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Intelectuais Gramscianos, Tradução e Política em “Pasado y Presente” e “Presença”* * Agradeço a leitura e comentários de Alvaro Bianchi, Daniela Mussi, Igor Marquesine, Natalia Hirose e Nicole Herscovici. Este artigo é fruto de pesquisa de doutorado financiada pela Fapesp, Processo: 2016/09904-8.

Gramscian Intellectuals, Translation and Politics in “Pasado y Presente” and “Presença”

Les Intellectuels Gramsciens, la Traduction et la Politique dans «Pasado y Presente» et «Presença»

Intelectuales Gramscianos, Traducción y Política en “Pasado y Presente” y “Presença”

Resumo

Reunindo intelectuais gramscianos oriundos dos partidos comunistas, as revistas Pasado y Presente (1963-1965/1973) e Presença (1983-1992) buscaram oferecer um espaço de elaboração crítica dos dilemas postos pelos contextos de crise nos quais se localizavam, de modo autônomo às direções partidárias. A despeito do hiato de duas décadas que as separam, ambas possuem como traço comum o fato de repensarem a história de seus países a partir de analogias histórico-culturais promovidas por categorias gramscianas e por mobilizarem estas mesmas categorias modificando o seu sentido original. Tendo como fontes empíricas os textos de seus principais articulistas, José Aricó e Luiz Werneck Vianna, este artigo tem como objetivo avaliar o alcance de seus resultados face o desafio compartilhado de renovação teórico-política. A intenção é contribuir para a reflexão a respeito das condições de produção teórica em contextos nacionais periféricos a partir da tradução de conceitos de Gramsci.

Gramsci; intelectuais; política e cultura; Argentina; Brasil

Abstract

Gathering Gramscian intellectuals from the communist parties, the journals Pasado y Presente (1963-1965/1973) and Presença (1983-1992) sought to offer a space for critical elaboration of the dilemmas posed by the crisis contexts in which they were located, autonomously from party leaders. Despite the hiatus of two decades that separate them, both share the fact of rethinking the history of their countries based on historical-cultural analogies promoted by Gramscian categories and by mobilizing these same categories, modifying their original meaning. Using as empirical sources the texts of its main writers, José Aricó and Luiz Werneck Vianna, this article aims to assess the reach of its results in the face of the shared challenge of theoretical-political renewal. The intention is to contribute to the reflection about the conditions of theoretical production in peripheral national contexts, based on the translations of Gramsci’s work.

Gramsci; intellectuals; politics and culture; Argentina; Brazil

Résumé

Réunissant des intellectuels gramsciens issus des partis communistes, les revues «Pasado y Presente» (1963-1965/1973) et «Presença» (1983-1992) ont cherché à offrir un espace de élaboration critique sur les dilemmes posés par les contextes de crise dans lesquels elles s’inscrivent, de manière autonome par rapport aux directions des partis. Malgré l’écart de deux décennies qui les sépare, elles ont en commun de repenser l’histoire de leurs pays respectifs à partir d’analogies historique-culturelles promues par les catégories gramsciennes et de mobiliser ces mêmes catégories en modifiant le sens original. À partir des textes de leurs principaux contributeurs, José Aricó et Luiz Werneck Vianna, cet article vise à évaluer la portée de leurs résultats face au défi partagé du renouvellement théorique-politique. L’intention est de contribuer à la réflexion sur les conditions de production théorique dans des contextes nationaux périphériques à travers la traduction des concepts de Gramsci.

Gramsci; intellectuels; politique et culture; Argentine; Brésil

Resumen

Reuniendo intelectuales gramscianos oriundos de los partidos comunistas, las revistas Pasado y Presente (1963-1965/1973) y Presença (1983-1992) buscaron ofrecer un espacio de elaboración crítica de los dilemas presentados por los contextos de crisis en los cuales se localizaban, de modo autónomo, a las direcciones partidarias. A pesar de las dos décadas que las separan, ambas poseen como elemento común el hecho de que repensaron la historia de sus países a partir de analogías histórico-culturales promovidas por categorías gramscianas y por movilizar estas mismas categorías modificando su sentido original. Teniendo como fuentes empíricas los textos de sus principales articulistas, José Aricó y Luiz Werneck Vianna, este artículo tiene como objetivo evaluar el alcance de sus resultados de cara al desafío compartido de renovación teórico-política. La intención es contribuir a la reflexión respecto de las condiciones de producción teórica en contextos nacionales periféricos a partir de traducción de conceptos de Gramsci.

Gramsci; intelectuales; política y cultura; Argentina; Brasil

Introdução

As revistas Pasado y Presente e Presença reuniram intelectuais que estiveram envolvidos com a tradução da obra e das ideias de Antonio Gramsci na Argentina e no Brasil. Provenientes dos partidos comunistas, os argentinos e brasileiros buscaram oferecer em sua atividade editorial um espaço de elaboração dos dilemas colocados pelos distintos contextos de desdemocratização ou democratização nos quais se localizavam, de modo autônomo a direções partidárias. No caso argentino, o contexto era o dos anos 1960 e 1970. A primeira etapa de Pasado y Presente se deu em Córdoba e a publicação dos oito números, lançados entre 1963 e 1965, foi atravessada pelo golpe de 1966. Já a segunda etapa compreendeu três números publicados em Buenos Aires no ano de 1973, em meio a dois processos eleitorais que culminariam no curto governo de Juan Domingo Perón. Poucos anos depois haveria ainda o golpe de 1976, o que levaria muitos de seus editores ao exílio. Já no Brasil, a revista Presença surgiu em 1983 e os dezenove números publicados até 1992 acompanharam o processo de transição democrática que colocaria fim às duas décadas de ditadura militar no país.

A despeito dos diversos contextos nacionais e do hiato de duas décadas que as separa, argumenta-se que ambas iniciativas sejam comparáveis por repensarem a história de seus países a partir de analogias histórico-culturais promovidas por categorias gramscianas, primeiramente pensadas para o caso italiano, e por mobilizarem estas mesmas categorias modificando o seu sentido original ou ampliando-o de modo a produzir novas interpretações. Dentre as abordagens metodológicas que têm ganhado espaço na história intelectual para compreender a translação de ideias sociais e políticas para além das fronteiras nacionais e temporais, privilegia-se neste artigo a metáfora da tradução1 1 . Outras metáforas foram propostas, como a das “viagens”, em Edward Said (1983), e das “importações”, em Bourdieu (2002). , que tem encontrado bons alicerces no campo (Pocock, 2009Pocock, John Greville Agard. (2009 [1987]), “Texts as Events: Reflections on the History of Political Thought”, in J. G. A. Pocock, Political Thought and History: Essays in Theory and Method. Cambridge, Cambridge University, pp. 106-119. [1962]; Koselleck, 1996Koselleck, Reinhart. (1996), “A Response to Comments on the Geschichtliche Grundbegriffe”, in H. Lehmann e M. Richter (orgs.), The Meaning of Historical Terms and Concepts: New Studies on Begriffsgeschichte. Washington D.C., German Historical Institute, pp. 59-70.; Palonen, 2003Palonen, Kari. (2003), “Translation, Politics and Conceptual Change”. Redescriptions: Political Thought, Conceptual History and Feminist Theory, v. 7, n. 1, pp. 15-35.; Richter, 2005Richter, Melvin. (2005), “More Than a Two-Way Traffic: Analyzing, Translating, and Comparing Political Concepts from Other Cultures”. Contributions to the History of Concepts, v. 1, n. 1, pp. 7-20.).

Mais do que dimensionar o processo de difusão e troca de ideias que tem informado as pesquisas de cunho sociológico centradas na “circulação” ou “recepção” de ideias, procura-se ressaltar através da tradução o processo através do qual se originam novas matrizes de ação e de pensamento no processo de negociação entre contextos linguísticos e temporais distintos. Embora essa seja uma dinâmica presente no próprio “centro”2 2 . Em estudo sobre Maquiavel, Pocock (2003 [1975]) mostrou, por exemplo, como a linguagem retórica e humanista, cuja noção fundamental era a da virtù, pôde ser traduzida pelos jesuítas na linguagem escolástica e jurídica, cuja noção principal era a de direito. , entende-se que a metáfora se mostre especialmente interessante para refletir sobre a vida intelectual dos países de passado colonial, sempre cercada pelas ideias provenientes do centro a reproduzir hierarquias e subjugar ideias e saberes a sistemas conceituais dominantes. Nas palavras de Paulo Arantes (1992Arantes, Paulo. (1992), Sentimento da Dialética. Rio de Janeiro, Paz e Terra.:14-15), um traço da vida intelectual em nações periféricas seria mesmo a sensação de dualidade, derivada da “divisão íntima” que oporia continuamente “sentimento nacional” à “imaginação europeia”.

Nesse sentido, mais do que abordar como mais um capítulo do velho mal-estar posto pelo “descompasso” entre ideias centrais e ambiente social periférico3 3 . Cf. Schwarz (1987). , propõe-se que a tradução de Gramsci na América Latina tenha sido um dos mais profícuos caminhos adotados por intelectuais engajados do continente para superar o problema, aproximando-os da própria realidade – a qual não se buscava apenas compreender, mas transformar – através das analogias que a situação italiana despertava. Proveniente dessa outra periferia, as indagações de Gramsci não conseguiriam, no entanto, especificar “as condições latino-americanas, vale dizer, o estatuto de ex-colônias” (Oliveira, 2013Oliveira, Francisco. ([1972]/[2003] 2013), Crítica à Razão Dualista / O Ornitorrinco. São Paulo, Boitempo.[2003]:126). Para isso, seria necessário, conforme sugeriu Roberto Schwarz (1999Schwarz, Roberto. (1999 [1995]), “Um Seminário de Marx”. Sequências Brasileiras: Ensaios. São Paulo, Companhia das Letras. [1995]), crítica e invenção categorial – de modo a expressar a realidade concreta a qual o conceito se incorpora, “traindo” ou ampliando o sentido original.

Pensar o uso das ideias de Gramsci na Argentina e no Brasil através da metáfora da tradução tem a intenção, portanto, de enfatizar tanto o expediente de similaridade ou analogia imposto pela inserção dos países latino-americanos ao capitalismo mundial desde a colonização; bem como a necessidade de produzir novas categorias, de modo a dar conta das novidades históricas do meio. No caso, a Argentina das décadas de 1960 e 1970 e o Brasil dos anos 1980, às voltas com rupturas autoritárias e o desafio da renovação teórico-política posto por “novas esquerdas”, socialistas e/ou democráticas.

Portanto, o objetivo deste artigo é demonstrar, a partir dos específicos ambientes culturais e políticos depreendidos dos próprios textos, a forma através da qual ambos os grupos de intelectuais traduziram suas realidades nacionais em permanente tensão com as categorias gramscianas e, por fim, propor uma comparação entre os seus resultados teóricos. Para isso, foram acompanhadas nas páginas de Pasado y Presente, especialmente nas incursões de José Aricó4 4 . Aricó contribuiu em maior número, com seis artigos à Pasado y Presente, além de grande parte das traduções da língua italiana, seguido de Portantiero, Schmucler e Oscar del Barco, com quatro artigos cada. , as formas pelas quais se buscou traduzir a realidade argentina em linguagem teórica, ressaltando as analogias providas por categorias gramscianas – notadamente no que diz respeito ao peronismo entendido enquanto fenômeno “nacional-popular”. Em seguida, se concentrará sobre as intervenções de Presença, particularmente nos textos de Luiz Werneck Vianna5 5 . Werneck Vianna foi o intelectual que mais contribuiu à Presença, com dezoito artigos, seguido de Leandro Konder, Maria Alice Rezende de Carvalho, Luiz Sérgio Henriques e Maria Lúcia Werneck Vianna, os quais publicaram ao menos seis artigos na revista. , com o olhar voltado às teses sobre a transição para a democracia, o papel dos partidos e o descompasso entre estrutura e superestrutura centradas na categoria de “revolução passiva”.

Entendemos que as incursões de Aricó e Vianna são as que melhor elucidam a hipótese da tradução aqui defendida. Conhecedores do pensamento gramsciano, ambos os intelectuais partiram de hipóteses inspiradas por categorias do marxista sardo e foram além, criando visões próprias dos processos históricos analisados, comprometidos com o desafio de interpretar os fenômenos nacionais em suas peculiaridades. Articulistas constantes das revistas, sustenta-se ainda que foram, grosso modo, os grandes polemistas e teóricos cujas ideias repercutiram e pautaram os debates sobre a política nas páginas das revistas. Propõe-se, assim, que as sequências de raciocínios de ambos os autores registrem as tentativas de tradução, e que a comparação entre elas permite avaliar o alcance das interpretações das crises políticas pelas quais passavam a Argentina dos anos 1960 e 1970 e o Brasil dos anos 1980.

A escolha das revistas tem a intenção de acompanhar o processo de elaboração das hipóteses, os modos concretos de intervenção na conjuntura e seus desenvolvimentos teóricos e políticos sucessivos. Além disso, busca explorar as vias abertas para contraposição de ideias e realização de críticas segundo um ponto de vista próprio. Isso porque, tanto no caso argentino, quanto no brasileiro, a introdução do pensamento de Gramsci se deu primeiramente no interior dos Partidos Comunistas, onde os intelectuais envolvidos iniciaram sua formação político-intelectual. Nesse sentido, o projeto editorial levado a cabo por ambas as iniciativas buscava uma relativa autonomia em relação às direções e estruturas partidárias.

A perspectiva do artigo não é novidade em meio aos estudiosos do marxismo latino-americano, atribuindo à metáfora da tradução um caráter conceitual. Em particular, no caso dos argentinos, a hipótese foi lançada por aqueles que seriam os próprios tradutores – José Aricó (1980, 2005) e Juan Carlos Portantiero (1985) – e, mais recentemente, levada adiante por Martin Cortés (2010Cortés, Martín. (2010), “La Traducción como Búsqueda de un Marxismo Latinoamericano: La Trayectoria Intelectual de José Aricó”. Contra Corriente, v. 7, n. 3, pp. 145-167., 2015Cortés, Martín. (2015), Un Nuevo Marxismo para América Latina: José Aricó: Traductor, Editor, Intelectual. Buenos Aires, Siglo XXI.). A comparação com os brasileiros pretende se inserir nesta ampla agenda de pesquisa iniciada por Aricó. Entende-se, no entanto, que a sua hipótese – de que a “adoção” de Gramsci pelo pensamento latino-americano tenha sido vinculada ao fato das peculiaridades nacionais dos países da região encontrarem em suas sugestões teóricas, em seus conceitos fundamentais e em seu método de indagação, a possibilidade de serem universalizadas em um critério de interpretação mais geral (Aricó, 2014 [2005]:139) – possa ser melhor compreendida segundo os parâmetros da tradutibilidade propostos: 1) aproximação de culturas através da analogia histórica e 2) invenção categorial.

