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Política, emancipação e humanitarismo: Uma leitura crítica da escola inglesa sobre a questão da intervenção humanitária

Politics, emancipation, and humanitarianism: A critical reading of the english school over the issues of the humanitarian intervention

Resumos

O artigo analisa as possibilidades de realização de intervenções humanitárias a partir da lógica desenvolvida pela Escola Inglesa das Relações Internacionais. Apesar da ênfase dada ao tema de intervenções humanitárias por muitos de seus adeptos atualmente, buscamos evidenciar a necessidade do diálogo da Escola Inglesa com os Estudos da Paz e com outras teorias que trabalham especificamente com intervenções para superar as suas limitações, ontológicas e epistemológicas. Isto acontece principalmente pela impossibilidade do consenso sobre a existência de valores compartilhados pela sociedade internacional, tornando problemática a legitimação destas ações. Sugerimos que tais limitações sejam superadas a partir de um novo entendimento do que seriam "fronteiras". Enxergando as fronteiras como zonas políticas de troca onde a diferença é preservada para garantir a ordem internacional, podemos vê-las como espaço ético de delimitação e proteção da diferença, não apenas de exclusão. Neste sentido, e resgatando o ideal de diversidade e tolerância de Hannah Arendt, partimos em busca da valorização e aceitação da diferença no plano internacional, não nos restringindo às comunidades estatais dos pluralistas, nem à aceitação absoluta de valores universais solidaristas. Com isso, podemos ampliar coerentemente o conceito de intervenção.

Escola Inglesa; Intervenção Humanitária; Fronteiras; Estudos da Paz


This article discusses the possibilities of humanitarian intervention from the theoretical standpoint of the English School. Despite its recently emphasis on humanitarian intervention, the article shows the possibility of establishing a dialogue with Peace Studies and other theoretical approaches that discuss intervention in order to overcome the limitations of the English School - both ontological and epistemological - in this area due to the controversy over the existence or not of shared values by the international society. The article suggests that the limitations presented by the English School should be approached with a new understanding of the concept of "borders". By understanding borders as political zones where difference is preserved to guarantee international order, one may see borders as an ethical space of protection of difference, not only as a space of exclusion. In that fashion, and by using Hannah Arendt's ideals of diversity and tolerance, the article defends the acceptance of difference in international politics and the widening of the concept of intervention in the terms presented leading to a more politically conscious idea of humanitarian intervention.

English School; Humanitarian Intervention; Borders; Peace Studies


Política, emancipação e humanitarismo: Uma leitura crítica da escola inglesa sobre a questão da intervenção humanitária*

Politics, emancipation, and humanitarianism: A critical reading of the english school over the issues of the humanitarian intervention

Marcelo Mello Valença

Doutorando em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e professor de Relações Internacionais da mesma universidade. E-mail: marcelovalenca@me.com

Resumo

O artigo analisa as possibilidades de realização de intervenções humanitárias a partir da lógica desenvolvida pela Escola Inglesa das Relações Internacionais. Apesar da ênfase dada ao tema de intervenções humanitárias por muitos de seus adeptos atualmente, buscamos evidenciar a necessidade do diálogo da Escola Inglesa com os Estudos da Paz e com outras teorias que trabalham especificamente com intervenções para superar as suas limitações, ontológicas e epistemológicas. Isto acontece principalmente pela impossibilidade do consenso sobre a existência de valores compartilhados pela sociedade internacional, tornando problemática a legitimação destas ações. Sugerimos que tais limitações sejam superadas a partir de um novo entendimento do que seriam "fronteiras". Enxergando as fronteiras como zonas políticas de troca onde a diferença é preservada para garantir a ordem internacional, podemos vê-las como espaço ético de delimitação e proteção da diferença, não apenas de exclusão. Neste sentido, e resgatando o ideal de diversidade e tolerância de Hannah Arendt, partimos em busca da valorização e aceitação da diferença no plano internacional, não nos restringindo às comunidades estatais dos pluralistas, nem à aceitação absoluta de valores universais solidaristas. Com isso, podemos ampliar coerentemente o conceito de intervenção.

Palavras-chave: Escola Inglesa - Intervenção Humanitária - Fronteiras - Estudos da Paz

Abstract

This article discusses the possibilities of humanitarian intervention from the theoretical standpoint of the English School. Despite its recently emphasis on humanitarian intervention, the article shows the possibility of establishing a dialogue with Peace Studies and other theoretical approaches that discuss intervention in order to overcome the limitations of the English School - both ontological and epistemological - in this area due to the controversy over the existence or not of shared values by the international society. The article suggests that the limitations presented by the English School should be approached with a new understanding of the concept of "borders". By understanding borders as political zones where difference is preserved to guarantee international order, one may see borders as an ethical space of protection of difference, not only as a space of exclusion. In that fashion, and by using Hannah Arendt's ideals of diversity and tolerance, the article defends the acceptance of difference in international politics and the widening of the concept of intervention in the terms presented leading to a more politically conscious idea of humanitarian intervention.

Keywords: English School - Humanitarian Intervention - Borders - Peace Studies

Introdução

Este trabalho discutirá as possibilidades da realização e da legitimação de intervenções humanitárias a partir da lógica da Escola Inglesa, evidenciando a necessidade de estabelecer um diálogo com os Estudos da Paz e os teóricos que trabalham diretamente com intervenções humanitárias para a superação das limitações daquela abordagem. A Escola Inglesa tem foco voltado para a controvérsia sobre a natureza solidarista ou pluralista da sociedade internacional e, decorrente disso, da tensão entre ordem e justiça. Cada uma dessas posições fornece subsídios para alimentar ou esvaziar a discussão sobre intervenção humanitária com base na defesa da soberania ou da preservação dos direitos humanos dentro dos Estados. No entanto, seja qual for a posição assumida, o tratamento dado à sociedade internacional é contingente e não problematizado pela Escola Inglesa.

Com base nisso, e apesar da preocupação recente com o tema das intervenções humanitárias (WHEELER, 2000; JACKSON, 2000; WELSH, 2004; WEISS, 2007), as possibilidades para a sua legitimação são por demais restritas perante as preocupações ontológicas da teoria, como a existência de uma sociedade internacional estadocêntrica, o pluralismo metodológico e a preservação de instituições internacionais como a soberania e o direito internacional. Tais elementos constrangem o debate sobre intervenção humanitária ao impossibilitar o consenso sobre a existência de valores compartilhados pela sociedade internacional e as formas como aconteceriam a formação e estabilização dessa sociedade, seja pela preservação da ordem, seja da justiça.

Como forma de superar estas limitações e complementar o debate teórico sobre intervenções humanitárias, trazemos os argumentos defendidos por John Williams (2006) e Alex Bellamy (2003, 2004), bem como o arcabouço teórico proporcionado pelos Estudos da Paz. Williams vai fornecer o fundamento teórico crítico para a compreensão das fronteiras - elemento tomado como ontologicamente ligado ao Estado-como um fenômeno concebido a partir de práticas sociais que atribuem caráter ético a elas. Buscaremos evidenciá-las como zonas políticas de troca, onde a diferença é preservada e cuidada de modo a garantir a ordem internacional. Com Bellamy, ampliaremos o conceito de intervenção, permitindo entendê-la de diferentes maneiras e não apenas da forma concebida pela Escola Inglesa. Os Estudos da Paz permitirão o elo com a discussão promovida pelos teóricos que trabalham especificamente com a questão humanitária, mostran-do os objetivos que seriam atingidos ao se ampliar o conceito. Estas abordagens, a nosso ver complementares, permitirão compreender as emergências complexas1 sob a ótica do humanitarismo como um valor que ligaria as comunidades políticas com base no reconhecimento do Outro como humano e, portanto, digno de ser protegido. Este conceito não é problematizado pela Escola Inglesa, mas central na questão das intervenções humanitárias.

