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O PACTO FEDERATIVO E A IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA DE SAÚDE NO BRASIL

THE FEDERATIVE AGREEMENT AND THE IMPLEMENTATION OF PUBLIC HEALTH POLICY IN BRAZIL

LE PACTE FÉDÉRATIF ET LA MISE EN ŒUVRE DE LA POLITIQUE DE SANTÉ PUBLIQUE AU BRÉSIL

Resumos

O direito à saúde é fundamento inerente à dignidade da pessoa humana, no entanto, é notória a dificuldade crescente de acesso da população aos serviços públicos dessa natureza, levando os cidadãos rotineiramente a apelar ao Poder Judiciário. Diante disso surge o seguinte questionamento: por que o Poder Judiciário é tão acionado para resolver questões de saúde pública cuja responsabilidade pela execução é do Poder Executivo? Visando responder ao problema, nossa hipótese é que há uma incongruência entre a institucionalização das competências dos entes federados e a composição orçamentária, que impede a implementação das políticas públicas de saúde. Objetiva-se esclarecer as repartições de competências e de receitas entre os entes federados para analisar a possível relação da sua incompatibilidade com a ineficiência administrativa do Estado. A análise inicia-se pela apresentação da legislação aplicável ao Sistema Único de Saúde, para explicitar a forma de operacionalização e a divisão de competências pelas prestações de saúde entre os entes federados. Depois disso, é realizado o estudo acerca da viabilidade de custeio da saúde pública no Brasil, esclarecendo as fontes de receita e as porcentagens de participação dos entes na arrecadação tributária nacional. Por fim, a análise comprova a hipótese.

Políticas públicas; Saúde; Judicialização; Capacidade do Estado; Brasil


The right to health is an inherent basis for the dignity of the human person. However, the increasing difficulty of access to public services of this nature is evident, leading citizens to routinely appeal to the judiciary to see their rights guaranteed. Faced with this, the following question arises: why is the Judiciary so active in resolving public health issues that the Executive is responsible for executing? In order to answer the problem, our hypothesis is that there is an incongruity between the institutionalization of the powers of the federated entities and the budget composition, which impedes the implementation of public health policies. The objective is to clarify the distribution of powers and revenues among the federated entities to analyze the possible relation of their incompatibility with the administrative inefficiency of the State. The analysis begins with an explanation of the legislation applicable to the Unified Health System, to explain the way of operationalization and the division of competencies by health services among the federated entities. After that, the study on the feasibility of costing public health in Brazil, clarifying the sources of revenue and the percentages of participation of the entities in the national tax collection. Finally, the analysis confirms the hypothesis.

Public policy; Health; Judicialization; state capacity; Brazil


Le droit à la santé est un fondement inhérent à la dignité de la personne humaine, cependant, la difficulté croissante de la population à accéder aux services publics de cette nature est notoire, amenant les citoyens à faire systématiquement appel à la Justice. Face à cela, la question suivante se pose : pourquoi le pouvoir judiciaire est-il ainsi appelé à résoudre des problèmes de santé publique dont la responsabilité d’exécution incombe au pouvoir exécutif ? Visant à répondre au problème, notre hypothèse est qu’il existe une incohérence entre l’institutionnalisation des pouvoirs des entités fédérales et la composition du budget, qui empêche la mise en œuvre des politiques de santé publique. L’objectif est de clarifier la répartition des compétences et des revenus entre les entités fédérées pour analyser le rapport éventuel de leur incompatibilité avec l’inefficacité administrative de l’Etat. L’analyse commence par la présentation de la législation applicable au Système Unifié de Santé, afin d’expliquer son opérationnalisation et la répartition des compétences des services de santé entre les entités fédérées. Après cela, une étude est réalisée sur la faisabilité du financement de la santé publique au Brésil, clarifiant les sources de revenus et les pourcentages de participation des entités à la collecte des impôts nationaux. Enfin, l’analyse prouve l’hypothèse.

Politiques publiques; Santé; La judiciarisation; capacité de l’État; Brésil


INTRODUÇÃO

Em 1948, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas promulgou a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Tal documento objetivou a garantia dos direitos inerentes à dignidade da pessoa – assegurando, para tanto, em seu artigo 3°, dentre outros, o direito à vida a todos os seres humanos, os quais, conforme artigo 2º, in limine, “não podem ser distinguidos por razões nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação” (Organização das Nações Unidas, 1948, n. p.).

No mesmo sentido, também redigida em momento de fragilidade social, dado ao largo período de duração do regime civil-militar, a Constituição Federal de 1988 tem o intuito de assegurar a todos os cidadãos os direitos individuais e as garantias fundamentais. Conforme explicitado no seu preâmbulo, a referida norma fundamental foi promulgada para instituir um Estado “destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos” (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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, n. p.). Não por outro motivo, dispõe expressamente, em seu artigo 1º, que a República Federativa do Brasil tem como fundamento, dentre outros, a dignidade da pessoa humana (1988, n. p.).

A presença, no texto constitucional, da dignidade da pessoa humana dentre os fundamentos da República permite afirmar que o direito à dignidade foi reconhecido pelos representantes da população brasileira como de atenção imperiosa (Comparato, 1997COMPARATO, F. K. Fundamento dos Direitos Humanos. IEA: São Paulo, 1997.). Quer dizer, como resultado da correlação das forças que compunham a Assembleia Nacional Constituinte obteve-se o reconhecimento de que a dignidade deveria ser garantida pelo Estado Brasileiro a todos os seus cidadãos.

Como se sabe, falar em direito à dignidade significa falar em “direito a reconhecimento, respeito, proteção e até mesmo promoção e desenvolvimento da dignidade, podendo inclusive falar-se de um direito a uma existência digna” (Sarlet, 2004SARLET, I. W. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição de 1988. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2004., p. 58).

Explicitando a composição dos direitos assegurados constitucionalmente para garantir essa existência digna aos cidadãos brasileiros, a Constituição Federal prevê, em seu artigo 5°, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (Brasil, 1988, n. p.).

A norma fundamental determina que o direito à saúde se trata de dever do Estado destinado a todos e precisa ser “garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (1988, n. p.).

Como visto, seja pelo reconhecimento do direito à vida como inerente à dignidade humana, seja pela previsão desse direito na Constituição Federal como resultado das discussões instituintes da República, é seguro afirmar que o Estado brasileiro tem o dever de garanti-lo mediante a prestação universal e igualitária dos serviços de saúde.

Exatamente por isso, tal dever foi devidamente regulamentado, mediante a edição e a aprovação, em 1990, da Lei n.º 8.080, especificando em seu preâmbulo que “Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes” na qual se institui o Sistema Único de Saúde. De acordo com o artigo 2º da referida lei, “A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício” (Brasil, 1990BRASIL. Lei nº 8.080, 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, de 19 de setembro de 1990. Brasília, DF: Presidência da República, 1990., n. p.).

Quer dizer, o acesso universal e igualitário aos serviços de saúde está presente na legislação do Estado brasileiro como política pública fundamental.