Em meio à bibliografia produzida sobre intelectuais comunistas e brasileiros, vale destacar que há uma literatura já consolidada sobre a revista Pasado y Presente, em especial sobre José Aricó como tradutor dos conceitos de Gramsci e sua polêmica com Hector Agosti (Burgos, 2004Burgos, Raul. (2004), Los Gramscianos Argentinos: Cultura y Política en la Experiencia de Pasado y Presente. Buenos Aires, Siglo XXI.; Cortés, 2010Cortés, Martín. (2010), “La Traducción como Búsqueda de un Marxismo Latinoamericano: La Trayectoria Intelectual de José Aricó”. Contra Corriente, v. 7, n. 3, pp. 145-167., 2014Cortés, Martín. (2014), “Marx Siempre Contemporáneo. Las Operaciones de Lectura de Pasado y Presente”. Prismas, n. 18, v. 11, pp. 189-192., 2015Cortés, Martín. (2015), Un Nuevo Marxismo para América Latina: José Aricó: Traductor, Editor, Intelectual. Buenos Aires, Siglo XXI.; Massholder, 2014Massholder, A. (2014), El Partido Comunista y Sus Intelectuales: Pensamiento y Acción de Héctor P. Agosti. Buenos Aires, Luxemburg.; Petra, 2017Petra, Adriana. (2017), Intelectuales y Cultura Comunista: Itinerarios, Problemas y Debates em la Argentina de Pós-Guerra. Buenos Aires, Fondo de Cultura Económica.). Já no Brasil, estudos sobre a revista Presença são mais escassos, sendo normalmente lembrada como integrante de uma linhagem mais ampla do “comunismo democrático” animada desde a década de 1920 (Carvalho, 2007Carvalho, Maria Alice Rezende. (2007), “Breve História do ‘Comunismo Democrático’”, in J. Ferreira e D. A. Reis (org.), Esquerdas no Brasil: Revolução e Democracia. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira.) ou, ao menos, desde a entrada das teses eurocomunistas no Brasil (Segatto e Santos, 2007Segatto, José Antonio; Santos, Raimundo. (2007), “A Valorização da Política na Trajetória Pecebista: dos anos 1950 a 1991”, in M. Ridente e D. Aarão Reis (orgs.), História do Marxismo no Brasil, v. 6, Partidos e Movimentos após os Anos 1960. Campinas, Editora da Unicamp.). O artigo pretende contribuir com a área, portanto, ao propor parâmetros analíticos para abordar a tradução dos conceitos de Gramsci na América Latina; realizar uma comparação entre duas revistas que reuniram intelectuais dissidentes dos partidos comunistas na Argentina e no Brasil; aproximar desafios de renovação teórico-política em contextos distintos de crises políticas e, ao fim, ao atribuir à revista Presença relevância como fonte para entender o debate político e ideológico do período de transição brasileira à democracia nos anos 1980.

Pasado y Presente e a agenda de uma nova geração

Na Argentina, a década assinalada pela fratura da ordem constitucional de 1955 e pelo golpe de estado de 1966 foi marcada pelo que Oscar Terán (2013Terán, Oscar. (2013 [1991]), Nuestros Años Sesenta: La Formación de la Nueva Izquierda Intelectual Argentina, 1956-1966. Buenos Aires, Siglo Veintiuno Editores. [1991]) considerou como a “formação de uma nova esquerda intelectual argentina”. Durante esse período, os comunistas realizaram um “complexo movimento que levou desde a ‘natural’ oposição, enquanto o peronismo esteve no governo, até um feroz processo de releitura do mesmo a partir de sua derrubada, o qual constituiu um dos fatores político-culturais fundamentais do período em análise” (Terán, 2013Terán, Oscar. (2013 [1991]), Nuestros Años Sesenta: La Formación de la Nueva Izquierda Intelectual Argentina, 1956-1966. Buenos Aires, Siglo Veintiuno Editores. [1991]:65)6 6 . Todas as citações de excertos em língua estrangeira foram traduzidas por mim, a quem cabe todas as eventuais inconsistências. . Foi então que, através de artigos publicados nos Cuadernos de Cultura7 7 . Criada em 1950, por iniciativa de Rodolfo Ghioldi, Héctor Agosti participa da direção desde 1952. , se buscou articular uma resposta dentro do partido. A publicação era dirigida por Hector Agosti8 8 . Agosti foi responsável pelo esforço inicial em editar as Cartas, em 1950, e os Cadernos, entre 1958 e 1962, pela editora Lautaro, bem como a encomenda da tradução e os cuidados da edição dos mesmos. , o primeiro intelectual argentino a usar reflexões gramscianas para repensar a história argentina com Echeverría (Agosti, 1951Agosti, Hector. (1951), Echeverría. Buenos Aires, Futuro.). Recuperando as reflexões gramscianas sobre o Risorgimento, Agosti afirmava que a história argentina devia caracterizar-se como uma “revolução interrompida”, dada a incapacidade da burguesia de dar resposta ao problema da terra e assim integrar as massas rurais em um projeto nacional. Com isso, dava início a uma teoria do “paralelismo histórico”, baseado na grande semelhança entre o processo cultural argentino e o italiano – o que constituiria o programa político intelectual de toda a sua obra (Altamirano, 2013Altamirano, Carlos. (2013), Peronismo y Cultura de Izquierda. Buenos Aires, Siglo XXI.:189).

Com o livro de Agosti tornou-se possível uma abertura e um diálogo mais produtivo entre as diversas correntes intelectuais da época, ainda que esta tentativa tenha se realizado justamente nos anos da encruzilhada entre os governos peronistas e seu colapso em 1955 (Burgos, 2004Burgos, Raul. (2004), Los Gramscianos Argentinos: Cultura y Política en la Experiencia de Pasado y Presente. Buenos Aires, Siglo XXI.:48). Iniciava-se, então, um projeto de inovação cultural que seria responsável por aglutinar intelectuais em um movimento “tendencialmente gramsciano” (Aricó, 2014Aricó, José. (2014 [1988]), La Cola del Diablo: Itinerario de Gramsci en América Latina. Buenos Aires, Siglo XXI Editores Argentina. [2005]:36). Para tanto, Agosti rodeou-se de jovens como Juan Carlos Portantiero e os cordobeses José Aricó e Hector Schmucler, os quais organizaram, em 1963, o primeiro número de Pasado y Presente – Revista Trimestral de Ideologia e Cultura, financiada pelo Partido Comunista Argentino (PCA).

No editorial que abriu Pasado y Presente, Aricó traçava um panorama das revistas culturais argentinas, que cumpririam na sociedade moderna “um papel semelhante ao do Estado ou dos partidos políticos” (Aricó, PyP 1, 1963:9). Nessa linhagem, à qual se pretendia dar continuidade, estavam Nosostros, Revista de Filosofia, Martin Fierro, Claridad e Sur, com destaque para Contorno, considerada a “revista mais avançada do que se pode chamar esquerda independente argentina” (Aricó, PyP 1, 1963:10). Não parecia haver espaço no texto de Aricó para Cuadernos de Cultura – que embora não fosse mencionada diretamente, poderia ser entendida como parte da esquerda marxista-leninista, vista como “absolutamente estrangeira à nossa realidade” (Aricó, PyP 1, 1963:10).

Contorno9 9 . Integravam a revista: David e Ismael Viñas, Ramón Alcalde, León Rozitchner, Noé Jitrik e Juan José Sebreli. era componente do que Cuadernos havia entendido como “neoesquerda”, sendo na Argentina a maior expressão da chamada “teoria do compromisso” influenciada pela obra de Jean-Paul Sartre (Croce, 2006Croce, Marcela. (2006), “Las Revistas Literarias Argentinas o Una Historia Colectiva de la Literatura Local”, in H. Lafleur, S. Provenzano e F. Alonso (orgs.), Las Revistas Literárias Argentinas (1893-1967). Buenos Aires, El 8vo. Loco Ediciones, pp. 9-29.:25). Beatriz Sarlo assinala que a revista foi um ponto de guinada na história cultural argentina: “Uma dúzia de jovens universitários (...) irrompem com violência, dispostos a ajustar contas com os lados que dividiam a ideologia argentina: peronistas e antiperonistas, nacionais e liberais, oportunistas e profetas” (Sarlo, 1981:3).

A revista publicou dez números no período após a experiência peronista, encerrando sua atividade em meio ao frondizismo – entre novembro de 1953 e abril de 1959. Para Aricó, o desaparecimento em plena era frondizista teria expressado o naufrágio de uma esperança, a quebra de uma ilusão impossível na Argentina de então e, ao mesmo tempo, um claro índice das limitações presentes na “autonomia política” do proletariado e da ainda fraca capacidade intrínseca de captação que possuía a filosofia da práxis (Aricó, PyP.1, 1963:10).

Pasado y Presente assumia, assim, o objetivo de dar continuidade à “teoria do compromisso”, “conscientes do papel que devem jogar no plano da ideologia e responsáveis do profundo sentido político que tem de projetar todo seu trabalho coletivo” (Aricó, PyP 1, 1963:11). A revista deveria ser um efetivo centro unitário de confrontação e elaboração ideológica de todas as forças que se colocassem a necessidade impostergável de renovar totalmente a sociedade argentina (Aricó, PyP1, 1963:11).

A conjuntura em que surgia Pasado y Presente estava marcada por uma grave crise hegemônica na Argentina, a qual, segundo Portantiero, já estaria sendo gestada desde a década de 1930, quando a burguesia industrial passara a ter maior peso relativo na vida econômica. Sem conseguir encontrar “equivalências ao nível de hegemonia da sociedade política”, contudo, a solução encontrada teria sido “bonapartista”. Em aparente aliança com as velhas classes dominantes, e sob os termos de um falso equilíbrio social, o peronismo surgira com a função de “simular uma identificação com as massas populares, acentuando assim seu caráter populista, que as velhas classes (e sobretudo seus mediadores políticos) não podiam tolerar” (Portantiero, PyP 1, 1963:20).

Em Gramsci, o conceito de bonapartismo foi comumente debatido em dupla com o de “cesarismo”, categoria difundida e debatida na ciência política da época (Liguori, 2017Liguori, Guido. (2017), “Cesarismo”, in P. Voza e G. Liguori (orgs.), Dicionário Gramsciano, São Paulo, Boitempo. pp. 109-111.:109). O termo indicava uma situação na qual “as forças em luta se equilibram de forma catastrófica, isto é, se equilibram de modo que a continuação da luta não pode ocorrer sem a destruição recíproca” (C. 9, §133, 1975:1194)10 10 . Com base na edição crítica dos Cadernos do Cárcere (1975), as citações serão feitas da seguinte forma: C. “X”, para o número do Caderno, § “Y”, para o parágrafo. . O caráter fundamental estaria no vínculo “pessoal” de certo estrato com o governo, mediado pela “burocracia” (Filippini, 2017Filippini, Michele. (2017), “Bonapartismo”, in P. Voza e G. Liguori (orgs.). Dicionário Gramsciano. São Paulo, Boitempo, pp. 68-69.:68-69). No caso tratado por Portantiero, a “frente bonapartista” era formada pelo equilíbrio desastroso entre velha oligarquia agroexportadora e burguesia industrial voltada ao mercado interno. A frente baseava-se ainda no apoio ideológico e burocrático do peronismo, destinado a criar alguma identificação entre a burguesia e as massas trabalhadoras, o que seria impossível às velhas classes dominantes.

A frente só poderia se sustentar, entretanto, em conjuntura favorável. À medida que a crise econômica se intensificava, na década de 1950, houve uma intensificação da luta de classes e, em 1955, uma ruptura. Perante o temor de que a classe trabalhadora fizesse sentir seu peso sobre o Estado, do qual participava vicariamente, os velhos grupos oligárquicos retomaram o poder (Portantiero, PyP 1, 1963:21). Como as condições históricas eram outras – a indústria possuía peso majoritário no produto bruto nacional e havia uma classe trabalhadora organizada, somada ao crescimento nacionalista das camadas médias – o “frondizismo” surgiu como uma saída racional para as classes dominantes11 11 . Em 16 de setembro de 1955, uma ditadura civil-militar passou a governar a República Argentina, após derrubar Juan Domingo Perón, fechar o Congresso Nacional e depor membros do Supremo Tribunal. Após mais de dois anos, o governo passou ao Presidente eleito Arturo Frondizi, em 1 de maio de 1958, que também foi derrubado quatro anos mais tarde, em 1962. .

Mas, como tal equilíbrio de forças era demasiado instável – “catastrófico”, diria Gramsci – este se quebrou em 1962. Para Portantiero, a luta de classes na Argentina teria ultrapassado as barreiras da burocracia peronista. As velhas classes dirigentes, vinculadas aos Estados Unidos em sua campanha anticomunista, não teriam aceitado o domínio da burguesia na sociedade política (Portantiero, PyP 1, 1963:22). Chegava-se então à constatação de uma situação revolucionária em perspectiva econômica e social, mas não política. Enquanto a magnitude desta crise retirava espaço ao reformismo burguês e tornava inviável tanto a fórmula “bonapartista” de 1945 como a “integracionista” de 1959, o projeto de uma ditadura militar aberta se colocava na agenda de um dos setores das Forças Armadas (Altamirano, 2013Altamirano, Carlos. (2013), Peronismo y Cultura de Izquierda. Buenos Aires, Siglo XXI.:191-192). Essa grande transformação que se operava na Argentina no momento de formação do grupo de Pasado y Presente tornava necessária, na apreciação de Aricó, uma mudança também do juízo histórico.

Em seu entendimento, o progresso da história teria um sentido iminentemente dialético – de conservação/renovação. Todo acontecimento deveria ser permanentemente reelaborado, e de forma progressiva, pelo movimento histórico (Aricó, PyP 1, 1963:7). Só desta forma seria possível identificar uma linha de desenvolvimento real e, então, intervir na ação prática cometendo menos erros, posto que existiriam condições de identificar a maior quantidade de elementos renovadores sobre os quais apoiar-se para estruturar um verdadeiro trabalho de transformação histórica (Aricó, PyP 1, 1963:7). Nesse aspecto, o filão italiano do marxismo era celebrado por Aricó por ter definido “com absoluta justeza” o “traço fundamental da doutrina ao denominá-la filosofia da práxis” (Aricó, PyP 1, 1963:8). De modo confluente, a revista Pasado y Presente aspirava “converter-se em uma nova expressão da esquerda argentina” tendo como ponto de partida a acepção do “marxismo como a filosofia do mundo atual” (Aricó, PyP 1, 1963:8).

