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Negócios inclusivos liderados por mulheres empreendedoras: busca por avanços teóricos e empíricos

Negocios inclusivos liderados por mujeres emprendedoras: búsqueda de avances teóricos y empíricos

Resumo

O presente estudo tem por objetivo contribuir com reflexões teóricas e empíricas sobre as mulheres empreendedoras sob o prisma do feminismo pós-estruturalista e os negócios inclusivos com base na literatura acadêmica sobre pobreza e exclusão social. Para tanto, foi realizada uma pesquisa qualitativa exploratória, com início na triangulação entre o referencial teórico, a análise de conteúdo de entrevistas em profundidade e dados secundários obtidos de documentos. Os resultados dessa investigação corroboram estudos anteriores sobre as características dos empreendedores sociais e trazem indícios complementares à literatura acadêmica. Foram encontradas indicações de que as empreendedoras em negócios inclusivos atuam apoiadas na construção de parcerias que prezam pela escuta e o compartilhamento de decisões. Essas mulheres têm formação acadêmica superior e valorizam o aprendizado, priorizam trabalhar com outras mulheres e atuam em redes de mulheres tanto formais como informais. Além disso, dependendo do tipo de negócio, do público-alvo atendido e da forma como as empreendedoras entendem suas organizaçõ es, foi possível identificar quatro tipos de negócio inclusivo: i) inclusão de consumidores da base da pirâmide; ii) inclusão de pessoas por meio da mão de obra, prestação de serviços e fornecedores na cadeia de valor; iii) inclusão por meio da defesa e garantia de direitos; e iv) aqueles que visam à autoinclusão. Os dois últimos são incipientes na literatura acadêmica e, ao mesmo tempo, ilustram desafios e problemas de construção social de gênero e questões de ordem estrutural na sociedade brasileira.

Palavras-chave:
Negócios inclusivos; Empreendedorismo social; Gênero; Feminismo pós-estruturalista

Resumen

Esta investigación pretende contribuir con reflexiones teóricas y empíricas sobre las mujeres emprendedoras desde la perspectiva del feminismo posestructuralista y sobre los negocios inclusivos desde la literatura académica sobre pobreza y exclusión social. Para ello, se llevó a cabo una investigación cualitativa exploratoria, basada en la triangulación entre el marco teórico, el análisis de contenido de las entrevistas en profundidad y los datos secundarios obtenidos de los documentos. Los resultados de esta investigación corroboran los estudios anteriores sobre las características de los emprendedores sociales y aportan pruebas complementarias a la literatura académica. Se encontraron indicios de que las mujeres empresarias de negocios inclusivos actúan basándose en la creación de asociaciones, valorando la escucha y compartiendo las decisiones. Estas mujeres tienen una mayor formación académica y valoran el aprendizaje, priorizan el trabajo con otras mujeres y actúan en redes femeninas formales e informales. Además, en función del tipo de negocio, del público al que se dirige y de la forma en que las empresarias entienden sus organizaciones, fue posible identificar cuatro tipos de negocios inclusivos: (i) la inclusión de los consumidores de la base de la pirámide; (ii) la inclusión de las personas a través de la mano de obra, la prestación de servicios y los proveedores en la cadena de valor; (iii) la inclusión a través de la defensa y garantía de los derechos y (iv) los dirigidas a la autoinclusión. Los dos últimos son incipientes en la literatura académica y, al mismo tiempo, ilustran los desafíos y problemas de la construcción social de género y cuestiones de orden estructural en la sociedad brasileña.

Palabras clave:
Negocios inclusivos; Emprendimiento social; Género; Feminismo posestructuralista

Abstract

This study contributes with theoretical and empirical reflections on female entrepreneurs from the perspective of post-structuralist feminism and on inclusive business based on the academic literature on poverty and social exclusion. The study consisted of exploratory qualitative research based on the triangulation of the theoretical framework, content analysis of in-depth interviews, and secondary data obtained from documents. The results of this research corroborate previous studies regarding the characteristics of social entrepreneurs and offer complementary insights to the academic literature. The study shows that female entrepreneurs in inclusive businesses act based on building partnerships, valuing listening, and sharing decisions. They have a higher level of education, value learning opportunities, prioritize working with other women, and work in both formal and informal women’s networks. In addition, based on the type of business, the target public, and the way entrepreneurs understand their organizations, it was possible to identify four types of inclusive businesses: (i) inclusion of consumers from the base of the pyramid; (ii) inclusion of people through labor, service provision and suppliers in the value chain; (iii) inclusion through advocacy and guarantee of rights, and (iv) those aimed at self-inclusion. The last two areincipient in the academic literature and, at the same time, illustrate challenges and problems of social gender construction and structural issues in Brazilian society.

Keywords:
Inclusive business; Social entrepreneurship; Gender; Post-structuralist feminism

INTRODUÇÃO

O Global Entrepreneurship Monitor (GEM) realizou uma pesquisa, em 2015, sobre empreendedorismo social. O relatório indica que 45% dos empreendedores sociais são mulheres e que a representação feminina na América Latina é de 45% em novos empreendimentos e 42% em empreendimentos já estabelecidos. No relatório emitido em 2016 sobre o mercado brasileiro, foi demonstrado maior equilíbrio nos empreendimentos iniciais (51,5 % de participação feminina) em comparação com empreendimentos estabelecidos (42,7% de participação feminina), sugerindo que as mulheres já criam negócios na mesma proporção que os homens. Por outro lado, Muntean e Ozkazanc-Pan (2015Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2015). A gender integrative conceptualization of entrepreneurship. New England Journal of Entrepreneurship, 18(1), 27-40. Recuperado de https://doi.org/10.1108/NEJE-18-01-2015-B002
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) argumentaram que as mulheres empreendedoras foram categorizadas como “empreendedorismo feminino”, ou seja, foram relegadas a um subcampo ou status de nicho.

Henry, Foss, e Ahl (2016Henry, C., Foss, L., & Ahl, H. (2016). Gender and entrepreneurship research: A review of methodological approaches. International Small Business Journal, 34(3), 217-41. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0266242614549779
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) realizaram uma revisão sistemática da literatura de gênero e empreendedorismo publicada em 18 periódicos ao longo de um período de 30 anos e verificaram que, somente na década de 1980, começaram a aparecer artigos de pesquisa sobre o empreendedorismo feminino. Numa análise conjunta, os autores constataram que houve uma ênfase nos estudos empíricos com pouca ou nenhuma crítica feminista. Sob o ponto de vista metodológico, indicaram a necessidade de pesquisas mais profundas e baseadas em história de vida, estudos de caso e análise de discurso.

Foss, Henry, Ahl, e Mikalsen (2019Foss, L., Henry, C., Ahl, H., & Mikalsen, G. H. (2019). Women’s entrepreneurship policy research: a 30-year review of the evidence. Small Business Economics, 53(2), 409-29. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s11187-018-9993-8
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) elencaram três categorias em estudos com perspectivas feministas: a primeira conhecida como o empirismo feminista tem uma abordagem liberal, na qual homens e mulheres possuem capacidades semelhantes e que, portanto, se as mulheres tivessem as mesmas oportunidades que os homens, elas alcançariam resultados iguais; a segunda seria a teoria sob a perspectiva feminista, na qual se destacam certas mudanças estruturais e avanços em direitos e, nesse contexto, as mulheres possuem contribuições únicas e específicas; a terceira seria a pós-estruturalista, na qual se compreende a importância em se evidenciarem as construções sociais e as práticas discriminatórias de gênero.

Os primeiros estudos equiparavam gênero com sexo. Já os estudos pós-estruturalistas usam uma definição mais apropriada da palavra “gênero”, a saber, “práticas sociais e representações associadas à feminilidade ou masculinidade, tal como temos atualmente com pessoas transgênero, cisgênero, não binários etc”. Além disso, numa análise do discurso contido em 81 artigos analisados ao longo de quase duas décadas (1982-2000), foi possível perceber um reforço inadvertido da subordinação das mulheres aos homens no contexto do empreendedorismo. Outra descoberta foi a de que os pesquisadores pouco têm feito no sentido de “descobrir” o mundo da mulher empreendedora. Em termos metodológicos, por exemplo, numa base de 60 artigos, apenas dois utilizaram grupos focais e três entrevistas em profundidade, ou seja, uma demasiada ênfase em pesquisas quantitativas e em larga escala (Henry et al., 2016Henry, C., Foss, L., & Ahl, H. (2016). Gender and entrepreneurship research: A review of methodological approaches. International Small Business Journal, 34(3), 217-41. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0266242614549779
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).

Na pesquisa de Muntean e Ozkazanc-Pan (2016Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2016). Feminist perspectives on social entrepreneurship: critique and new directions. International Journal of Gender and Entrepreneurship, 8(3), 221-241. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/IJGE-10-2014-0034
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), o campo do empreendedorismo social foi investigado criticamente sob a abordagem feminista. Nesse sentido, utilizou-se a lente do feminismo pós-estruturalista, e a investigação revelou que ocorriam pressupostos de gênero problemáticos e que estes se encontravam subjacentes, algo distinto à suposta neutralidade de gênero no campo do empreendedorismo social. As autoras constataram que existem um arranjo estrutural e conjecturas culturais que contribuem para reproduzir as desigualdades de gênero. Por exemplo: as microempresas e pequenas empresas, assim como os empreendimentos sociais, seriam mais “adequadas” às mulheres por serem menores e por crescerem mais lentamente; as empresas com crescimento rápido, escaláveis, altamente tecnológicas, seriam do domínio masculino. Ou seja, nas entrelinhas e de forma às vezes não intencional, reforça-se que as mulheres seriam menos ambiciosas e, talvez, mais avessas ao risco, reforçando, mais uma vez, o preconceito de gênero.