A despeito disso, é de conhecimento público a problemática da crescente demanda ao Poder Judiciário pela efetivação da política pública de saúde, indicando a existência, nas estruturas que compõem tal política, de algum fator que dificulta a sua implementação administrativa, pelo Poder Executivo. Para investigar quais os fatores que levam a essa dificuldade administrativa do Estado Brasileiro de garantir aquele que deve ser considerado como o primordial dos direitos do ser humano, o direito à vida, levantamos o seguinte problema de pesquisa: por que o Poder Judiciário é tão acionado para resolver questões de saúde pública cuja responsabilidade pela execução de políticas é do Poder Executivo?

A partir de estudos preliminares, alinhavamos a hipótese de que há uma relevante incongruência entre a institucionalização das competências dos entes federados e a composição orçamentária, que dificulta a implementação administrativa das políticas públicas de saúde.

Objetiva-se, através do presente estudo, (I) esclarecer a distribuição de competências administrativas pela implementação das políticas públicas de saúde, (II) compreender a repartição das receitas públicas entre os entes federados, (III) comparar a distribuição de competências com a repartição das receitas para analisar a congruência entre as estruturações administrativa e orçamentaria do SUS.

A abordagem metodológica se dará pela utilização mista de análise qualitativa e quantitativa. Serão utilizados métodos de revisão bibliográfica e de legislação, análise de casos, com levantamento de dados secundários, e comparação.

O estudo iniciará pela explanação das normas constitucionais e da legislação aplicável ao Sistema Único de Saúde, desde a sua Lei Orgânica até as portarias do Ministério da Saúde, para entender a forma de operacionalização e a divisão de competências pelas prestações de saúde entre os entes federados.

Depois disso, realizar-se-á o estudo acerca da viabilidade de custeio da saúde pública no Brasil, explicitando as fontes de receita e as porcentagens de participação dos entes na arrecadação tributária nacional. Nesta parte do estudo, os levantamentos se concentrarão no período entre 1998 e 2013, porque, segundo pesquisa prévia, é a disponibilização mais completa disponibilizada até o momento do estudo e que está em conformidade com os dados secundários encontrados em bibliografia utilizada.

Por fim, esclarecidas as repartições de competências e de receitas entre os entes federados, efetuar-se-á uma análise para auferir a eventual existência de relação entre as estruturas administrativa e orçamentária e a (in)capacidade do Estado de implementar as devidas políticas públicas.

O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E O DEVER DE ATENÇÃO À SAÚDE

De acordo com o artigo primeiro da Constituição Federal de 1988, o Brasil é uma república federativa, formada pelos Estados, Municípios e Distrito Federal, que constitui um Estado Democrático de Direito, os quais tradicionalmente são entendidos como aqueles em que “a vontade soberana do povo decide, direta ou indiretamente, todas as questões de governo, de tal sorte que o povo seja sempre o titular e o objeto – a saber, o sujeito ativo e o sujeito passivo de todo o poder legítimo (Bonavides, 1980BONAVIDES, P. Do Estado Liberal ao Estado Social. 4. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1980., p. 17).

Ainda, segundo Martinez (2006)MARTINEZ, V. Estado de Direito. Jus.com.br, 7 jan. 2006. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7786. Acesso em: 13 jul. 2023.
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, por estados de direito entende-se aqueles em que o poder é adstrito à ordem constitucional, de forma que a própria atuação estatal é vinculada aos preceitos legais, não podendo o poder público desconsiderar os deveres impostos pela legislação e tampouco impor suas vontades quando desprovidas de embasamento.

A fusão desses dois conceitos, que configura o inicialmente referido estado democrático de direito, foi positivada no parágrafo único do dispositivo legal supracitado, através da seguinte disposição: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”, reafirmando a soberania das ordens democrática e jurídica (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Mais que isso, na concepção pós-moderna, a instituição do estado democrático de direito demonstra a superação do paradigma liberal individualista, passando-se a adotar os preceitos do estado social, pautado pelos princípios da dignidade, liberdade e igualdade.

Em outros termos, a instituição do estado democrático de direito importa na superação do chamado estado de direito legislativo, não cabendo mais a dissociação entre lei e justiça (Vasconcelos, 2013VASCONCELOS, A. G. de. O Processo Coletivo e o Acesso a Justiça sob o paradigma do estado democrático de direito. Revista Eletrônica de Direito Processual, v. XII, n. 12, p. 66-82, 2013.). Assim, podemos afirmar que para o direito contemporâneo o estado democrático de direito compõe-se de regras e de princípios, todos carregados de necessária natureza normativa, impondo a transposição da concepção positivista e individualista da jurisdição e alcançando um sentido indissociável da normatividade dos princípios constitucionais de justiça e do necessário reconhecimento e consequentemente garantia dos direitos individuais e garantias fundamentais (Vasconcelos, 2013VASCONCELOS, A. G. de. O Processo Coletivo e o Acesso a Justiça sob o paradigma do estado democrático de direito. Revista Eletrônica de Direito Processual, v. XII, n. 12, p. 66-82, 2013.).

Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 assegura direitos individuais e as garantias fundamentais a todos os cidadãos brasileiros e também aos estrangeiros residentes, com a expressa referência, em seu artigo 1º, da dignidade da pessoa humana como fundamento da República (Brasil, 1988). Logo, é direito de todos e de cada um dos cidadãos brasileiros e dos estrangeiros residentes o reconhecimento, respeito, proteção e até mesmo promoção e desenvolvimento da dignidade, podendo inclusive falar-se de um direito a uma existência digna (Comparato, 1997COMPARATO, F. K. Fundamento dos Direitos Humanos. IEA: São Paulo, 1997.), para a qual a Constituição Federal prevê, em seu artigo 5°, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (Brasil, 1988, n. p.).

A partir dessa perspectiva de estado social, com o dever de assegurar direitos, é possível compreender as políticas públicas como forma de assegurar esses direitos. Em outras palavras, pode-se entender a política pública como a ação do Estado (aqui entendido como o poder estatal em todas as suas formas), quando este se movimenta com o intuito de assegurar direitos aos cidadãos (Hess, 2010HESS, H. M. C. O Ativismo Judicial no Controle de Políticas Públicas no Estado Democrático de Direito. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 34., Caxambu. [Anais...]. ST17: Judiciário, Ativismo e Políticas, 2010.).

Para o caso brasileiro há bons estudos que demonstram que este processo de construção de políticas públicas, depois da Constituição de 1988, passou por uma mudança muito significativa. Martha Arretche (2001ARRETCHE, Marta T. S. Estado Federativo e Políticas sociais: Determinantes da descentralização. São Paulo: FAPESP; Rio de Janeiro, 2001.; 1999) mostrou como o processo de descentralização das políticas nacionais para estados e municípios, e das políticas estaduais para municípios, foi fortemente democratizado pela necessidade e possibilidade dos entes mais frágeis aderirem ou não às políticas dos entes maiores. Os estudos de Arretche demonstram que a descentralização ocorreu com mais rapidez e completude, quão maiores foram os incentivos financeiros, administrativos e políticos implementados pelo governo federal e pelos governos estaduais, e quão menores foram os custos de adesão para municípios e estados.