As limitações enfrentadas pela Escola Inglesa no tema das intervenções decorrem principalmente de dois aspectos. O primeiro seria os seus próprios pressupostos. Ao se pensar as relações internacionais como fundadas em Estados soberanos, as intervenções assumiriam o formato de ações coercitivas empreendidas por agentes não envolvidos com as causas que motivaram a intervenção para restaurar a ordem dentro de um Estado, evitando a instabilidade da ordem internacional. O dilema em intervir está na legitimação da intervenção, pois a soberania assume papel central, uma consequência ontológica do debate entre pluralistas e solidaristas, que ignoram os propósitos que cercam as intervenções (BELLAMY, 2003, p. 330-331) e se concentram apenas no papel da soberania na manutenção da ordem e no respeito à justiça em detrimento de programas de desenvolvimento em longo prazo (BELLAMY; WILLIAMS, 2004, p. 7).2 A conceituação de emergência complexa seria decorrente do debate entre pluralistas e solidaristas e suas posições sobre o compartilhamento de valores no plano internacional.

A segunda limitação decorreria da proximidade da teoria proposta por esta corrente ao processo decisório político. A Escola Inglesa tem grande participação na delimitação das agendas políticas internacionais em virtude de seu próprio escopo, que permite análises históricas, sociológicas e normativas (BELLAMY, 2005a, p. 7-8). Ademais, o conceito de sociedade internacional, ainda que não haja consenso sobre sua origem, aproxima a Escola Inglesa dos processos decisórios políticos ao proclamar laços de cooperação e respeito entre os Estados (DUNNE, 2005). Essa afinidade contribui para a indefinição dos formatos de resposta às emergências complexas, bem como do conceito de humanitarismo, por colocá-los na esfera do interesse dos Estados, evitando que um padrão coerente de atuação seja estabelecido.

O debate entre solidaristas e pluralistas também afeta o debate sobre intervenção humanitária, moldando a sua teoria e prática. A controvérsia entre estes dois grupos se baseia, essencialmente, em três questões que guiarão este trabalho: (i) até que ponto pode-se considerar a existência da condição de emergência complexa; (ii) havendo esta emergência complexa, qual seria o limite para intervir; e (iii) como os Estados deveriam se comportar durante a intervenção (BELLAMY, 2003, p. 325).

John Williams (2006) aparece como contraponto à Escola Inglesa porque sua argumentação busca um posicionamento verdadeiramente pluralista,3 mas sem compreender como dada a soberania, promovendo a problematização do papel da fronteira na política internacional para além da mera materialidade, permitindo observar a dinâmica política. As fronteiras e a soberania são consideradas por ele como práticas sociais que permitem entender a dinâmica política internacional, fato ignorado pela Escola Inglesa.

Ademais, resgatando as ideias de Hannah Arendt sobre diversidade e tolerância, Williams transcende os limites da Escola Inglesa, rejeitando o solidarismo homogeneizante e o pluralismo determinista característicos desta abordagem. Isso facilita a sua busca pela valorização e aceitação da diferença entre os atores internacionais, não se restringindo às comunidades estatais dos pluralistas, nem tampouco considerando que a tolerância à diferença implicaria a aceitação absoluta de valores universais solidaristas. Com isso, podemos fugir do estadocentrismo característico da Escola Inglesa sem, contudo, desmerecer o papel ético desempenhado pelas fronteiras, avançando para além da Escola Inglesa ao diferenciar os papéis da soberania e das fronteiras e buscando novas formas de socialização no plano internacional (DUNNE, 2005, p. 69). Diante deste posicionamento, a fronteira passa a ser vista como lócus político de troca, servindo como espaço de contato entre as diferenças e não apenas de marginalização (WALKER, 2005). Isso permitiria o fim de sua replicação, passando a ser compreendida como um conjunto de práticas sociais ligadas ao poder e à ética, vitais para a manutenção da sociedade internacional (WILLIAMS, 2006, p. 42). O papel da soberania como norma constitutiva da sociedade internacional não é abandonado, mas as fronteiras passam a ser entendidas de maneira independente deste princípio, demarcando valores distintos e possibilitando que estes estejam sujeitos a mudança.

Tal perspectiva nos permitiria enxergar de maneira otimista as fronteiras como espaço ético de delimitação e proteção da diferença. Projetos totalizantes que pusessem em risco a diversidade e o pluralismo seriam tratados como fatos intoleráveis, caracterizando as emergências complexas. Conseguiríamos assim fortalecer o diálogo entre a Escola Inglesa e o campo da intervenção humanitária.

As dificuldades enfrentadas pela Escola Inglesa em lidar com a questão da intervenção humanitária tornam-se ainda mais sérias diante do conceito restrito que a intervenção assume, pois esta se caracterizaria como atos de natureza coercitiva (PUGH, 1998; BELLAMY, 2003). Logo, a contribuição de Bellamy torna-se importante por nos permitir entender as intervenções humanitárias em sua integralidade, fugindo do estadocentrismo e, consequentemente, do seu caráter militarizado, permitindo que tracemos critérios objetivos para a sua legitimação. Neste ponto, os conceitos de abuso e emancipação trabalhados pelos Estudos da Paz e por teóricos críticos não só ajudariam no estabelecimento destes critérios, mas também permitiriam que entendêssemos o que constitui o intolerável, oferecendo formas de identificá-lo.

Entendemos que o abuso aconteceria quando da invocação de argumentos não amparados por uma preocupação moral, mas por interesses de curto prazo, para justificar ações de caráter supostamente humanitário (BELLAMY, 2004, p. 132; 2006, p. 147). Já a emancipação deve ser entendida como o oferecimento de condições que auxiliem o indivíduo a se libertar das limitações que os impede de atingir seu pleno potencial, em um conceito similar ao de violência estrutural (BELLAMY, 2003).4 Tais conceitos retomariam o diálogo da intervenção humanitária proposto por Williams, especialmente ao re-lacioná-los com a ideia de isolamento e de política como espaço de tolerância e diálogo com a diferença, possibilitando a liberdade de querer e a libertação do medo,5 outros aspectos que se mostram presentes no conceito de emancipação.

Acreditamos que o diálogo entre estas teorias possibilita a compreensão dos dilemas éticos e políticos impostos pelas intervenções humanitárias, oferecendo procedimentos coerentes e pragmáticos para lidar com as emergências complexas. A ação coercitiva não deve ser vista como única solução para a sua resolução: diante do intolerável, as emergências complexas devem ser tratadas a partir de diferentes tipos de ação, de acordo com uma análise pragmática das necessidades que cada situação demandaria. Estas respostas devem envolver não apenas esforços militares, mas também outros tipos de intervenção, não coercitivas, limitando o aparecimento da violência estrutural na sociedade.