Em particular, o campo do empreendedorismo social é um terreno fértil para pesquisas e análise, por meio da perspectiva feminista, pois os empreendedores sociais tendem a ser descritos como heróis, ambiciosos, corajosos e fortes, atributos com tendência masculina. Ao mesmo tempo, por lidarem com a exclusão social, a pobreza, a marginalização e o sofrimento e humano, algo que requer um senso elevado de empatia, que pode enfatizar um engajamento das mulheres (Muntean & Ozkazanc-Pan, 2016Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2016). Feminist perspectives on social entrepreneurship: critique and new directions. International Journal of Gender and Entrepreneurship, 8(3), 221-241. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/IJGE-10-2014-0034
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). Nesse contexto, os negócios inclusivos - um tipo organizacional no campo do empreendedorismo social -, ao gerarem lucro e inclusão social, são um recorte recente e ainda pouco explorado pelo mundo acadêmico.

O empreendedorismo social como meio de promover impacto social positivo tem sido amplamente abordado em estudos acadêmicos (Austin, Stevenson, & Wei-Skillern, 2012Austin, J., Stevenson, H., & Wei-Skillern, J. (2012). Social and commercial entrepreneurship: same, different, or both? Revista de Administração, 47(3), 370-384. Recuperado de https://doi.org/10.5700/rausp1055
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; Dee, 1998; Mair & Martí, 2006Mair, J., & Martí, I. (2006, fevereiro). Social entrepreneurship research: A source of explanation, prediction, and delight. Journal of world business, 41(1), 36-44. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.jwb.2005.09.002
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; Zahra, Gedajlovic, Neubaum, & Shulman, 2009Zahra, S. A., Gedajlovic, E., Neubaum, D. O., & Shulman, J. M. (2009, setembro). A typology of social entrepreneurs: motives, search processes and ethical challenges. Journal of Business Venturing, 24(5), 519-32. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.jbusvent.2008.04.007
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), uma vez que os empreendedores sociais buscam construir modelos de negócios para oferecer soluções criativas para problemas sociais complexos e persistentes, proporcionando contribuições significativas para suas comunidades e sociedades (Zahra et al., 2009Zahra, S. A., Gedajlovic, E., Neubaum, D. O., & Shulman, J. M. (2009, setembro). A typology of social entrepreneurs: motives, search processes and ethical challenges. Journal of Business Venturing, 24(5), 519-32. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.jbusvent.2008.04.007
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).

Atualmente, os empreendimentos híbridos, que equilibram objetivos sociais, financeiros e até ambientais (Iizuka, Varela, & Larroudé, 2015Iizuka, E. S., Varela, C. A., & Larroudé, E. R. A. (2015). Social business dilemmas in Brazil: Rede Astacase. Revista de Administração de Empresas, 55(4), 385-96. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0034-759020150403
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), têm emergido cada vez mais e está despertando um interesse crescente tanto no meio acadêmico quanto prático. Tais negócios têm se destacado, entre outros motivos, por tratar das preocupações globais que permanecem fora do pensamento convencional de negócio (Yunus, Moingeon, & Lehmann-Ortega, 2010Yunus, M., Moingeon, B., & Lehmann-Ortega, L. (2010). Building social business models: lessons from the grameen experience. Long Range Planning, 43(2-3), 308-25. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.lrp.2009.12.005
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).

A literatura acadêmica sobre negócios inclusivos, ainda em construção, tem abordado, principalmente, os negócios que promovem inclusão social de pessoas de baixa renda (Márquez, Reficco, & Berger, 2009Márquez, P., Reficco, E., & Berger, G. (2009). Negocios inclusivos en América Latina. Harvard Business Review, 87(5), 28-38.). Entretanto, alguns exemplos práticos oferecem evidências de que esse fenômeno abrange mais do que o combate à pobreza e a busca pela inclusão financeira, como a Rede Asta, que desenvolveu um modelo de negócio único que atua na inclusão social de artesãs vítimas de violência doméstica, de assédio sexual e de gênero, entre outras agressões (Iizuka, Varela, & Larroudé, 2015Iizuka, E. S., Varela, C. A., & Larroudé, E. R. A. (2015). Social business dilemmas in Brazil: Rede Astacase. Revista de Administração de Empresas, 55(4), 385-96. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0034-759020150403
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).

Os negócios inclusivos - por serem impulsionados pela necessidade de promover a existência humana digna, por meio de abordagens de mercado para enfrentar os desafios socioeconômicos de forma sustentável (Likoko & Kini, 2017Likoko, E., & Kini, J. (2017, fevereiro). Inclusive business - a business approach to development. Current opinion in environmental sustainability, 24, 84-88. Recuperado dehttps://doi.org/10.1016/j.cosust.2017.03.001
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) - podem ser catalizadores de mudanças sociais estruturais. Isso corrobora o pensamento de Amartya Sen (2000Sen, A. (2000). Desenvolvimento como liberdade. São Paulo, SP: Companhia das Letras.), que considerou que o ganho de poder das mulheres seria um dos aspectos centrais no processo de desenvolvimento de muitos países e no papel de agentes ativas de transformação social.

Assim, diante do estado da arte sobre as pesquisas no campo do empreendedorismo social, especificamente com o aspecto de gênero, busca-se investigar, sob a perspectiva feminista pós-estruturalista, as empreendedoras que atuaram na criação dos negócios inclusivos. Por entender que as pesquisas anteriores deram pouca ênfase a abordagens que dessem destaque às mulheres, suas experiências e vivências, propõe-se uma pesquisa qualitativa exploratória, por meio de entrevistas semiestruturadas em profundidade, de caráter descritivo, que busquem responder às seguintes questões de pesquisa: como se caracterizam as empreendedoras sociais que atuam em negócios inclusivos? De que forma podemos analisar e compreender os negócios inclusivos liderados por mulheres sob a perspectiva feminista pós-estruturalista? De forma complementar e utilizando-se do referencial teórico de pobreza e exclusão social, assim como as percepções das empreendedoras sociais, quais reflexões teóricas e empíricas podemos fazer sobre os negócios inclusivos?

Ou seja, a presente pesquisa busca colaborar com um trabalho que os pesquisadores do campo do empreendedorismo social, especificamente de questões de gênero, indicam como relevante e necessário. Adicionalmente, por causa da escolha empírica de análise, este texto visa apresentar possíveis implicações teóricas e gerenciais sobre os negócios inclusivos.

NEGÓCIOS INCLUSIVOS: IMPORTÂNCIA EM DISTINGUIR A POBREZA E A EXCLUSÃO SOCIAL

De acordo com Ranjatoelina (2018Ranjatoelina, J. T. (2018, novembro). The inclusive business model revisited: an “extended resource-based theory” (re)definition built on the investigation of three diversified inclusive enterprises in France. Strategic Change, 27(6), 587-597. Recuperado de https://doi.org/10.1002/jsc.2241
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, p. 587), os negócios inclusivos foram inicialmente definidos pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) num documento que ficou conhecido como Business Call to Action (United Nations Development Programme [UNDP], 2008United Nations Development Programme. (2008, julho). Creating value for all: strategies for doing business with the poor. New York, NY: Autor. Recuperado de https://www.undp.org/rwanda/publications/creating-value-all-strategies-doing-business-poor
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, 2010United Nations Development Programme. (2010). Brokering inclusive business models: a supporting document to the IMD handbook. New York, NY: Autor. Recuperado de https://www.undp.org/publications/brokering-inclusive-business-models
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, 2014United Nations Development Programme. (2014, setembro). Breaking through: Inclusive business and the business call to action today. Mapping challenges, progress and the way ahead. New York, NY: Autor. Recuperado de https://www.businesscalltoaction.org/s/BCtAImpactReport_BreakingThrough-g7jm.pdf
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). Por essa definição, o modelo de negócios inclusivos está centrado na inclusão das pessoas pobres, seja como consumidores, mão de obra, seja como fornecedores na cadeia produtiva. Em países desenvolvidos, tal modelo foca, principalmente, o emprego de trabalhadores excluídos (Márquez et al., 2009Márquez, P., Reficco, E., & Berger, G. (2009). Negocios inclusivos en América Latina. Harvard Business Review, 87(5), 28-38.; Ranjatoelina, 2018Ranjatoelina, J. T. (2018, novembro). The inclusive business model revisited: an “extended resource-based theory” (re)definition built on the investigation of three diversified inclusive enterprises in France. Strategic Change, 27(6), 587-597. Recuperado de https://doi.org/10.1002/jsc.2241
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). Nesse contexto, o crescimento inclusivo teria o potencial de reduzir os trade-offs entre crescimento e desigualdade porque os pobres se tornam clientes, funcionários, proprietários, fornecedores e membros da comunidade (George, McGahan, & Prabhu, 2012George, G., McGahan, A. M., & Prabhu, J. (2012, junho). Innovation for inclusive growth: towards a theoretical framework and a research agenda. Journal of Management Studies, 49(4), 661-683. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1467-6486.2012.01048.x
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, pp. 661-662).

A definição apresentada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2008 é que modelos de negócios inclusivos expandem o acesso de comunidades de baixa-renda a produtos, serviços e meios de subsistência (UNDP, 2008United Nations Development Programme. (2010). Brokering inclusive business models: a supporting document to the IMD handbook. New York, NY: Autor. Recuperado de https://www.undp.org/publications/brokering-inclusive-business-models
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). Com base no conceito de negócios da base da pirâmide (população que vive com menos de US$ 8 por dia), foca a inclusão de pobres na cadeia de valor das empresas, de forma a gerar um benefício mútuo. Estas poderiam envolver populações de baixa renda em qualquer lugar ao longo de sua cadeia de valor, incluindo fornecimento, produção, distribuição e comercialização de bens e serviços.