Arretche reconhece a importância do formato estatal da Nova República com a retomada do equilíbrio entre os três poderes, o controle das polícias estaduais pelos estados, e a autonomia dos executivos e legislativos eleitos de poderem exercer suas posições e oposições.

Neste sentido, a tripartição dos poderes e o dever constitucional diferenciado de cada um dos poderes, competindo, de regra, a formulação das políticas pelo Poder Legislativo, a implementação delas pelo Poder Executivo e a apreciação, pelo Poder Judiciário, dos casos em que há desrespeito ou controvérsia acerca dos preceitos emanados pelo parlamento (Dallari, 2010DALLARI, D. A. Elementos de Teoria Geral do Estado. 29. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.).

Acontece que tal desrespeito ou controvérsia acerca dos mandamentos legais pode ser praticado ou envolver a atuação do Poder Executivo na implementação das políticas devidamente formuladas – hipóteses em que os pretensos destinatários ou demais interessados têm acionado o Poder Judiciário para que esse aufira a adequação e regule a aplicabilidade da política, no caso concreto.

Quanto a essa questão, há relevante discussão a respeito da legitimidade da interferência do Poder Judiciário. Por um lado, é verdade que a judicialização da política impõe ao Judiciário absoluta responsabilidade em decidir sobre políticas públicas, especialmente sobre questões de direitos garantidos constitucionalmente, o que acaba por interferir e reduzir a autonomia dos demais poderes. De qualquer sorte, por outro lado, afirma-se a supremacia da constituição, e a definição de questões políticas na Constituição permitem e até impõem que o Judiciário interfira na seara política e garanta a implementação das garantias fundamentais, por tratar-se de uma questão constitucional (Barboza; Kozicki, 2012BARBOZA, E. M. Q.; KOZICKI, K. Judicialização da Política e Controle Judicial de Políticas Públicas. Revista Direito FGV, São Paulo, p. 059-086, 2012.).

Sob essa ótica, acredita-se que política pública é o “conjunto de normas (Poder Legislativo), atos (Poder Executivo) e decisões (Poder Judiciário), que visam à realização dos fins primordiais do Estado” e que, portanto, as ordens judiciais emanadas para forçar a implementação de políticas públicas previstas na legislação não se traduzem em intervenção do Poder Judiciário na atividade do Poder Executivo, pois, em determinados casos, revelam-se necessárias para a completude do ciclo da política (Grinover, 2008GRINOVER, A. P. O Controle de Políticas Públicas pelo Poder Judiciário. Revista Processo, São Paulo, ano 33, n. 164, p. 9-28, 2008., p. 11-12).

Ainda nessa linha, de acordo com Chieffi e Barata (2009)CHIEFFI, A. L.; BARATA, R. B. Judicialização da política pública de assistência farmacêutica e eqüidade. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 25, n. 8, p. 1839-1849, 2009., especificamente no âmbito da política pública de saúde, “a judicialização tem se traduzido como a garantia de acesso a bens e serviços por intermédio da utilização de ações judiciais”. Ou seja, essa tem sido a forma encontrada pela população para ver atendida a pretensão de figurar como destinatário das políticas públicas (Chieffi; Barata, 2009CHIEFFI, A. L.; BARATA, R. B. Judicialização da política pública de assistência farmacêutica e eqüidade. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 25, n. 8, p. 1839-1849, 2009.).

Ademais, a atividade estatal vem se desenvolvendo diante da corrente submissão do Poder Executivo a ordens de prestação positiva proferidas pelo Poder Judiciário. Logo, independentemente de, a rigor técnico, ser ou não legítima tal sobreposição dos poderes do Estado, é incontroverso que ela faz parte da realidade e merece, portanto, dessa forma ser considerada e estudada.

Por isso, não se pretende, aqui, definir a possibilidade ou a legitimidade da influência do Poder Judiciário na implementação da política pública de saúde. O que se pretende é, a partir da atual situação em que se encontra o ciclo da política pública de saúde, auferir as causas da ineficiente atuação do Poder Executivo na implementação da política pública de saúde no Brasil e analisar as consequências do seu deslocamento, para a esfera judicial.

A POLÍTICA PÚBLICA DE SAÚDE NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Para investigar as causas da massiva atividade judiciária na implementação da política pública de saúde no Brasil, parece relevante explicitar a organização normativo-administrativa pela qual se orienta a execução da política, já que, considera-se, aqui, hipótese segundo a qual há algum fator que dificulta a sua implementação administrativa, pelo Poder Executivo, acabando por deslocar a sua efetivação para o Poder Judiciário.

Ainda, para realizar a análise da organização normativo-administrativa da política pública de saúde, assim como para analisar qualquer outra atividade do Estado brasileiro, é necessário considerar o sistema de leis vigente, além de considerar esse sistema como um conjunto cujas partes se inter-relacionam mútua e constantemente.

É necessário considerar o sistema de leis vigente porque o Brasil é uma república federativa, formada pelos Estados, Municípios e Distrito Federal, que constitui um Estado Democrático de Direito (Brasil, 1988). E, conforme já referido, por Estados Democráticos entende-se aqueles estruturados para garantir a dignidade dos cidadãos e, por Estado de Direito, entende-se aquele em que o poder é limitado à ordem constitucional, de tal forma que se de um lado o cidadão não pode reivindicar direitos quando desprovidos de embasamento legal, de outro lado o Estado não pode impor suas vontades, ou atuar contra as normas existentes (Martinez, 2006MARTINEZ, V. Estado de Direito. Jus.com.br, 7 jan. 2006. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7786. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Diante de todos esses conceitos e tendo em vista a hierarquia existente dentro do ordenamento jurídico-institucional brasileiro, deve-se entender a Constituição Federal como sendo o fundamento básico de todo esse sistema que instituiu o estado social no Brasil, amparando os direitos sociais e garantias individuais.

Logo, considerando-se que dita carta fundamental prevê, em seu artigo 5°: que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” e determina que o direito à saúde constitui dever do Estado destinado a todos, o qual deve ser “garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, é seguro afirmar que o Estado brasileiro tem o dever de garanti-lo mediante a prestação universal e igualitária dos serviços de saúde (Brasil, 1988, n. p.).

Quer dizer, o acesso universal e igualitário aos serviços de saúde está presente na legislação do Estado Brasileiro como política pública fundamental.

Para regulamentar a implementação dessa política, foi editada, em 1990, a Lei n. 8080, instituindo-se o Sistema Único de Saúde. Tal legislação, além de dispor acerca das condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes”, reafirma, expressamente, em seu artigo 2º, que: “A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício” (Brasil, 1990BRASIL. Lei nº 8.080, 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, de 19 de setembro de 1990. Brasília, DF: Presidência da República, 1990., n. p.).

No entanto, a despeito da previsão constitucional de responsabilidade solidária entre os entes federados pelas prestações de saúde, essa regulamentação, objetivando esquematizar a implementação da política e otimizar o emprego dos recursos, instituiu competências específicas para os entes de cada uma das esferas.

