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EDITORIAL

Francisco Viacava; Iúri da Costa Leite; Cláudia Travassos

Editores convidados

É muito comum, no Brasil, especialmente nos debates na área de informação em saúde, o comentário de que, apesar da enorme quantidade de dados disponíveis, poucos estudos os analisam, o que significa que há uma baixa contribuição desses dados para apoiar os processos de formulação e avaliação de políticas.

Além das estatísticas vitais que fazem parte do Registro Civil do IBGE, as informações de saúde só passaram a ser sistematizadas, em nível nacional, a partir de meados da década de 1970, quando o Ministério da Saúde iniciou a implantação do Sistema de Informações de Saúde, em que os dados de mortalidade passaram a constituir o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM). O acesso aos dados era muito difícil e praticamente restrito aos dados tabulados pelo Ministério da Saúde e pelo extinto Inamps, que por essa época começava a divulgar, periodicamente, tabulações dos dados sobre internações hospitalares.

Durante as décadas de 1970 e 1980, o acesso aos dados primários era feito pela cessão de fitas magnéticas que só podiam ser lidas em equipamentos de grande porte existentes em alguns centros de processamento de dados e no Laboratório de Computação Científica do CNPq. O mesmo se passava no IBGE quando se necessitava de dados do Registro Civil, dos Censos Demográficos, da Pesquisa Assistência Médica Sanitária (AMS) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).

Nos anos 90, com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), e com a mudança de plataforma de informática das instituições produtoras e disseminadoras de dados, houve uma verdadeira explosão de disseminação de informações por intermédio do Departamento de Informática do SUS (Datasus) e posteriormente do IBGE.

Essas mudanças, no entanto, não foram acompanhadas de investimento na geração de informações de base populacional, que ficou a cargo de organismos internacionais como o Population Council e o Banco Mundial, que financiaram as Pesquisas de Demografia e Saúde (DHS) e a Pesquisa sobre Padrão de Vida (PPV).

Desde a implantação do SUS, no início da década de 1990, não haviam sido conduzidas pesquisas dirigidas para seu monitoramento, e os últimos dados de abrangência nacional vinham do suplemento PNAD de 1981 e de 1986 e da Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição (PNSN) de 1989.

Com a vigência do programa Reforsus, no âmbito do Ministério da Saúde, foram promovidos os entendimentos necessários entre o IBGE e o Ministério da Saúde para a realização de um suplemento Saúde da PNAD, que foi a campo em 1998.

Esse suplemento resgata, em parte, a carência de informações sobre saúde e serviços de saúde de base populacional, com abrangência nacional, ao longo dos anos 90, período de intensas modificações na política de saúde que promoveram a consolidação do Sistema Único de Saúde. O questionário do suplemento foi desenhado por uma comissão constituída por representantes do Ministério da Saúde/Fiocruz, IBGE, Abrasco e da Abepe e teve como objetivos a produção de uma base de dados populacional com informações sobre acesso e consumo de serviços de saúde, discriminadas pela fonte de financiamento do cuidado. Essa pesquisa permitiu medir, pela primeira vez no país, a cobertura dos planos privados e públicos de saúde, assim como identificar quais grupos populacionais utilizam o SUS segundo diferentes modalidades de cuidado de saúde. Ao mesmo tempo, coletaram-se dados sobre o gasto direto das famílias com saúde, o que só era conhecido por meio das Pesquisas de Orçamento Familiar, limitadas aos municípios das capitais, e da PPV (1996/1997), que também coletou dados desse tipo mas em uma amostra restrita às regiões Nordeste e Sudeste.

Os dados primários (microdados) da PNAD/98 tornaram-se disponíveis para análise a partir de agosto de 2000. Com isso, a área de saúde coletiva encontra-se com uma fonte rica de informações para avaliação do acesso e da utilização de serviços de saúde em nível nacional e estadual.

Foi com esse objetivo que propusemos à Abrasco a edição deste número da revista Ciência & Saúde Coletiva, que a nosso ver representa uma importante contribuição para promover a análise, a divulgação e a apropriação do conhecimento gerado pela área de saúde coletiva e ao mesmo tempo um incentivo ao desenvolvimento pelos pesquisadores da análise de dados provenientes de amostras complexas.