E o mundo em que viviam os articulistas de Pasado y Presente passava por grande agitação também em âmbito local. A revista era editada em Córdoba, o “epicentro do conflito social” argentino dos anos 1950 e 1960 (Aricó, [1988] 2005:98). A cidade passara por intenso e acelerado processo de industrialização que, desde meados dos anos 1950, a transformara em centro da indústria argentina de automóveis. Antes disso, estava vinculada às atividades agrícolas e possuía como símbolo maior sua legendária universidade, cujo acesso a filhos de agricultores e de setores em ascensão das camadas médias urbanas havia sido possibilitado graças ao Movimento da Reforma Universitária que, originado em Córdoba, em 1918, se difundiu pela América Latina como um símbolo libertário (Burgos, 2004Burgos, Raul. (2004), Los Gramscianos Argentinos: Cultura y Política en la Experiencia de Pasado y Presente. Buenos Aires, Siglo XXI.:64)12 12 . Para mais informações sobre o movimento, conferir Portantiero (1978). .

A universidade, inclusive, foi um dado importante para pensar a formação interna de Pasado y Presente – com exceção de Aricó, todos os integrantes do Comitê Editorial tinham formação universitária e, inclusive, haviam cursado estudos de pós-graduação no exterior, alguns completando estudos doutorais antes dos 35 anos. Entre os que primeiro dirigiram a revista, Oscar Del Barco era historiador, enquanto que Aníbal Arcondo era doutor em Economia pela Universidade Nacional de Córdoba, título que complementaria pouco depois, em 1968, quando defendeu sob orientação de Ruggiero Romano sua tese de doutorado em História Econômica pela Sorbonne. A junção entre militância dos trabalhadores nas fábricas e dos estudantes universitários favoreceu a aproximação intensa entre o mundo peronista e o mundo da esquerda marxista na época13 13 . Anos mais tarde, referindo-se à cidade, Aricó ([1988] 2005: 98) a descreveria como “Turim latino-americana”. .

A ênfase dada por Aricó a essa transformação não recairia apenas no domínio da produção, mas, sobretudo, “no domínio da sensibilidade, da psicologia social, caracterizada agora pela aparição e difusão de novos ‘tipos’ humanos” (Aricó, PyP 1, 1963:12). A subjetividade passava a ocupar, mesmo, o primeiro plano da reflexão filosófica e social. A centralidade das questões referentes à consciência e alienação trazia como referência os escritos de Gramsci sobre o “Americanismo e Fordismo” e sua controversa hipótese de que a racionalização do trabalho poderia deixar o trabalhador livre para pensar no que quisesse (C. 22, §12, 1975:2171).

A ideia central seria a de que, à medida que o conteúdo humano do trabalhador se reduzisse, sua alienação cresceria apenas na medida em que a liberação de energias psíquicas não fosse orientada pelo trabalhador para a análise de sua situação na sociedade de classes (Aricó, PyP 1, 1963:13). Uma consequência desse raciocínio era a de que a superação da alienação deveria começar ali, no mesmo local onde ela surgia: na própria fábrica. Assim, a Pasado y Presente deveria trabalhar com o fim de alcançar uma mediação “perfeita” entre a filosofia mais coerente, “mais concretamente totalizadora”, e tal realidade complexa, em permanente mudança, o que demandaria um enorme e constante esforço por “atualização” da própria teoria (Aricó, PyP 1, 1963:14). Essa mediação “perfeita” só poderia ser concebida através da modificação substancial da relação entre intelectuais e massas – diagnóstico herdado do legado agostiano – e no enfrentamento da realidade que escapasse à forma do “enciclopedismo erudito e estéril”. Nas palavras de Aricó, essa tarefa seria facilitada “incorporando, através de traduções, o que está sendo escrito no mundo e está ao nosso alcance, sobre a problemática do marxismo teórico e outros campos do conhecimento humano” (Aricó, PyP 1, 1963:16).

O mundo, neste caso, era dos comunistas italianos em seus textos “a propósito do caráter do historicismo marxista” publicados na revista oficial do Partido Comunista Italiano (PCI), Rinascita. Traduzia-se parte das discussões travadas entre filósofos italianos, e que refletiam fortes tensões políticas em torno da perspectiva de Galvano Della Volpe14 14 . Da mesma geração de Gramsci e Palmiro Togliatti, Della Volpe iniciou, segundo Perry Anderson, a primeira escola “ferrenhamente anti-hegeliana” do marxismo ocidental (Anderson, 2004 [1979], p. 82). , cuja obra – fundamentalmente dedicada à estética e a uma nova leitura da obra de Marx –, se tornava, ao longo dos anos 1960, uma referência entre os argentinos.

Diversos aspectos do debate aberto entre os comunistas italianos permearam o primeiro número de Pasado y Presente, caracterizando o grupo que vinha se constituindo. Em primeiro lugar, a elevação do tema da subjetividade e da consciência junto à constatação de uma realidade local que passava por uma transformação social de grandes proporções com a expansão industrial – a centralidade da política. Em segundo lugar, uma nova configuração para o fenômeno do peronismo e a urgência por prover uma atualização da teoria que pudesse estabelecer as corretas mediações entre massas e intelectuais. Por fim, a reivindicação do historicismo como a metodologia marxista mais eficaz e a abertura às considerações do filósofo italiano Della Volpe no campo da estética.

Todos esses elementos lançaram luz sobre a revista e logo as consequências da polêmica se fizeram sentir. A direção do partido comunista, alvo ao qual as críticas de Pasado y Presente claramente se dirigiam através da alcunha do “dogmatismo”, vestiu a carapuça. O revide veio por meio de artigo de Rodolfo Ghioldi15 15 . Ghioldi, um dos fundadores do PCA, ficou conhecido pela participação na “Coluna Prestes” e por ter sido detido e torturado na prisão de Fernando de Noronha junto a militantes brasileiros. , que acusava a publicação de ser “antimarxista e anticomunista”. Pasado y Presente replicou parte de sua crítica e as apreciações consideradas “mais grosseiras” foram respondidas na sequência (Ghioldi apud Editores, PyP 2-3, 1963:237). Frente às insinuações de que o pensamento da revista tivesse que ver com autores como Haya de La Torre, Paz Estenssoro, Palacios, Grondona, Juliáns Marías, Ortega y Gasset, os cordobeses esclareciam que bastaria recorrer a Palmiro Togliatti, de cujo pensamento teria sido retirado “o central da demonstração” (Editores, PyP 2-3, 1963:237). Contra a suposta incompreensão histórica do núcleo dirigente do PCA, entendido como destacadamente stalinista, o grupo cordobês contrapunha o exemplo dos comunistas italianos, os quais teriam compreendido mais rapidamente o “descongelamento” do movimento iniciado com o XX Congresso e, por isso, empreendido com maior profundidade um processo de “desestalinização” (Aricó, PyP 2-3,1963:204). A “imitação” dos comunistas italianos acompanhava o desafio particular aos gramscianos argentinos – dar nova interpretação ao “processo peronista”.

A revista Pasado y Presente representou exemplarmente o conflito que atravessou o mundo comunista a partir dos anos 1960, tanto em sua disposição em se aproximar do mundo peronista como em sua atenção direcionada aos efeitos da Revolução Cubana. No caso, isso significou uma ruptura total com Agosti que, mesmo receoso, havia apoiado a revista. Todo o trabalho de renovação, no qual particularmente havia se empenhado, submergiu de uma só vez. Essa mudança encontrou, inclusive, um desfecho no contato que o grupo da revista teve, logo após a expulsão do PCA, com o Ejército Guerrillero del Pueblo (EGP)16 16 . Situada em Salta, a guerrilha foi promovida por Cuba e tinha entre seus primeiros combatentes o ex-militante comunista Ciro Bustos, através de quem o grupo de Pasado y Presente se vinculou à experiência. A respeito desta experiência guerrilheira, ver Rot (2000). . O fato de alguns membros do grupo de Pasado y Presente terem apoiado a guerrilha, derrotada entre março e abril de 1964, apresentou consequências. Um dos membros fundadores da revista, Samuel Kieczkovsky, ficou preso por um ano. Do ponto de vista ideológico, as marcas mais evidentes foram expostas no editorial do quarto número, publicado em janeiro-março de 1964.

Neste momento, a Revolução Cubana assumia centralidade na empenhada polêmica com a orientação comunista oficial. Para Aricó, a experiência cubana trouxera ao marxismo uma série de “originalidades” incontornáveis. Havia sido uma revolução popular dirigida por um grupo de extração pequeno-burguesa e apoiado fundamentalmente pelo campesinato, que havia atuado por completo à margem do partido comunista. Com isso, teria destruído “a convicção de que não poderia haver um processo revolucionário sem a prévia direção do Partido Comunista” (Aricó, PyP 4, 1964:150). A mera aceitação ou adaptação – às “particularidades nacionais” – de um princípio de “validez universal” impediria um exame detido da luta de classes na Argentina e na América Latina, levando o PCA a uma ação política equivocada.

Por trás do “paternalismo” estaria, para Aricó, a crença do partido em sua própria superioridade, junto a uma profunda ingenuidade sociológica presente na crença de que haveria “uma massa operária sempre pronta para a luta, esperando a voz da vanguarda para fazer a revolução”, permanentemente traída pela burocracia peronista da qual não conseguiria “se livrar” (Aricó, PyP 4, 1964:260, grifos do autor). Segundo Aricó, era necessário saber com “objetividade científica” quais as condições existentes para que o proletariado conseguisse exercer seu papel revolucionário e quais seriam os fatores que obstaculizariam este processo. As interrogações a respeito do “homem real e concreto” emergiam no texto de Aricó através da analogia estabelecida entre seu país e a Questão Meridional italiana.

A questão agrária e a reivindicação de que o proletariado se despojasse “de todos os resíduos corporativos, de todo espírito de grupo ou preconceito sindicalista”, e se concebesse como classe “universal”, era extraído diretamente do texto pré-carcerário (Gramsci, 2004Gramsci, Antonio. (2004 [1926]), “Notas sobre o problema meridional e sobre a atitude diante dele dos comunistas, dos socialistas e dos democratas”, in A. Gramsci, Escritos Políticos. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, pp. 405-435. [1926]:416). Gramsci havia afirmado que a “hegemonia do proletariado” dependeria da obtenção do consenso de amplas massas camponesas. Sendo necessário, para isso, “modificar a orientação política e a ideologia geral do próprio proletariado, enquanto elemento nacional que vive no conjunto da vida estatal e sofre inconscientemente a influência da escola, do jornal, da tradição burguesa” (Gramsci, 2004 [1926]:408). Também no que tocava a questão ideológica argentina, seria preciso eliminar do horizonte mental do proletariado as ideologias reformistas.

A questão da hegemonia era traduzida “na unidade do proletariado urbano e rural com as massas campesinas e semiproletárias do ‘hinterland’ colonial” (Aricó, PyP 4, 1964:261). Para isso, era preciso destruir o bloco latifundiário que havia centralizado e dominado toda a sociedade “tradicional”. Esse bloco funcionaria através da mediação de intelectuais, provenientes da pequena e média burguesia rural, entre proprietários e massas campesinas. A exemplo da sociedade italiana, sua função seria a de homogeneizar “em sentido conservador a inorgânica e desagregada sociedade tradicional nortenha” (Aricó, PyP 4, 1964:262). Aqui ganhava centralidade a questão dos intelectuais: “Se pode afirmar, no entanto, que dada a dispersão e o isolamento da população rural e das dificuldades para concentrá-la em sólidas organizações, convém iniciar o movimento pelos grupos intelectuais...” (C. 19, § 24, 1975:2024 [grifos de Aricó]).

Entre as características que tornariam a sociedade tradicional argentina “inorgânica”, Aricó apontava a inexistência de “uma verdadeira sociedade civil”; a violência que dominaria as relações entre Estado e trabalhadores; e a fraqueza de suas camadas intelectuais, que se inclinavam a servir os interesses dos latifundiários (Aricó, PyP 4, 1964:263). Além disso, os organismos “privados” de mediação social estariam reduzidos a uma “mínima expressão”. Diante desse cenário, o proletariado urbano e suas organizações de classe teriam a tarefa de estruturar “novos esqueletos organizativos” que fossem capazes de combinar a luta política – nesse caso, sugerido pela formação das ligas dos camponeses pobres – com a ação direta.

Além da Revolução Cubana, outro ponto que animava a polêmica com a orientação intelectual do PCA era a suposta falta de “objetividade científica” atribuída à forma dogmática com que dispunham da orientação marxista e que o distanciavam da realidade nacional-popular. Esse ponto pode ser encontrado em resenha de Portantiero sobre o livro Argentina, realidad y perspectivas, de Benito Marianetti (1964). O livro é visto como “um serviçal marco de referência” das teses programáticas do PCA, o que permitiria visualizar um “resumo de quase cinquenta anos de atividade política” (Portantiero, PyP 5-6, 1964:82). Segundo Portantiero, o livro apresenta uma análise entrecruzada com a “mera vontade de justificar” as teses do partido, sem a “mínima intenção de partir desde um exame concreto do mundo real” (Portantiero, PyP 5-6, 1964:82).

Consequência da impossibilidade de confrontar teoria e realidade social em bases cientificas seria a incompreensão do fenômeno do peronismo pelos comunistas, que o inseririam como mais um capítulo da luta dualista entre “civilização e barbárie” transfigurado em “democracia” e “naziperonismo”. Com isso, ficava fora da análise “todo o conflito real que para a sociedade argentina supunha o crescimento industrial com a aparição de novas classes” e a necessidade inevitável que essas classes tinham de participar na condução do Estado (Portantiero, PyP 5-6, 1962:85). Toda a riqueza do processo que envolvia o surgimento de um novo proletariado teria ficado presa à disjuntiva do “fascismo”. Portantiero concluía que o livro de Marianetti servia, portanto, como testemunho da “esclerose de pensamento” que acometia o grupo dirigente do PCA.

Dando continuidade à preocupação em explicitar as diferenças entre perspectivas mistificadoras e científicas do marxismo, no último número cordobês de Pasado y Presente surgia a seção “A condição operária”. Nesta seção, junto a um ensaio de Aricó, foi publicado um “informe preliminar” sobre um longo conflito na fábrica FIAT. O texto de Aricó estava às voltas com os acontecimentos que agitavam o movimento operário em Córdoba desde julho de 1965, quando uma greve geral e ocupações se seguiram à demissão de quase três mil trabalhadores da FIAT. Consequência disso, o mundo industrial voltava a ganhar centralidade.