A supracitada Lei nº 8.080/90, denominada Lei Orgânica da Saúde, determina que as ações que integram o Sistema Único de Saúde devem “obedecer à descentralização político-administrativa, com ênfase na descentralização dos serviços para os municípios e na regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde, de acordo com os níveis de complexidade do serviço a ser prestado (Brasil, 1990BRASIL. Lei nº 8.080, 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, de 19 de setembro de 1990. Brasília, DF: Presidência da República, 1990., n. p.).

Nos artigos 16, 17 e 18, a Lei Orgânica da Saúde estabelece a repartição de competências entre os Entes Federados, de forma que, no que concerne à efetiva prestação dos serviços de saúde, temos a seguinte distribuição de competências.

Quadro 1
Repartição das Competências Executivas do SUS entre os Entes Federados

Subsume-se, assim, claramente, a prevalência de competência Municipal, a quem incumbe gerir e executar todos os serviços públicos de saúde, os serviços de vigilância sanitária, alimentação e nutrição, saneamento básico, de saúde do trabalhador e, no âmbito municipal, a política de insumos e equipamentos para a saúde. A par dessas atribuições executivas, compete apenas à União a execução da política de vigilância sanitária de portos, aeroportos e fronteiras. No mais, tanto a União quanto os Estados e o Distrito Federal apenas participam, colaboram, suplementam e apoiam outros serviços (Brasil, 1990BRASIL. Lei nº 8.080, 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, de 19 de setembro de 1990. Brasília, DF: Presidência da República, 1990.).

Além disso, a Portaria do Ministério da Saúde número 2.023 do ano de 2004 definiu que os Municípios e o Distrito Federal são “responsáveis pela gestão do sistema municipal de saúde na organização e na execução das ações de atenção básica” (Brasil, 2004BRASIL. Portaria do Ministério da Saúde nº 2.023, 2004. Define que os municípios e o Distrito Federal sejam responsáveis pela gestão do sistema municipal de saúde na organização e na execução das ações de atenção básica, e dá outras providências, 23 de setembro de 2004. Brasília, DF: Presidência da República, 2004., n. p.). Ainda, de acordo com a Portaria do Ministério da Saúde número 399 do ano de 2006, que divulgou “o Pacto pela Saúde 2006 – Consolidação do SUS e aprova as Diretrizes Operacionais do Referido Pacto”, esclarece que compõe a atenção básica, além do atendimento básico de saúde, a atenção à saúde da família, a contratação de agentes comunitários de saúde e a prestação dos serviços de saúde bucal (Brasil, 2006BRASIL. Portaria do Ministério da Saúde nº 399, 2006. Divulga o Pacto pela Saúde 2006 – Consolidação do SUS e aprova as Diretrizes Operacionais do Referido Pacto, 22 de fevereiro de 2006. Brasília, DF: Presidência da República, 2006., n. p.). Essa mesma Portaria define os procedimentos de alta complexidade, a serem custeados pela União, sendo eles, além daqueles regulados pela CNRAC – Central Nacional de Regulação da Alta Complexidade, os transplantes e as ações estratégicas emergenciais, de caráter temporário, implementadas com prazo predefinido (Brasil, 2006BRASIL. Portaria do Ministério da Saúde nº 399, 2006. Divulga o Pacto pela Saúde 2006 – Consolidação do SUS e aprova as Diretrizes Operacionais do Referido Pacto, 22 de fevereiro de 2006. Brasília, DF: Presidência da República, 2006.). Por fim, em relação à assistência farmacêutica, a Portaria 399/96 a subdivide de acordo com três componentes: medicamentos da assistência básica, insumos de atuação estratégica e fármacos de dispensação excepcional (Brasil, 2006BRASIL. Portaria do Ministério da Saúde nº 399, 2006. Divulga o Pacto pela Saúde 2006 – Consolidação do SUS e aprova as Diretrizes Operacionais do Referido Pacto, 22 de fevereiro de 2006. Brasília, DF: Presidência da República, 2006.).

A portaria do Ministério da Saúde número 204 de 2007 reparte o custeio do sistema de saúde em seis blocos: a atenção básica, a atenção de média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar, a vigilância em saúde, a assistência farmacêutica, a gestão do SUS e os investimentos na rede de serviços de saúde, e inclui, na atenção básica em saúde, além do atendimento básico de saúde, a atenção à saúde da família, a contratação de agentes comunitários de saúde e a prestação dos serviços de saúde bucal, a atenção básica aos povos indígenas, a atenção à saúde no sistema penitenciário e a atenção integral à saúde dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e internação provisória, assistência pré-natal e procedimentos de coleta de material para exames citopatológicos e coleta de sangue para triagem neonatal. Quanto à assistência farmacêutica, a referida portaria, em seu artigo 26, esclarece que o Componente Estratégico da Assistência Farmacêutica se destina ao financiamento de ações para o controle de endemias (exemplos: a tuberculose, a hanseníase, a malária, a leishmaniose, a doença de chagas), dos antirretrovirais do programa DST/Aids, de sangue e hemoderivados e de imunobiológicos (Brasil, 2007BRASIL. Emenda Constitucional nº 55, 2007. Altera o art. 159 da Constituição Federal, aumentando a entrega de recursos pela União ao Fundo de Participação dos Municípios, 20 de setembro de 2007. Brasília, DF: Presidência da República, 2007.).

Finalmente, em 2013, a Portaria número 1.555, do Ministério da Saúde, dispondo sobre as normas de financiamento e de execução do Componente Básico da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), estabelece o aporte de (I) R$ 5,10 reais por habitante/ano pela União, para financiar a aquisição dos medicamentos e insumos da assistência farmacêutica básica; (II) R$ 2,36 reais por habitante/ano pelos Estados, para financiar as prestações da assistência farmacêutica básica, já incluindo os insumos para os usuários insulinodependentes; e (III) 2,36 reais por habitante/ano pelos Municípios. De qualquer sorte, não há alteração no dever de execução das políticas – que, uma vez competindo aos municípios, acabam estes por ter que arcar com o custeio excedente aos R$ 9,82 por habitante/ano (Brasil, 2013BRASIL. Planilha do Resultado Fiscal do Governo Central. Brasília, DF: Tesouro Nacional, 2013. Disponível em: https://www.tesourotransparente.gov.br/temas/estatisticas-fiscais-e-planejamento/resultado-do-tesouro-nacional-rtn-conteudos-relacionados. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Como se vê, portanto, a estruturação administrativa do SUS impõe aos Municípios (e Distrito Federal) a gestão e execução da “Atenção Básica”, onde estão inclusos todos os atendimentos de clínica geral, especialidades e emergências, os procedimentos ambulatoriais de baixa e média complexidade, a disponibilização de todos os medicamentos da assistência farmacêutica básica, a contratação de agentes comunitários de saúde, a prestação dos serviços de saúde bucal, a atenção à saúde no sistema penitenciário e a atenção integral à saúde dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e internação provisória.

À União compete a disponibilização dos procedimentos de alta complexidade, sendo eles aqueles regulados pela Central Nacional de Regulação da Alta Complexidade (CNRAC), os transplantes e as ações estratégicas emergenciais, de caráter temporário, implementadas com prazo predefinido – além dos respectivos fármacos.