Pluralistas versus Solidaristas: A Escola Inglesa e a Intervenção

Nesta seção, abordaremos brevemente a questão entre pluralismo e solidarismo que move os estudos da Escola Inglesa. Esta controvérsia sobre como entender a sociedade internacional, se pluralista ou solidarista (BULL, 2002; ALMEIDA, 2003; WILLIAMS, 2006), acaba por repercutir em outro importante binômio deste marco teóri-co,queéatensãoexistente entreordem ejustiça. Apossibilidade de intervir estaria relacionada ao produto desta discussão, e os pressupostos que cercariam a questão humanitária estariam diretamente ligados à visão que se tem da natureza da sociedade internacional. É a partir deste debate que iniciaremos nosso argumento.

O próprio tratamento dado pela Escola Inglesa às relações entre os Estados pressupõe a existência de vínculos compartilhados pelos Estados e pelos indivíduos que os formam: é a diferença entre o internacional e o mundial de que Bull (2002) trata em sua obra. O primeiro refere-se à relação entre Estados, enquanto o segundo se refere ao relacionamento entre os indivíduos, independentemente do Estado ao qual pertençam, promovendo conflitos entre os direitos e deveres em cada um desses níveis. Como lidar com os desafios impostos por estes relacionamentos, conjugando o respeito aos diferentes níveis com a manutenção da sociedade internacional?

Há duas respostas a esta pergunta. A primeira ressalta o aspecto pluralista da sociedade internacional, em que os Estados são entes soberanos e os seus pares não teriam o direito, nem a legitimidade, de intervir em seus assuntos domésticos. A segunda resposta, propensa ao solidarismo, coloca em evidência os indivíduos. Apesar da existência da autoridade central dentro do Estado, a sociedade internacional deveria agir de forma a aliviar as ameaças que recairiam sobre os indivíduos, mesmo que violando aquela autoridade.

Para os pluralistas, a diversidade no plano internacional é garantida pelos Estados: as fronteiras preservariam a diferença, delimitando territorialmente o lócus de autoridade do ator internacional: "a sociedade internacional possibilita a difusão do poder aos povos por meio da pluralidade de Estados, permitindo a cada nação e a cada Estado desenvolver seu próprio modo de vida" (BELLAMY, 2003, p. 323).Isto faria com que a preservação da ordem na sociedade internacional fosse mais importante que os indivíduos dentro dos Estados, refletindo na importância dos princípios da não-intervenção e da soberania. A alegação da existência de valores universais esbarraria no relativismo cultural, e a ética decorrente deste pretenso universalismo promoveria a desordem internacional: a pluralidade é um fator necessário para o surgimento e a estabilidade da ordem, mas é utilizada de forma instrumental por instituições internacionais como o direito internacional e a diplomacia (O'HAGAN, 2005, p. 215-216).

Para garantir a continuidade dos Estados e o bom funcionamento da ordem internacional, a ordem mundial é submetida àquela: "a soberania estatal e a não-intervenção são normas poderosas que combinam o interesse estatal, princípios morais e leis formais" (BELLAMY, 2003, p. 323). Assim, a intervenção não constituiria um meio legítimo de proteção dos indivíduos: esta é pertinente apenas ao Estado ao qual pertencem, e a interferência externa nos assuntos domésticos é mínima.

Já para os solidaristas, os princípios da não-intervenção e da soberania estariam submetidos aos direitos humanos: haveria um consenso entre os Estados para que os padrões morais de cada um deles convergissem em direção ao respeito aos indivíduos. O desenvolvimento de mecanismos de controle dos Estados e de como tratam seus nacionais seria uma das evidências da proteção universal aos direitos humanos. Uma prova disso é o conjunto de normas que fundamentaria o direito internacional e a legitimação do uso da força quando para garantir o enforcement da lei, ajudando a manter os valores éticos universais: "as autoridades estatais são responsáveis pela garantia da segurança e das vidas de seus cidadãos" (ICISS, 2001, p. 13). Assim, violações maciças de direitos humanos justificariam a ruptura do princípio da não-intervenção. Estas diferenças entre as posições solidarista e pluralista se refletem, também, no debate entre ordem e justiça. A tensão gerada por esse debate molda o entendimento da intervenção humanitária.

Para os pluralistas, sejam eles mais conservadores, como Martin Wight (2002) e Robert Jackson (2000), ou mais tolerantes, como Hedley Bull (2002),7 a ordem internacional predominaria, pois sua estabilidade é condição para a justiça e igualdade entre os Estados, exceto em casos em que o consenso entre as grandes potências determinasse o contrário. Por serem os Estados os principais atores no plano internacional, o respeito à diversidade é estimulado, garantindo a pluralidade cultural: o único valor compartilhado entre os Estados é a manutenção da sociedade internacional. A soberania torna-se o principal atributo dos Estados, impondo o ideal da não-intervenção nas relações internacionais: a solidariedade residual decorrente deste valor mínimo compartilhado teria a função normativa de garantir a coexistência e sobrevivência dos Estados.

Assim, as questões domésticas seriam tratadas pela autoridade soberana por meio de seus próprios critérios de justiça, e o seu respeito garantiria a estabilidade da ordem internacional (KEENE, 2002), consistindo na e abrangendo a relação entre Estados (BULL, 2002, p. 13-26). Com o bom desenvolvimento desta relação, seria possível garantir a manutenção da independência dos Estados, da paz e da própria sociedade internacional. Para Bull (2002, p. 26-29), preservar a ordem internacional garantiria a ordem mundial, resguardando, em último caso, os indivíduos: haveria uma relação direta entre preservar o internacional e garantir o doméstico.

Neste contexto, os ideais de justiça são entendidos como comutativos, justificando os princípios da soberania e da não-intervenção (BULL, 2002, p. 97). Tal ideia de justiça pressupõe a reciprocidade na interação entre atores: ao considerar um Estado como soberano e respeitar sua autoridade, este teria garantido o seu reconhecimento por seus pares, recebendo, assim, o "direito" de sobreviver. A justiça comutativa seria complementada pelo ideal de justiça internacional, ou seja, regras morais que determinam quais são os deveres e direitos de cada cidadão em seus Estados. Estas regulariam o comportamento aceito dentro do Estado de forma a garantir a ordem doméstica, independentemente de como esses valores repercutiriam em outras sociedades. Mesmo diante de violações dos direitos humanos, a intervenção não seria legítima, ainda que possível:

[...] a estabilidade da sociedade internacional, especialmente em relação à unidade das grandes potências, é mais importante […] que os direitos das minorias e a preservação de elementos humanitários na Iugoslávia ou em qualquer outro país [...]. A guerra é uma ameaça aos direitos humanos. A guerra entre as grandes potências é a maior ameaça humanitária de todas (JACKSON, 2000, p. 291).