Somando-se a Portantiero, Aricó reforçava que o surgimento de uma nova classe operária na Argentina havia sido menosprezado pelo PCA, que só analisava parcelas da realidade, ainda que fossem “anacrônicas” ou “arcaicas”, desde que comprovassem suas teses (Aricó, PyP 9, 1965:47). Deste foco no passado derivaria uma concepção política equívoca – a reivindicação por um arco de alianças que iriam do proletariado à “burguesia nacional” – e a “deformação” do peronismo – a manifestação política desta nova classe – em fascismo. De modo oposto, Aricó lembrava que o objetivo de Pasado y Presente era o de alcançar uma maior incidência política, baseando-se numa análise do novo mundo industrial.

Em sua análise dos problemas ideológicos relacionados ao chão de fábrica, Aricó começava por denunciar a política patronal que tendia a deslocar as reivindicações operárias da esfera da produção (a fábrica) para a esfera do consumo (sociedade). Isso era feito como “forma de impedir a aparição de exigências de ‘gestão’ na classe operária” (Aricó, PyP 9, 1965:50). Para isso, se disporia da política e da administração pública, das próprias organizações operárias e da propaganda publicitária, o que nublaria as consciências e paralisaria as vontades na opinião pública (Aricó, PyP 9, 1965:50). Todos esses elementos foram encontrados no conflito FIAT, segundo Aricó, de modo a impedir qualquer ação “espontânea” dos trabalhadores.

Haveria ainda a visão de mundo corporativista, que tenderia a fragmentar a unidade de classe e que seria muito útil à “ação desagregadora do capitalismo” (Aricó, PyP 9, 1965:52). Neste aspecto, Aricó sublinhava que a sociologia traria demonstrações muito detalhadas de que o sentido de pertencimento a uma classe tenderia a se enfraquecer nos estratos operários pertencentes a empresas “modernas” (Aricó, PyP 9, 1965:53). Dessas circunstâncias teria emergido um fato político da maior importância – a relativa tendência conservadora dos trabalhadores nos novos setores emergentes.

Contrário a essa tendência fragmentadora, o peronismo seria o responsável pelo movimento de “homogeneização ‘classista’ do proletariado argentino” (Aricó, PyP 9, 1965:54). Para Aricó, era um fato indiscutível a identificação quase absoluta entre o proletariado industrial e a ideologia peronista, bem como sua solidez imutável e resistência considerável aos intentos políticos de integração encarados pelas classes dominantes argentinas: “É esta resistência a que cria um amplo campo para uma política de esquerda no país” (Aricó, PyP 9, 1965:54). Aricó concluía ser necessário explicar o surgimento deste sentido de “diferenciação”, de “separação” do resto dos setores sociais e que se evidenciaria na classe operária argentina como o primeiro escalão da conquista progressiva de uma consciência de classe (Aricó, PyP 9, 1965:55).

Não há nenhuma explicação para a interrupção, em 1965, dos volumes de Pasado y Presente. Segundo Burgos (2004Burgos, Raul. (2004), Los Gramscianos Argentinos: Cultura y Política en la Experiencia de Pasado y Presente. Buenos Aires, Siglo XXI.:103), o fim da etapa cordobesa teria que ver muito mais com os problemas derivados da forma de intervenção do grupo do que com as novas condições criadas com o golpe militar de 1966, como se poderia supor. Entre o último número, publicado em setembro de 1965, e o golpe, se passaram nove meses, e ainda que a revista tivesse o costume de publicar numa mesma edição dois números, o atraso desta vez levaria oito anos. Neste interregno, o grupo editorial permaneceu ativo através da publicação dos Cuadernos Pasado y Presente que resultou em quarenta e oito volumes entre traduções e organizações de livros.

Já desde os primeiros números, ainda editada em Córdoba, os Cuadernos foram distribuídos em Buenos Aires e, com a formação da editora Siglo XXI, em 197117 17 . A vertente argentina de Siglo XXI começou seu trabalho editorial em agosto de 1971. Poucos meses depois de criada a editora foi potencializada com a fusão de Pasado y Presente. Nestes mesmos anos, Héctor Schmucler e Jorge Tula, membros do editorial cordobês, haviam se radicado em Buenos Aires. Para saber mais a respeito, cf. Sorá, 2017:223-251. , ganharam uma nova potência de difusão. Junto a essa expansão, o núcleo editorial adquiriu maior relevância – de um pequeno empreendimento de difusão cultural, passou a fazer parte de uma das mais bem-sucedidas editoras em língua espanhola (Burgos, 2004Burgos, Raul. (2004), Los Gramscianos Argentinos: Cultura y Política en la Experiencia de Pasado y Presente. Buenos Aires, Siglo XXI.; Sorá, 2017). Em sua nova etapa, ainda que fosse distribuída pela Siglo XXI em Buenos Aires, a revista permaneceria a ser dirigida em grande parte pelo núcleo de origem cordobês – José Aricó como editor responsável, junto a Oscar Del Barco, Jorge Feldman, José Nun, Juan Carlos Portantiero, Juan Carlos Torre e Jorge Tula.

Ressurgida em Buenos Aires em 1973, dois fatos ganhavam centralidade: o “Cordobazo”, movimento de operários e estudantes que ocuparam as ruas de Córdoba entre os dias 29 e 30 de maio de 196918 18 . Milhares de estudantes e trabalhadores, com o apoio ativo dos bairros da cidade, ocuparam as ruas e levantaram barricadas. Atuaram movidos também pela solidariedade com seus pares do litoral – em maio de 1969, um estudante havia sido morto pela polícia (Novaro, 2016, p. 100 e ss). , e a vitória peronista nas eleições de março de 197319 19 . De 1966 às eleições de 1973, diversos pontos do espectro ideológico, da extrema-esquerda à extrema-direita aglutinaram-se sob o peronismo. Através da candidatura de Hector Cámpora, Perón, ainda exilado, buscou iniciativas moderadoras dos conflitos entre esses diversos grupos. . Com base nesses fatos determinantes, Pasado y Presente dedicava sua nova série à explicitação de dois tempos. O primeiro tempo compreenderia do golpe militar de 1966 ao desfecho peronista das eleições de março de 1973 e seria caracterizado pela ofensiva do capital monopolista estrangeiro em sua busca por transmutar o poder econômico em poder político. No entanto, a enorme resistência das classes afetadas e as chamadas “contradições secundárias”, especialmente desde as revoltas de 1969, teriam impedido a estabilização de um modelo político autoritário, tal como havia se dado no Brasil. O segundo tempo, portanto, se iniciaria a partir da posse de Héctor Cámpora, em maio de 1973, e lançaria luz à possibilidade de uma “nova consciência socialista”, resultante da luta do movimento operário e popular e de seus experimentos institucionais de democracia revolucionária, os conselhos.

Empenhado na análise deste primeiro tempo, e escrito antes das eleições, Portantiero afirmava que a galvanização do aparato autoritário era necessária para a aceleração dos planos econômicos “neo-dependentes” – o que havia permitido no Brasil o chamado “milagre econômico”. Isso, contudo, não teria sido possível na Argentina, onde a crise social e política de 1969-70 teria se adiantado e levado à queda do autoritarismo militar, restabelecendo uma situação de “vazio hegemônico”. Este vazio colocaria em primeiro plano as contradições internas do sistema capitalista dependente. Como pano de fundo, havia ainda um crescimento consistente das mobilizações sociais e a colocação de um conteúdo socialista inédito pelo proletariado industrial (Portantiero, PyP II 1, 1973:60).

Era nesse contexto que Pasado y Presente, “depois de oito anos de silêncio”, voltava a aparecer. Um longo texto, “produto da discussão e redação coletiva”, dedicava-se a delinear oito teses a respeito das possibilidades de vincular à luta que se colocava no movimento operário e popular argentino fórmulas anticapitalistas. Para eles, a “questão peronista” se vincularia a uma problemática generalizada em todas as sociedades dependentes – a existência de poderosos movimentos nacional-populares cuja coluna vertebral estaria constituída pela adesão das grandes massas operárias e camponesas (Editores, PyP II 1, 1973:19).

Distanciando-se das vertentes nacionalistas de interpretação do fenômeno, o núcleo editorial considerava mais importante que o peronismo tivesse se desenvolvido no interior da classe operária. A este fator estaria relacionado o surgimento do peronismo revolucionário, reunindo um espectro de tendências unidas por um mesmo objetivo: “a construção de um instrumento organizativo que garanta o desenvolvimento da luta das massas e o avanço a uma sociedade socialista” (Editores, PyP II 1, 1973:21). Este seria, na apreciação dos organizadores de Pasado y Presente, o caráter original do fenômeno peronista que, a partir do resultado das eleições de março de 1973, teriam inaugurado uma nova etapa.

O primeiro número da segunda etapa da revista dedicava-se a embasar teoricamente o tema dos conselhos e da espontaneidade e direção consciente no pensamento de Gramsci. A tentativa era a de aproximar a experiência de Córdoba a de Turim, bem como a L’Ordine Nuovo da própria Pasado y Presente. A revista fundada por Gramsci e Togliatti, em maio de 1919, tinha como programa de ação, segundo Aricó, ser “o centro propulsor de ideias que educava a classe no espírito internacionalista da revolução europeia, orientando-a à conquista de sua plena autonomia como classe” (Aricó, PyP II 1, 1973:93). Teria se estabelecido, assim, “uma relação entre espontaneidade e direção consciente, entre massas e vanguarda, absolutamente inédita na tradição socialista italiana, caracterizada sempre por uma concepção aristocrática, iluminista e tutelar das massas proletárias” (Aricó, PyP II 1, 1973:93). O periódico socialista seria exemplar, justamente, da dialética que os editores cordobenses buscavam entre direção e espontaneidade.

Aricó julgava que Gramsci, em seus textos carcerários, teria levado adiante um raciocínio coerente com o reconhecimento antes afirmado nas páginas de L’Ordine Nuovo a respeito do valor da ação espontânea das massas operárias. Esse raciocínio estaria marcado por uma concepção da ação espontânea como “um nível de concreção dos sentimentos populares”. Ou seja, entre “espontaneidade” e “direção consciente”, entre ações aparentemente inorgânicas das massas e a atividade educadora sistemática de um grupo dirigente, não haveria diferença qualitativa, mas meramente quantitativa – de grau e não de qualidade. Justificava-se, além disso, que a coerência entre teoria e prática de Gramsci deveria ser valorizada pela “recuperação bastante original da tradição dos grandes mestres revolucionários a partir do ‘presente’ da ação histórica e das necessidades que esse presente coloca” (Aricó, PyP II 1, 1973:96). O próprio Gramsci havia retomado a experiência ordinovista em seus escritos carcerários ressaltando o mérito de ter sabido “traduzir”, em linguagem histórica italiana, os principais postulados da doutrina e da tática da Internacional Comunista.

A edição seguinte, e que encerraria a experiência da revista Pasado y Presente, se dedicava à análise da crise política que irrompeu em meio ao movimento peronista, marcada pela renúncia de Cámpora em julho de 1973. O deslocamento da luta política para o interior do peronismo recolocava o processo de continuidade-descontinuidade que se estabeleceria entre o nacionalismo popular e o socialismo em países dependentes (Editores, PyP II 1, 1973:177). As primeiras páginas da revista eram compostas por um longo editorial que aprofundava hipóteses já lançadas anteriormente. No entanto, os editores avançavam ao apontar que, na vitória de Cámpora, dois níveis diferenciados de interesses sociais foram superpostos. Um deles transbordaria os marcos do capitalismo e o outro teria como objetivo negociar a dependência, de modo a colocar o capital nacional em melhores condições frente ao imperialismo.

A contradição de ambos interesses marcaria a conjuntura que, desde a queda de Cámpora e o retorno ao poder de Perón, em outubro daquele ano, teria chegado a uma etapa decisiva. Segundo os editores de Pasado y Presente, ficava claro que no interior do peronismo havia dois campos bem definidos e inconciliáveis – um revolucionário e outro contrarrevolucionário. Diferente do que fora sua primeira experiência, a reedição do peronismo no poder teria sido incapaz de alcançar uma síntese, deslocando ao seu interior o centro de gravidade da luta de classes na Argentina (Editores, PyP II 2, 1973:180). Se a vitória de Cámpora havia significado a confluência peronista contra o projeto monopolista, o retorno de Perón para a Argentina, em junho de 1973, marcaria uma reorientação do campo, agora articulado aos interesses da burguesia nacional e a uma consequente política de desmobilização das massas. Nesse aspecto, um evento havia sido primordial: no dia do retorno de Perón ao país, um movimento de ultradireita peronista promovera um massacre de militantes da esquerda no aeroporto Ezeiza.

Para Pasado y Presente, a reconquista do poder em sintonia com este setor contrarrevolucionário havia recolocado ao fenômeno metas históricas, próprias de um movimento nacionalista em país dependente. Essas metas estariam limitadas, entretanto, pelo entrecruzamento da penetração imperialista junto ao desenvolvimento capitalista, processo que havia se implantado na Argentina desde pelo menos a década de 1960. Assim, a retomada de um projeto baseado em desenvolvimento econômico com controle nacional através da associação entre Estado, burguesia local e direções sindicais revelaria “desejo utópico de voltar ao passado, esquecendo as mudanças produzidas nos últimos 25 anos de desenvolvimento capitalista argentino e de transformação do sistema imperialista mundial” (Editores, PyP II 2, 1973:182).

Esse projeto exigiria uma política de desmobilização em um crescente autoritarismo do aparato de Estado que, no limite, ameaçaria o próprio movimento peronista. O paradoxo seria característico de todo movimento nacionalista – alcançar-se-ia sempre um resultado diretamente contrário ao que fora almejado, “posto que em definitivo não serão as classes dominantes as que irão cedendo parte do seu poder, mas o governo popular que se tornará cada vez mais prisioneiro delas” (Editores, PyP II 2, 1973:185). O deslocamento de setores das classes dominante não constituiria demonstração da capacidade hegemônica do peronismo, mas o contrário: “se apoia a Perón para que Perón decapite a esquerda de seu próprio movimento” (Editores, PyP II 2, 1973:187).

A complexidade do momento decorreria do fato de, pela primeira vez em sua história, ter se constituído no interior do peronismo uma direção revolucionária de massas. Essa direção se expressaria na unificação das Fuerzas Armadas Revoluzionarias (FAR) com os Montoneros. A segunda etapa da revista Pasado y Presente foi marcada pela intenção de intervir nesse arranjo político (Editores, PyP II 2, 1973:202). Nessa direção estaria uma convocação ao peronismo revolucionário para que permanecesse no movimento e não passasse imediatamente para a luta armada, que fosse hegemonizado pela classe operária e se fundasse na centralidade econômica e política da “fábrica”. A revista encerraria suas atividades num momento de agudização dos conflitos. As organizações peronistas de esquerda não optariam pela direção aconselhada pelos gramscianos e a luta armada seria derrotada pelos militares, abrindo o período extremamente violento da Ditadura Militar que, em 1976, levaria seus intelectuais ao exílio mexicano.