Os negócios inclusivos passaram a ser vistos como uma vertente do empreendedorismo social mais aderente ao contexto de países em desenvolvimento, que coloca ênfase na inclusão social por meio do consumo da oferta de produtos e serviços para a base da pirâmide (Rosolen, Tiscoski, & Comini, 2014Rosolen, T., Tiscoski, G. P., & Comini, G. M. (2014). Empreendedorismo social e negócios sociais: um estudo bibliométrico da produção nacional e internacional. Revista Interdisciplinar de Gestão Social, 3(1), 85-105. Recuperado de https://doi.org/10.9771/23172428rigs.v3i1.8994
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). Desse modo, o termo “modelo de negócios inclusivos” tornou-se de uso comum fora dos círculos acadêmicos americanos para negócios que desempenham um papel no alívio da pobreza (Reficco & Márquez, 2012Reficco, E., & Márquez, P. (2012). Inclusive networks for building BOP markets. Business & Society, 51(3), 512-56. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0007650309332353
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). Adicionalmente, os negócios inclusivos podem ser entendidos como uma alternativa para gerar oportunidades de emprego e renda para grupos com baixa ou nenhuma mobilidade no mercado de trabalho, dentro dos padrões de trabalho decente e num modelo autossustentável, ou seja, gerar lucros para as empresas e estabelecer relações com organizações empresariais típicas, seja como fornecedor de produtos ou serviços, seja no sistema de distribuição (Comini, Barki, & Aguiar, 2012Comini, G. M., Assad, F., & Fischer, R. M. (2012). Social business in Brazil. Baltimore, MD: International Society for Third Sector Research.).

Teodósio e Comini (2012Comini, G. M., Assad, F., & Fischer, R. M. (2012). Social business in Brazil. Baltimore, MD: International Society for Third Sector Research.) compreendem que o grupo com baixa ou nenhuma mobilidade no mercado de trabalho é constituído por mulheres e homens com mais de 40 anos, pobres e com pouca educação formal; comunidades locais com laços étnicos e baixa escolaridade (indígenas, descendentes de aldeias quilombolas etc.); jovens sem experiência de trabalho que vivem em áreas de alta vulnerabilidade social; e pessoas com deficiência, entre outras, ou seja, pessoas pobres em risco social e ambiental nos países em desenvolvimento.

No Brasil, Teodósio e Comini (2012Comini, G. M., Assad, F., & Fischer, R. M. (2012). Social business in Brazil. Baltimore, MD: International Society for Third Sector Research.) analisaram os dados de pesquisas realizadas com participantes de seminários de responsabilidade social empresarial sobre negócios inclusivos e identificaram que a principal crítica dos respondentes era sobre o interesse das empresas em vender produtos e serviços aos pobres. Ademais, os autores defenderam a diferenciação entre os negócios inclusivos (no combate à exclusão social) e os negócios na base da pirâmide (negócio de nicho), considerados por alguns como sobrepostos e até mesmo como sinônimos, pois existe o risco de não compreender devidamente o combate à pobreza e a luta social existente e seus diversos atores, interesses e tensões inerentes (Walchhütter & Iizuka, 2019Walchhütter, S., & Iizuka, E. S. (2019). Tensões organizacionais inerentes como elemento distintivo à natureza dos negócios sociais. Revista de Ciências da Administração, 21(53), 129-143. Recuperado dehttps://doi.org/10.5007/2175-8077.2019V21n53p129
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).

O conceito de negócio inclusivo encontra-se em construção na área acadêmica. A abordagem predominante é que este favorece a inclusão dos setores de baixa renda, por meio do consumo e de mão de obra, assim como fornecedores na cadeia de valor, o que melhora suas condições de vida (Angeli & Jaiswal, 2016Angeli, F., & Jaiswal, A. K. (2016). Business model innovation for inclusive health care delivery at the bottom of the pyramid. Organization & Environment, 29(4), 486-507. Recuperado de https://doi.org/10.1177/1086026616647174
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; Golja & Požega, 2012Golja, T., & Požega, S. (2012). Inclusive business-what it is all about? Managing inclusive companies. International Review of Management and Marketing, 2(1), 22-42. Recuperado dehttps://www.econjournals.com/index.php/irmm/article/view/95
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; Halme, Lindeman, & Linna, 2012Halme, M., Lindeman, S., & Linna, P. (2012, junho). Innovation for inclusive business: intrapreneurial bricolage in multinational corporations. Journal of Management Studies, 49(4), 743-784. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1467-6486.2012.01045.x
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; Teodósio & Comini, 2012Comini, G. M., Barki, E., & Aguiar, L. T. (2012). A three-pronged approach to social business: A Brazilian multi-case analysis. Revista de Administração, 47(3), 385-397. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0080-21072012000300004
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; Virah-Sawmy, 2015Virah-Sawmy, M. (2015, dezembro). Growing inclusive business models in the extractive industries: demonstrating a smart concept to scale up positive social impacts. The Extractive Industries and Society, 2(4), 676-679. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.exis.2015.07.003
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; Wach, 2012Wach, E. (2012, abril). Measuring the “inclusivity” of inclusive business. IDS Practice Papers, 2012 (9), 1-30. Recuperado dehttps://doi.org/10.1111/j.2040-0225.2012.00009_2.x
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).

A visão baseada em recursos foi a abordagem teórica utilizada para analisar a seleção de parcerias no estudo de caso conduzido por Gradl, Kramer, e Amadigi (2010Gradl, C., Krämer, A., & Amadigi, F. (2010). Partner Selection for Inclusive Business Models. Greener Management International, 56, 25-42. Recuperado dehttps://www.jstor.org/stable/greemanainte.56.25
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). Destaca-se também a análise de Halme et al. (2012Halme, M., Lindeman, S., & Linna, P. (2012, junho). Innovation for inclusive business: intrapreneurial bricolage in multinational corporations. Journal of Management Studies, 49(4), 743-784. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1467-6486.2012.01045.x
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) sobre a importância do papel da média gerência em iniciativas de empreendedorismo inovadoras em multinacionais para negócios inclusivos.

A pesquisa conduzida por Golja e Požega (2012Golja, T., & Požega, S. (2012). Inclusive business-what it is all about? Managing inclusive companies. International Review of Management and Marketing, 2(1), 22-42. Recuperado dehttps://www.econjournals.com/index.php/irmm/article/view/95
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) com dados mundiais, que usa a base da iniciativa Growing Inclusive Markets, das Nações Unidas, concluiu que os negócios inclusivos se caracterizam por serem pequenos e médios, alguns com atuação nacional, e por estarem distribuídos sobretudo no setor de agricultura, seguido de tecnologia da informação e comunicação; alimentos e bebidas; produtos artesanais; cuidados de saúde; produtos de consumo; energia; biocombustíveis; habitação, construção e microcrédito.

Nesse sentido, Likoko e Kini (2017Likoko, E., & Kini, J. (2017, fevereiro). Inclusive business - a business approach to development. Current opinion in environmental sustainability, 24, 84-88. Recuperado dehttps://doi.org/10.1016/j.cosust.2017.03.001
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), com base na análise da evolução conceitual e das discussões acadêmicas e profissionais sobre negócios inclusivos, propõem um modelo abrangente que defende que um negócio é inclusivo se for inovador, efetivo, crível, adaptável, fizer produtos e serviços saudáveis e de baixo custo para os pobres, criar empregos e tiver sustentabilidade financeira e ecológica a longo prazo.

O modelo de negócio inclusivo diz respeito às organizações cuja intenção estratégica é incluir, em sua criação de valor, predominantemente, pessoas que estão sendo desperdiçadas pelas práticas dominantes dos atores do mercado em função de presumirem que elas possuem um desempenho negativo. Além disso, os negócios inclusivos podem ser entendidos como um tipo de organização que luta contra a exclusão social e, nesse contexto, as pessoas vulneráveis incluídas devem ser a maioria entre os recursos humanos (Ranjatoelina, 2018Ranjatoelina, J. T. (2018, novembro). The inclusive business model revisited: an “extended resource-based theory” (re)definition built on the investigation of three diversified inclusive enterprises in France. Strategic Change, 27(6), 587-597. Recuperado de https://doi.org/10.1002/jsc.2241
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).

Hahn (2012Hahn, R. (2012, janeiro). Inclusive business, human rights and the dignity of the poor: a glance beyond economic impacts of adapted business models. Business Ethics, the Environment & Responsibility, 21(1), 47-63. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1467-8608.2011.01640.x
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) foca sua análise em como os modelos de negócios inclusivos afetam a dignidade dos pobres, considerando os direitos humanos (liberdade, segurança, provisões e autoestima) como subcategorias da dignidade humana. Destacou que a contribuição das empresas para vários aspectos da dignidade humana inclui mais do que “apenas” melhorias financeiras para os pobres, mas envolve aspectos de reconhecimento, autoestima e inclusão. Enquanto Wach (2012Wach, E. (2012, abril). Measuring the “inclusivity” of inclusive business. IDS Practice Papers, 2012 (9), 1-30. Recuperado dehttps://doi.org/10.1111/j.2040-0225.2012.00009_2.x
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) analisa casos práticos a fim de identificar as abordagens que contribuem positivamente para o desenvolvimento, o estudo indica que, apesar do potencial que as empresas têm de alcançar impacto, a maioria das avaliações de negócios inclusivos não consegue delinear claramente quais atividades são “inclusivas” e não fornecem uma análise abrangente e robusta do impacto dessas atividades.

De fato, as definições de negócios inclusivos tendem a considerar as pessoas como consumidoras da base da pirâmide, mão de obra a ser empregada e fornecedoras de serviços na cadeia produtiva. Os avanços teóricos são no sentido de reconhecer que há pessoas “desperdiçadas” ou mesmo aquelas em que os direitos humanos e a dignidade encontram-se afetados. Cabe indagar: os negócios inclusivos estão, de fato, incluindo os que se encontram excluídos socialmente?

