ER. A pragmatic approach to evaluating new techniques in regional anesthesia and acute pain medicine. Pain Manag. 2018;8(6):475-85..

O uso de opioides em sistemas de ACP parece ser eficaz para controle da dor e melhora da satisfação dos pacientes5757 McNicol ED, Ferguson MC, Hudcova J. Patient controlled opioid analgesia versus non-patient controlled opioid analgesia for postoperative pain. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(6):CD003348.. As bombas modernas permitem liberação do fármaco pelo próprio paciente em doses programadas pela equipe de saúde e com limite de administração por dose e intervalos de tempo, a fim de evitar acúmulo e toxicidade. Além do uso de opioides, os sistemas atuais permitem a infusão de outros analgésicos (como AINES, anestésicos e dexmedetomidina) em uso peridural, subcutâneo e transdérmico5858 Morlion B, Schäfer M, Betteridge N, Kalso E, Morlion B, Schäfer M, et al. Non-invasive patient-controlled analgesia in the management of acute postoperative pain in the hospital setting. Curr Med Res Opin. 2018;34(7):1179-86..

Outros métodos de controle de dor não invasivos e de fácil manejo têm sido publicados, tais como tabletes sublinguais, adesivos e sistemas transdérmicos (fentanil, lidocaína e, mais recentemente, dex-medetomidina), porém com evidências ainda escassas em relação a emprego e eficácia na dor aguda5555 Mudumbai SC, Auyong DB, Memtsoudis SG, Mariano ER. A pragmatic approach to evaluating new techniques in regional anesthesia and acute pain medicine. Pain Manag. 2018;8(6):475-85.,5858 Morlion B, Schäfer M, Betteridge N, Kalso E, Morlion B, Schäfer M, et al. Non-invasive patient-controlled analgesia in the management of acute postoperative pain in the hospital setting. Curr Med Res Opin. 2018;34(7):1179-86.,5959 Bai Y, Miller T, Tan M, Law LS, Gan TJ. Lidocaine patch for acute pain management: a meta-analysis of prospective controlled trials. Curr Med Res Opin. 2015;(31):575-81..

Há recomendação também para ampliação do uso de terapias não farmacológicas e seguimento psicoterapêutico no manejo da dor, principalmente nos pacientes oncológicos, tais como musicoterapia, acupuntura e crioterapia55 Devlin JW, Skrobik Y, Vice-chair F, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJC, et al. Clinical practice guidelines for the prevention and management of pain, agitation / sedation, delirium, immobility, and sleep disruption in adult patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e873.. A familiaridade com essas terapias deve englobar toda a equipe multiprofissional e cada proposta terapêutica deve se adequar individualmente a cada paciente tratado. É imprescindível que as reavaliações sejam frequentes e as terapias reajustadas a qualquer momento, objetivando o balanço entre conforto e efeitos adversos.

Cabe ainda ressaltar que o emprego crescente de serviços especializados em dor dentro do ambiente crítico parece melhorar a satisfação e a qualidade do cuidado6060 Farooq F, Khan R, Ahmed A. Assessment of patient satisfaction with acute pain management service: Monitoring quality of care in clinical setting. Indian J Anaesth. 2016;(30):248-52., principalmente em pacientes com manejo mais difícil, tais como aqueles com dor crônica agudizada, com dor aguda de difícil manejo após traumas extensos, em pacientes com tolerância/dependência a opioides e em subpopulações de maior risco (idosos, sedados, graves). Essas equipes (multidisciplinares) também auxiliam nos registros, no gerenciamento de protocolos, na educação continuada sobre tratamentos, nos efeitos adversos encontrados e na auditoria de dados.

Sobre o futuro

O estudo translacional para terapias promissoras no controle da dor na UTI pode representar um avanço futuro6161 Knezevic NN, Yekkirala A, Yaksh TL. Basic/translational development of forthcoming opioid- and nonopioid-targeted pain therapeutics. Anesth Analg. 2017;125(5):1714-32.. Dentre os fármacos mais promissores, os agonistas dos receptores nicotínicos da acetilcolina parecem reduzir a ativação glial, modulando a resposta imune inflamatória e promovendo efeito central nos mecanismos de dor e hiperalgesia6262 Ren C, Tong YL, Li JC, Lu ZQ, Yao YM. The protective efect of alpha 7 nicotinic acetylcholine receptor activation on critical illness and its mechanism. Int J Biol Sci. 2017;13(1):46-56..