Presença e a renovação frustrada

Diferente da Argentina, na cultura comunista brasileira o movimento de renovação teórica inspirada pelos escritos de Gramsci não foi promovido pela camada dirigente do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que, segundo Carlos Nelson Coutinho não teria colocado “obstáculos a seu encaminhamento por parte de alguns jovens intelectuais então ligados ao partido” (2007:154). Essa abertura – antes editorial20 20 . Em 1978 o volume das Obras Escolhidas de Gramsci foi publicado e traduzido por Manoel Cruz. Em 1981, Coutinho lançou seu pioneiro Gramsci, editando fragmentos dos Cadernos e onze textos do período pré-carcerário (Secco, 2017, p. 145). que política – a interpretações da realidade brasileira informada pelos conceitos gramscianos se deu somente com a crise da ditadura e com o fracasso da luta armada. Em 1976, a primeira pesquisa publicada com essas características foi a de Luiz Werneck Vianna, em Liberalismo e Sindicato no Brasil. Encarando o golpe de 1964, o livro abordava pela primeira vez a modernização capitalista brasileira a partir das categorias de “revolução passiva”, “via prussiana”21 21 . Conceito elaborado por Lenin em sua abordagem do desenvolvimento capitalista e formação do Estado nacional na Alemanha, no qual os latifúndios feudais teriam se metamorfoseado lentamente em capitalistas enquanto se dava a expropriação camponesa com apoio estatal. e “revolução pelo alto”.

No artigo “Cultura e Sociedade no Brasil”, escrito entre 1977 e 1979, Coutinho (1990)Coutinho, Carlos Nelson. (1990), “Cultura e Sociedade no Brasil”, in C. N. Coutinho, Cultura e Sociedade no Brasil: Ensaios sobre Ideias e Formas. Belo Horizonte, Oficina de Livros, pp. 35-72. recorria aos mesmos conceitos para afirmar a tendência objetiva de transformação social no Brasil a se realizar por meio da “conciliação pelo alto”. Nesse caso, a inspiração gramsciana se via também no tratamento de outra questão – os intelectuais. Para ele, o reflexo ideológico da tendência brasileira de “conciliação com o atraso” seria a disposição ao “ecletismo”, ou seja, à conciliação igualmente no plano das ideias. Em sua visão, os intelectuais seriam “pressionados pela situação objetiva a confusas sínteses ecléticas” (Coutinho, 1990Coutinho, Carlos Nelson. (1990), “Cultura e Sociedade no Brasil”, in C. N. Coutinho, Cultura e Sociedade no Brasil: Ensaios sobre Ideias e Formas. Belo Horizonte, Oficina de Livros, pp. 35-72.:48). Essa postura configuraria um tipo de “cosmopolitismo abstrato”, no qual a “importação cultural” não teria como objetivo responder a questões colocadas pela própria realidade brasileira, mas visaria tão somente satisfazer exigências de um círculo restrito de intelectuais “intimistas”. Só seria possível quebrar definitivamente os estreitos limites de casta em que a “via prussiana” teria colocado os intelectuais com a “construção de uma democracia de massas”: “lutando pela democratização da cultura, os intelectuais combatem efetivamente pela renovação democrática da vida nacional em seu conjunto; e, ao mesmo tempo, lutando por essa renovação democrática, asseguram condições mais favoráveis à expansão e florescimento de sua própria práxis cultural” (Coutinho, 1990Coutinho, Carlos Nelson. (1990), “Cultura e Sociedade no Brasil”, in C. N. Coutinho, Cultura e Sociedade no Brasil: Ensaios sobre Ideias e Formas. Belo Horizonte, Oficina de Livros, pp. 35-72.:68).

O argumento seria radicalizado no ensaio de 1979, “A democracia como valor universal”, no qual tocava a tese especificamente política de que a democracia não possuiria um valor apenas instrumental e tático aos socialistas: “A luta pela renovação democrática [...] implica em conceber a unidade como valor estratégico” (Coutinho, 1979Coutinho, Carlos Nelson. (1979), “A Democracia Como Valor Universal”, in Silveira et al. (eds), Encontros com a Civilização Brasileira, v. 9. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, pp. 33-47.:44-45, grifos do autor). Esse ensaio foi apontado como um “dos mais polêmicos da história da esquerda brasileira” (Secco, 2002Secco, Lincoln. (2002), Gramsci e o Brasil: Recepção e Difusão de suas Ideias. São Paulo, Cortez.:60), sendo entendido como cristalização da influência das ideias e posições “italianas” no Brasil e do que Nogueira (1993Nogueira, Marco Aurélio. (1993 [1985]), “Gramsci, a Questão Democrática e a Esquerda no Brasil”, in C. N. Coutinho e M. A. Nogueira (orgs.). Gramsci e a América Latina. Rio de Janeiro, Paz e Terra, pp. 129-152. [1985]) chamou de “gramscismo”, entre 1976 e 1982. Vale destacar que, ao longo dos anos 1970, Coutinho se exilou em Bolonha, onde teve contato direto com as teses do Partido Comunista Italiano. Segundo Coutinho (2007:161), esse seria o ponto de “definitiva ruptura com o ‘marxismo-leninismo’”, no qual passava-se a assumir radicalmente uma reavaliação da “questão democrática”.

A expansão da influência gramsciana seguiria com a “diáspora” do grupo de Coutinho (Secco, 2002Secco, Lincoln. (2002), Gramsci e o Brasil: Recepção e Difusão de suas Ideias. São Paulo, Cortez.:61), que seria integrado pela chamada “corrente renovadora”, caracterizada especialmente por defender a democracia tal como vinha se colocando no comunismo italiano (Santos, 1994Santos, Raimundo. (1994), O Pecebismo Inconcluso. Escritos sobre Ideias Políticas. Rio de Janeiro, Editora Universidade Rural.:37). Rotulados como de direita, os “gramscianos” foram afastados dos poucos postos de direção que tinham, em particular do Voz da Unidade, fundado em 1980. Fora do semanário do partido, e depois de ver o golpe militar de 1981 na Polônia ser saudado como mais uma “vitória do socialismo real”, o grupo decidiu abandonar em massa o partido (Coutinho, 2007Coutinho, Carlos Nelson. (2007), “O Gramsci no Brasil: Recepção e Usos”, in J. Q. Moraes, História do Marxismo no Brasil, v. 3, Teoria. Interpretações. Campinas, Editora da Unicamp, pp. 151-196.:163). A maioria provinha da militância da passagem dos anos 1950 para a década de 1960, como os próprios Vianna e Coutinho, mas alguns tinham larga tradição no PCB, como Armênio Guedes. O jornalista, que havia integrado o grupo de redação da “Declaração de março 1958”22 22 . Entendida como início de uma “primeira renovação pecebista” (Santos, 1988), só então o PCB passava a reconhecer que o capitalismo de fato se desenvolve, que o faz por trilhas não previstas e que, com ele, se afirmaria uma tendência democratizante do regime político (PCB, Voz Operária, 1958). , foi quem assinou a apresentação do primeiro número de Presença – Revista de Política e Cultura, lançado em novembro de 1983 na cidade de São Paulo.

Contudo, a empreitada, inicialmente liderada por Davi Capistrano Filho, não rompia com a tradição comunista. No manifesto, chamava-se a atenção aos laços de continuidade com o passado de publicações brasileiras da cultura comunista, tradição já presente nos anos 1950. Junto à “Declaração de 1958”, esse é um precedente importante de Presença – entre os comunistas, as revistas parecem ter sido uma forma mais livre de intervir no debate público, pois não interpelavam diretamente o partido. Presença pretendia “dar continuidade à tradição de outras publicações brasileiras que, no passado, mantiveram laços estreitos e foram porta-vozes do movimento operário e revolucionário,” (Guedes, P.1, 1983, p.8). São exemplos a Revista Brasiliense, de Caio Prado Jr., na década pós-195423 23 . A tensa relação da revista Brasiliense com o PCB foi bem demonstrada em artigo de Limongi (1987) dedicado ao assunto. ; bem como a Estudos Sociais, de Astrojildo Pereira, que circulou de 1956 a 1964; e a prestigiosa Revista Civilização Brasileira, de Ênio Silveira, com suas duas fases no longo pós-1964. Na esteira desta tradição, Presença surgiu como proposta de “aggiornamento da cultura de esquerda no Brasil” (Segatto e Santos, 2007Segatto, José Antonio; Santos, Raimundo. (2007), “A Valorização da Política na Trajetória Pecebista: dos anos 1950 a 1991”, in M. Ridente e D. Aarão Reis (orgs.), História do Marxismo no Brasil, v. 6, Partidos e Movimentos após os Anos 1960. Campinas, Editora da Unicamp.:16).

Embora viesse se somar a uma série de publicações comprometidas com o estudo da realidade brasileira e o avanço democrático dos anos 1980, a revista se destacava do conjunto por certa ambiguidade em sua conformação. Ainda que não partidária, os presencistas se moviam sob as bases de uma tradição que, naquele momento, enfrentava duras críticas. Não só o seu surgimento acompanhava o fim do ciclo de partidos comunistas, com exceção da experiência italiana, mas o início de uma nova vinculação entre política e cultura. No Brasil, esse período ficou conhecido como sendo o “das bases”, animado pelos novos movimentos sociais, pelo novo sindicalismo, pelas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e pela movimentação dos trabalhadores urbanos e rurais. Os núcleos de elaboração de cultura revolucionários e as concepções vanguardistas representadas pelas publicações comunistas – as “revistas de opinião” – perdiam espaço e o marxismo inclinava-se ao ambiente acadêmico.

Reagindo a essas mudanças, os presencistas consideravam necessária uma renovação conceitual. Independente de orientação ideológica, diversa que fosse, a urgência desta renovação deveria ter um denominador político comum: a liquidação do regime de 1964 (Capistrano Filho, P.1, 1983:12-13). Diferente do caso argentino, o que ficaria conhecida no Brasil como a “nova esquerda” (aglutinada em torno do Partido dos Trabalhadores – PT) – não integraria em conjunto o grupo editorial de Presença, que permaneceria o percurso todo em forte oposição ao partido. A convicção presencista era a de que a tradição e a luta acumulada ao longo de sessenta anos teriam feito dos comunistas parte integrante da história brasileira, “candidatos naturais a um posto de destaque em qualquer sistema partidário inspirado na democracia e na liberdade” (Nogueira, P.1, 1983:91, grifos nossos)24 24 . As citações da revista Presença serão feitas como P.“X”, “Y” para indicar respectivamente o número da revista e o ano de publicação. . Os motivos para ineficiência em ocupar esse lugar seriam tema constante de Presença.

Além das críticas ao PCB, os problemas da conjuntura, particularmente a redemocratização e o desejo de renovação da esquerda seriam também temas recorrentes na revista, segundo diversas perspectivas. Ao longo dos dezoito números de Presença, percebe-se um projeto de recuperação da estratégia democrática surgida em março de 1958 entre os comunistas – “a herança que não renunciamos” (Vianna, P.15, 1990) – junto ao projeto de renovação teórica, que como buscaremos demonstrar, pode ser compreendida em torno do conceito de “revolução passiva”. Assim como no caso dos argentinos, recorria-se ao pensamento do marxista sardo como forma de articular uma crítica à direção do partido comunista brasileiro e às suas “fórmulas enrijecidas” (Nogueira, P.1, 1983:93).

Nesse sentido, Werneck Vianna defendia que a luta pelo socialismo deveria passar também pela luta das ideias – “não há como se organizar a concepção de mundo do movimento operário sem os intelectuais e sem uma forma superior de elaboração para o problema da cultura” (Vianna, P.1, 1983:145). Desta forma, localizava-se o terreno no qual os intelectuais ao redor da publicação se encontravam – o texto articulava um pedido de renovação à esquerda brasileira tomada em sua totalidade e ao PCB em especial. Na Presença seguinte, Vianna reforçava o pedido de renovação contra o que denominou “vanguardismo messiânico”. Seria necessário retomar na história dos comunistas brasileiros a linha democrática e a abertura ao mundo das classes subalternas, sem as quais seria impossível requalificar a inscrição do PCB na sociedade e na política (Vianna, P.2, 1984:59). Esta linha democrática deveria ser buscada na “Declaração de Março de 1958”, resultante do impacto do XX Congresso do PCUS de 1956, e na resultante reconfiguração do tema dos intelectuais ao longo dos anos 1960.

A recorrência às categorias de Gramsci, existente na Presença, seria motivo de críticas à “subserviência a modas importadas”, como é possível localizar nas páginas da própria revista sob a rubrica do “gramscismo”25 25 . Na segunda Presença se afirmava que, tendo em vista o esgotamento da expansão do capitalismo e a criação de novas situações não analisadas por Gramsci, “seria necessário ir além de Gramsci, tal como foi necessário, nos países socialistas e capitalistas, ir além de Lenin” (Pompeu, P.2, 1984, p. 123). No terceiro número de Presença, Giannotti afirmava que “a corrida ao gramscismo” teria sido “muito adequada à dispersão de nossa intelectualidade” (Giannotti, P.3, 1984, p. 39). . Para Maria Alice Rezende de Carvalho, a opção por Gramsci teria se dado num clima de “recusa hegemônica às generalizações”, junto a um relativismo e afirmação da problemática da singularidade (Carvalho, P.4, 1984:111). A despeito disso, é possível observar nos textos da Presença uma base comum de teses generalizáveis aglutinadas sob a categoria de “revolução passiva”. Nesse sentido, buscou-se pensar o anacronismo ou descompasso das instituições e a política, resultantes da modernização autoritária e da precariedade característica à reprodução da ordem burguesa no Brasil.

Para Werneck Vianna, haveria uma confusão naquele contexto entre a ideia de transição e conservação, e que relegaria a ideia de mudança a um “privilégio das revoluções” (Vianna, P.3, 1984:16). Essa noção do senso comum estaria sendo desmentida pela experiência política brasileira. Vianna via possibilidades erigidas pela revolução passiva no país como um resultado não almejado da modernização realizada “pelo alto”. A longa transição teria feito emergir, em sua visão, “o mais vasto e profundo movimento” em favor da elevação das classes subalternas à “plena cidadania”, com destaque ao movimento operário e à organização dos trabalhadores do campo (Vianna, P.3, 1984:17). O contexto registrado pelo cientista político era o de uma modernização que concluía a imposição do modo de produção capitalista ao país, mas sem uma ordenação institucional que legitimasse a nova ordem instalada, bem como na ausência de um projeto político de esquerda alternativo.