Do resultado dessas análises teremos certamente novas indagações e propostas de reformulação, limites, alcances e aperfeiçoamento de pesquisas de base populacional. A realização de futuras pesquisas coloca-se como um imperativo para o monitoramento das políticas de saúde. Neste contexto, o país precisa debater com urgência a realização de um novo inquérito nacional de saúde. E, no debate, alguns pontos críticos merecem destaque. Entre eles salientamos a discussão sobre a realização de um novo Suplemento Saúde na PNAD, e mais do que isso, a movimentação dos gestores e pesquisadores em direção a um inquérito nacional específico sobre saúde e serviços de saúde, o estabelecimento de um cronograma para coleta de dados de âmbito nacional e a incorporação do âmbito municipal no desenho amostral dos inquéritos.

Francisco Viacava; Iúri da Costa Leite; Cláudia Travassos

Guest editors

In Brazil, especially in debates in the health information field, one frequently hears that in spite of the huge amount of available data, few studies analyze such information. As a result, the data contribute little to the formulation or evaluation of policies.

Beyond the vital statistics that are part of the Civil Registry under the IBGE (the Brazilian Institute for Geography and Statistics, or National Census Bureau), health information only began to be systematically recorded at the national level in the mid-1970s, when the Ministry of Health launched the implementation of the Health Information System, in which mortality data constituted the Mortality Information System (SIM). Access was difficult and practically restricted to the data tabulated by the Ministry of Health and the now-defunct INAMPS (National Institute for Medical Care and Social Security), which began periodically publishing tabulations of hospital admissions data.

During the 70s and 80s, access to primary data was obtained by the provision of magnetic tapes which could only be read on huge equipment existing in a limited number of data processing centers and in the Scientific Information Technology Laboratory of the CNPq (National Research Council). The same was true at the IBGE whenever data were needed from the Civil Registry, Demographic Censuses, Health and Medical Care Survey (AMS), or the National Sample Household Survey (PNAD).

During the 90s, with the implementation of the National Unified Health System (SUS) and the change in the information technology platform at institutions that produced and disseminated data, there was a veritable explosion in data dissemination through the SUS IT Department (DATASUS) and subsequently at IBGE.

However, these changes were not accompanied by investment in generating population-based information, which was left up to international agencies like the Population Council and the World Bank, who funded the Demographic and Health Survey (DHS) and the Living Standards Measurement Survey (LSMS).

Since the implementation of the SUS in the early 1990s, no studies had been conducted to monitor the System, and the most recent nationwide data were from the supplementary editions to the 1981 and 1986 PNAD and the National Survey on Health and Nutrition (PNSN) in 1989.

When the Ministry of Health implemented the REFORSUS program, the Ministry held the necessary agreements with IBGE to conduct a health supplement for the PNAD, whose field work was launched in 1998.

This supplement partially covers the nationwide population-based information gap on health and health services over the course of the 1990s, during which time profound health policy changes were introduced which helped consolidate the National Unified Health System. The supplement's questionnaire was designed by a commission consisting of representatives from the Ministry of Health, Oswaldo Cruz Foundation (FIOCRUZ), IBGE, Brazilian Association for Graduate Studies in Collective Health (ABRASCO), and ABEPE, with the objectives of producing a population database with information on access to and use of health services, broken down by source of funding for health care. For the first time in Brazil, this study allowed for the measurement of coverage by private care plans and public services, in addition to identifying which population groups use the SUS according to different health care modalities. Meanwhile, data were collective on families out-of-pocket health expenditures, information that had only been available through Family Budget Surveys, limited to the State capitals, and the LSMS (1996/97), which also collected such data but in a sample limited to the Northeast and Southeast Regions of the country.

The primary data (microdata) from the 1998 National Sample Household Survey (PNAD/98) were made available for analysis beginning in August 2000. The field of collective health thereby found a rich source of data for evaluating access to and utilization of health services at the national and State level.

This was our objective in proposing this special edition of Ciência & Saúde Coletiva to ABRASCO, which in our view represents an important contribution to the analysis, dissemination, and utilization of knowledge generated by the field of collective health, while spawning the evaluation of data from complex samples by researchers.

Based on the results of these analyses, there are certainly to be new queries and new proposals for the reformulation, limits, reach, and improvement of population-based studies. Future studies must deal with the imperative of monitoring health policies. In this context, Brazil needs to debate the urgent need to hold a new national health survey. Some points are critical in this debate, including a discussion on producing a new Health Supplement in the PNAD, and the mobilization of health system managers and researchers towards a specific national survey on health and health services, the definition of a timetable for collecting nationwide data, and the incorporation of the municipal sphere into the sampling design of surveys.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jul 2007
  • Data do Fascículo
    2002
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