Fala-se sobre “recursos humanos desperdiçados”, mas não se contemplam pessoas que sequer sejam consideradas. É como se fossem pessoas inexistentes ou invisíveis ou até mesmo a serem “repelidas” pelo mercado, especialmente sob o prisma de mão de obra de ex-presidiários, pessoas transgênero, com deficiência etc. Talvez seja preciso reconhecer as pessoas estigmatizadas, vítimas de preconceito, inclusive as que não são pobres, ou seja, identificar aspectos adicionais do que seja exclusão e inclusão social. Exemplos podem contribuir para a reflexão sobre a importância de distinguir a pobreza da exclusão social.

A artista Pabllo Vittar, uma pessoa rica e famosa, não está isenta de preconceito e discriminação, e, conforme suas palavras, “sei como é difícil ser motivo de chacota, de risada, não conseguir emprego por ser quem você é” (Estadão Conteúdo, 2019Estadão Conteúdo. (2019, abril 03). Pabllo Vittar critica preconceito: “Sei como é difícil ser motivo de chacota”. Istoé Gente. Recuperado de https://istoe.com.br/pabllo-vittar-critica-preconceito-sei-como-e-dificil-ser-motivo-de-chacota/
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). A ex-consulesa francesa Alexandra Loras, uma mulher negra que vive há oito anos no Brasil, disse o seguinte: “Tenho consciência de que sou privilegiada. Mas isso não significa que não sou alvo de racismo. Quando entro no supermercado, costumo comprar muitos produtos importados e sempre tem um segurança atrás de mim [...] quando vou ao clube com meu filho, os sócios me olham com surpresa, pois não estou vestida de branco, como a maioria das babás” (Barrucho, 2020Barrucho, L. (2020, novembro 23). ‘Racismo no Brasil está por todo o lado; eu mesma sou alvo’, diz ex-consulesa da França. BBC News. Recuperado de https://www.bbc.com/portuguese/brasil-55046807
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). Ou seja, independentemente da classe socioeconômica, o racismo persiste e pode levar à exclusão social. O ativista e ex-deputado Jean Wyllys, jornalista e professor universitário, foi obrigado a se exilar por causa de ameaças a sua vida. O processo de exclusão social é complexo: Jean Wyllys tornou-se famoso por causa de um programa televisivo; a fama contribuiu para sua eleição; no entanto, sua projeção e atuação, de forma paradoxal, o obrigaram a se excluir do próprio país (Malvezzi & Nascimento, 2021Malvezzi, P., & Nascimento, A. (2021, fevereiro 17). Jean Wyllys: “O exílio me mantém vivo e protegido, mas é uma forma de solidão” . Brasil de Fato. Recuperado de https://www.brasildefatope.com.br/2021/02/17/jean-wyllys-o-exilio-me-mantem-vivo-e-protegido-mas-e-uma-forma-de-solidao
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).

A exclusão social reconhece que há pessoas e grupos vulneráveis e que sofrem mais privações e são socialmente marginalizados em razão de preconceito, discriminação e estigmas, aspectos dinâmicos e construídos socialmente. A depender do grau de exclusão social, há uma forma de apartheid social, a ideia de que o outro é um “não semelhante”, ou seja, um estar “fora”, e não apenas à margem. No Brasil, os exemplos apresentados parecem indicar que ser negro(a), transgênero, ativista LGBTQIA+ por si só pode gerar um processo de exclusão social, e isso não tem, necessariamente, relação com a pobreza (Bak, 2018Bak, C. K. (2018, maio). Definitions and Measurement of Social Exclusion. Advances in Applied Sociology, 8(5), 422-443. Recuperado de https://doi.org/10.4236/aasoci.2018.85025
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; Birău, 2018Birău, R. F. (2018, novembro). Conceptual analysis on social exclusion. Bulletin of the Transilvania University of Braşov. Series VII: Social Sciences and Law, 11(1), 37-42.; Castel, 1998Castel, R. (2008). As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Rio de Janeiro, RJ: Vozes.; Iizuka, 2003Iizuka, E. S., Walchhutter, S., Dias, M. R., & Barbosa, A. D. S. (2014). Empreendedorismo social e negócios sociais: revisão crítica e agenda de pesquisa. In Anais do 17º Seminários em Administração, São Paulo, SP.; Wanderley, 2001Wanderley, M. B. (2001). Refletindo sobre a noção de exclusão. In B. Sawaia (Org.), As artimanhas da exclusão análise psicossocial e ética da desigualdade (pp. 16-26). Petrópolis, RJ: Vozes.).

EMPREENDEDORISMO SOCIAL E GÊNERO

A definição de empreendedorismo social requer a valorização das motivações de indivíduos e grupos que aceitam os riscos associados à concepção, à construção, ao lançamento e à manutenção de novas organizações e modelos de negócios. Isso significa que certos indivíduos com valores, capacidades e habilidades particulares serão atraídos para o empreendedorismo social, buscando oportunidades e respostas organizacionais inovadoras para criar riqueza social (Zahra et al., 2009Zahra, S. A., Gedajlovic, E., Neubaum, D. O., & Shulman, J. M. (2009, setembro). A typology of social entrepreneurs: motives, search processes and ethical challenges. Journal of Business Venturing, 24(5), 519-32. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.jbusvent.2008.04.007
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).

A prevalência masculina nas iniciativas empreendedoras em geral é clara e amplamente evidenciada em pesquisas realizadas em todo o mundo, porém tem sido observada menor desigualdade de gênero quando se trata de empreendedorismo social (Bosma, & Levie, 2010Bosma, N., & Levie, J. (2010). Global entrepreneurship monitor: 2009 global report. Babson Park, MA: Babson College; Santiago, Chile: Universidad del Desarrollo; Háskólinn Reykjavík, Iceland: Reykjavík University; London, UK: London Business School. Recuperado de https://www.gemconsortium.org/report/gem-2009-global-report
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; Huysentruyt, 2014Huysentruyt, M. (2014). Women’s social entrepreneurship and innovation (Papers, No. 2014/01). Paris, France: OECD Publishing.; Kelley, Singer, & Herrington, 2015Kelley, D., Singer, S., & Herrington, M. (2015). Global Entrepreneurship Monitor: 2015/16 global report. Babson Park, MA: Babson College; Santiago, Chile: Universidad del Desarrollo; Kuala Lumpur, Malaysia: Universiti Tun Abdul Razak; Mexico, DC: Tecnológico de Monterrey, London, UK: London Business School . Recuperado de https://www.gemconsortium.org/file/open?fileId=49480
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; Nicolás & Rubio, 2016Nicolás, C., & Rubio, A. (2016, maio). Social enterprise: gender gap and economic development. European Journal of Management and Business Economics, 25(2), 56-62. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.redeen.2015.11.001
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; Orr, Kickul, Gundry, & Griffiths, 2018Orr, J., Kickul, J., Gundry, L., & Griffiths, M. (2018). The mediating role of female migration on social entrepreneurship activity. The International Journal of Entrepreneurship and Innovation, 19(4), 273-81. Recuperado de https://doi.org/10.1177/1465750317748876
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). Estudos têm sugerido que existe maior equidade em organizações do terceiro setor (N. Teasdale, McKay, Phillimore, & S. Teasdale, 2011Teasdale, S., McKay, S., Phillimore, J., & Teasdale, N. (2011). Exploring gender and social entrepreneurship: women’s leadership, employment and participation in the third sector and social enterprises. Voluntary Sector Review, 2(1), 57-76. Recuperado dehttps://doi.org/10.1332/204080511X560620
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), bem como nos conselhos de pequenos negócios sociais (Lyon & Humbert, 2012Lyon, F., & Humbert, A. L. (2012). Gender balance in the governance of social enterprise. Local Economy, 27(8), 831-45. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0269094212455158
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).

Embora trate-se de um conceito ainda pouco explorado por estudos acadêmicos, têm sido encontradas evidências que mulheres poderiam ser mais propensas ao empreendedorismo social que os homens (Loarne-Lemaire, Maalaoui & Dana, 2017Loarne-Lemaire, S. L., Maalaoui, A., & Dana, L. P. (2017). Social entrepreneurship, age and gender: toward a model of social involvement in entrepreneurship. International Journal of Entrepreneurship and Small Business, 31(3), 363-81.), o que, somado ao senso comum de que mulheres são mais avessas ao risco e mais inclinadas às atividades voltadas para o cuidado, pode-se levar à suposição de que não há mais a ser analisado nesse campo.

No entanto, algumas pesquisas levantam dúvidas sobre as perspectivas sob as quais o empreendedorismo foi conceituado desde os primeiros estudos, fortemente baseados na ideia do “heroico, competitivo, agressivo e inovador” empreendedor tradicional (Muntean & Ozkazanc-Pan, 2016Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2016). Feminist perspectives on social entrepreneurship: critique and new directions. International Journal of Gender and Entrepreneurship, 8(3), 221-241. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/IJGE-10-2014-0034
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). Em função disso, Humbert (2012Humbert, A. L. (2012). Women as social entrepreneurs (Working Paper, 72). Birmingham, UK: Third Sector Research Centre. Recuperado de https://eprints.mdx.ac.uk/8834/
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) propõe que a própria literatura sobre empreendedorismo reconsidere suposições muito estereotipadas quanto aos papéis de homens e mulheres com base na masculinidade implícita do empreendedor como constructo e na androcentricidade que se tornou inerente ao campo.