A despeito da forma como se resolveria esse impasse da transição, em termos políticos, a emergência das massas constituía, para Vianna, uma verdadeira ruptura. Haveria uma “positividade latente” dessa nova situação e que, nisso, diferiria de todas as crises antecedentes – a revolução passiva abria, então, a possibilidade de tornar-se positiva. De um lado, haveria a “exaustão” do Estado autoritário e, de outro, a vacilação da burguesia em apresentar um projeto de ordenação democrática. Para que essa positividade se tornasse realidade, seria necessária uma ação política orientada a barrar a reprodução do regime sem que se confundisse o tema da negociação com o da conciliação – “porque quando se trata de poder, como no futebol, o que conta é o resultado” e a conquista da ruptura, para Vianna, era a democracia política (Vianna, P.3, 1984:20).

Operando nas mesmas bases teóricas, Carlos Nelson Coutinho relacionava a assunção da democracia a um desafio “modernizante” da esquerda brasileira, em sintonia com as transformações que ocorriam no comunismo italiano que já estava em franca posição socialdemocrata (Coutinho, P.3, 1984). Já Vianna acentuava o descompasso entre o movimento social e o político, às voltas com a frustração de uma renovação comunista que pudesse dirigir as massas. O desafino entre modernização econômica e a falta de novas instituições que pudessem “atualizar” o país à sua nova realidade “ocidental” permaneceria a ser o fio condutor da análise de Vianna.

Longe de ter implantado uma economia capitalista de livre mercado, mas movido por uma velha ideologia – o ufanismo da “grande potência” – o regime, na perspectiva de Vianna, teria se limitado à sofisticação de mecanismos já existentes de intervenção sobre a sociedade para fins de acumulação econômica (Vianna, P.4, 1984:5). Com isso, teria reforçado ao paroxismo todas as antigas formas de controle das classes subalternas – o que, por sua vez, teria desembocado num desencontro “brutal” entre velha institucionalidade e modernidade emergente no Brasil. Quanto mais se aproximava dos fins almejados, menos conseguia controlar as forças sociais e políticas que surgiam (Vianna, P.4, 1984:7).

Para o cientista político, o fim do regime militar seria resultado da ação política, particularmente da campanha por diretas. A base dessa construção estaria em assumir a centralidade da questão sucessória, e não da crise econômico-social, naquela conjuntura26 26 . Diferente de Vianna, outras interpretações creditavam à crise econômica e ao conflito distributivo a mudança qualitativa da abertura, decorrendo disto a mobilização popular pelas eleições diretas – esta era a visão que baseava, em linhas gerais, a atuação petista. . A dissociação entre movimento estrutural e superestrutural vista por Vianna o levava a relegar à estrutura um papel secundário – a positividade latente era da política. Em aparente contradição, o autor considerava irrelevante que a forma da transição se revestisse do caráter de uma eleição indireta. As forças progressistas deveriam se engajar, apesar disso, num processo de democracia progressiva, o que só poderia ser levado em diante no terreno da política, que exigiria a presença de um partido comunista (Vianna, P.4, 1984:12).

Centrado em sua interpretação da história brasileira a partir do conceito de “revolução passiva”, Vianna escrevia na quinta Presença sobre o “moderno na política brasileira”. Para ele, a “civilização brasileira” teria optado, sem sombra de dúvidas, pela modernidade (Vianna, P.5, 1985:37). No entanto, a aspiração pelo moderno antecederia a primazia da burguesia industrial e o “mundo do trabalho”. Nem o atraso negaria, por isso, o moderno, e nem vice-versa – ter-se-ia constituído uma “composição de contrários” que mutuamente se sustentariam, “a modernidade começa seu caminho sem ruptura com o passado”. Marca de origem e que continuava a se reiterar na história brasileira, sempre “renovando uma coalizão entre classes e elites dominantes de papéis sociais novos com as tradicionais” (Vianna, P.5, 1985:38).

O recurso à política como meio violento para a expansão capitalista provocara, segundo Vianna, a intensificação das formas tradicionais de controle social. No entanto, essas formas se tornavam cada vez mais contraditórias na medida em que eram aplicadas a “novíssimos seres sociais”, resultado mesmo da modernização econômica. Seria neste quadro que o autor entenderia o levante dos movimentos sociais contra o autoritarismo do regime, responsáveis por evidenciar a “caducidade das instituições de controle social e político do Estado burguês” (Vianna, P.5, 1985:43). Era então que, para Vianna, deslocar-se-ia o moderno da dimensão econômica para a dimensão política (Vianna, P.5, 1985:44).

Um novo caminho para a revolução passiva brasileira se colocava naquele momento. Para Vianna, o moderno assumiria, então, uma acepção revolucionária até ali inatingível. Ser contemporâneo significaria, em sua visão, “a escolha de uns valores em oposição a outros feita por um sujeito” (Vianna, P.5, 1985:45). E os sujeitos seriam, na acepção de Vianna, os partidos. Sem eles, as classes subalternas não conseguiriam traduzir a modernidade social numa opção política para toda a sociedade. Assim, concluía-se que, ou se conquistava a democracia política num processo progressivo, ou o curso da revolução passiva brasileira permaneceria a dirigir uma mudança conservadora que acionaria, assim que possível, “os freios para impor limites à democratização da sociedade” (Vianna, P.5, 1985:45). Mais uma vez, era reforçado o argumento de que sem um partido comunista centrado na questão operária essa dinâmica não poderia ser realizada plenamente, já que os movimentos sociais não seriam sujeitos dotados de capacidade de produzir interpelações políticas (Vianna, P.5, 1985:46).

É importante destacar que, neste momento, Marco Aurélio Nogueira retornava ao Brasil após realizar pós-doutorado na Itália, trazendo na bagagem o livro de Norberto Bobbio, O futuro da democracia27 27 . A tese central de Bobbio é a de que não haveria uma doutrina marxista do Estado e a esta lacuna o marxismo teria desenvolvido uma teoria negativa do Estado, pensado como mal necessário que deveria ser extinto com o fim das classes sociais. , que traduziria ainda em 1985 pela editora Paz e Terra. Diferente do ambiente italiano, que era marcado pela polêmica entre Bobbio e os comunistas, inclusive acerca de suas distintas leituras de Gramsci28 28 . Os termos dessa polêmica encontram-se registrados em alguns livros, como Marxismo e Estado (1982) e Qual socialismo? (1985b). , Nogueira e Vianna combinavam elementos da ideologia eurocomunista a uma acepção de democracia bastante afim àquela proposta pelo liberal italiano, entendida como “um conjunto de regras de procedimento para a formação de decisões coletivas, em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados” (Bobbio, 1985a:22). Para Bobbio, a democracia como método, ainda que estivesse aberta a todos os possíveis conteúdos, seria ao mesmo tempo “exigente ao solicitar o respeito às instituições, exatamente porque neste respeito estão apoiadas todas as vantagens do método e entre estas instituições estão os partidos políticos como os únicos sujeitos autorizados a funcionar como elos de ligação entre os indivíduos e o governo” (Bobbio, 1985a:23, grifos nossos).

Na última Presença paulistana, publicada em outubro de 198529 29 . Capistrano Filho já não aparecia mais no conselho de edição que, agora, passava a incluir Alberto Aggio e Maria Alice Rezende de Carvalho. , Vianna enfatizava a questão do tempo histórico. Nos processos modernos de transição do autoritarismo para a democracia – como revoluções passivas – ainda que se mudassem menos as coisas quando comparados às “rupturas revolucionárias”, “o papel do sujeito político no que muda tende a ser não só saliente, como frequentemente determinante” (Vianna, P.6, 1985:34). Para Vianna, o tempo histórico da transição estaria partido de modo tríplice. Haveria o tempo do antigo regime; o tempo da transição com a “lógica do agora”; e o tempo futuro que já se antecipava equivocadamente como prática, “a nitidez político-ideológica, o sistema de partidos classistas” (Vianna, P.6, 1985:34).

Nenhum dos tempos se imporia, e a contemporaneidade dependeria da rejeição da falsa oposição entre político-institucional e econômico-social. Dessa oposição viveria o passado tanto à direita, nos “círculos conservadores” quanto à esquerda, “populista e revoltosa”. Ambas as forças convergiriam no esforço de implodir a frente política consubstanciada na Aliança Democrática, cujo papel, considerado da maior importância, seria o de “conduzir a Nação ao processo constituinte” (Vianna, P.6, 1985:35). Era um erro grave, na visão do cientista político, que se desse ênfase à ideologização em detrimento dessa tarefa política primordial, pois consistiria em “antecipar o futuro sem realizar o presente” (Vianna, P.6, 1985:37).

Em março de 1986, a revista inaugurava a fase carioca30 30 . Não há em Presença nenhuma explicação sobre a mudança para o Rio de Janeiro. É possível que tenha a ver com a absorção pelo PT e pela nova esquerda do núcleo concentrado sob a direção de Capistrano Filho, originalmente situado em São Paulo. . Este é um marco importante do percurso de Presença – a transferência de São Paulo para o Rio de Janeiro. A revista assumiria, então, um caráter mais explicitamente acadêmico – sendo importante destacar que foi a partir daí que passou a receber auxílio do CNPq e mudou de editora. A partir do nono número (1987), deixava de ser publicada pela Editora Caetés e passava a ser expedida pelo Centro de Pesquisas e Difusão Cultural. No Rio de Janeiro, haveria grande proximidade entre os colaboradores de Presença e o Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), onde lecionavam Vianna e Carvalho. Lahuerta e Nogueira, o braço paulista da revista, se localizariam a partir de suas posições na Universidade Estadual de São Paulo (Unesp).

Na sétima edição de Presença, a reforma econômica31 31 . O “Plano Cruzado” instituía: “a substituição do cruzeiro pelo cruzado – indexação da moeda, incorporando a expectativa de uma deterioração do valor da moeda, de quase 15% ao mês para os próximos 12 meses” (Editores, P.7, 1986, p. 5). , adotada em fevereiro daquele ano, era vista em ângulo político e social. Para os editores, Milton Lahuerta, Marco Aurélio Nogueira e Luiz Werneck Vianna, a transição à democracia dependeria do êxito do programa desencadeado pelo governo (Editores, P.7, 1986:8). Isso porque se verificaria que a efetivação das mudanças dependeria “da participação ativa do povo e de suas organizações” (Editores, P.7, 1986:8, grifos dos autores). Era nisso que estaria sua “positividade” – na possibilidade de aprofundamento do processo de transição, encaminhando-o para uma ruptura com o regime e o capitalismo autoritário. Essa participação ativa incluiria, sobretudo, os partidos políticos da oposição ao regime, que deveriam compor “ampla coalizão” que repelisse “o revanchismo do antigo regime e o populismo autoritário” (Editores, P.7, 1986:8).

Vianna aprofundava diversos aspectos da argumentação que subjaz o editorial, em especial sobre o que entendia por “populismo”. Para ele, a política estaria sendo “atropelada” pelas urgências dos movimentos, “passando ao largo da intervenção calculadora e racional dos partidos” (Vianna, P.7, 1986:18). Era nesse ambiente cultural que teria se reatualizado o fenômeno do populismo (Vianna, P.7, 1986:18). Frente a realidade fruto de nosso “americanismo bizarro” – a modernização reacionária – toda forma de anacronismo seria identificada, por Vianna, como uma variação populista. Era este o nome dado a todos os que rejeitassem o caráter de ruptura implicado na conquista da democracia política, opondo-o a urgências e reivindicações particulares. Estas deveriam ser dirigidas pelo mundo da política organizada, especialmente pelos partidos, visando um “protagonismo efetivo” – o que, na visão do cientista político, consistiria numa “verdadeira revolução” (Vianna, P.7, 1986:21).

Na oitava Presença, texto de Coutinho – a respeito das categorias de Gramsci e a realidade brasileira, escrito por ocasião do seminário internacional promovido pelo Istituto Gramsci em 1985 – apresentava uma síntese magistral dos paralelismos históricos entre a experiência brasileira e a situação italiana analisada por Gramsci, e aos quais o próprio autor, junto de Vianna e Nogueira, faziam uso em suas interpretações, conformando a linha editorial de Presença. O quadro teórico fornecido por Coutinho apresenta os caminhos através dos quais as categorias de Gramsci levaram estes autores às suas novas interpretações da história brasileira e às estratégias de suas intervenções políticas na transição democrática.

Assim como no Risorgimento italiano, não seria difícil documentar, segundo Coutinho, nas principais transformações “pelo alto” no Brasil os momentos de “restauração” e “renovação” implicados nas revoluções passivas (Coutinho, P.8, 1986:147). Nesse sentido, Coutinho interpretava a Revolução de 1930, o advento do Estado Novo e o regime ditatorial instaurado no Brasil em 1964. Nesse último caso, a analogia não era mais a do período de consolidação do capitalismo na Itália, mas a da passagem da fase concorrencial à fase monopolista, na forma de revolução passiva inaugurada pelo fascismo italiano (Coutinho, P.8, 1986:148).

Para pensar a transição democrática, Coutinho acrescentava a teoria do Estado ampliado e as distinções gramscianas entre Oriente e Ocidente. Não sendo conceitos estáticos, mas referentes a processos históricos, haveria, portanto, a possibilidade de “ocidentalização” de sociedades. No Brasil, essa possibilidade teria sido freada pelo golpe de 1964, sobretudo após o AI-5. A sociedade civil, no entanto, teria conseguido conservar uma margem de autonomia real, tendo crescido e se complexificado a partir dos anos 1970 (Coutinho, P.8, 1986:159). Esse desfecho teria se tornado possível mediante o colapso de legitimação do regime, a partir da crise do “milagre econômico” em 1974. O mínimo consenso que havia sido conquistado – tolerando-se a presença do parlamento e de um partido de oposição – esfacelava-se mediante a formação progressiva de uma ampla frente política de forças antiditatoriais (Coutinho, P.8, 1986:160).

Sendo o Brasil uma sociedade “ocidental”, não haveria mais bases para uma transição centrada na guerra de movimento, “em rupturas revolucionárias entendidas como explosões violentas concentradas num breve lapso de tempo” (Coutinho, P.8, 1986:161-162). Coutinho concluía, entretanto, ressaltando uma diferença importante em relação aos colegas de Presença. Ao contrário de Vianna, o autor considerava que emergia no Brasil uma esquerda moderna, disseminada em vários partidos e organizações, e que teriam em comum o fato de haver assimilado que “(...) o objetivo das forças populares é a conquista da hegemonia, no curso de uma difícil e prolongada ‘guerra de posições’” (Coutinho, P.8, 1986:162).