E aos Estados, em competência residual, é imposto o dever de custear os procedimentos hospitalares de alta complexidade, os medicamentos de dispensação estratégica para controle de endemias: a tuberculose, a hanseníase, a malária, a leishmaniose e a doença de chagas, por exemplo, e os fármacos de dispensação especial, como as insulinas, por exemplo.

Diante dessa repartição de competências, recai sobre os Municípios (e Distrito Federal) o dever de disponibilizar parcela importante dos serviços de saúde.

A par disso, em virtude da norma Constitucional, a participação dos Municípios na repartição da receita tributária nacional vem se reduzindo consideravelmente, motivo pelo qual tais entes têm cada vez menos condições de arcar com os custos de disponibilizar a grande gama de produtos e serviços que lhe compete.

O PACTO FEDERATIVO E O SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

A principal fonte de arrecadação de divisas do Estado é o recolhimento de tributo - que, conforme descrito no artigo 3º do Código Tributário Nacional, constitui-se de “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (Brasil, 1966BRASIL. Lei nº 5.172, 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, 25 de outubro de 1966. Brasília, DF: Presidência da República, 1966.).

Diz-se isso para esclarecer que nem todo tributo é imposto. Os tributos podem ser:

Quadro 2
– Espécies de Tributos

Conforme descrito no artigo 16 do Código Tributário Nacional, “Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte” (Brasil, 1966BRASIL. Lei nº 5.172, 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, 25 de outubro de 1966. Brasília, DF: Presidência da República, 1966.). Quer dizer, o imposto é uma prestação pecuniária compulsória, paga em virtude de uma situação fática específica do contribuinte, como, por exemplo, o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores, o Imposto sobre a Renda, o Imposto sobre Serviços, dentre outros, que devem ser pagos pelo simples fato de o contribuinte possuir um veículo, auferir renda ou prestar serviços, respectivamente. O imposto é um tributo não vinculado porque os valores arrecadados em virtude da incidência dos contribuintes nas situações fáticas previstas na lei como geradoras do dever de pagá-los podem ser utilizados de acordo com as necessidades da Administração, não se impondo a sua utilização no respectivo setor. Ou seja, os valores arrecadados a título de IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) não precisam ser necessariamente investidos na pavimentação de ruas ou estradas.

Por outro lado, de acordo com o artigo 77 da mesma norma, as taxas são tributos cobrados como contrapartida a um serviço prestado ou disponibilizado (Brasil, 1966BRASIL. Lei nº 5.172, 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, 25 de outubro de 1966. Brasília, DF: Presidência da República, 1966.). Como exemplo, pode-se citar a taxa de coleta de lixo ou a taxa anual de licenciamento dos veículos, cobradas, respectivamente, pelo Poder Público Municipal, em vista da disponibilização do serviço de coleta de lixo e pelo Departamento Estadual de Transito, em face da prestação do serviço relativo ao licenciamento veicular. Pode-se ver que, ao contrário dos impostos, as taxas são tributos vinculados porque a arrecadação delas decorrente deve ser investida diretamente na manutenção dos serviços que as originam.

Ainda, segundo definido no artigo 81 também do Código Tributário Nacional, a contribuição de melhoria é a prestação cobrada dos proprietários de imóveis que tenham se valorizado em razão de obra realizada pela Administração; tratando-se, dessa forma, claramente de um tributo vinculado, já que os valores arrecadados apenas repõem os gastos tidos com a obra pública (Brasil, 1966BRASIL. Lei nº 5.172, 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, 25 de outubro de 1966. Brasília, DF: Presidência da República, 1966.).

As contribuições especiais ou parafiscais são tributos incluídos no Sistema Tributário Nacional pela Constituição Federal de 1988, de competência exclusiva da União, que podem ser instituídos para subsidiar a sua atuação em determinados setores. Pelo teor do artigo 149 da norma fundamental, “compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas” (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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). Como visto, podem elas ser contribuições sociais (exemplos: o PIS/PASEP e a COFINS), contribuições de intervenção no domínio econômico (contribuição para controle de produção de açúcar, por exemplo) ou contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas (cita-se a contribuição sindical). Essas, como o próprio nome já diz, assim como os tributos vinculados, devem ter a destinação específica para o fim que motivou a sua criação.

Por fim, os empréstimos compulsórios, também inseridos no ordenamento pela Constituição Federal de 1988 e também de competência exclusiva da União, podem ser instituídos “para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência ou no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional” (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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). Conforme disposto no parágrafo único do artigo 148 desse diploma, “A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição” (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Esclarecidas as definições e as finalidades de cada um dos tipos de tributos, entende-se que apenas os impostos – enquanto tributos não vinculados cujos valores arrecadados podem ser utilizados de acordo com as necessidades da Administração, não havendo destinação pré-definida – constituem elemento de composição de verba disponível para a implementação de políticas públicas, sobretudo para os Estados e Municípios. A União, de certa forma, pode contar com as contribuições sociais – as quais, conquanto de utilização vinculada, destinam-se ao custeio da seguridade: educação, saúde, previdência.

Além de os impostos constituírem única fonte de renda disponível da Administração, apenas alguns deles são de arrecadação direta pelos Municípios e Estados. Ao contrário, de acordo com a previsão constitucional, esses tributos não vinculados são majoritariamente arrecadados pelo ente federal (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Cabe à União, além da exclusividade na instituição de novos impostos, a arrecadação do Imposto de Produtos Estrangeiros, do Imposto de Exportação, do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza, do Imposto sobre Produtos Industrializados, do Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou Relativas a Títulos e Valores Mobiliários, do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural e do Imposto sobre Grandes Fortunas (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Aos Estados compete a arrecadação de Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação, Imposto sobre Operações Relativas à circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação, e Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Finalmente, compete aos Municípios a arrecadação de Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana, Imposto de Transmissão Inter Vivos e Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Em virtude dessa repartição de competências, o volume de tributos arrecadado se concentra na União Federal, comparativamente com Estados e Municípios. Tomando por base os dados referentes ao exercício de 2013, disponibilizados pela Receita Federal, vê-se que a União concentrou aproximadamente 70% da receita tributária bruta, ficando com os Estados cerca de 25% e com os Municípios quantia próxima a 5% (Brasil, 2015BRASIL. Receita Federal. Estudos Tributários: Carga Tributária no Brasil – 2013 (Análise por Tributo e Bases de Incidência), outubro de 2015. Brasília, DF: Receita Federal, 2015. Disponível em: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Tabela 1
– Repartição de Receitas Tributárias de 2013 entre os Entes Federados

Nesse contexto, tem-se a seguinte distribuição da arrecadação tributária:

Tal concentração na arrecadação é propositalmente formulada pela estruturação do pacto federativo e tem como objetivo a posterior redistribuição igualitária dos fundos para compensar e reduzir as desigualdades econômicas e sociais existentes entre as regiões do País. Quer dizer, a Constituição Federal prevê a arrecadação tributária concentrada para que os recursos sejam distribuídos de forma proporcional – distribuição que se dá, além do retorno de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e dos repasses específicos do Sistema Único de Saúde, eminentemente, pelos fundos de participação dos Municípios e dos Estados (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