Com foco nas motivações das empreendedoras, Levie e Hart (2011Levie, J., & Hart, M. (2011). Business and social entrepreneurs in the UK: gender, context and commitment. International Journal of Gender and Entrepreneurship, 3(3), 200-217. Recuperado de https://doi.org/10.1108/17566261111169304
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) identificarm que quanto mais carentes as comunidades em que vivem, maior a probabilidade de as mulheres iniciarem um empreendimento social tradicional. Dados corroborados pelo estudo de Kimbu e Ngoasong (2016Kimbu, A. N., & Ngoasong, M. Z. (2016, setembro). Women as vectors of social entrepreneurship. Annals of Tourism Research, 60, 63-79. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.annals.2016.06.002
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), em Camarões, indicam que a pobreza de sua família e a falta de emprego bem remunerado em tempo integral seriam vetores para o empreendeorismo social feminino, sugerindo que lidar com problemas locais seria um forte motivador para as mulheres tornarem-se empreendedoras sociais.

Quanto aos traços de personalidade, os empreendedores sociais apresentam alto grau de abertura a experiências, extroversão, amabilidade, estabilidade emocional e concienciosidade. Mas as mulheres apresentariam maior nível de amabilidade que os homens (Bernardino, Santos, & Ribeiro, 2018Bernardino, S., Santos, J. F., & Ribeiro, J. C. (2018). Social entrepreneur and gender: What’s personality got to do with it?International journal of gender and entrepreneurship, 10(1), 61-82. Recuperado de https://doi.org/10.1108/IJGE-07-2017-0040
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), além de tenderem a atuar de forma colaborativa, principalmente quando se trata de inovação, trabalhando, inclusive, em parceria com outras organizações e com propensão a adotar práticas de gestão participativa (Huysentruyt, 2014Huysentruyt, M. (2014). Women’s social entrepreneurship and innovation (Papers, No. 2014/01). Paris, France: OECD Publishing.), o que contribuiria para o viés de gênero no campo de empreendedorismo social, por conta da importância do relacionamento interpessoal nesse setor.

Existem indícios de que a satisfação profissional da empreendedora social não dependente do salário gerado pelo negócio social (Estrin, Stephan, & Vujic, 2014Estrin, S., Stephan, U., & Vujic, S. (2014, novembro). Do women earn less even as social entrepreneurs? (IZA Discussion Papers, n. 8650). Bonn, Germany: Institute for the Study of Labor.). Assim como, quando se trata de criação de novos mercados, as mulheres seriam mais inovadoras que os homens, sendo mais frequentemente as primeiras a fornecer um produto ou serviço, talvez por maior atenção a necessidades sociais não atendidas (Huysentruyt, 2014Huysentruyt, M. (2014). Women’s social entrepreneurship and innovation (Papers, No. 2014/01). Paris, France: OECD Publishing.).

Deve-se evitar categorizar o empreendedorismo liderado por mulheres como um subgênero, definido como pequenos negócios, de menor lucro e crescimento lento em setores considerados tipicamente de mulheres, sem analisar o impacto da dinâmica social na qual se inserem (Muntean & Ozkazanc-Pan, 2016Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2016). Feminist perspectives on social entrepreneurship: critique and new directions. International Journal of Gender and Entrepreneurship, 8(3), 221-241. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/IJGE-10-2014-0034
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). Assim como, para abordar a diversidade real dos empreendedores sociais, não se pode ignorar o contexto cultural, social e pessoal (Humbert, 2012Humbert, A. L. (2012). Women as social entrepreneurs (Working Paper, 72). Birmingham, UK: Third Sector Research Centre. Recuperado de https://eprints.mdx.ac.uk/8834/
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).

Portanto, para compreender o papel das mulheres no empreendedorimo social, especialmente em se tratando de negócios inclusivos, é necessária uma abordagem que leve em consideração o contexto que as cerca, assim como suas características.

MÉTODO DE PESQUISA

Com o objetivo de compreender as empreendedoras, suas características e saber como os negócios inclusivos são entendidos por elas, foi adotada uma metodologia qualitativa de caráter exploratório, pois é fundamentalmente interpretativa e permite aos pesquisadores terem uma visão holística do fenômeno (Creswell, 2002Creswell, J. W. (2002). Research design: Qualitative, quantitative, and mixed method approaches. London, UK: SAGE.). Essa abordagem dispõe de meios de pesquisa que busquem a compreensão do fenômeno social e da explicação do ponto de vista do participante (Godoi, Bandeira-de-Melo, & Silva, 2010Godoi, C. K., Bandeira-de-Mello, R., & Silva, A. B. (2010). Pesquisa qualitativa em estudos organizacionais: paradigmas, estratégias e métodos. São Paulo, SP: Editora Saraiva.).

Assim, na primeira fase, foi realizada a pesquisa bibliográfica necessária para a construção da base teórica do estudo, de uma base empírica com negócios inclusivos nacionais e internacionais e para a alinhar o entendimento acadêmico com as evidências da experiência prática.

Essa base empírica foi elaborada com o apoio de documentos disponíveis sobre os negócios inclusivos liderados por mulheres. Basicamente, foram considerados os websites dessas organizações, assim como as redes sociais (como o Instagram) e materiais veiculados em mídias de negócio, quando necessário, com o intuito de checar as informações. A análise documental foi importante no sentido de compreender o público-alvo atendido, a data de criação da organização e o setor de atuação.

Na segunda fase, foram realizadas entrevistas em profundidade com sete empreendedoras de negócios sociais inclusivos, para compreender essas mulheres, suas características e a estrutura de seus negócios.

Instrumentos de coleta de dados

A escolha da entrevista como principal fonte de dados deve-se ao fato de que, em suas diferentes formas, os métodos de entrevista distinguem-se pela aplicação de processos fundamentais de comunicação e interação humana. Corretamente valorizados, esses processos permitem ao investigador retirar das entrevistas informações e elementos de reflexão muito ricos e matizados (Quivy & Van Campenhoudt, 1998Quivy, R., & Campenhoudt, L. V. (1998). Manual de investigação em ciências sociais (2a ed.). Lisboa, Portugal: Gradiva.).

Foram construídas questões abertas para que as participantes pudessem apresentar a própria visão livremente. Buscou-se adotar as perspectivas das próprias empreendedoras, sob a luz da literatura acadêmica, para a realização da pesquisa. Além disso, a pesquisadora realizou todas as entrevistas, analisou e debateu os resultados com outro pesquisador, a fim de aumentar a confiabilidade dos dados e explorar possíveis categorias e temas emergentes.

O roteiro da entrevista contemplou questões relacionadas com a investigação da trajetória pessoal e profissional da entrevistada; as motivações para o empreendedorismo social; as características individuais; a visão de negócio e de inclusão e a influência de contextos de aprendizagem. Ele foi construído com base na literatura acadêmica, considerando as categorias de análise do indivíduo listadas no Quadro 1, a seguir.

Quadro 1
Categorias de análise do indivíduo

As três categorias foram organizadas com base nos autores citados no Quadro 1 e exploraram as experiências e motivações das empreendedoras, suas características e atributos individuais no contexto do empreendedorismo social e verificaram a formação acadêmica e demais formações das entrevistadas. Assim, o questionário utilizado pelas empreendedoras baseou-se nessas categorias e as perguntas buscaram explorar cada contribuição teórica previamente validada pela literatura.

Análise e tratamento dos dados

Todas as entrevistas foram transcritas e analisadas com os demais documentos para verificação de conteúdo, por meio de um conjunto de técnicas de avaliação da comunicação que utilizam procedimentos sistemáticos para inferir conhecimentos relativos às condições de produção e recepção dessas mensagens (Bardin, 2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo, SP: Edições, 70.). Na fase de pré-análise, foi realizado um exame de conteúdo dos documentos coletados de cada empreendedora e seus negócios inclusivos, como websites, redes sociais e notícias. Com base na exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência, foram formulados os objetivos da pesquisa. Como segundo passo, materiais foram explorados para efeito de unidades de registro e posterior categorização. Finalmente, a interpretação procedeu-se fundamentada nos resultados obtidos (Bardin, 2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo, SP: Edições, 70.).

Sendo assim, cada empreendedora foi analisada, primeiro individualmente, e, em seguida, foram realizadas as comparações entre as entrevistadas para identificação de padrões e exceções.

Melhor do que qualquer outro método de trabalho, a análise de conteúdo permite, quando incide sobre um material rico e penetrante, satisfazer harmoniosamente as exigências do rigor metodológico e da profundidade inventiva, que nem sempre são facilmente conciliáveis (Quivy & Van Campenhoudt, 1998Quivy, R., & Campenhoudt, L. V. (1998). Manual de investigação em ciências sociais (2a ed.). Lisboa, Portugal: Gradiva.).

RESULTADO E ANÁLISE

Descrição geral das empreendedoras

Foram enviadas cartas convite para 37 empreendedoras selecionadas da base empírica, de acordo com a análise documental sobre a declaração de missão e propósito. Os dados foram coletados entre fevereiro e junho de 2019 por meio de entrevistas semiestruturadas presenciais e virtuais, de uma hora e meia cada uma, em média, com sete empreendedoras. Todas as entrevistadas têm curso superior completo, seis têm pós-graduação, e estão na faixa entre 25 e 50 anos. Uma caracterização geral das empreendedoras é apresentada no Quadro 2, a seguir.

Quadro 2
Descrição dos negócios

Análise das entrevistas com as empreendedoras

As entrevistas em profundidade foram analisadas de acordo com as categorias encontradas na literatura acadêmica sobre as empreendedoras sociais que lideram os negócios inclusivos.

Experiências anteriores e motivações

Foram encontradas evidências de que aproveitar-se do conhecimento adquirido em experiências profissionais anteriores para a construção e gestão do negócio seria uma prática comum (Kimbu & Ngoasong, 2016Kimbu, A. N., & Ngoasong, M. Z. (2016, setembro). Women as vectors of social entrepreneurship. Annals of Tourism Research, 60, 63-79. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.annals.2016.06.002
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), conforme relatado por cinco das entrevistadas.

E1: Lá atrás, desenvolvi muitos produtos do zero como intraempreendedora, e aí me apaixonei pelo mundo da educação, quis me aprofundar nisso. Essa experiência prévia me ajudou.