As grandes potências, com base nos seus interesses vitais e na preservação do equilíbrio de poder, podem escolher entre intervir em outros Estados ou até mesmo não fazê-lo, caso constatem que "a não-in-tervenção pode ser uma política tão positiva quanto a intervenção" (WIGHT, 2002, p. 202). A não-intervenção é, inclusive, preferível por garantir a ordem pelo equilíbrio de poder internacional. A intervenção é percebida como um instrumento coercitivo aplicado por meio da guerra, geralmente contra Estados mais fracos, para garantir a ordem: o uso da força deve-se à importância assumida pelo poder nas relações internacionais (BULL, 2002, p. 236). O humanitarismo não pode ser definido por não haver valores compartilhados universalmente, impedindo a caracterização de eventos como emergências complexas: mesmo que a ordem doméstica esteja comprometida, a intervenção não será realizada, pois a soberania estatal deve prevalecer (JACKSON, 2000, p. 372-373). A ideia de mudança no plano internacional é restrita pela necessidade de manter a ordem.

A postura pluralista, portanto, considera a intervenção como excepcional, voltada exclusivamente para a manutenção da ordem internacional desde que alternativas políticas se mostrem inadequadas para preservar a ordem. A intervenção implica um perigoso precedente, poisnão só violariaasoberaniaeajustiçacomutativa, como também comprometeria a ordem internacional.

Por considerar a ordem mundial como fundamental, apesar da necessidade de garantir a ordem internacional, o pluralismo de Bull pode ser considerado um meio termo entre o pluralismo conservador e os solidaristas. Bull rompe as fronteiras que separam os Estados e aproxima os indivíduos em um cenário onde, desde que haja o consenso entre os grandes poderes como condição para a justiça predominar sobre a ordem, a intervenção pode ser justificável.

Do lado solidarista, há a predominância da justiça sobre a ordem. A justiça, ao invés de ser um mero jogo de troca, consiste em tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente, assumindo um caráter distributivo. A justiça mundial, de caráter humanístico, ganha espaço, fugindo do simplismo da justiça comutativa e permitindo compreender diferentes estágios de desenvolvimento e respeito aos valores internacionais. A intervenção é possível e também necessária para proteger os indivíduos contra arbitrariedades praticadas pelos Estados. A ordem mundial, isto é, a estabilidade na relação entre os indivíduos de diferentes Estados, deve ser considerada como primordial.

Os solidaristas entendem que a sociedade internacional compartilha valores básicos inerentes aos indivíduos e não apenas o direito de sobrevivência dos Estados. Estes, inclusive, devem responder pela proteção aos seus indivíduos: "a soberania dos Estados não pode ser usada como anteparo para violações grosseiras de direitos humanos" (ANNAN, 2001). Graças a isso, as discussões sobre intervenção humanitária privilegiariam o valor humanístico como potencial elemento de mudança na sociedade internacional, que se adequaria ao relacionamento gerado pela ordem mundial:

[s]olidaristas […] defendem que há um consenso na sociedade internacional sobre o que constitui um caso de emergência humanitária suprema e o que é um ato legítimo de intervenção. [...] [C]asos extremos de sofrimento humano constituem uma exceção legítima ao princípio da não-intervenção (BELLAMY, 2003, p. 324-325).

A sociedade internacional é entendida a partir da agência humana e do conceito de soberania responsável: os direitos humanos são uma realidade que os Estados não podem ignorar. A intervenção seria possível quando capaz de eliminar a ameaça e restaurar a proteção aos direitos humanos, seja pelo uso da força ou não (WHEELER, 2000, p. 4-37), promovendo uma exceção legítima ao princípio da não-intervenção (BELLAMY, 2004, p. 138): a ideia de que o direito de sobrevivência mútuo dos Estados seria o único valor compartilhado na sociedade internacional ruiria, uma vez que os Estados não têm agido fundamentados exclusivamente em seus interesses vitais ao aprovar intervenções nas últimas duas décadas baseadas em um ideal de humanitarismo (WHEELER, 2000, p. 297-299). Este seria respaldado pelos valores da sociedade internacional.

Apesar do contraste entre solidaristas e pluralistas em relação à possibilidade de intervir ou não, ambos acabam por reduzir a importância da soberania na delimitação de fronteiras, as quais são consideradas elementos materiais contingentes aos interesses do Estado, seja na manutenção da ordem, seja da paz. Para a Escola Inglesa, o ideal ético na sociedade internacional decorreria da forma como a diversidade é tratada: no caso pluralista, a diversidade seria tolerável até ameaçar a estabilidade da sociedade internacional, enquanto os solidaristas defendem a diferença localizada em um processo de assimilação de valores universais que uniria os povos em torno destes. A ética das fronteiras ignora a possibilidade de pensá-las como elementos para a preservação e a tolerância da diferença na ordem internacional, gerando aspectos normativos que restringem o debate entre ordem e justiça, fazendo com que até aspectos humanistas sejam frus-trados pela homogeneização logocêntrica baseada em doutrinas políticas ou ideológicas8 sobre as razões do Estado para intervir. As possibilidades de ação internacional são mais amplas, porém restritas ao consenso estatal ocidental, representado pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (BELLAMY, 2005b, p. 34).

Diante do exposto, colocamos os desafios apresentados às intervenções humanitárias. Quanto à existência das emergências complexas, vemos que esta somente é possível para os solidaristas, caracterizan-do-se quando os valores da sociedade internacional fossem ameaçados por meio da violação da justiça humana pelos Estados. Mas como identificar quando estas violações levariam a uma emergência complexa de fato?

Não há indicações neste sentido e a prática política mostra que nem toda violação motivou a intervenção. Esta situação nos leva a pensar nos limites e condições para intervir. As intervenções são tratadas como atos coercitivos, envolvendo a presença do Estado e de seu aparato institucional, buscando o respeito aos direitos humanos por meio de ações garantidas pela força e conforme seus interesses vitais, baseados em uma lógica racionalista, por mais que pensemos em valores comuns que mobilizariam os Estados.

É para superar essa limitação que problematizamos o papel das fronteiras (WILLIAMS, 2006). A forma como estas são tratadas pela Escola Inglesa reforça a contingência de seus papéis: elas teriam valor ético apenas porque serviriam para um objetivo maior, isto é, preservar a ordem ou a justiça. O papel da ética é desligado da política, ficando à mercê da soberania, como um subproduto da demarcação de espaços de autoridade exclusiva (WILLIAMS, 2006). No entanto, a partir de um espaço que proporciona o relacionamento político, pode-se trabalhar as fronteiras como práticas sociais dinâmicas que preservam e valorizam a diferença por meio de seu papel ético, disso-ciando-as da soberania e fugindo do estadocentrismo determinista: "aceitar esta imagem de fronteiras territoriais constituindo práticas sociais como sendo produto da agência humana e da escolha é [ignorar] que a partir da agência é que atingimos a ética" (WILLIAMS, 2006, p. 18).

Este respeito à diferença possibilitaria, inclusive, superar as limitações e contradições das posturas solidarista e pluralista perante a questão humanitária: a primeira, ao buscar simultaneamente aceitar a tolerânciaeacivilização na ordem internacional, acaba por gerar contradições internas que levariam à valorização de um desses elementos apenas, promovendo padrões homogeneizantes (KEENE, 2002). Por outro lado, os pluralistas se posicionariam diante da diferença como um ponto que deve ser preservado a qualquer custo, mesmo em detrimento da justiça, obrigando o entendimento da tolerância e da diferença como um novo valor a ser compartilhado. Diante desses elementos, Williams vai propor a tolerância da diferença até os limites do "intolerável", ou seja, quando ocorre o isolamento e a política não é mais possível, mas sem indicar que critérios estipulariam o momento em que essa situação de intolerância se daria. A diferença na ordem internacional seria algo positivo, permitindo o debate sobre os limites das intervenções humanitárias com base no ideal de emergência complexa, oferecendo indicações sobre o que constituiria o intolerável.