Gráfico 1
– Proporção da Receita Tributária dos Entes Federados em 2013

Os fundos de participação foram instituídos pelo Código Tributário Nacional, em 1966, para destinar, aos Estados e Municípios, parte da receita referente ao Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza e ao Imposto Sobre Produtos Industrializados (Brasil, 1966BRASIL. Lei nº 5.172, 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, 25 de outubro de 1966. Brasília, DF: Presidência da República, 1966.). Inicialmente, cada um dos fundos era formado por 10% do produto da arrecadação do IR e do IPI (Brasil, 1966BRASIL. Lei nº 5.172, 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, 25 de outubro de 1966. Brasília, DF: Presidência da República, 1966.). Atualmente, são compostos de montante equivalente a 24,5% (FPM) e 21,5 % (FPE) da arrecadação da União com o Imposto de Renda e com o Imposto sobre Produtos Industrializados (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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). Veja-se a evolução dos percentuais dos fundos de participação:

Note-se que as emendas constitucionais 55/2007 e 84/2014 implementaram adicionais de 1% cada uma delas apenas para o Fundo de Participação dos Municípios. Ainda, diferentemente do repasse dos outros 22,5% e da totalidade do Fundo de Participação dos Estados (que ocorrem regularmente nos dias 10, 20 e 30 de cada mês), a quantia implementada pela Emenda Constitucional 55/2007 é repassada no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano e a quantia implementada pela Emenda Constitucional 84/2014 é repassada no primeiro decêndio do mês de julho de cada ano (Brasil, 2007BRASIL. Emenda Constitucional nº 55, 2007. Altera o art. 159 da Constituição Federal, aumentando a entrega de recursos pela União ao Fundo de Participação dos Municípios, 20 de setembro de 2007. Brasília, DF: Presidência da República, 2007.; 2014).

Tabela 2
– Evolução Legislativa e Percentual dos Fundos de Participação

De qualquer sorte, em resumo, tem-se atualmente a destinação de 21,5% da arrecadação tributária relativa aos Impostos sobre a Renda e sobre os Produtos Industrializados destinados para a composição do Fundo de Participação dos Estados e 24,5% destinados para incorporação do Fundo de Participação dos Municípios (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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).

O Fundo de Participação dos Estados é rateado de acordo com os critérios da Lei Complementar número 62 de 1989. A teor do artigo 2° do diploma:

[...] Art. 2° Os recursos do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal – FPE serão distribuídos da seguinte forma:

I - 85% (oitenta e cinco por cento) às Unidades da Federação integrantes das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste;

II - 15% (quinze por cento) às Unidades da Federação integrantes das regiões Sul e Sudeste.

§ 1° Os coeficientes individuais de participação dos Estados e do Distrito Federal no Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal - FPE a serem aplicados até o exercício de 1991, inclusive, são os constantes do Anexo Único, que é parte integrante desta Lei Complementar.

§ 2° Os critérios de rateio do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal, a vigorarem a partir de 1992, serão fixados em lei específica, com base na apuração do censo de 1990.

§ 3° Até que sejam definidos os critérios a que se refere o parágrafo anterior, continuarão em vigor os coeficientes estabelecidos nesta Lei Complementar (Brasil, 1989BRASIL. Lei Complementar nº 62, 1989. Estabelece normas sobre o cálculo, a entrega e o controle das liberações dos recursos dos Fundos de Participação e dá outras providências, de 28 de dezembro de 1989. Brasília, DF: Presidência da República, 1989., n. p.).

O anexo referido no parágrafo 1° desse artigo determina a proporção distributiva do Fundo de Participação dos Estados. Acompanhe-se:

Tabela 3
– Porcentagem de Participação dos Estados no rateio do FPE

Ou seja, sobre o montante acumulado no Fundo de Participação dos Estados em cada período são aplicados os coeficientes supratranscritos para determinar o valor a ser repassado a cada uma das Unidades Federativas.

Em relação ao Fundo de Participação dos Municípios, tem-se inicialmente a divisão das unidades em três critérios: as capitais – que recebem 10% dos valores do fundo; os municípios do interior – a que se destinam 86,4% dos recursos; e os municípios de reserva – aos quais se destinam 3,6% da quantia (Brasil, 1966BRASIL. Lei nº 5.172, 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, 25 de outubro de 1966. Brasília, DF: Presidência da República, 1966.). A cada uma dessas categorias aplicam-se critérios de população e renda per capta, recalculados ano a ano, de complexidade bastante relevante e que, portanto, não cabe aqui detalhar.

De qualquer sorte, para que se possa entender a relevância dessas verbas nos orçamentos municipais, vale realizar uma exposição orçamentária – para o que se adotam dois municípios vizinhos, mas de população e expressividade econômica bastante díspares.

No exercício de 2013, tomado por base na indicação feita acerca das porcentagens arrecadadas diretamente pelas diferentes entidades federativas, por exemplo, o Município de Rio Grande teve uma arrecadação bruta de 471.882 milhões de reais, sendo que desse total apenas 29,37% correspondem à receita própria, 59,5% correspondem a repasses intergovernamentais e 11,13% advêm de outras receitas (Brasil, 2014BRASIL. Emenda Constitucional nº 84, de 2 de dezembro de 2014. Altera o art. 159 da Constituição Federal para aumentar a entrega de recursos pela União para o Fundo de Participação dos Municípios, 2 de dezembro de 2014. Brasília, DF: Presidência da República, 2014.). É sabido que tal Município possui atividade econômica expressiva, disponibiliza um número importante de vagas na rede escolar e é referência regional em saúde, tendo, consequentemente, os valores de retorno do ICMS e de repasse do FUNDEB e do SUS importantes; assim, dos 59,5% correspondentes a repasses intergovernamentais, 17,77% referem-se à cota do FPM, 33,92% referem-se à cota do ICMS, 23,1% referem-se ao FUNDEB, 7,14% ao repasse do Sistema Único de Saúde e 18,8% referem-se a outras transferências (Brasil, 2014BRASIL. Emenda Constitucional nº 84, de 2 de dezembro de 2014. Altera o art. 159 da Constituição Federal para aumentar a entrega de recursos pela União para o Fundo de Participação dos Municípios, 2 de dezembro de 2014. Brasília, DF: Presidência da República, 2014.). De qualquer sorte, considerando a importância da atividade econômica e o nível de desenvolvimento do Município também se espera que a sua arrecadação própria seja mais expressiva. Ainda assim, como dito acima, apenas 29,37% da arrecadação municipal correspondem à receita própria.

Não por outro motivo, ainda que adotemos um município de menor potencial econômico, é flagrante a dependência orçamentária aos repasses da União. Exemplificativamente, adotando-se os dados do Município de São José do Norte, vizinho ao Município de Rio Grande, vê-se que, no mesmo exercício de 2013, de uma receita total de 42.271 milhões de reais, apenas 8,38% correspondem à receita própria, 84,68% correspondem a repasses intergovernamentais e 6,94% advêm de outras receitas, sendo que, da totalidade dos repasses intergovernamentais 34,71% referem-se à cota do FPM, 19,87% referem-se à cota do ICMS, 21,53% referem-se ao FUNDEB, 17,15% ao repasse do Sistema Único de Saúde e 6,74% referem-se a outras transferências (Brasil, 2014BRASIL. Emenda Constitucional nº 84, de 2 de dezembro de 2014. Altera o art. 159 da Constituição Federal para aumentar a entrega de recursos pela União para o Fundo de Participação dos Municípios, 2 de dezembro de 2014. Brasília, DF: Presidência da República, 2014.).