As empreendedoras abordam uma clara preocupação com as desigualdades sociais, razão pela qual veem esse fator como um grande motivador para investir em um negócio social. Percebe-se também que há uma crença de que os negócios inclusivos têm maior potencial de provocar mudanças em áreas em que o setor público não atinge todos integralmente.

E3: Como eu já tive uma experiência no setor público e percebi como as coisas são instáveis, porque uma hora você está realizando e aí muda, por exemplo, a gestão, e você já não tem mais como prosseguir o trabalho. Assim, acredito que o negócio em que atuo tem mais chances de causar melhorias e reduzir as desigualdades.

Seis empreendedoras analisadas relatam experiências pessoais como um fator de grande impacto na decisão de empreender em um negócio social voltado para a inclusão, em especial de mulheres e minorias. A vivência de situações de exclusão, mesmo que tenha ocorrido com outras pessoas, demonstrou ter sido muito importante na definição e construção do negócio.

E4: Eu via muita diferença no tratamento com as funcionárias mulheres, com as clientes mulheres, com a maneira machista; a minha família ainda é machista. Isso me incomodava. Em todos os lugares têm essa cultura impregnada, e me irrita um pouco, e foi a partir disso que eu quis fazer um movimento, que o meu trabalho pudesse contribuir para diminuir, de alguma forma, essa cultura.

Uma das entrevistadas vai além e se reconhece como alguém que deveria empreender para fazer frente ao processo de exclusão social em função das imposições vividas pelas mulheres transgênero. Ou seja, a própria experiência de estar excluída do mercado formal de trabalho a incentivou a buscar alternativas.

E6: O que me fez pular no empreendedorismo foi a rejeição que eu estava tendo com o mercado de trabalho, o mercado de trabalho não estava me dando o que eu achava que merecia […].

As entrevistadas valorizam suas experiências anteriores, sejam elas positivas ou não, assim como possuem um senso de missão social claro. São proativas e reconhecem nos negócios inclusivos uma chance de combater a exclusão social, inclusive a que as afeta diretamente. Tais características estão amparadas pela literatura sobre empreendedorismo social, pobreza e exclusão social. Por outro lado, a busca pela inclusão de si mesma num negócio inclusivo é algo incipiente na literatura acadêmica. Nas poucas pesquisas em que se reconhece a existência desse tipo de negócio, cita-se o estudo de Ranjatoelina (2018Ranjatoelina, J. T. (2018, novembro). The inclusive business model revisited: an “extended resource-based theory” (re)definition built on the investigation of three diversified inclusive enterprises in France. Strategic Change, 27(6), 587-597. Recuperado de https://doi.org/10.1002/jsc.2241
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), no qual optou-se por excluir o tipo de negócio “autoinclusivo”, ou seja, o caso em que uma pessoa em situação de exclusão ou vulnerabilidade cria a própria empresa. Sob o prisma do feminismo pós-estruturalista, contudo, a experiência de se incluir é uma forma de indicar problemas de ordem estrutural mais complexos e profundos de exclusão social de mulheres transgênero que não encontram no mercado formal possibilidades de emprego e renda adequados.

Características e atributos individuais

Além do comprometimento com a causa para a qual o negócio foi criado, as empreendedoras têm características pessoais semelhantes. Foram destacados atributos já reconhecidos como comuns ao perfil do empreendedor social, como alta tolerância a risco e criatividade na utilização de recursos escassos e na proposição de novas formas de endereçar problemas sociais. A empatia foi enfatizada sob a perspectiva de humanização das relações em todo o processo do negócio, corroborando a percepção do empreendedor social como mais altruísta e que tende a confiar nos demais (Petrovskaya & Mirakyan, 2018Petrovskaya, I., & Mirakyan, A. (2018). A mission of service: Social entrepreneur as a servant leader. International Journal of Entrepreneurial Behavior & Research, 24(3), 755-767. Recuperado de https://doi.org/10.1108/IJEBR-02-2016-0057
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). Três empreendedoras chegaram a declarar que consideram importante colocar as necessidades subjetivas individuais como prioridade no cotidiano do negócio.

E2: Do jeito que a gente trata nossos parceiros, fornecedores, clientes aqui, nossos colegas, sinto que é uma coisa muito mais humana; talvez por trabalhar com mulheres, tento, hoje, de forma natural sempre que tem uma mulher no ambiente de trabalho valorizá-la.

A busca pela valorização de características atribuídas às mulheres foi apresentada como importante elemento humanizador das relações de trabalho. A presença de mulheres, especialmente na liderança, é considerada muito relevante para negócios que se propõem a serem inclusivos.

E7: Eu tenho essa prioridade de trabalhar com mulheres nas comunidades. Também trabalhar com mulheres anfitriãs… a minha prioridade sempre é contratar mulheres.

Foi bastante destacada a importância de compartilhar a liderança na gestão do negócio, bem como agregar perspectivas e experiências diferentes na criação e condução do negócio de forma horizontal.

E4: É horizontal, assim, sou muito de ouvir e tentar unir o que as pessoas falam.

De acordo com as falas das empreendedoras, houve a valorização de uma gestão mais humana e horizontal, na qual as subjetividades são tão relevantes quanto o resultado financeiro do negócio. Em particular, a valorização das mulheres é algo imprescindível num negócio inclusivo não apenas em âmbito interno, mas também externo às organizações. Essas características tendem a reforçar a produção de literatura sobre o empreendedorismo social, em particular textos que analisem os aspectos relacionados com o gênero. Cabe destacar que a valorização das mulheres nos negócios inclusivos, algo que tende a ser positivo, pode ser compreendida como provável dificuldade ou ausência desse tipo de prática em outras organizações e no mercado de trabalho. Nesse sentido, as entrevistas parecem indicar, ainda que indiretamente, práticas discriminatórias de gênero nas empresas brasileiras.

Formação educacional e contextos de aprendizagem

Como já havia sido observado pela literatura sobre empreendedorismo conduzida por mulheres (Fischer, Reuber, & Dyke, 1993Fischer, E. M., Reuber, A. R., & Dyke, L. S. (1993, março). A theoretical overview and extension of research on sex, gender, and entrepreneurship. Journal of business venturing, 8(2), 151-168. Recuperado de https://doi.org/10.1016/0883-9026(93)90017-Y
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), em geral, encontram-se profissionais com um alto nível de formação educacional. E isso se confirmou com as entrevistas, que deixam claro que seis das empreendedoras abordadas obtiveram ao menos uma pós-graduação. Além disso, as empreendedoras que não têm educação formal voltada para a gestão, buscaram aprender sobre esse tema inclusive por meio de cursos sobre gestão de negócios sociais.

As entrevistadas relataram que adotam a construção de parcerias como principal prática, em que envolvem toda a equipe nos processos, algo que está em sintonia com a tendência de utilização de habilidades relacionais pelas mulheres em posições de liderança (Buttner, 2001Buttner, E. H. (2001). Examining female entrepreneurs’ management style: An application of a relational frame. Journal of business ethics, 29(3), 253-69. Recuperado de https://doi.org/10.1023/A:1026460615436
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). Esse aspecto é visto pelas empreendedoras como essencial para a condução do negócio e é abordado de forma abrangente, pois inclui desde colaboradores até concorrentes. O que favorece a hipótese de que o empreendedorismo social liderado por mulheres tem o poder de empoderar os outros (Huysentruyt, 2014Huysentruyt, M. (2014). Women’s social entrepreneurship and innovation (Papers, No. 2014/01). Paris, France: OECD Publishing.) no ambiente no qual se inserem.

E6: Todo mundo tem um interesse legítimo não só no dinheiro, mas na causa. Então daí vem a conclusão óbvia que todo mundo está sempre dando o seu melhor como uma grande equipe.

E6: Eu sou uma pessoa bem coletiva, então gosto de ouvir a opinião de todo mundo, de falar, de trocar.

Ganha destaque também a importância de buscar o conhecimento prático do setor e a participação do público beneficiário do negócio, principalmente quando o empreendedor não faz parte deste, a fim de evitar soluções que não sejam realmente aderentes ao problema que se pretende endereçar.

E1: Tem um lado muito forte também de entender as pessoas e pensar como eu entro no modo mental delas, não elas terem que entrar no meu modelo mental. Minhas ideias são construídas a partir da escuta e da compreensão das outras pessoas.

Os desafios mais abordados são relacionados com a construção e validação do modelo de negócios. Cinco dos casos estudados estão passando por um processo de revisão em relação ao modelo proposto inicialmente, por causa de alguma premissa adotada na definição do negócio e não confirmada na implementação.

E2: A gente está agora em um reposicionamento, então, a gente entende que o conceito está validado, mas tem que repensar o produto e o canal para poder falar com essa turma mais jovem que antes não estava sendo tão alcançada assim.

Os relacionamentos - por meio de redes de empreendedoras, parcerias, mentorias ou coworking - foram identificados como essenciais para o compartilhamento de ideias, suporte no aspecto do negócio desconhecido pela empreendedora e até mesmo o apoio emocional. A participação em redes, em especial específicas de mulheres, mostrou ser de grande importância para a construção e consolidação do negócio.

Seis entrevistadas disseram participar de grupos como o Rede Mulher Empreendedora, para a troca de experiências e suporte mútuo. Esse envolvimento permite às empreendedoras também melhor percepção das questões sociais com as quais lidam, apoio em momentos desafiadores e suporte na definição de estratégia. Isso fica evidente quando a Empreendedora 1 diz: “Eu uso muito essas redes para tomar decisões, para ajudar a pensar, para usar a experiência de pessoas que já viveram muito mais do que eu.”