A Ética das Fronteiras: Em Busca do Mínimo Valor Ético

Vimos que o debate entre pluralistas e solidaristas na Escola Inglesa subteoriza o papel ético das fronteiras na sociedade internacional, limitando as possibilidades de intervenção humanitária diante da tensão entre ordem e justiça que decorreria da análise não problematizada dos elementos políticos da sociedade internacional. Tanto pluralistas quanto solidaristas oferecem argumentos que embasam sua po-sição, mas nenhum deles questiona o papel das fronteiras: é impensável lançar desafios a elas, já que se chocariam com a concepção de política e de mundo da Escola Inglesa. Para os pluralistas, as fronteiras importam desde que mantenham a ordem internacional; caso este papel possa ser preenchido por outros arranjos institucionais, as fronteiras perderiam importância. No caso dos solidaristas, as fronteiras são encaradas como barreiras para a realização da justiça (WILLIAMS, 2006, p. 21-22). Em suma, o que importaria à Escola Inglesa seriam os limites assumidos pela soberania e que efeitos ela produz nas intervenções (WILLIAMS, 2006, p. 60).

Acreditamos que a intervenção humanitária é mais bem compreendida a partir da leitura crítica das fronteiras, sem que estas sejam vistas apenas como elementos estáticos submetidos à ordem ou à justiça. As fronteiras devem ser encaradas de diferentes maneiras, conforme as práticas sociais que as constituem e reproduzem (WILLIAMS, 2006, p. 28), possibilitando a construção de ideais dinâmicos de tolerância. A intervenção humanitária desafia o consenso sobre como as fronteiras devem ser enxergadas, e a Escola Inglesa falha ao responder a esses desafios por não proporcionar elementos suficientes para a sua compreensão.

Entendemos que, por serem inerentes à própria condição humana, as fronteiras territoriais são essenciais na preservação da diversidade da política internacional e devem ser vistas como necessárias e moralmente defensáveis para a preservação da liberdade e da diferença entre os indivíduos por meio da explicitação de seus mecanismos éticos (WILLIAMS, 2006, p. 38). Ao contrário da Escola Inglesa, que toma a fronteira como um atributo da soberania, entendemos que sua importância está em atuar como prática social que garantiria o pluralismo, não só possibilitando a diferença na comunidade internacional, mas tendo participação fundamental na formação das identidades políticas (WILLIAMS, 2006, p. 99). A interação entre os atores aconteceria a partir da estipulação de um mínimo ético baseado em valores socialmente compartilhados, mas sem restringir esse valor ao direito de sobrevivência. Tampouco esse mínimo ético consiste na aceitação autorreferenciada da diferença defendida pelos solidaristas.

Ao analisarmos o papel que a fronteira assume socialmente, tomamos a agência internacional como humana, rompendo com o paradigma da Escola Inglesa (WILLIAMS, 2006, p. 63). A ética não pode ser dissociada da política, logo as fronteiras não podem ser tomadas como pré-dadas e ligadas à soberania. As formas de ação coletiva que se reproduzem no plano internacional decorrem desta consideração dos indivíduos como principais atores, mas sem desprezar o papel que os Estados possuem na garantia da estabilidade da ordem (DUNNE, 2005, p. 68). Assim, a sociedade internacional seria composta também por atores não estatais, fugindo dos modelos tradicionalmente considerados centrados apenas em Estados.

Ao problematizarmos as fronteiras, percebemos a soberania como resposta que preenche momentaneamente demandas históricas: a sociedade internacional gerou formas diferentes de soberania para lidar com diferentes modelos de ordem internacional (KEENE, 2002).De outro lado, as fronteiras são parte da ontologia das comunidades políticas que as ajuda a determinar sua própria identidade por meio de relações políticas que acontecem no espaço representado pelas fronteiras (WILLIAMS, 2006, p. 17). Estes espaços proporcionam a troca e o diálogo entre diferenças. Assim, o ato de estabelecer fronteiras assume conotação otimista, o que nem sempre é partilhado por outras perspectivas teóricas.

Walker (2005) defende que as fronteiras possuem a função de promover um duplo processo de exclusão que não apenas constituiria a identidade do Outro como oposição ao Eu, mas também produziria e ocultaria os processos de exclusão do que está para além das fronteiras e inclusão do que está dentro delas. Contudo, as práticas sociais que formam as fronteiras permitem que, ao confrontar-se com a diferença, o Eu busque padrões de entendimento por meio dos quais entenderia a relação com o Outro a partir da análise do seu próprio interior, percebendo dentro de si elementos que o aproximariam do Outro. Isto permitiria que o Outro não fosse reduzido a um alguém semelhante ao Eu, nem tampouco fosse inferiorizado. O entendimento holístico da diferença deve ser estimulado para que o diálogo seja estabelecido. Assim, com a cooperação e a sobreposição do Eu e do Outro formando um espaço ético de entendimento, a competição típica da modernidade que impõe o caráter homogeneizante a esta relação é evitada. A separação das diferenças no formato territorial assumido pelo Estado deve ser entendida como parte da ética global de tolerância e não a formação de padrões de exclusão (WILLIAMS, 2006, p. 13-14).

A delimitação de fronteiras como prática social é inerente à manutenção do sistema internacional moderno e, consequentemente, da própria sociedade internacional. As fronteiras não apenas seriam elementos inevitáveis, mas também constituiriam o espaço onde a realização da política é possível, sendo, portanto, sujeitas à mudança e atuando como lócus de constituição da identidade e do sentimento de inclusão em determinada comunidade política, permitindo o diálogo com a diferença por meio da interação social.

Esta interação não implica a homogeneização da cultura, nem a necessidade artificial de criar diferenças. As fronteiras possibilitariam a distinção territorial das comunidades políticas, com o exercício da diferença dentro e entre elas em um processo de aceitação e tolerância que impediria o isolamento dos indivíduos e das comunidades. Uma vez que ocorre o isolamento, a política deixa de existir, com as fronteiras passando a delimitar apenas a separação das comunidades, sem permitir que estas tangenciassem. Com isso, o diálogo entre as diferenças deixa de acontecer, levando a um projeto totalizante que ameaça o pluralismo e a diversidade internacionais.

Tal cenário caracterizaria a ocorrência do intolerável, que exigiria a ação da sociedade internacional para restaurar a ordem internacional. Neste sentido, entendemos que o intolerável para Williams (2006) representa a caracterização da emergência complexa, pois constituiria uma situação em que o espírito de tolerância proporcionado pelas fronteiras seria encerrado, limitando a capacidade dos indivíduos e das comunidades de exercerem sua diversidade, seja por meio da violência direta, seja pela repressão ao seu direito de ter direitos. Segundo o pensamento arendtiano, todos seriam diferentes desde que as condições para a manifestação da diferença sejam possíveis a partir de um espaço político comum de tolerância, que estimule a participação de indivíduos: as comunidades políticas. A pluralidade mos-tra-se necessária como um atributo da comunidade, mas não baseada em padrões excludentes ou marginalizantes: o status de humano não pode ser negado ao Outro (WILLIAMS, 2006, p. 98). Mas uma reflexão deve ser promovida: como e em quais bases pensar essa negação de status de humano?