Ainda existem assuntos a serem explorados, por exemplo: quais fatores associados a sexo, idade, etnia e comportamentos afetam a percepção dolorosa e a farmacogenômica dos diversos fármacos nesse contexto, qual a melhor medida objetiva de dor em pacientes que não conseguem se comunicar6363 Gélinas C. Pain assessment in the critically ill adult : recent evidence and new trends. Intensive Crit Care Nurs. 2016;34:1-11., como biomarcadores séricos de dor poderiam auxiliar nesse processo6464 Niculescu AB, Le-Niculescu H, Levey D F, Roseberry K, Soe KC, Rogers J, Jones FK, et al. Towards precision medicine for pain: diagnostic biomarkers and repurposed drugs. Mol Psychiatry. 2019;24(24):501-22., quais as melhores combinações e doses de fármacos analgésicos adjuntos aos opioides e quais outros desfechos negativos em órgãos-alvo a dor aguda pode ocasionar. Além disso, há carência de ensaios clínicos randomizados no assunto, em grande parte por questões éticas. Novos estudos podem auxiliar no maior entendimento em relação à avaliação de intensidade da dor, eficiência de sedativos e analgésicos, eventos adversos e complicações associadas aos analgésicos, desfechos negativos e, inclusive, sobre a associação entre dor e inflamação, através da dosagem sérica de neuropeptídios circulantes e marcadores bioquímicos.

CONCLUSÃO

Por seus efeitos sistêmicos e sua prevalência, a dor aguda ainda é problemática relevante nas UTI. Novos métodos diagnósticos estão sendo comercializados com a proposta de objetivar essa avaliação em pacientes complexos. A abordagem da dor aguda deve priorizar o emprego de técnicas multimodais, que apresentam respostas clínicas mais consistentes, além de redução no consumo de opioides. A existência de equipes multidisciplinares especializadas no controle da dor no ambiente hospitalar é capaz de auxiliar em casos difíceis e ajudar nas auditorias de qualidade.

  • Fontes de fomento: não há.