A necessidade de fortalecimento da rede de apoio, em alguns casos, deve-se também aos riscos intrínsecos ao negócio ou ao grupo social ao qual pertencem. Duas empreendedoras destacaram preocupação com a própria segurança. Em um caso porque o negócio expõe a realidade do assédio sexual, em outro, por sua condição de mulher transgênero.

E5: Toda vez que dou palestra, toda vez que o negócio toma notabilidade, começam as agressões virtuais.

E6: Acho que o principal desafio é sobreviver, literalmente, sobreviver. Estou num grupo social em que posso ser morta simplesmente por estar andando na rua.

A tendência de priorizar atuação com outras mulheres foi identificada não apenas como forma de apoiar minorias com as quais se identificam, mas também para trazer para o cotidiano do negócio as características comumente atribuídas ao gênero feminino, como sensibilidade às necessidades coletivas.

E7: Homens de alma feminina também se incluem… não só as mulheres, mas, assim, essa coisa do feminino. Eu acho que têm essa coisa do se preocupar com o próximo, essa coisa do coletivo.

A aprendizagem coletiva fundamentada na rede de mulheres tem ocorrido para além da gestão e do negócio. Inclui pautas de fortalecimento mútuo, empoderamento, especialmente em questões de violência e exclusão social. Nesse contexto, os relatos obtidos parecem indicar desafios no sentido das construções sociais sobre como gerir, liderar e lidar com as dificuldades cotidianas dos negócios inclusivos. Ao mesmo tempo, aparentam revelar práticas discriminatórias de gênero, seja por meio de agressões virtuais, especialmente quando existe o reconhecimento das falas em eventos, seja quando há risco à vida da mulher.

SÍNTESE SOBRE AS EMPREENDEDORAS

Com o levantamento teórico e empírico, foi construída a proposta de um modelo interpretativo das principais características das empreendedoras sociais que lideram negócios inclusivos. A Figura 1, a seguir, contempla a revisão teórica, as entrevistas e os dados secundários obtidos com base em documentos sobre as empreendedoras e os negócios inclusivos.

Figura 1
Síntese sobre empreendedoras de negócios inclusivos

A pesquisa indica que as empreendedoras que lideram os negócios inclusivos possuem as características dos empreendedores sociais já elencadas pela literatura acadêmica, ou seja, atuam como agentes de mudanças sociais e buscam soluções criativas e inovadoras para lidar com a escassez de recursos e solucionar os problemas (Austin, Stevenson, & Wei-Skillern, 2006Austin, J., Stevenson, H., & Wei-Skillern, J. (2006, janeiro). Social and commercial entrepreneurship: same, different, or both?Entrepreneurship theory and practice, 30(1), 1-22. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1540-6520.2006.00107.x
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; Dees & Anderson, 2003Dees, J. G., & Anderson, B. B. (2003). For-profit social ventures. International Journal of Entrepreneurship Education, 2(1), 1-26.; Desa & Kock, 2014Desa, G., & Koch, J. L. (2014). Scaling social impact: building sustainable social ventures at the base-of-the-pyramid. Journal of Social Entrepreneurship, 5(2), 146-74. Recuperado de ttps://doi.org/10.1080/19420676.2013.871325
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; Mair & Shoen, 2007; Mort, Weerawardena, & Carnegie, 2002Mort, G. S., Weerawardena, J., & Carnegie, K. (2002). Social entrepreneurship: towards conceptualization and measurement. In Proceedings of the 2002 AMA Summer Marketing Educators Conference, Chicago, IL.; Peredo & Mclean, 2006Peredo, A. M., & McLean, M. (2006, fevereiro). Social entrepreneurship: a critical review of the concept. Journal of World Business, 41(1), 56-65. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.jwb.2005.10.007
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; Zahra et al., 2009Zahra, S. A., Gedajlovic, E., Neubaum, D. O., & Shulman, J. M. (2009, setembro). A typology of social entrepreneurs: motives, search processes and ethical challenges. Journal of Business Venturing, 24(5), 519-32. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.jbusvent.2008.04.007
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) e são movidas pelo imperativo de impulsionar mudanças sociais e gerar benefício transformacional duradouro para a sociedade (Martin & Osberg, 2007Martin, R. L., & Osberg, S. (2007). Social entrepreneurship: The case for definition. Stanford Social Innovation Review, 5, 28. Recuperado dehttps://doi.org/10.48558/tsav-fg11
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).

No entanto, alguns aspectos específicos foram apresentados pelas empreendedoras que lideram negócios inclusivos, que sugerem que elas podem ser reconhecidas como um subgrupo de empreendedor social com características únicas que as diferenciam dos demais.

As empreendedoras relatam que adotam a construção de parcerias como principal prática, envolvendo toda a equipe nos processos, o que ratificaria a tendência de utilização de habilidades relacionais pelas mulheres em posições de liderança (Buttner, 2001Buttner, E. H. (2001). Examining female entrepreneurs’ management style: An application of a relational frame. Journal of business ethics, 29(3), 253-69. Recuperado de https://doi.org/10.1023/A:1026460615436
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). Esse aspecto é visto pelas empreendedoras como essencial para a condução do negócio e é abordado de forma bastante abrangente, ou seja, inclui desde colaboradores até concorrentes, o que favorece a hipótese de que o empreendedorismo social feminino tem o poder de empoderar os outros (Huysentruyt, 2014Huysentruyt, M. (2014). Women’s social entrepreneurship and innovation (Papers, No. 2014/01). Paris, France: OECD Publishing.) no ambiente no qual se inserem.

A participação em redes, em especial as específicas de mulheres, mostrou ser de grande importância para a construção e consolidação do negócio. Seis entrevistadas disseram participar de grupos como o Rede Mulher Empreendedora, para a troca de experiências e suporte mútuo. Esse envolvimento permite às empreendedoras também melhor percepção das questões sociais com as quais lidam e suporte na definição da estratégia.

Essas empreendedoras construíram seus negócios apoiadas nas próprias experiências, boas ou ruins, que definem a causa à qual se dedicam, portanto, seu negócio é um meio para atingir esse objetivo primário.

Como já havia sido observado pela literatura sobre empreendedoras (Fischer et al., 1993Fischer, E. M., Reuber, A. R., & Dyke, L. S. (1993, março). A theoretical overview and extension of research on sex, gender, and entrepreneurship. Journal of business venturing, 8(2), 151-168. Recuperado de https://doi.org/10.1016/0883-9026(93)90017-Y
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), essas mulheres também têm alto nível de formação educacional, e seis das empreendedoras analisadas obtiveram ao menos uma pós-graduação.

Uma tendência a priorizar atuação com outras mulheres foi identificada não apenas como forma de apoiar minorias com as quais se identificam, mas também para trazer ao cotidiano do negócio as características comumente atribuídas ao gênero feminino, como sensibilidade às necessidades coletivas.

Por outro lado, é preciso reconhecer que parte das características encontradas, sob o prisma do feminismo pós-estruturalista, parece indicar desafios tanto de ordem de construção social sobre gênero - mulheres transgênero, por exemplo - estigmas, preconceitos, vulnerabilidades e discriminação que geram exclusão social do mercado de trabalho formal quanto problemas de ordem estrutural com relação à existência da violência de gênero, especificamente o assédio sexual no ambiente de trabalho. Dito de outra forma, caso não houvesse problemas na construção social de gênero tampouco a violência sexual contra as mulheres, haveria espaço para esses negócios inclusivos?

Ao triangular as entrevistas, os dados secundários sobre cada empreendedora, o negócio inclusivo e observações in loco, foi possível reconhecer quatro categorias nas quais esses negócios podem ser classificados: i) base da pirâmide, que visa oferecer produtos e/ou serviços para as populações de baixa renda; ii) oferta de produtos e prestação de serviços ao longo da cadeia de valor, que inclui minorias como colaboradores, fornecedores, parceiros etc.; iii) direitos, que tem por objetivo a defesa dos direitos de mulheres excluídas socialmente; e iv) autoinclusão, pelos quais minorias buscam a própria inclusão no mercado de trabalho.

A Figura 2, a seguir, ilustra e sintetiza os tipos de inclusão que as empreendedoras buscam promover por meio de seus negócios inclusivos.

Figura 2
Categorias de negócios inclusivos

Os negócios voltados para a base da pirâmide (BoP) e que atuam na cadeia de valor, dos quadrantes “a” e “b”, estão presentes na literatura acadêmica dos negócios inclusivos. Além disso, tais negócios parecem lidar, sobretudo, com o problema da pobreza como foco central. Os negócios inclusivos relacionados com a luta pelos direitos (advocacy) e pela autoinclusão, quadrantes “c” e “d”, por outro lado, são incipientes na produção científica até o momento. Ambos parecem focalizar os problemas de exclusão social de gênero, seja em função da construção social, seja pela violência sexual contra as mulheres.

O Quadro 3, a seguir, relaciona as características apresentadas no modelo interpretativo com as fontes de evidência utilizadas no estudo.'