Diferentemente, Vianna não constatava a existência de uma expressão partidária ou subjetiva moderna. Embora existisse processo de ocidentalização, este careceria ainda de um ator. Vianna considerava que o sistema político brasileiro estaria dominado, ao contrário, por forças extrapartidárias, pela prevalência do Executivo sobre o Legislativo, do Estado sobre a sociedade, pela primazia da cooptação sobre a representação, com os partidos marginalizados do mundo da expressão dos interesses e canalizados para o interior de agências estatais (Vianna, P.8, 1986:12). Em resumo, os partidos, “na melhor das hipóteses”, agregariam apenas opiniões e ideologias e, na pior, não passariam “de legendas vazias de identidade e manipuladas ao bel-prazer das oligarquias partidárias” (Vianna, P.8, 1986:12).

Em fevereiro de 1987, na nona Presença, Vianna seguia analisando o desajuste entre sociedade civil e sociedade política. Esse processo decorreria diretamente da modernização autoritária, que invertia tendência histórica da revolução passiva brasileira: “o Estado de vocação histórica ocidentalizante se orientaliza no despotismo; a sociedade, superando seu legado de inarticulação e passividade, é quem agora se ocidentaliza” (Vianna, P.9, 1987:10). Era a partir deste processo contraditório que Vianna buscava as explicações para a transição em curso. A economia se constituiria como linguagem dominante da modernização autoritária, enquanto a política se tornava o campo privilegiado da modernidade. Aí residiria a ambiguidade do PT: ainda que sua forma de partido fosse considerada moderna, pois enraizada nos movimentos sociais e no embate de interesses, acabava por se confundir “com o atraso e o tradicionalismo político do velho tronco terceiro-mundista ao subestimar o tema da democracia política como central na luta contra a modernização autoritária” (Vianna, P.9, 1987:10).

Era a primeira vez que Vianna acrescentava a esse quadro de interpretação da transição a existência minoritária no PT de uma “moderna esquerda brasileira” (Vianna, P.9, 1987:17). No número seguinte, Vianna ia adiante em sua crítica da “esquerda populista”. Diferente da sua velha expressão – terceiro-mundista e estatista – a nova expressão encontraria raízes no corporativismo societal e na ideologia católica de “ida ao povo” (Vianna, P.10, 1987:7). A recusa petista da solução posta por Tancredo Neves e a Aliança Democrática revelaria uma “siderúrgica incompreensão sobre o caráter da Nova República” (Vianna, P.10, 1987:8). A “via democrática” encontrar-se-ia, assim, ameaçada pela disseminação da ideia de que já se vivia uma democracia, dispensando a estratégia de transição, por um lado, e pela gravidade da crise econômica, que poderia comprometer o alinhamento político da sociedade, por outro.

No décimo primeiro número de Presença, um artigo de maior fôlego seria dedicado a pensar os “problemas modernos na construção de hegemonia”. Segundo Vianna, a emergência neoliberal assumiria singularidades relevantes na América Latina, visto que aqui não se apresentava como reação à socialdemocracia, mas como continuidade, sob novas condições, do padrão excludente e autoritário (Vianna, P.11, 1988:9). No caso brasileiro, entretanto, essa continuidade teria sido ameaçada pela ampliação da esfera pública e pela inédita influência do associativismo das classes subalternas sobre ela – e era contra a vitória desse processo que reagia o neoliberalismo (Vianna, P.11, 1988:9).

Assim, ao lado da velha direita, Vianna via surgir uma nova versão, “moderna e civilizada” – “um projeto de hegemonia burguesa a partir da sociedade civil” (Vianna, P.11, 1988:13). A esquerda só poderia propor uma alternativa se rompesse com a tradição – tida como anacrônica – de conceber a política pelo Estado; e a ruptura estaria no deslocamento da sua orientação para a sociedade civil (Vianna, P.11, 1988:13). Na Presença posterior, do mesmo ano, Vianna generalizava sua hipótese teórica. Salvo o caso mexicano, a modernização capitalista na Íbero-América não teria irrompido por meio de processos que implicassem descontinuidade revolucionária com a ordem anterior. Fruto de revoluções passivas, o Estado teria se constituído, no continente, por uma natureza ambígua, “contraditório aparelho consagrado a abrir passagem para o novo em nome da defesa do velho” (Vianna, P.12, 1988:153).

A contraface dessa ambiguidade se veria na novidade da estrutura social e de sua composição demográfica – o que, por sua vez, tensionaria o caráter autoritário do Estado. Para manter o “novo” sob controle, haveria toda uma complexa convergência ideológica entre direita e esquerda. De um lado, radicalizar-se-ia a singularidade nacional como forma de legitimação da modernização, mitificando um passado ilusório de modo a admitir o moderno somente se fosse para salvar a tradição (Vianna, P.12, 1988:154). De outro, a esquerda teria apostado no atraso como alavanca para a passagem ao pós-capitalismo permanecendo, assim, sob hegemonia burguesa (Vianna, P.12, 1988:155).

Assim, perdia-se a “vantagem do atraso” e a “vantagem do moderno”, ao incluir a classe operária e o sindicalismo numa coalizão sob hegemonia da burguesia. Perdia-se, portanto, a capacidade de exprimir a modernidade da nova sociedade que surgia com o êxito da modernização econômica. Aí estava o núcleo central da interpretação de Vianna sobre a “revolução-restauração” brasileira, e que adquiria traços de particular dramaticidade no período da transição. Para ele, nessa ocasião, a esquerda ainda estaria prisioneira de seu “específico atraso”. Para ilustrar o raciocínio, Vianna recorria ao caso do PT. Isso se veria, principalmente, “na subestimação, ou no mero uso instrumental, da democracia política e suas instituições” (Vianna, P.12, 1988:160).

Para a postulação da hegemonia, “um partido marxista de novo tipo” deveria emancipar a classe operária de sua pauta “econômico-corporativa” (Vianna, P.12, 1988:161). No entanto – e este é um elemento fundamental da interpretação de Vianna e que o distingue – esses novos valores não deveriam desorganizar a singularidade do modo de ser brasileiro, “que deriva de uma certa tradição cultural nas classes populares, que desconhecem a influência puritana e o papel disciplinador do universo fabril e das relações de cálculo e de previsibilidade prevalecentes no mercado formal” (Vianna, P.12, 1988:162). Essa tradição não se tornaria, por si mesma, parte ativa da construção democrática. Aqui, ecoava a hipótese de Richard Morse (1988)Morse, Richard. (1988), O Espelho de Próspero: Cultura e Ideias nas Américas. São Paulo, Companhia das Letras. de que haveria um modo de ser “ibérico” que ofereceria uma saída à via “americana”. Mantida como “folclore”, a positividade da cultura popular não conseguiria se tornar ação empenhada na mudança social, necessitando de uma direção operária moderna, que as organizasse de “cima” para “baixo”, sem que negasse a sua singularidade.

Na Presença seguinte, Vianna afirmava que a “Carta de 1988” não havia concluído a transição (Vianna, P.13, 1989:10). Do ponto de vista da “moderna ordem burguesa”, o processo estaria consolidado, mas sob desajuste “evidente” de suas instituições políticas e sociais com a expressão da sua economia (Vianna, P.13, 1989:12). A “solução socialdemocrata moderna” animada pelo autor, embora não fosse desejada pelas elites econômicas constituídas por neoliberais, poderia ainda ser realizada “pela via do voto e da pressão organizada da sociedade civil” (Vianna, P.13, 1989:12). Vibravam mais uma vez os preceitos de Bobbio na interpretação do cientista político em sua rigorosa distinção dos planos social e político – o caminho moderno era eleitoral (Vianna, P.13, 1989:12). Em 1989, em que precisamente essa opção emergia com a candidatura petista, Vianna a interpretava como uma “bizarra figura” (Vianna, P.13, 1989). A derrota de Lula, que havia chegado ao segundo turno das primeiras eleições diretas no Brasil, continuaria a ser explicada segundo a mesma linha argumentativa – o problema teria sido a primazia do petista pelo social, a sua suposta oposição à transição, a abstenção de voto na aprovação da Carta de 1988, etc. (Vianna, P.15, 1990:20). Para o autor, refletiria nesse “obreirismo tardio” do novo sindicalismo a temática da esquerda dos anos 1920, nos temas do conselhismo e da espontaneidade operária – como ocorrera também na “nova esquerda” argentina.

No entanto, em vez de inaugurar uma estratégia de ação coletiva baseada no cálculo de interesses e na negociação neocorporativa, esse movimento se convertera num movimento trabalhista de novo tipo, visando a criação de uma identidade social e política submetida à lógica da coalizão democrática de resistência à ditadura (Vianna, P.15, 1990:28). Assim teria surgido o PT, com a justaposição dos interesses do moderno e do atraso. Segundo Vianna, seria inútil solidarizar, fora da política, interesses tão heterogêneos como “os do camponês sem-terra do Bico do Papagaio, os do engenheiro da Petrobrás, os do operário metalúrgico do ABC, os do habitante da periferia de Nova Iguaçu” (Vianna, P.15, 1990:29). Em suma, a “incorporação transformista” se contraporia à hegemonia.

Diferente de Pasado y Presente que terminava seu percurso animando uma perspectiva conselhista, Vianna destacava que a democratização europeia do segundo pós-guerra teria questionado “o modelo de intensa politização e ideologização do movimento operário comunista, tendendo a produzir seu isolamento da classe operária real” (Vianna, P.15, 1990:31). As ressalvas eram dadas pelos casos francês e italiano, nos quais foi possível preservar a influência comunista no movimento operário graças à “tradicional razão iluminista” de seus marxismos nacionais. Vianna destacava o caso do PCI: “favorecido pelo legado de Gramsci, (...) [o partido] ocupou o espaço não só da temática popular e intelectual, mas sobretudo das novas questões emergentes do mundo operário” (Vianna, P.15, 1990:31).

O problema no “Terceiro Mundo”, porém, seria a sobrevivência da ideia de esquerda em um contexto marcado por agressiva iniciativa econômica, política e cultural do capital. A saída animada pelos presencistas era a da socialdemocracia europeia, em especial a italiana. Essa saída era considerada inviável ao Brasil, já que o PT teria se recusado “à segmentação das classes subalternas” (Vianna, P.15, 1990:32). As outras opções disponíveis não teriam capacidade de atender ao setor operário moderno. Para Vianna, a transição não poderia, dessa forma, ser cumprida. O desafio permanecia sendo a adoção de uma estratégia da esquerda comunista e de defesa de sua herança política na luta contra o autoritarismo – âmago da intervenção editorial que tinha em Werneck Vianna seu principal articulador.

Atestava-se, naquele momento, uma frustração de grandes proporções – nem a transição democrática se completara, muito menos a renovação comunista se efetivara. O PT, visto inicialmente com grande ceticismo, havia se tornado a principal força política de oposição. Repercutiam os efeitos desmobilizadores desses processos no fato de a décima sexta Presença não incluir nenhuma análise que desse continuidade ao raciocínio trilhado até então, sendo retomado derradeiramente no décimo sétimo número da revista, de março de 1992, quando constatava-se o “fim de uma época” (Nogueira, P.17, 1992:9). Num pequeno artigo, Werneck Vianna reforçava que estaria por vir, ainda, um “processo constituinte” da esquerda que correspondesse à recriação da própria cultura política do país (Vianna, P.17, 1992:39). Ainda nessa Presença, uma série de textos originalmente publicados em L’Unità de janeiro de 1991, dedicados à memória de Gramsci, eram traduzidos. Como apresentação a essa série de textos italianos, Luiz Sérgio Henriques comentava a passagem do PCI, em 1991, ao novo Partito Democratico della Sinistra (PDS). Apesar dos esforços em redefinir a identidade comunista na afirmação do caminho democrático para o socialismo, o PCI não havia resistido à mudança de época. Assim como o PCI, a queda do muro de Berlim e a conclusão do cenário geográfico, sociocultural e ideológico do que se imaginava cristalizado desde o fim da Segunda Guerra, colocaria obstáculos muito grandes à continuidade de Presença.

Considerações finais

As revistas Pasado y Presente e Presença corroboram a hipótese geral de que “não existe uma revista digna desse nome sem que um homem tenha lhe consagrado suas ideias, seu tempo, sua energia e às vezes seu dinheiro. Uma revista pode ter uma vida coletiva, mas sua alma permanece sempre individual” (Julliard, 1987Julliard, Jacques. (1987), “Le Monde des Revues au Début du Siècle. Introduction”. Cahiers Georges Sorel, n. 5. Les Revues dans la vie Intellectuelle (1885-1914), pp. 3-9.:5, grifos nossos). Enquanto “aventuras coletivas”, as revistas nos contam a história de grupos de intelectuais que encontraram nas sugestões teóricas e políticas de Gramsci e dos comunistas italianos a força motriz de seus projetos de renovação cultural da esquerda, em oposição às estruturas consideradas dogmáticas dos partidos comunistas. O fato de terem se constituído, a partir da identidade gramsciana, em espaços plurais e heterodoxos de ampla circulação de ideias não nega – sobretudo no que diz respeito às ideias repercutidas – certos “compromissos pessoais”. Assim, foi possível comparar os distintos alcances das traduções, realizadas por Pasado y Presente e Presença, a partir da sequência de hipóteses interpretativas realizadas por José Aricó e Luiz Werneck Vianna – as almas das revistas.

Segundo os parâmetros enunciados neste trabalho, a decisão por Aricó e Vianna não se explica unicamente pelo engajamento dos autores com os afazeres da revista e tampouco pelos critérios de fidelidade ou rigor teórico na forma com que lidaram com o pensamento de Gramsci. A escolha está pautada, antes, pelo desafio dialético da tradução animado pelos autores – na busca por novas interpretações, enquanto sínteses possíveis da tensão imanente entre um esquema teórico geral e a forma peculiar que este apresenta em uma dada realidade histórico-social. Mas, se um mesmo ímpeto encorajou as iniciativas desses tradutores, os alcances de suas traduções são distintos. Ao adentrarem o profícuo caminho das analogias promovidas pelo pensamento gramsciano para refletirem sobre a história da Argentina e do Brasil, Aricó e Vianna parecem ter sido atormentados por um problema político comum que talvez decorresse do método compartilhado – por que não havia em seus países um Partido Comunista Italiano?

O panorama histórico no qual havia se desenvolvido o capitalismo e se unificado o Estado na Itália servia de quadro geral para elevar as semelhanças entre os países, ao mesmo tempo em que podia servir ao propósito de diminuir suas diferenças. Se o quadro geral da “incompletude” italiana servia para destacar as formas espúrias da hegemonia burguesa na Argentina e no Brasil, aproximando os comunistas de suas realidades, uma assombrosa inferioridade era sentida quando se comparavam política e culturalmente aos italianos – que haviam tido não só Gramsci como fundador e dirigente, mas também Togliatti e Berlinguer, de cujas teses específicas se alimentariam nossos autores em suas polêmicas com os partidos comunistas nacionais.