REFERENCES

  • 1
    Puntillo KA. Pain experiences of intensive care unit patients. Heart Lung. 1990;19(5 Pt 1):526-33.
  • 2
    Morone NE, Weiner. DK. Pain as the 5th vital sign: exposing the vital need for pain education. Clin Ther. 2013;35(11):1728-32.
  • 3
    Gan TJ. Poorly controlled postoperative pain: prevalence, consequences and prevention. J Pain Res. 2017;10:2287-98.
  • 4
    Cohen M, Quintner J, van Rysewyk S. Reconsidering the International Association for the Study of Pain definition of pain. Pain Rep. 2018;(2):e634.
  • 5
    Devlin JW, Skrobik Y, Vice-chair F, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJC, et al. Clinical practice guidelines for the prevention and management of pain, agitation / sedation, delirium, immobility, and sleep disruption in adult patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e873.
  • 6
    Basbaum AI, Bautista DM, Scherrer G, Julius D. Cellular and molecular mechanisms of pain. Cell. 2009;139(2):267-84.
  • 7
    Gregory J, McGowan L. An examination of the prevalence of acute pain for hospitalised adult patients: a systematic review. J Clin Nurs. 2016;25(5-6):583-98.
  • 8
    Puntillo KA, Max A, Timsit J, Vignoud L, Chanques G, Robleda G, et al. Determinants of procedural pain intensity in the intensive care unit. Am J Respir Crit Care Med. 2014;189(1):39-47.
  • 9
    Puntillo KA, Max A, Timsit J F, Ruckly S, Chanques G, Robleda G, et al. Pain distress: the negative emotion associated with procedures in ICU patients. Intensive Care Med. 2018;44(9):1493-501.
  • 10
    Olsen B F, Rustøen T, Sandvik L, Jacobsen M, Valeberg BT. Results of implementing a pain management algorithm in intensive care unit patients: the impact on pain assessment, length of stay, and duration of ventilation. J Crit Care. 2016;(36):207-11.
  • 11
    Hoc A P. Pain Assessment is associated with decreased duration of mechanical ventilation in the intensive care unit. Crit Care Med. 2009;111(6):1308-16.
  • 12
    Sebbane M, Perrigault P, Mann C. Impact of systematic evaluation of pain and agitation in an intensive care unit. 2006;34(6):1691-9.
  • 13
    Vaurio LE, Sands L P, Wang Y, Mullen EA, Leung JM. Postoperative delirium: the importance of pain and pain management. Anesth Analg. 2006;102(4):1267-73.
  • 14
    Georgiou E, Hadjibalassi M, Lambrinou E, Andreou P, Papathanassoglou ED. The impact of pain assessment on critically ill patients outcomes: a systematic review. Bio-med Res Int. 2015:2015:503830.
  • 15
    Puntillo KA, Naidu R. Chronic pain disorders after critical illness and ICU-acquired opioid dependence. Curr Opin Crit Care. 2016;22(5):506-12.
  • 16
    Pöpping D. Impact of epidural analgesia on mortality and morbidity after surgery - systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Ann Surg. 2014;259(6):1056-67.
  • 17
    Seers T, Derry S, Seers K, Moore RA. Professionals underestimate patients’ pain: a comprehensive review. Pain. 2018;195(5):811-8.
  • 18
    Burry LD, Williamson DR, Perreault MM, Rose L, Cook DJ, Ferguson ND, et al. Analgesic, sedative, antipsychotic, and neuromuscular blocker use in Canadian intensive care units: a prospective, multicentre, observational study. Can J Anesth. 2014;61(7):619-30.
  • 19
    Ahlers SJ, van Gulik L, van der Veen AM, van Dongen H P, Bruins P, Belitser S V, et al. Comparison of different pain scoring systems in critically ill patients in a general ICU. Crit Care. 2008;12(1):R15.
  • 20
    Arbour C, Gélinas C. Are vital signs valid indicators for the assessment of pain in postoperative cardiac surgery ICU adults? Intensive Crit Care Nurs. 2010;26(2):83-90.
  • 21
    Payen J, Bru O, Bosson J, Lagrasta A. Assessing pain in critically ill sedated patients by using a behavioral pain scale. Crit Care Med. 2001;29(12):2258-63.
  • 22
    Fillion L, Puntillo KA, Viens C, Fortier M, City Q. Validation of the critical-care pain observation tool in adult patients. Am J Crit Care. 2006;15(4):420-7.
  • 23
