Acessibilidade / Reportar erro

Dicionário UNESP do português contemporâneo

NOTAS SOBRE LIVROS

Francisco Gomes de Matos

Letras/CAC/UFPE e Associação Brasil América, Recife

BORBA, Francisco S. (org.) 2004. Dicionário UNESP do Português Contemporâneo. São Paulo, Editora UNESP, xv + 1470 p.

Com este auspicioso lançamento, a Editora da Universidade Estadual de São Paulo dá continuidade à expressiva Tradição Lexicográfica Brasileira.

A propósito, foi dessa casa editorial, e sob a competente organização do lingüista de Araraquara, o volume Dicionário de Verbos do Português Contemporâneo do Brasil, publicado em 1990. A Borba devemos, também, o pioneiro Dicionário de Usos do Português do Brasil (São Paulo, Ática, 2002). Fruto de trabalho de equipe (quatro colaboradores: Beatriz Nunes de Oliveira Longo, Maria Helena de Moura Neves, Marina Bortolotti Bazzoli e Sebastião Expedito Ignácio), este bem intitulado Dicionário UNESP (primeira vez, entre nós, que se reconhece a contribuição de uma Universidade ao relevante trabalho lexicográfico) contém uma Introdução (5 p.), Símbolos e Abreviaturas (3 p.), Símbolos fonéticos (1 p.), De A a Z (1457 p.), 4 Apêndices – Afixos e elementos de composição (5 p.), Questões de ortografia (1 p.), Expressões latinas (1 p.), Siglas mais comuns (4 p.) – e Corpus (2 p.), as 55 obras usadas para abonações.

Na Introdução, Borba informa que "este dicionário dirige-se àqueles que se servem da língua escrita em algum momento da vida social e, especificamente, aos escolares do ensino médio e dos primeiros anos do ensino superior de qualquer área". Esclarece o organizador que o conjunto das entradas foi estabelecido "pelo critério de ocorrência num corpus de cerca de 90 milhões de itens lexicais em textos escritos no Brasil a partir de 1950" e que esse material foi extraído "do Banco de Dados do Laboratório de Lexicografia da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP (campus de Araraquara)" (vii).

Quanto ao público visado, diríamos que também a estudantes de Português como língua estrangeira poderá ser útil esta criação lexicográfica, por duas razões: a farta exemplificação de usos contextualizados e a prática freqüente de apresentar construções equivalentes (cf.as entradas para equivalência, interpendência, pazes). Assim, os usuários podem ampliar, diversificar seus repertórios de opções semantáticas (se me permitem o neologismo) e desenvolver sua competência parafrástica. Outro serviço prestado à educação de usuários de Português: valores/efeitos de usos, segundo rótulos variados, dentre os quais chulo, coloquial (Borba opta por esse termo genérico, em vez de recorrer a dois específicos, formal e informal), gíria, jornalismo, lusitanismo. Uma dimensão pouco explorada em Lexicografia tem a ver com o que chamo qualidade humanizadora da contextualização. Aplicada ao DUPC, o resultado é bem positivo. Aos pesquisadores da área e a professores de língua portuguesa, sugiro o exame das frases exemplificativas para tolerância, empatia, paz, brasilidade, criatividade, humanizar. Igualmente proveitoso poderá ser o questionamento de generalizações encontradas nas abonações. Dois exemplos: "A corrupção é o grande mal do serviço público" (351) e "O estadista preocupa-se com as futuras gerações, enquanto o político planeja as próximas eleições" (1090).

Louvar, no DUPC, comentários sobre a ocorrência de itens lexicais no Corpus. Assim, na entrada para extramuros, informa-se que "Só ocorreu associado a um substantivo, na forma invariável, equivalendo a que está fora dos limites sociais, políticos ou físicos: os alunos são levados a atividades extramuros: população extramuros" (585).

Numa obra de tal magnitude – a produto lingüístico mais complexo é o dicionário monolingue extenso – é inevitável encontrar-se interpretações questionáveis, ou lacunas definitórias. Assim, ao definir língua, Borba e colaboradores, referem-se ao falado ou escrito (846), mas omitem língua de sinais. O adjetivo culto (sociolinguisticamente questionável, mas ainda em voga em obras de referência e gramáticas, entre nós), tem esta definição (número 3, na entrada): "próprio das classes mais escolarizadas: a língua culta "Em seguida, informa-se que seus antônimos, no caso, seriam vulgar, coloquial "(366). A rigor, o uso coloquial manifesta-se em um contínuo que vai do muito informal ao muito formal. Talvez pela natureza problemática do adjetivo culto, dicionários da anglofonia, por exemplo, não mais recorram a esse rótulo: em vez disso, encontramos educated/uneducated.

Aplicamos um breve teste, para verificar a inclusão de verbos em izar: contextualizar, globalizar, internacionalizar, otimizar, oportunizar. Todos ocorrem, exceto o primeiro. Minha listinha para testagem de empréstimos do inglês, revelou-se plenamente incluída: download, link, petshop, site, videomaker.

Mais poderia dizer, mas avaliar aspectos positivos (inúmeros) e questionáveis em uma criação lexicográfica como esta é tarefa para grupos, em cursos de graduação e pós-graduação. O prazer de realizar esse trabalho avaliativo certamente trará outros frutos e benefícios, além do poder compartilhar desta significativa contribuição Araraquarense à Tradição Lexicográfica em Língua Portuguesa.

Como mencionei Português Língua Estrangeira, lembraria: quando teremos nosso dicionário, criado especificamente para usuários de outras línguas e que aprendem o Português?

Em suma, duplo aplauso: à Editora UNESP e aos cinco lexicógrafos que tão bem criaram mais um instrumento indispensável à educação comunicativa de usuários de Português.

E-mail: fcgm@hotlink.com.br

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Out 2006
  • Data do Fascículo
    2006
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP PUC-SP - LAEL, Rua Monte Alegre 984, 4B-02, São Paulo, SP 05014-001, Brasil, Tel.: +55 11 3670-8374 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: delta@pucsp.br