Williams não consegue responder a essa pergunta. Suas indagações sobre o que consistiria o intolerável não são conclusivas, limitan-do-se a apontar que o intolerável decorre de projetos totalizantes, necessitando apoio em outros campos.

A intervenção humanitária para evitar a violência decorrente desses projetos totalizantes permitiria o pleno exercício no campo político do potencial dos indivíduos, restaurando o cenário de garantia às diversidades humana e política, em um processo de construção da tolerância genuína (WILLIAMS, 2006, p. 96). Por conseguinte, uma vez que a política não se realiza, surge uma disparidade entre o potencial de realização do indivíduo e sua realização de fato. A existência deste gap se caracterizaria como a ocorrência da violência estrutural (OSTERGAARD, 1990), preocupação que os Estudos da Paz tentam evitar. Assim, a partir da interpretação dos objetivos dos Estudos da Paz e da extrapolação do argumento de Williams, podemos entender o intolerável, como o acontecimento de eventos que impedem a emancipação dos indivíduos e provocam o gap entre o real e o potencial. Conforme o que expusemos anteriormente, a ocorrência da violência estrutural representaria este intolerável, construindo o conceito de emergências complexas de modo mais objetivo do que a ideia de "violação dos valores compartilhados pela sociedade internacional".

A intervenção humanitária seria, assim, parte do instrumental político transnacional que garantiria a não-violência como forma de melhoria das condições de vida nas comunidades políticas, possibilitando a diversidade. Isto já diferenciaria as possibilidades de intervenção daquelas legitimadas pelos solidaristas, por separar processos violentos - genocídios, limpezas étnicas e massacres - de uma violência menos evidente, que afetaria o direito dos indivíduos de terem direitos, preparando espaço para a aceitação do conceito de humanitarismo dos teóricos de intervenção humanitária.

Com isso, e a partir da análise do papel ético desempenhado pelas fronteiras, o isolamento representaria o intolerável porque negaria à comunidade política ou a uma parcela dela o direito de emancipação, caracterizando a emergência complexa. Para contorná-la, é necessária a participação da sociedade internacional por meio de uma ideia de intervenção que não se limite ao uso da força, mas que garanta a emancipação e evite o abuso, escapando de limitações estadocêntricas.

Seguimos na tentativa de fortalecer o diálogo entre a Escola Inglesa e o campo da intervenção humanitária. O ideal ético que buscamos não decorre da consideração da soberania como absoluta ou de valores liberais autorreferenciados transpostos do plano doméstico para a sociedade internacional: pensar desta maneira apenas reforçaria o caráter de contingência do debate entre pluralistas e solidaristas e da tensão entre ordem e justiça decorrente deste debate. A ética passa a assumir um valor próprio, deixando de ser vista como o termo fraco em oposição à política. Isto é possível ao percebermos as fronteiras como espaços intermediários que permitem a realização da política: a interação e o diálogo entre diferenças deixam de explicar a fronteira como separação material, tornando-a objeto de reflexão e atribuindo papel ético em um plano do real e não mais no do ideacional. E é neste ponto, de busca dos valores reais e não abstratos, que dialogaremos com o campo das intervenções humanitárias e os Estudos da Paz.

Intervenção Humanitária e Estudos da Paz: Complementações para a Escola Inglesa

A Escola Inglesa privilegia a forma como a intervenção é realizada em detrimento de seu conteúdo: a intervenção consistiria em uma ação promovida por Estados de maneira coercitiva, visando restaurar as condições que retornariam a ordem ou a justiça à sua normalidade, acusando, em maior ou menor escala, o uso da força para a conclusão do empreendimento (BELLAMY, 2003, p. 329). Para superar esse impasse, propusemos entender como as fronteiras desempenham um papel ético e não contingente.

Williams problematiza o entendimento das fronteiras territoriais, en-xergando-as não como elementos dependentes da soberania, mas como práticas sociais dinâmicas capazes de desempenhar o papel ético na relação entre comunidades políticas. As fronteiras permitiriam que a diversidade internacional acontecesse, garantindo a tolerância à diferença como um valor a ser preservado para o bem da ordem internacional, tendo papel fundamental na constituição da identidade das comunidades políticas e garantindo a ação coletivaeaagência humana como determinantes para a concepção do mínimo ético que guiaria as relações internacionais. O espaço constituído pelas fronteiras permitiria o diálogo com a diferença, apontando que esta troca é positiva para o desenvolvimento da sociedade internacional. Isso permitiria a construção de um conceito positivo de ética, pautado na diversidade e na rejeição de projetos totalizantes que impeçam a emancipação dos indivíduos e das comunidades políticas às quais eles pertencem.

Ao se preocupar com a formação de um espaço político em que a diferença pode coexistir e ajudar a alcançar a emancipação, o conceito de intervenção se ampliaria, demandando respostas para problemas que não podem ser solucionados por meio do uso da força: a intervenção deve ser capaz de solucionar também os problemas causados pela violência estrutural, que impedem a realização da total capacidade dos indivíduos. O conceito de emergência complexa mostra-se, por conseguinte, ampliado de modo a abarcar as condições de ameaça - física ou estrutural - que impulsionaria a capacidade humana de agir.

Já os solidaristas afirmam que a violação das condições de justiça humana caracterizaria a emergência complexa, enquanto pluralistas não admitiriam a sua existência. Williams complementa essas respostas apontando que se deve pensar em termos de ameaças à pluralidade política. Estas ameaças aconteceriam por meio de projetos totalizantes que homogeneizariam a diversidade, criando uma cultura compartilhada artificial; logo, a justiça humana pretendida pelos solidaristas seria falsa, quiçá perigosa para a estabilidade internacional. No entanto, mesmo a discussão sobre ética e os limites da tolerância propostos por Williams não conseguem explicar por si só o que exatamente consistiria uma emergência complexa.

De forma a suprimir esse vazio explicativo, buscamos em Alex Bellamy (2003) os argumentos para intervenções mais complexas que garantam a emancipação. Estas intervenções objetivariam não apenas acabar com a violência física praticada, mas também eliminar as condições que geram a violência estrutural. Em consonância com os postulados dos Estudos da Paz, qualquer forma de sofrimento humano constituiria um sinal de que a capacidade humana não é atingida, caracterizando a emergência complexa.10 As intervenções armadas - formato de intervenção vislumbrado pela Escola Inglesa - abordariam apenas a parcela mais visível destas emergências, ignorando outros eventos que prejudicariam a emancipação.