    Lukaszewicz A, Dereu D, Gayat E, Payen D. The relevance of pupillometry for evaluation of analgesia. Anesth Analg. 2015;120(6):1297-300.
  • 24
    Aubrun F, Beaussier M. Objective assessment of the immediate postoperative analgesia using pupillary reflex measurement. a prospective and observational study. Anes-thesiology. 2012;116(5):1006-12.
  • 25
    Daccache G, Jeanne M, Fletcher D. The analgesia nociception index: tailoring opioid administration. Anesth Analg. 2017;125(1):15-7.
  • 26
    Upton HD, Hons B, Ludbrook GL, Wing A, Hons B, Hons B, et al. Intraoperative “analgesia nociception index”– guided fentanyl administration during sevoflurane anesthesia in lumbar discectomy and laminectomy: a randomized clinical trial. Anesth Analg. 2017;125(1):81-90.
  • 27
    Edry R, Recea V, Dikust Y, Sessler D. Preliminary intraoperative validation of the nociception level index. Anesthesiology. 2016;125(1):193-203.
  • 28
    Bargshady G, Zhou X, Deo RC, Soar J, Whittaker F, Wang H. Enhanced deep learning algorithm development to detect pain intensity from facial expression images. Expert Syst Appl. 2020;149.
  • 29
    Martyn JAJ, Mao J, Bittner EA. Opioid tolerance in critical illness. N Engl J Med. 2019;380(4):365-78.
  • 30
    Stevens J P, Wall MJ, Novack L, Marshall J, Hsu DJ, Howell MD. The critical care crisis of opioid overdoses in the United States. Ann Am Thorac Soc. 2017;14(12):1803-9.
  • 31
    Kosciuczuk U, Knapp P, Lotowska-Cwiklewska AM. Opioid-induced immunosuppression and carcinogenesis promotion theories create the newest trend in acute and chronic pain pharmacotherapy. Clinics. 2020;75:e1554.
  • 32
    Hutchinson MR, Shavit Y, Grace PM, Rice KC, Maier S F, Watkins LR. Exploring the neuroimmunopharmacology of opioids: an integrative review of mechanisms of central immune signaling and their implications for opioid analgesia. Pharmacol Rev. 2011;63(3):772-810.
  • 33
    Faust A, Rajan P, Sheperd LA. Impact of an analgesia-based sedation protocol on mechanically ventilated patients in a medical intensive care unit. Anesth Analg. 2016;123(4):903-9.
  • 34
    Vincent JL, Shehabi Y, Walsh TS, Pandharipande PP, Ball JA, Spronk P, et al. Comfort and patient-centred care without excessive sedation: the eCASH concept. Intensive Care Med. 2016;42(9):962-71.
  • 35
    Marra A, Ely E, Pandharipande P. The ABCDEF Bundle in Critical Care. Crit Care Clin. 2017;33(2):225-43.
  • 36
    Rustam JS, Kongsuwan W, Kitrungrote L. Comfort in patients receiving mechanical ventilation : a literature review. Crit Care Nurs J. 2018;11(2):1-7.
  • 37
    Hamrick KL, Beyer CA, Lee JA, Cocanour CS, Duby JJ. Multimodal analgesia and opioid use in critically ill trauma patients. J Am Coll Surg. 2019;228(5):769-775.e1.
  • 38
    Frauenknecht J, Kirkham KR, Albrecht E. Analgesic impact of intra-operative opioids vs opioid-free anaesthesia: a systematic review and meta-analysis. Anaesthesia. 2019;(74):651-62.
  • 39
    Wampole CR, Smith KE. Beyond opioids for pain management in adult critically ill patients. J Pharm Pract. 2019;32(3):256-70.
  • 40
    Harvin JA, Kao LS. Pain management in the surgical ICU patient. Curr Opin Crit Care. 2020;26(6):628-33.
  • 41
    Kaye AD, Chernobylsky DJ, Thakur P, Siddaiah H, Kaye RJ, Eng LK, et al. Dexmedetomidine in enhanced recovery after surgery (ERAS) protocols for postoperative pain. Curr Pain Headache Rep. 2020;24(5):21.
  • 42
    Panchgar V, Shetti AN, Sunitha HB, Dhulkhed VK, Nadkarni AV. The effectiveness of intravenous dexmedetomidine on perioperative hemodynamics, analgesic requirement, and side effects profile in patients undergoing laparoscopic surgery under general anesthesia. Anesth Essays Res. 2017;11(1):72-7.
  • 43
    Brown K, Tucker C. Ketamine for acute pain management and sedation. Crit Care Nurse. 2020;40(5):26-33.
  • 44
    Lipscomb J. Subanesthetic ketamine for acute pain in critically ill patients. US Pharm. 2020;45(4):1-10.
  • 45
    Brinck EC, Tiippana E, Heesen M, Bell R F, Straube S, Moore RA, et al. Perioperative intravenous ketamine for acute postoperative pain in adults (Review). Cochrane Database Syst Rev. 2018;(12):CD012033.