Na Argentina, embora Aricó tivesse rompido com Agosti – na radicalização de seu impulso antiliberal e na abertura a diversos aspectos do conhecimento humano, em especial à questão da subjetividade – dar-se-ia continuidade ao paralelismo histórico que havia despontado em sua obra. Partindo desse diagnóstico, o projeto de realizar a atualização da teoria por dentro do partido comunista fracassou logo no primeiro número, levando os cordobeses a transformar a iniciativa editorial da revista no que desejavam para o PCA – um lugar de inovação teórica comunista antistalinista, a exemplo do PCI. Se a identidade comunista era assegurada graças à referência heterodoxa italiana, esta não seria suficiente para fundamentar a inovação teórica. Nesse aspecto, seria fundamental o desenvolvimento de uma série de investigações que pretendiam “objetividade científica” a respeito da particular situação argentina. Caberia a Aricó – e nos textos assinados por todos os editores – o papel de sintetizador destes resultados.

Num primeiro momento, o anseio por inverter o processo de enquadramento da realidade a princípios gerais foi falho. Afastando-se dos modelos eurocêntricos, a experiência argentina passou a ser plasmada ao modelo cubano. O exagero na teoria sobre o papel revolucionário da “sociedade tradicional” levaria a uma análise equivocada e a uma experiência trágica. A despeito disso, o destaque dado ao problema da unidade nacional faria Aricó avançar suas hipóteses sobre a questão regional argentina. Desta investigação calcada na analogia com a Questão Meridional italiana desenvolveu-se a compreensão do que parecia ser o “grande outro” da cultura comunista no país – o peronismo. A singularidade do fenômeno seria uma das frustrações da fantasia italiana, abrindo a avenida para a realidade argentina – não havia instrumentos conceituais prontos para percorrê-la.

Diferentemente dos argentinos, os gramscianos brasileiros não levariam adiante nenhum precedente teórico comunista, apenas um político – reivindicariam como “herança” a valorização da democracia política inaugurada pela “Declaração de março de 1958”. Além de arrogarem esse legado, os brasileiros, assim como os argentinos, buscariam se justificar, uma vez fora do PCB, a partir do exemplo dos italianos – à contraluz estariam, então, o movimento eurocomunista e os preceitos teóricos do “socialismo liberal” de Bobbio. A visão de Brasil continuamente elaborada por Werneck Vianna nas páginas de Presença conformou um panorama centrado no conceito de revolução passiva que se estendeu à América Latina.

Baseado nesse panorama interpretativo, o projeto de Vianna era o de configurar uma direção teórica e política comunista mais avançada do que a oferecida pelo PCB. Embora avançasse na compreensão da história brasileira a partir do destaque à “forma passiva” de suas transformações, se atrelava a essa visão uma série de afinidades vanguardistas também herdadas da tradição – os presencistas confrontar-se-iam, até o fim, com a expectativa tida como natural de que seriam os comunistas a dirigir as classes populares na transição democrática. Diversamente aos argentinos, a frustração dessa perspectiva não lhes abriu espaço a uma transformação informada pelas categorias gramscianas que desse conta da realidade rebelde – sofisticar-se-ia a visão da revolução passiva, mas não se abriria mão, frente às invenções políticas do período, de algumas convicções. Tendo bem resolvido a interpretação do golpe militar de 1964, o “grande outro” dos presencistas seria dado pelo surgimento do PT.

Da comparação entre ambos os grupos, a partir da exposição em sequência das hipóteses desenvolvidas por seus principais teóricos, é possível constatar alcances distintos das traduções realizadas. Se, no caso argentino dos anos 1960 e 1970, o percurso argumentativo demonstrava uma reformulação constante das categorias de modo a dar conta de sua realidade concreta, no caso brasileiro dos anos 1980 um apego às convicções parece ter impedido uma mediação dialética similar frente às novidades postas pelo meio. A agenda de pesquisa elaborada por Aricó e os intelectuais de Pasado y Presente acompanharia o surgimento de uma “nova esquerda” argentina – reelaborar-se-ia, em seu âmago, uma nova apreensão do “ponto cego” da velha esquerda comunista, o peronismo. De modo oposto, os presencistas não reconheceriam a novidade da esquerda que emergia da “sociabilidade” gestada na oposição à ditadura militar (Oliveira, 2007Oliveira, Francisco. (2007), “Política Numa era de Indeterminação: Opacidade e Reencantamento” in F. Oliveira e F. Rizek, A Era da Indeterminação. São Paulo, Boitempo, pp. 15-48.). Salta aos olhos que o fim da empreitada de Presença tenha coincidido, justamente, com a dissolução do PCI – via-se fracassada a estratégia de levar adiante uma estratégia de comunismo democrático não só no Brasil, mas também na Itália.

*Agradeço a leitura e comentários de Alvaro Bianchi, Daniela Mussi, Igor Marquesine, Natalia Hirose e Nicole Herscovici. Este artigo é fruto de pesquisa de doutorado financiada pela Fapesp, Processo: 2016/09904-8.

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  • Vianna, Luiz Werneck. (1992), “Nova Esquerda e Cultura Política”. Presença: Revista de Política e Cultura, n. 17, pp. 31-41.

Notas

  • 1
    . Outras metáforas foram propostas, como a das “viagens”, em Edward Said (1983)Said, Edward. (1983), “Traveling Theory”, in E. Said, The World, the Text and the Critic, Cambridge, Harvard University, pp. 226-247., e das “importações”, em Bourdieu (2002)Bourdieu, Pierre. (2002), “Les Conditions Sociales de la Circulation Internationale des Idées”. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, v. 145, pp. 3-8..
  • 2
    . Em estudo sobre Maquiavel, Pocock (2003Pocock, John Greville Agard. (2003 [1975]), The Machiavellian Moment: Florentine Political Thought and the Atlantic Republican Tradition. Princeton, Princeton University Press. [1975]) mostrou, por exemplo, como a linguagem retórica e humanista, cuja noção fundamental era a da virtù, pôde ser traduzida pelos jesuítas na linguagem escolástica e jurídica, cuja noção principal era a de direito.
  • 3
    . Cf. Schwarz (1987)Schwarz, Roberto. (1987), “Nacional por Subtração”, in R. Schwarz, Que Horas São? Ensaios. São Paulo, Companhia das Letras..
  • 4
    . Aricó contribuiu em maior número, com seis artigos à Pasado y Presente, além de grande parte das traduções da língua italiana, seguido de Portantiero, Schmucler e Oscar del Barco, com quatro artigos cada.
  • 5
    . Werneck Vianna foi o intelectual que mais contribuiu à Presença, com dezoito artigos, seguido de Leandro Konder, Maria Alice Rezende de Carvalho, Luiz Sérgio Henriques e Maria Lúcia Werneck Vianna, os quais publicaram ao menos seis artigos na revista.
  • 6
    . Todas as citações de excertos em língua estrangeira foram traduzidas por mim, a quem cabe todas as eventuais inconsistências.
  • 7
    . Criada em 1950, por iniciativa de Rodolfo Ghioldi, Héctor Agosti participa da direção desde 1952.
  • 8
    . Agosti foi responsável pelo esforço inicial em editar as Cartas, em 1950, e os Cadernos, entre 1958 e 1962, pela editora Lautaro, bem como a encomenda da tradução e os cuidados da edição dos mesmos.
  • 9
    . Integravam a revista: David e Ismael Viñas, Ramón Alcalde, León Rozitchner, Noé Jitrik e Juan José Sebreli.
  • 10
    . Com base na edição crítica dos Cadernos do Cárcere (1975), as citações serão feitas da seguinte forma: C. “X”, para o número do Caderno, § “Y”, para o parágrafo.
  • 11
    . Em 16 de setembro de 1955, uma ditadura civil-militar passou a governar a República Argentina, após derrubar Juan Domingo Perón, fechar o Congresso Nacional e depor membros do Supremo Tribunal. Após mais de dois anos, o governo passou ao Presidente eleito Arturo Frondizi, em 1 de maio de 1958, que também foi derrubado quatro anos mais tarde, em 1962.
  • 12
    . Para mais informações sobre o movimento, conferir Portantiero (1978)Portantiero, Juan Carlos. (1978), Estudiantes y Política en América Latina: el Proceso de la Reforma Universitaria (1918-1938). México, Siglo XXI..
  • 13
    . Anos mais tarde, referindo-se à cidade, Aricó ([1988] 2005: 98) a descreveria como “Turim latino-americana”.
  • 14
    . Da mesma geração de Gramsci e Palmiro Togliatti, Della Volpe iniciou, segundo Perry Anderson, a primeira escola “ferrenhamente anti-hegeliana” do marxismo ocidental (Anderson, 2004 [1979], p. 82).
  • 15
    . Ghioldi, um dos fundadores do PCA, ficou conhecido pela participação na “Coluna Prestes” e por ter sido detido e torturado na prisão de Fernando de Noronha junto a militantes brasileiros.
  • 16
    . Situada em Salta, a guerrilha foi promovida por Cuba e tinha entre seus primeiros combatentes o ex-militante comunista Ciro Bustos, através de quem o grupo de Pasado y Presente se vinculou à experiência. A respeito desta experiência guerrilheira, ver Rot (2000)Rot, Gabriel. (2000), Los Orígenes Perdidos de la Guerrilla en Argentina. Buenos Aires, El Cielo por Asalto..
  • 17
    . A vertente argentina de Siglo XXI começou seu trabalho editorial em agosto de 1971. Poucos meses depois de criada a editora foi potencializada com a fusão de Pasado y Presente. Nestes mesmos anos, Héctor Schmucler e Jorge Tula, membros do editorial cordobês, haviam se radicado em Buenos Aires. Para saber mais a respeito, cf. Sorá, 2017:223-251.
  • 18
    . Milhares de estudantes e trabalhadores, com o apoio ativo dos bairros da cidade, ocuparam as ruas e levantaram barricadas. Atuaram movidos também pela solidariedade com seus pares do litoral – em maio de 1969, um estudante havia sido morto pela polícia (Novaro, 2016Novaro, Marcos. (2016), Historia de la Argentina (1955-2010). Biblioteca Básica de Historia. Buenos Aires, Siglo XXI., p. 100 e ss).
  • 19
    . De 1966 às eleições de 1973, diversos pontos do espectro ideológico, da extrema-esquerda à extrema-direita aglutinaram-se sob o peronismo. Através da candidatura de Hector Cámpora, Perón, ainda exilado, buscou iniciativas moderadoras dos conflitos entre esses diversos grupos.
  • 20
    . Em 1978 o volume das Obras Escolhidas de Gramsci foi publicado e traduzido por Manoel Cruz. Em 1981, Coutinho lançou seu pioneiro Gramsci, editando fragmentos dos Cadernos e onze textos do período pré-carcerário (Secco, 2017Secco, Lincoln. (2017), A Batalha dos Livros: Formação da Esquerda no Brasil. Cotia, Ateliê Editorial., p. 145).
  • 21
    . Conceito elaborado por Lenin em sua abordagem do desenvolvimento capitalista e formação do Estado nacional na Alemanha, no qual os latifúndios feudais teriam se metamorfoseado lentamente em capitalistas enquanto se dava a expropriação camponesa com apoio estatal.
  • 22
    . Entendida como início de uma “primeira renovação pecebista” (Santos, 1988Santos, Raimundo. (1988), A Primeira Renovação Pecebista: Reflexos do XX Congresso do PCUS no PCB (1956-1957). Belo Horizonte, Oficina de Livros.), só então o PCB passava a reconhecer que o capitalismo de fato se desenvolve, que o faz por trilhas não previstas e que, com ele, se afirmaria uma tendência democratizante do regime político (PCB, Voz Operária, 1958).
  • 23
    . A tensa relação da revista Brasiliense com o PCB foi bem demonstrada em artigo de Limongi (1987)Limongi, Fernando. (1987), “Marxismo, Nacionalismo e Cultura: Caio Prado e a Revista Brasiliense”, Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 2, n. 5, pp. 27-46. dedicado ao assunto.
  • 24
    . As citações da revista Presença serão feitas como P.“X”, “Y” para indicar respectivamente o número da revista e o ano de publicação.
  • 25
    . Na segunda Presença se afirmava que, tendo em vista o esgotamento da expansão do capitalismo e a criação de novas situações não analisadas por Gramsci, “seria necessário ir além de Gramsci, tal como foi necessário, nos países socialistas e capitalistas, ir além de Lenin” (Pompeu, P.2, 1984, p. 123). No terceiro número de Presença, Giannotti afirmava que “a corrida ao gramscismo” teria sido “muito adequada à dispersão de nossa intelectualidade” (Giannotti, P.3, 1984, p. 39).
  • 26
    . Diferente de Vianna, outras interpretações creditavam à crise econômica e ao conflito distributivo a mudança qualitativa da abertura, decorrendo disto a mobilização popular pelas eleições diretas – esta era a visão que baseava, em linhas gerais, a atuação petista.
  • 27
    . A tese central de Bobbio é a de que não haveria uma doutrina marxista do Estado e a esta lacuna o marxismo teria desenvolvido uma teoria negativa do Estado, pensado como mal necessário que deveria ser extinto com o fim das classes sociais.
  • 28
    . Os termos dessa polêmica encontram-se registrados em alguns livros, como Marxismo e Estado (1982) e Qual socialismo? (1985b).
  • 29
    . Capistrano Filho já não aparecia mais no conselho de edição que, agora, passava a incluir Alberto Aggio e Maria Alice Rezende de Carvalho.
  • 30
    . Não há em Presença nenhuma explicação sobre a mudança para o Rio de Janeiro. É possível que tenha a ver com a absorção pelo PT e pela nova esquerda do núcleo concentrado sob a direção de Capistrano Filho, originalmente situado em São Paulo.
  • 31
    . O “Plano Cruzado” instituía: “a substituição do cruzeiro pelo cruzado – indexação da moeda, incorporando a expectativa de uma deterioração do valor da moeda, de quase 15% ao mês para os próximos 12 meses” (Editores, P.7, 1986, p. 5).
  • *
    Agradeço a leitura e comentários de Alvaro Bianchi, Daniela Mussi, Igor Marquesine, Natalia Hirose e Nicole Herscovici. Este artigo é fruto de pesquisa de doutorado financiada pela Fapesp, Processo: 2016/09904-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    4 Set 2021
  • Revisado
    8 Jul 2022
  • Aceito
    16 Ago 2022
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