A legitimidade que a Escola Inglesa busca para as intervenções humanitárias é respaldada pelo consenso dos Estados-ou por uma parcela deles, as grandes potências (BULL, 2002), em consenso ou, na pior das hipóteses, sem a oposição de quaisquer delas-com base em preceitos normativos representados pela Carta das Nações Unidas, na figura do Conselho de Segurança. Contudo, ao se pensar a agência humana como fonte para a ética política, como sugerido por Williams e Dunne, a legitimidade da sociedade internacional deixa de ser necessária: a autorização daqueles que sofrem a violência seria suficiente para iniciar a intervenção, visto que é o seu direito de ter direitos que está ameaçado e sua emancipação é tolhida: limitar a legitimação ao nível estatal é dar condições para o agente produtor da violência continuar impedindo a realização da política, prolongando o isolamento. A ameaça seria real, logo ignorar o pleito destes indivíduos constituiria o abuso, alegações falsamente morais para justificar uma tomada de decisão.

Assim, o campo das intervenções humanitárias passaria a ser orientado pelo humanitarismo, baseado no pragmatismo e não mais no compartilhamento de valores abstratos pela sociedade de Estados tal como desejam os solidaristas da Escola Inglesa. O humanitarismo consiste em quatro princípios fundamentais que dialogam com o campo das intervenções humanitárias e dos Estudos da Paz. Estes seriam os da: (i) humanidade, que consiste em prevenir o sofrimento humano onde quer que este se encontre; (ii) imparcialidade, mostrando que não existem condições de poder, nacionalidade, etnia ou religião para que o auxílio seja prestado; (iii) neutralidade, não tomando partido para qualquer um dos lados durante a ação; e (iv) universalidade, que mostra que o humanitarismo é universalmente aplicável e todos os indivíduos têm direito a ele (RAMSBOTHAM; WOODHOUSE apud PUGH, 1998, p. 339-340).

A natureza da sociedade seria pluralista, pela própria impossibilidade de valores universalmente aceitos pelas diferentes comunidades políticas que a compõem (WILLIAMS, 2006). O pluralismo seria possível graças às relações políticas entre os indivíduos no espaço constituído pelas fronteiras estatais, em um processo em que as identidades são construídas e a diferença é aceita, como parte da valorização dos sujeitos, proporcionando a emancipação. A ruptura deste processo constituiria o cerne das emergências complexas, criando critérios para apontar a sua ocorrência e estimulando medidas para reprimir sua repetição diante do ideal do humanitarismo. A Escola Inglesa tem dificuldades em trabalhar com este conceito porque a intervenção seria um evento excepcional na sociedade internacional, dirigido espacial e temporalmente para restaurar a natureza normativa da sociedade internacional (BELLAMY, 2003, p. 338). Todavia, o ideal de intervenção decorrente do diálogo entre os teóricos deste campo e os Estudos da Paz sugeriria uma postura mais intervencionista da comunidade internacional.

Esta impressão decorre da leitura de intervenção com base nos preceitos da Escola Inglesa. Como ressaltamos em diversos momentos, as intervenções assumem diferentes formatos conforme os objetivos que elas buscam atingir. Destarte, a "postura mais intervencionista" deve ser entendida como uma postura mais ativa da sociedade internacional em identificar os riscos de ocorrência do isolamento e da violência estrutural, eliminando-os antes que assumam proporções que ameacem definitivamente a emancipação.

Neste sentido, Bellamy (2003), baseando-se na ideia de que o conhecimento é obtido por meio de representações da realidade, defende a necessidade de a intervenção ser avaliada conforme correspondesse ou não a uma estrutura de "regime da verdade", que delimitaria as fronteiras do conhecimento e dos sistemas de validação e de legitimação. Isto levaria a intervenção a assumir um caráter pragmático, surgindo diferentes critérios de legitimação e de verificação do sucesso de uma ação. Esta abordagem privilegiaria especialmente a problemática das identidades envolvidas no conflito, garantindo a manutenção da diversidade, tal como defende Williams. O questionamento do papel das fronteiras na proteção da diversidade permitiria um novo espaço para a realização da política que possibilitará não apenas atolerânciaeainteração entre comunidades políticas distintas com base em valores humanísticos, mas a própria problematização do humanitarismo e da emergência complexa. O humanitarismo assumiria dimensões verdadeiramente morais, deixando de ser um instrumento de discursos políticos. Cria-se um valor ético que transcende o mero direito de sobrevivência para englobar a compreensão de processos totalizantes que ameaçariam a diversidade política, comprometendo os esforços de emancipação.

A atuação constante da comunidade internacional evidenciaria a realização da política nas áreas de contato entre as comunidades, demonstrando o papel ativo e dinâmico das fronteiras, que não se restringiriam a ser um elemento material de constituição da soberania. Não só o espaço de tolerância estaria configurado, permitindo o diálogo entre o Eu e o Outro nos mesmos termos de humanidade que existiria dentro da própria comunidade, mas também os limites para que esta tolerância aconteça, mobilizando ações que viabilizem a constituição plena do Eu e do Outro.

Considerações Finais

Buscamos expor neste trabalho como as limitações da Escola Inglesa em tratar os elementos que constituem a sociedade internacional impedem uma visão compreensiva das intervenções humanitárias. Por se ater ao debate entre solidaristas e pluralistas, com repercussões na forma como a ordem e a justiça são concebidas, a Escola Inglesa deixa de problematizar o papel dinâmico que as fronteiras desempenham na formação das comunidades políticas, atuando separadamente da soberania. Assim, as possibilidades da intervenção humanitária acabam reduzidas ao entendimento da sociedade internacional de Estados. A fronteira, elemento não problematizado pela Escola Inglesa, assumiria um importante papel ao estabelecer um espaço de diálogo entre as diferentes comunidades políticas existentes no plano internacional por proporcionar elementos dinâmicos de realização da política.

A leitura arendtiana de Williams mostra que as fronteiras funcionam como um espaço intermediário onde a tolerância à diversidade aconteceria, permitindo a compreensão do Outro como ser humano e não como um elemento excluído ou renegado (WALKER, 2005). A diversidade, vista de maneira otimista, promoveria a estabilização da ordem internacional, mas não da maneira artificial que a Escola Inglesa defende: Williams baseia-se na construção de identidades e do sentimento de pertencimento a uma comunidade, criando sujeitos separados pelas fronteiras que interagem, dialogam e mutuamente se constituem, fugindo da lógica excludente pós-moderna e pós-positi-vista.

A negação da diferença levaria à condição de isolamento, evidenciando situações em que a emergência complexa ocorreria, ameaçando a estabilidade da ordem internacional. Fica claro que o pluralismo de Williams, ao contrário daquele da Escola Inglesa, concebe sim a ocorrência de emergências complexas. Isto acontece porque os ideais de emergência complexa e de humanitarismo são controversos na Escola Inglesa, com os pluralistas negando a sua existência e os solidaristas defendendo a sua ocorrência quando da violação maciça de direitos humanos por meio da violência física e política.

Contudo, Williams dá indicações de que o humanitarismo surgiria quando da presença do intolerável, mas sem apontar critérios para defini-lo. Surge daí nossa necessidade de buscar nos Estudos da Paz um suporte para tal definição, de forma a operacionalizá-la, escapando do uso abusivo do termo para justificar posturas políticas autointeressadas. A emergência complexa aconteceria, então, quando houvesse uma situação de isolamento, impedindo que a diversidade fosse mantida. A intervenção internacional seria legitimada para garantir que o espaço de diálogo fosse restabelecido, evitando o abuso que distorcesse os elementos morais e éticos que norteariam as práticas sociais entre as comunidades políticas.