Tabela 4
– Fonte de Receita dos Municípios de Rio Grande e São José do Norte - 2013

De fato, o que se vê é que, independentemente da importância da atividade econômica e do nível de desenvolvimento do Município, é inequívoca a dependência orçamentária aos repasses da União. E assim não deve deixar de ser, pois, como referido inicialmente, a concentração na arrecadação é parte da estruturação do pacto federativo e tem como objetivo a posterior redistribuição igualitária dos fundos para compensar e reduzir as desigualdades econômicas e sociais existentes entre as regiões do País.

O que ocorre é que, conforme já visto, os Fundos de Participação são compostos unicamente pelas receitas de dois dos impostos de competência da União – o IR e o IPI – e a instituição de novas fontes de receita tem-se dado através da criação de tributos de natureza diversa.

Por isso, as receitas do repasse constitucional têm aumentado em uma proporção menor do que o aumento da arrecadação total da União. Em 1998, a receita total do Governo Federal foi de 18% do PIB e o repasse aos fundos de participação foi de 2,5% do PIB. Quinze anos depois, em 2013, a receita do mesmo ente alcançou 24,6% do PIB, enquanto que o repasse aos fundos se limitou a 3,0% do PIB (Brasil, 2013BRASIL. Planilha do Resultado Fiscal do Governo Central. Brasília, DF: Tesouro Nacional, 2013. Disponível em: https://www.tesourotransparente.gov.br/temas/estatisticas-fiscais-e-planejamento/resultado-do-tesouro-nacional-rtn-conteudos-relacionados. Acesso em: 13 jul. 2023.
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). Vejamos:

Tabela 5
– Receita da União X repasse aos fundos entre os anos de 1998 e 2013

Nesse período, a arrecadação federal cresceu 36,37%, enquanto a quantia destinada aos fundos foi acrescida de 20%, a despeito da vigência da Emenda Constitucional 55/07, que acresceu 1% ao Fundo de Participação dos Municípios.

Isso porque, conforme referido acima, há o crescimento do recolhimento de contribuições imensamente superior ao implemento da receita de impostos. Em 1998, a arrecadação com impostos somava 7,4% do PIB e o recolhimento de contribuições alcançava 4,6% do PIB. Já em 2013, os impostos alcançam 8,5% do PIB e as contribuições, 7,2% do PIB (Brasil, 2013BRASIL. Planilha do Resultado Fiscal do Governo Central. Brasília, DF: Tesouro Nacional, 2013. Disponível em: https://www.tesourotransparente.gov.br/temas/estatisticas-fiscais-e-planejamento/resultado-do-tesouro-nacional-rtn-conteudos-relacionados. Acesso em: 13 jul. 2023.
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). Dessa forma:

Tabela 6
– Evolução da Arrecadação Tributária da União com Impostos e com Contribuições entre os anos de 1998 e 2013

Quer dizer, enquanto que a arrecadação com impostos, que reflete nos repasses dos fundos de participação, cresceu 14,86%, a receita advinda das contribuições cresceu 56,52%.

Gráfico 2
– Arrecadação de impostos e de contribuições em 1998 e em 2013

Como visto, há um crescimento desigual na arrecadação dos entes. Nas últimas décadas vem diminuindo a capacidade financeira dos Municípios e, consequentemente, aumentando a sua dependência dos repasses da União.

Há o aumento da Carga Tributária no Brasil e Proporcional Diminuição da Participação Municipal na Repartição de Receitas. Assim, se por um lado temos a previsão da assistência integral, igualitária e universal na política pública de saúde do Brasil, e a consequente ampliação constante das prestações disponibilizadas pelo Sistema Único de Saúde, cuja responsabilidade em sua maioria recai sobre os Municípios, por outro lado temos o crescimento da participação desses entes na repartição das receitas nacionais, proporcionalmente inferior ao crescimento da carga tributária do Brasil.

Diante dessa disparidade, é possível entender a incapacidade financeira dos Municípios de prestar a atenção básica, que abrange a grande maioria dos problemas da população. Segundo Dresch (2015)DRESCH, R. L. A Garantia de Acesso à Saúde e as Regras de Repartição da Competência entre os Gestores. RAHIS: Revista de Administração Hospitalar e Inovação em Saúde, v. 12, p. 19-43, 2015.:

[...] a saúde está subfinanciada, é fato. Os Municípios são os principais sacrificados, tanto que, em média, despendem 22% da sua receita líquida com ações e serviços de saúde. Os Estados-membros dificilmente ultrapassam o patamar de 12%. A União, por seu turno, despende de 7% a 7,5% da sua receita líquida em saúde, tendo incluído no orçamento de 2013 o total de 85,70 bilhões, para 2014, 98,03 bilhões, e na proposta de 2015 aproximadamente 109,2 bilhões, para uma proposta orçamentária de 1,235 trilhões. As despesas dos Municípios aumentaram, enquanto o percentual da União no financiamento da saúde tem-se reduzido (p. 39).

Além dessa situação da distorção na distribuição da receita, ocorrida a partir da evolução da natureza do aumento da carga tributária, que levou à concentração crescente da receita pública na União, também há de se ponderar o impacto das políticas de ajuste fiscal nas contas públicas e na política de saúde do Brasil. Desde a década de 1990, o governo federal vem implementando mecanismos de controle de gastos públicos os quais também levam à centralização, porque impõem a redução de investimentos aos Estados e Municípios como condição para o acesso a políticas e investimentos promovidos pela União, reduzindo a autonomia fiscal destes entes e, consequentemente, a agravando incapacidade financeira para a implementação de políticas públicas essenciais, como a de saúde. Este ponto, em verdade, constitui uma agenda de pesquisa importante, pois indica mais um fator que possivelmente dificulta a implementação da política a nível administrativo, o qual merece especial atenção e estudo específico.

De tudo isso resume-se que, de um lado, há redução constante na independência financeira dos Municípios e, de outro lado, há crescente concentração das competências e deveres de custeio na organização do SUS.

Assim, existindo a política pública universal e igualitária, e diante da garantia constitucional de acesso à saúde e à vida, não se pode deixar de alcançar as prestações de saúde aos que delas necessitem (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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). Por isso, diante da negativa administrativa, é natural a busca pelo atendimento na via judicial, deslocando a implementação dessa política para o Poder Judiciário e comprometendo, de consequência, o orçamento dos próprios Municípios, dos Estados (cuja competência administrativa é eminentemente residual) e da União (cuja competência administrativa abrange apenas a alta complexidade).

O DESLOCAMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA DE SAÚDE PARA O PODER JUDICIÁRIO

Como visto, é possível inferir que diante da incapacidade financeira dos Municípios de prestar a atenção básica, na qual se inclui número expressivo das prestações de que a população necessita, cresce a judicialização da política pública de saúde, comprometendo, em consequência, o orçamento de todos os entes.

Tal comprometimento orçamentário se dá por duas razões. A primeira delas diz com o entendimento construído pelo Poder Judiciário acerca do direito constitucionalmente garantido e a estruturação administrativa do Sistema Único de Saúde. Conforme explicitado no capítulo específico, de acordo com o artigo 196 da Constituição Federal, “a saúde é direito de todos e dever do Estado” (Brasil, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 jul. 2023.
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). Por isso, a despeito da repartição de competências descrita na Lei Orgânica da Saúde e nas portarias do Ministério da Saúde, no julgamento das ações judiciais de saúde, aplica-se entendimento segundo o qual todos os entes são responsáveis por todas e quaisquer prestações pleiteadas. Isso porque, nas palavras do ministro Celso de Mello:

[...] o caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado (Brasil, 2006, p. 1-2).

A segunda razão é pela qual o deslocamento da implementação da política de saúde tem a ver com a forma de execução das decisões. Nas demandas judiciais, conquanto haja ordem para que o ente preste ao cidadão diretamente o serviço pleiteado; por não possuir o fármaco nas farmácias públicas ou por não haver disponibilidade de realização o atendimento em vista das filas de espera, a ordem não é cumprida – impondo ao Poder Judiciário que adote a medida coercitiva cabível: bloqueio de valores nas contas públicas. E, uma vez efetuado o bloqueio, o valor é entregue diretamente à parte – que satisfaz a sua necessidade por meios privados e presta contas ao Juízo.

Por óbvio, sendo o fármaco adquirido ou a prestação de saúde contratada diretamente pelo cidadão, não há (e não tem como haver) atenção aos princípios da administração pública – dentre os quais se ressalta o princípio da economicidade –, causando prejuízos às contas estatais e, consequentemente, diminuindo os recursos disponíveis para a execução da política pública de saúde. Exatamente por isso, segundo consignaram Chieffi e Baratta (2009):

[...] no ano 2006, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP) gastou, com o cumprimento das decisões judiciais da comarca da capital, 65 milhões de Reais, para atender cerca de 3.600 pessoas. Em comparação, no mesmo ano, ela investiu 838 milhões de Reais no Programa de Medicamentos de Dispensação Excepcional (alto custo), atendendo 380 mil pessoas. Foram gastos aproximadamente 18 mil Reais por paciente com ações judiciais naquele ano, enquanto o Programa de Medicamentos de Dispensação Excepcional consumiu 2,2 mil reais por paciente (p. 1839).

Identifica-se, assim, um círculo vicioso, porquanto o aumento do número de ações judiciais, objetivando a garantia do direito à saúde e à vida, impõe o deslocamento cada vez maior de receita para o atendimento de situações individuais, reduzindo a cobertura da prestação de saúde do Estado e levando mais cidadãos a ingressar em juízo para ter acesso às prestações.

Gráfico 3
– O Círculo Vicioso da Implementação da Política Pública de Saúde no Brasil

Nessa linha, conclui-se que o crescimento exponencial das demandas judiciais e a impossibilidade de previsão orçamentária dos gastos oriundos dessas ações impedem que os gestores do sistema de saúde, nos âmbitos municipal, estadual e federal, possam resolver os impasses criados pelo desequilíbrio do sistema de saúde frente às repartições tributárias e o confronto destas com princípios básicos do SUS, como o da equidade na dimensão coletiva (Chieffi; Baratta, 2009).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Da análise da estruturação administrativa do SUS, pode-se concluir que estão os Municípios (e Distrito Federal) incumbidos de prestar a grande maioria dos serviços de saúde. A esses entes compete a gestão e execução da “Atenção Básica”, onde estão inclusos todos os atendimentos de clínica geral, especialidades e emergências, os procedimentos ambulatoriais de baixa e média complexidade, a disponibilização de todos os medicamentos da assistência farmacêutica básica, a contratação de agentes comunitários de saúde, a prestação dos serviços de saúde bucal, a atenção à saúde no sistema penitenciário e a atenção integral à saúde dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e internação provisória.

De outro lado, estudado o pacto federativo e o sistema tributário nacional evidenciou-se que o crescimento da participação dos Municípios na repartição das receitas nacionais é proporcionalmente inferior ao crescimento da carga tributária do Brasil – diminuindo a capacidade financeira desses entes e aumentando a sua dependência em relação à União.

Assim, é possível entender a incapacidade dos Municípios de cumprir o seu dever no sistema de saúde. Ainda, diante da negativa administrativa, é natural a busca pelo atendimento na via judicial, deslocando a implementação dessa política para o Poder Judiciário e comprometendo, de consequência, o orçamento dos próprios Municípios, dos Estados (cuja competência administrativa é eminentemente residual) e da União (cuja competência administrativa abrange apenas a alta complexidade).

Ou seja, estima-se que a causa do deslocamento da implementação da política pública de saúde para a esfera judicial não advém da ausência ou da insuficiência das respectivas previsões administrativas de custeio, mas sim da incongruência da sua repartição de competências com a estrutura de distribuição da receita tributária.

Por todas essas razões, identifica-se a instituição de um círculo vicioso, porquanto o aumento do número de ações judiciais objetivando a garantia do direito à saúde e à vida impõe o deslocamento cada vez maior de receita para o atendimento de situações individuais, reduzindo a cobertura da prestação de saúde do Estado e levando mais cidadãos a ingressar em juízo para ter acesso às prestações.

Diante disso, está confirmada a hipótese inicial de que há uma relevante incongruência entre a institucionalização das competências dos entes federados e a composição orçamentária impedindo a implementação administrativa da política pública de saúde.

Por mais que esta conclusão revele uma falta de eficiência da capacidade do Estado (Souza, 2017SOUZA, C. Modernização do Estado e construção de capacidade burocrática para a implementação de políticas federalizadas. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro v. 51, n. 1, p. 27-45, 2017.) abre, de outro lado, uma agenda de estudos para responder questões como: Há alguma relação do tamanho e do nível de desenvolvimento dos municípios com a dependência financeira em relação à União? Há alguma relação desses fatores com a incapacidade de prestar a assistência à saúde que compete aos municípios? A política de saúde existente, de acordo com a sua forma de prestação administrativa, seria capaz de atender às necessidades da população, se resolvido o problema orçamentário?

Assim, torna-se esta uma pesquisa inicial e, por óbvio, incapaz de responder a todas as inquietações que surgem quando estudamos o Sistema Único de Saúde. Incapaz, inclusive, de apontar se a incongruência entre as estruturas administrativa e orçamentária se deve à inadequação desta ou daquela. De qualquer sorte, pode-se a partir dela considerar a necessidade de resolução do problema estrutural do sistema, antes de pensar-se em inadequação ou necessidade de ampliação da política. Quer dizer, pode-se, a partir deste trabalho, afirmar que não nos falta política, o que nos falta é efetividade.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    13 Maio 2019
  • Aceito
    05 Jun 2023
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