  • 46
    Mo Y, Thomas MC, Antigua AD, Ebied AM, Karras GE Jr. Continuous lidocaine infusion as adjunctive analgesia in intensive care unit patients. J Clin Pharmacol. 2017;57(7):830-6.
  • 47
    Foo I, Macfarlane AJR, Srivastava D, Bhaskar A, Barker H, Knaggs R, et al. The use of intravenous lidocaine for postoperative pain and recovery: international consensus statement on efficacy and safety. Anaesthesia. 2021;76(2):238-50.
  • 48
    Weibel S, Jelting Y, Pace NL, Helf A, Eberhart LH, Hahnenkamp K, et al. Continuous intravenous perioperative lidocaine infusion for postoperative pain and recovery in adults. Cochrane Database Syst Rev. 2018;(6):CD009642.
  • 49
    Wiebalck A, Grau T. Ultrasound imaging techniques for regional blocks in intensive care patients. Crit Care Med. 2007;35(5 Suppl)S268-74.
  • 50
    Albrecht E, Chin KJ. Advances in regional anaesthesia and acute pain management: a narrative review. Anaesthesia. 2020;75:(Suppl 1):e101-e110.
  • 51
    Cata J P. Outcomes of regional anesthesia in cancer patients. Curr Opin Anaesthesiol. 2018;(31):593-600.
  • 52
    Perlas A, Chan VW, Beattie S. Anesthesia technique and mortality after total hip or knee arthroplasty: a retrospective. Propensity score-matched cohort study. Anesthesiology. 2016;125(4):724-31.
  • 53
    Shaker TM, Carroll JT, Chung MH, Koehler TJ, Lane BR, Wolf AM, et al. Efficacy and safety of transversus abdominis plane blocks versus thoracic epidural anesthesia in patients undergoing major abdominal oncologic resections: a prospective, randomized controlled trial. Am J Surg. 2018;215(3):498-501.
  • 54
    Sari S, Kumar J, Turan A. New peripheral nerve blocks and local anesthetics. Curr Opin Crit Care. 2021;27(6):732-42.
  • 55
    Mudumbai SC, Auyong DB, Memtsoudis SG, Mariano ER. A pragmatic approach to evaluating new techniques in regional anesthesia and acute pain medicine. Pain Manag. 2018;8(6):475-85.
  • 56
    Savard X, Pinard A, Perioperative use of gabapentinoids for the management of postoperative acute pain. Anesthesiology. 2020;133(2):265-79.
  • 57
    McNicol ED, Ferguson MC, Hudcova J. Patient controlled opioid analgesia versus non-patient controlled opioid analgesia for postoperative pain. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(6):CD003348.
  • 58
    Morlion B, Schäfer M, Betteridge N, Kalso E, Morlion B, Schäfer M, et al. Non-invasive patient-controlled analgesia in the management of acute postoperative pain in the hospital setting. Curr Med Res Opin. 2018;34(7):1179-86.
  • 59
    Bai Y, Miller T, Tan M, Law LS, Gan TJ. Lidocaine patch for acute pain management: a meta-analysis of prospective controlled trials. Curr Med Res Opin. 2015;(31):575-81.
  • 60
    Farooq F, Khan R, Ahmed A. Assessment of patient satisfaction with acute pain management service: Monitoring quality of care in clinical setting. Indian J Anaesth. 2016;(30):248-52.
  • 61
    Knezevic NN, Yekkirala A, Yaksh TL. Basic/translational development of forthcoming opioid- and nonopioid-targeted pain therapeutics. Anesth Analg. 2017;125(5):1714-32.
  • 62
    Ren C, Tong YL, Li JC, Lu ZQ, Yao YM. The protective efect of alpha 7 nicotinic acetylcholine receptor activation on critical illness and its mechanism. Int J Biol Sci. 2017;13(1):46-56.
  • 63
    Gélinas C. Pain assessment in the critically ill adult : recent evidence and new trends. Intensive Crit Care Nurs. 2016;34:1-11.
  • 64
    Niculescu AB, Le-Niculescu H, Levey D F, Roseberry K, Soe KC, Rogers J, Jones FK, et al. Towards precision medicine for pain: diagnostic biomarkers and repurposed drugs. Mol Psychiatry. 2019;24(24):501-22.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    21 Jul 2021
  • Aceito
    22 Abr 2022
Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 937 Cj2 - Vila Mariana, CEP: 04014-012, São Paulo, SP - Brasil, Telefones: , (55) 11 5904-2881/3959 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: dor@dor.org.br