Para tanto, expande-se o conceito de intervenção. Deixando de consistir em ação coercitiva tal como entendida pela Escola Inglesa, a intervenção passa a assumir diferentes formatos, de forma a entender e aliviar o sofrimento humano por meio da eliminação de qualquer forma de violência, direta ou estrutural. Com base nos preceitos do humanitarismo, as intervenções humanitárias se voltariam para a garantia da emancipação, superando o gap entre a capacidade potencial e o que é realmente atingido pelos indivíduos, não mais buscando apenas a restauração da ordem internacional ou evitando a violação de valores compartilhados. A agência humana passa a ter grande relevância, delimitando formas pragmáticas de atuar com base na leitura da realidade e não mais em pressupostos abstratos.

Com isso, retornamos aos questionamentos que guiaram nossa exposição e que foram apresentados na introdução deste trabalho. Diante da pergunta de até que ponto existiria a condição de emergência complexa, nossa explanação indica que esta existiria sempre que a realização da política fosse impedida por meio do isolamento dos indivíduos, impedindo a sua emancipação. Este entendimento extrapolaria os limites da Escola Inglesa ao permitir compreender as emergências complexas para além da violação material e direta dos direitos dos indivíduos, incluindo a violência estrutural, fator menos perceptível e menos abordado pela comunidade internacional. A promoção ativa do desenvolvimento social e econômico passaria a entrar na agenda política, motivando ações mais concretas da comunidade internacional. Os limites para intervir seriam percebidos a partir da análise pragmática da situação considerada como potencial emergência complexa, implicando um tratamento mais "humano" no plano internacional e percebendo na interação entre os indivíduos e suas comunidades políticas as dificuldades enfrentadas pelas partes de forma a evitar o isolamento e, por consequência, os projetos totalizantes que oprimam o indivíduo.

Finalmente, resta falar da forma como os Estados deveriam se comportar durante a intervenção. Acreditamos que a questão deveria ser reformulada para indagar como os Estados deveriam se comportar diante da possibilidade de intervenção. A intervenção deve deixar de ser vista como algo excepcional e coercitivo, pois, ao contrário, ela implica a participação ativa da comunidade internacional no diálogo entre seus diversos componentes, permitindo a dinâmica na política e, com isso, o tratamento do Outro com humanidade. A diferença não pode servir como pretexto de exclusão, mas como forma de se perceber a própria identidade e, por meio do reconhecimento do Outro como possuindo status de humano, buscar a redenção do Eu, prolongando o entendimento entre as diferentes comunidades e eliminando o risco de isolamento, de forma a proporcionar a estabilidade e o bom funcionamento da ordem internacional.

Notas

1. Optamos por utilizar a expressão emergência complexa como sinônimo para as expressões "emergência humanitária suprema" (WHEELER, 2000, p. 34) e "extrema emergência" (WALZER, 2003, p. 426). Por emergência complexa, entendemos as situações sociopolíticas decorrentes da violência cometida contra indivíduos ou grupos (EVANS; NEWNHAM, 1998, p. 88), afetando o sentimento humanitário e fundamentando a postura intervencionista.

2. Bellamy (2003) critica Robert Jackson por diferenciar intervenção de persuasão. A primeira afetaria a soberania dos Estados, enquanto a última se dirigiria à sua autonomia. Segundo Jackson (2000), como nenhum Estado possui completa autonomia, seu comportamento poderia ser afetado voluntariamente por meio de vias diplomáticas ou econômicas, mas a intervenção não seria possível por violar sua soberania. A argumentação de Jackson poderia servir para ocultar o abuso, ao dissociar política, economia e sociedade.

3. Ressaltamos que a posição "verdadeiramente pluralista" de Williams em comparação aos autores da Escola Inglesa é mencionada pelo próprio. Segundo ele, para os pluralistas da Escola Inglesa, não apenas o direito de coexistência na sociedade internacional é visto como o único valor compartilhado, mas também a necessidade da diferença como forma de os Estados se autodefinirem se torna um valor comum aos atores internacionais (WILLIAMS, 2006, p. 77). Assim, o autor trata a Escola Inglesa como se solidarista fosse, de modo a justificar estes valores compartilhados "implicitamente".

4. Nas palavras de Ken Booth (2001, p. 539), o conceito de emancipação estaria ligado a posturas que possibilitassem libertar as pessoas "dos constrangimentos que as impedem de escolher livremente o que fazer, dos quais guerra, pobreza, opressão e má-educação são alguns". Esta conceituação, identificada mais frequentemente com o conceito de segurança humana, também nos ajuda a fugir da análise de referencial no Estado e passar a focar mais nos indivíduos.

5. No original em inglês, "freedom from want and freedom from fear" (FIERKE, 2007, p. 145).

6. Todas as citações em inglês foram traduzidas pelo autor deste trabalho.

7. O legado de Hedley Bull é marcado por dois momentos distintos. Em Asociedade anárquica, Bull apresenta-se como um pluralista, defendendo a diversidade da sociedade internacional. Posteriormente, em trabalhos como Justice in International Relations, Bull mostrar-se-ia partidário do solidarismo. Em ambos os momentos, contudo, Bull reconhece que solidarismo e pluralismo estão presentes a todo instante na política mundial, em diferentes escalas, mas mantendo o predomínio do pluralismo (ALMEIDA, 2003, p. 149), caracterizando a abordagem racionalista.

8. Entre os autores que seriam representativos desta postura, Wheeler (2000), um dos expoentes da ala solidarista da Escola Inglesa, trabalha seu argumento relacionando as condições da intervenção com as possibilidades oferecidas pela guerra justa.

9. Keene trabalha com a limitação do conceito de sociedade internacional ao questionar a sua equivalência ao conjunto de valores compartilhado pelos Estados europeus em um processo artificial de tolerância. Ao mesmo tempo em que se buscaria uma ordem internacional única, rompia-se com a diferença a partir da relação entre civilização e barbárie. Esta seria domada a partir do uso da força, método encontrado para lidar com a diferença não tolerada. Este posicionamento acaba por ignorar ordens internacionais formadas às margens da Europa, por não partilharem do sentimento de civilização que os Estados europeus buscavam àquele tempo.

10. Raimo Väyrynen (1999) apresenta uma tipologia para evidenciar as diferentes formas de emergências complexas que ocorreram durante a década de 1990, ajudando o nosso argumento a ampliar esta concepção para além da questão da violência direta de caráter político. Em suas palavras, "a guerra é operacionalizada pelo número de baixas, a saúde pela mortalidade infantil e abaixo dos cinco anos de idade, a fome pelo percentual de crianças subnutridas abaixo dos cinco anos, e o deslocamento pelo número total de refugiados e deslocados internos" (VÄYRYNEN, 1999, p. 191, grifo no original).

*Artigo recebido em novembro de 2008 e aprovado para publicação em março de 2009.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Maio 2010
    • Data do Fascículo
      Ago 2009

    Histórico

    • Aceito
      Mar 2009
    • Recebido
      Nov 2008
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