Quadro 3
Características e fontes de evidências

Como visto, o resultado da pesquisa foi alcançado segundo a triangulação de fontes de dados, como literatura acadêmica sobre empreendedorismo social e de gênero, negócios inclusivos, pobreza e exclusão social, documentos (websites, redes sociais, materiais sobre empreendedoras e negócios inclusivos) que serviram como base para os dados secundários e, finalmente, as entrevistas em profundidade. Parte dos achados corroborou as pesquisas anteriores, mas também contribuiu no sentido de mostrar que não há literatura acadêmica suficiente sobre o assunto; outros ainda são aparentemente inéditos, em especial sobre o entendimento dos negócios inclusivos como i) direito/advocacy e ii) inclusão de si mesma e para além da pobreza atuarem, sobretudo, no combate à exclusão social.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo alcançou o objetivo proposto de compreender, sob o prisma feminista pós-estruturalista, as mulheres que lideram os negócios inclusivos, com base em uma pesquisa qualitativa e exploratória que permitiu uma análise teórica e empírica indicada como relevante por pesquisadores prolíficos (Foss et al., 2019Foss, L., Henry, C., Ahl, H., & Mikalsen, G. H. (2019). Women’s entrepreneurship policy research: a 30-year review of the evidence. Small Business Economics, 53(2), 409-29. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s11187-018-9993-8
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; Henry et al., 2016Henry, C., Foss, L., & Ahl, H. (2016). Gender and entrepreneurship research: A review of methodological approaches. International Small Business Journal, 34(3), 217-41. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0266242614549779
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; Muntean & Ozkazanc-Pan, 2015Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2015). A gender integrative conceptualization of entrepreneurship. New England Journal of Entrepreneurship, 18(1), 27-40. Recuperado de https://doi.org/10.1108/NEJE-18-01-2015-B002
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, 2016). De fato, pesquisas com a abordagem teórica feminista pós-estruturalista no campo do empreendedorismo, em particular no empreendedorismo social num país em desenvolvimento, com uma abordagem baseada nas percepções das mulheres, são indicadas como algo necessário. Nesse sentido, cabe retomar as perguntas deste texto: como se caracterizam as empreendedoras sociais que atuam em negócios inclusivos? De que forma podemos analisar e compreender os negócios inclusivos liderados por mulheres sob a perspectiva feminista pós-estruturalista? De forma complementar e utilizando-se do referencial teórico de pobreza e exclusão social, assim como das percepções das empreendedoras sociais, quais reflexões teóricas e empíricas podemos fazer sobre os negócios inclusivos?

Verificou-se, nesta investigação, que as empreendedoras entrevistadas são essencialmente motivadas pela causa nas quais atuam, com as quais possuem profunda identificação, muito em consequência de suas experiências e trajetórias pessoais. Que elas definem seus objetivos em função das causas que abraçam, sendo esse o principal impulsionador para iniciar um negócio inclusivo. As empreendedoras entrevistadas relatam atenção e respeito à diversidade, ainda que priorizem mulheres no âmbito interno e externo da organização que apresentem essas características como uma espécie de valor, ou seja, apreciem a participação, o diálogo e a escuta ativa e permanente de todos os atores envolvidos no ecossistema do negócio, assim como a adoção do “feminino”, que pode ser, em síntese, a humanização das relações. Sob essa perspectiva, buscam priorizar a atuação com mulheres ou indivíduos sensíveis ao universo feminino.

O envolvimento das empreendedoras de negócios inclusivos entrevistadas em grupos formais e informais de mulheres para o compartilhamento de experiências mostrou-se de grande relevância, especialmente por contribuir com o aprendizado pragmático de liderança e gestão, assim como de luta, empoderamento e de como lidar com as diversas formas de exclusão social que esses ambientes proporcionam.

A despeito da relevância, inovação, criatividade e concretização profissional, da geração de emprego e renda propiciadas pelos negócios inclusivos objetos da pesquisa, foi possível perceber que há problemas e desafios importantes na construção social de gênero, assim como de ordem estrutural, presentes na sociedade brasileira. A criação de um negócio inclusivo para incluir uma mulher transgênero por absoluta falta de alternativas no mercado formal de trabalho e a proposição de uma empresa que tem por objetivo o combate ao assédio sexual nas empresas pode ser compreendido como a ponta do iceberg. Afinal, quantas mulheres transgênero no país encontram-se em absoluta exclusão social? Quantas mulheres não têm sofrido, silenciosamente, com o assédio sexual no trabalho?

De fato, o preconceito de gênero demonstrou barreiras individuais (diversidade de gênero, violência de gênero etc.), institucionais (políticas de recrutamento e seleção que podem marginalizar e excluir certos grupos sociais) e estruturais (ausência de políticas públicas ou mesmo de um processo de criminalização mais efetivo da violência de gênero no ambiente de trabalho) inter-relacionadas com o processo empreendedor que decorrem das normas sociais e culturais de gênero (Muntean & Ozkazanc-Pan, 2015Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2015). A gender integrative conceptualization of entrepreneurship. New England Journal of Entrepreneurship, 18(1), 27-40. Recuperado de https://doi.org/10.1108/NEJE-18-01-2015-B002
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).

Além disso, é preciso questionar ideias e afirmativas no campo do empreendedorismo social, em particular nos negócios inclusivos, como forma de flexibilizar o tempo no sentido de trabalhar em casa, apoiar a família e o cônjuge, sabotando seu talento e potencial, ou seja, sacrificando-se em nome do marido, companheiro(a) e filhos. Além disso, tal forma de atuar pode carregar normas de gênero socialmente construídas, como negócios de baixo risco e crescimento, de menor porte e menos ambiciosos, e, finalmente, depender de homens para superar suas dificuldades (Muntean & Ozkazanc-Pan, 2015Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2015). A gender integrative conceptualization of entrepreneurship. New England Journal of Entrepreneurship, 18(1), 27-40. Recuperado de https://doi.org/10.1108/NEJE-18-01-2015-B002
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).

Por outro lado, Muntean e Ozkazanc-Pan (2015Muntean, S. C., & Ozkazanc-Pan, B. (2015). A gender integrative conceptualization of entrepreneurship. New England Journal of Entrepreneurship, 18(1), 27-40. Recuperado de https://doi.org/10.1108/NEJE-18-01-2015-B002
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) defenderam a criação de incubadoras exclusivas para mulheres, programas de aceleração, workshops educacionais, concursos de plano de negócios, fundos de investidores-anjo e redes voltadas às mulheres seriam alternativas sob a perspectiva feminista. De fato, essas possibilidades podem fazer frente às questões de ordem individual e institucional, mas, talvez, não sob os aspectos estruturais. Nesse sentido, é preciso reconhecer a importância de ações coletivas da sociedade civil, assim como das políticas públicas e dos governos para questões de ordem estrutural, de tal forma a evitar, tanto quanto possível, uma espécie de teto de vidro na atividade empreendedora das mulheres. Portanto, apesar de reconhecer a importância dos negócios inclusivos, é preciso dizer que problemas de ordem estrutural não podem ser resolvidos por ações isoladas, ainda que meritórias.

Pôde-se concluir também, com esta pesquisa, que as empreendedoras estudadas compreendem os negócios inclusivos de forma diversa. Estes abrangeriam empreendimentos já abordados pela literatura acadêmica, como os negócios na base da pirâmide, que incluem esse público como clientes, e aqueles que promovem a inclusão ao longo de sua cadeia de valor. Como contribuição teórica e empírica desta investigação, emergiram dois tipos de negócios inclusivos incipientes na literatura acadêmica. Um deles foi construído por uma mulher transgênero com o objetivo de promover a própria inclusão e de mulheres numa condição semelhante. O outro achado, especialmente importante no contexto brasileiro, foi o negócio inclusivo de combate ao assédio sexual nas empresas, ou seja, em defesa e garantia de direitos das mulheres que têm sido afetadas por essa brutal violência. Em ambos os casos, foi possível perceber que os negócios inclusivos não se limitam à pobreza, mas podem atuar no combate à exclusão social. É preciso destacar que os casos presentes na literatura acadêmica atual tendem a focalizar o problema da pobreza. E que, do ponto de vista teórico, na área da administração, pouco se aproveitam os conhecimentos das áreas sociais, como o serviço social e a psicologia social, que se dedicam a compreender em profundidade o fenômeno da exclusão social. Sob o ponto de vista prático, a pesquisa contribui no sentido de ampliar e aprofundar a compreensão acerca dos negócios inclusivos e suas possibilidades de ação, que não se limitam às pessoas pobres, mas também aos que se encontram excluídos socialmente.

Algumas limitações do estudo devem ser destacadas. Uma delas se refere ao tamanho e à diversidade da amostra. O número limitado de empreendedoras entrevistadas e o perfil socioeconômico (mulheres brancas, de classe média e alta e alta escolaridade) não permitem extrapolar as conclusões para grupos de outros perfis. Nesse mesmo sentido, os negócios inclusivos em que empreenderam as entrevistadas são relativamente recentes e com uma estrutura limitada em relação à quantidade de pessoas.

Embora a amostra corrobore estudos anteriores quanto à alta escolaridade das empreendedoras, não se deve excluir a possibilidade de que uma formação acadêmica superior gere maior propensão a participar de um estudo acadêmico. Estudos que explorem as características das empreendedoras com menor escolaridade podem trazer uma perspectiva nova e valiosa para a compreensão do empreendedorismo social liderado por mulheres, no âmbito dos negócios inclusivos. Assim como, estudos com negócios mais maduros podem contribuir para melhor compreensão dos modelos de negócio e gestão, ao possibilitar entrevistas com colaboradores, fornecedores, parceiros e público beneficiário em geral.

De toda forma, apesar dessas limitações, as reflexões teóricas e empíricas da pesquisa colaboram para um olhar sobre gênero no campo do empreendedorismo social, em particular nos negócios inclusivos. Além disso, ao buscar a distinção entre o fenômeno da pobreza e a exclusão social, procura-se ampliar a noção dos papéis de um negócio inclusivo. E apesar de todo o mérito das empreendedoras e dos negócios inclusivos, reconhece-se que os problemas de construção social de gênero e os desafios de ordem estrutural estão muito além de soluções pontuais e requerem ações articuladas da sociedade civil, do mercado e especialmente dos governos com base em políticas públicas de gênero (Link & Strong, 2016Link, A. N., & Strong, D. R. (2016). Gender and entrepreneurship: an annotated bibliography. Foundations and Trends® in Entrepreneurship, 12(4-5), 287-441. Recuperado de http://dx.doi.org/10.1561/0300000068
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). Algo que, sem dúvida, o Brasil tem um longo e tortuoso caminho a trilhar.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    12 Jan 2022
  • Aceito
    22 Mar 2022
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