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Reabsorção óssea à distância na movimentação ortodôntica: quando se inicia e o como ocorre a reorganização periodontal

INSIGHT ORTODÔNTICO

Reabsorção óssea à distância na movimentação ortodôntica: quando se inicia e o como ocorre a reorganização periodontal

Alberto ConsolaroI; Lysete Berriel CardosoII; Angela Mitie Otta KinoshitaIII; Leda Aparecida FrancischoneIII; Milton Santamaria JrIV; Ana Carolina Cuzuol FracalossiV; Vanessa Bernardini MaldonadoVI

IProfessor Titular da FOB e da Pós-graduação da FORP-USP

IIProfessora de Histologia da Faculdade Anhanguera de Bauru

IIIProfessora da Universidade Sagrado Coração - Programa de Biologia Oral

IVProfessor da Universidade de Araras – Programa de Ortodontia

VMestre em Patologia Bucal pela FOB e Doutora pela UNIFESP

VIMestre em Odontopediatria pela FORP-USP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Alberto Consolaro E-mail: consolaro@uol.com.br

A movimentação dentária induzida por aparelhos ortodônticos constitui-se em um dos procedimentos terapêuticos mais aplicados na clínica odontológica. A procura da estética e da funcionalidade bucal e dentária requer o tratamento ortodôntico, o qual, muito frequentemente, está associado às reabsorções radiculares — que podem, em situação extrema, levar à perda dentária e/ou ao comprometimento periodontal.

O conhecimento da biologia da movimentação dentária induzida implica em reconhecer os fenômenos teciduais, celulares e moleculares a cada dia de sua evolução. Assim, poder-se-á interferir de forma segura e consciente com medicação, procedimentos e intervenções para otimizar o tratamento ortodôntico e o conforto do paciente, reduzir as reabsorções radiculares ou evitá-las e, ainda, viabilizar o tratamento ortodôntico para pacientes sistemicamente comprometidos.

O modelo experimental de movimentação dentária induzida de Heller e Nanda5 está universalmente consagrado3,10 pela sua utilização na maioria das pesquisas sobre o assunto, em decorrência da viabilidade de extrapolação dos resultados para a clínica ortodôntica (Fig. 1). Quanto maior a padronização e detalhamento desse modelo experimental, maior será sua aplicabilidade e potencialidade de extrapolação de resultados. Melhorar esse modelo implica em aperfeiçoar esta fonte de conhecimentos sobre a biologia da movimentação dentária induzida3,10.


Em geral, nos primeiros trabalhos os tempos experimentais se estendiam até o quinto ou sétimo dia7,8,9,13. Depois desse período, quais eram os fenômenos teciduais nas raízes do primeiro molar superior murino submetidas a forças intensas e nas quais apresentava-se reabsorção óssea à distância? Havia questionamentos que os trabalhos anteriores4,6,10,11 nesse modelo não responderam, como:

» As reabsorções radiculares associadas ao movimento dentário experimentalmente induzido estão mais relacionadas à reabsorção óssea frontal ou à reabsorção óssea à distância?

» Em que tempo as áreas de hialinização são eliminadas e o ligamento periodontal inicia seu processo de reorganização?

» Quando e como ocorre a substituição da cortical óssea alveolar reabsorvida para reinserir o ligamento periodontal?

» As áreas hialinizadas do tecido conjuntivo são fagocitadas, reabsorvidas ou circunscritas?

» Em que locais a reabsorção radicular ocorre em relação às áreas hialinas: imediatamente próximos ou distantes das áreas hialinas?

» Quando há suspeita clínica de reabsorção óssea à distância, os dados microscópicos sugerem ou não um intervalo maior para a reativação do aparelho ortodôntico?

» Na disjunção palatina, a ancoragem do aparelho nos pré-molares superiores promove hialinização do ligamento periodontal na face vestibular. A reabsorção óssea à distância se estabelece ou não há tempo, pois, com a abertura da sutura palatina média, dissipase a força e o processo cessa? Quando efetivamente inicia-se a reabsorção óssea à distância: 3, 5, 7 ou 9 dias?

Há poucos estudos sobre a cronologia e eventos sequenciais da reabsorção óssea à distância e consequente reorganização periodontal decorrente. A análise microscópica dos eventos induzidos por forças intensas em dentes submetidos à movimentação dentária induzida experimentalmente em murinos contribuiu para elucidar alguns dos questionamentos efetuados, como feito no trabalho conjunto de Cardoso2 com Consolaro, Kinoshita, Francischone, Santamaria Jr., Fracalossi e Maldonado. Os achados mais interessantes foram os mais tardios, quando ocorre a reorganização do ligamento periodontal e as reabsorções radiculares são mais ativas e extensas (Fig. 6, 7, 8).




Nos pacientes, os períodos tardios e a reorganização periodontal ocorrem a cada período de ativação, entre 15 e 21 dias. No final do período de seis meses a um ano, o somatório dos vários períodos de ativação dos aparelhos ortodônticos pode ser representado pela imagem radiográfica e tomográfica dos tecidos periodontais e raízes dentárias. Conhecer cada período de ativação — em seu início, meio e fim — aumenta muito a chance de se interferir para reduzir consequências indesejáveis.

Entre as interferências do profissional no tratamento ortodôntico, com base em resultados experimentais, pode-se incluir:

1) Planejamento defensivo para reabsorções radiculares e perda de nível ósseo.

Reabsorção óssea à distância na movimentação ortodôntica: quando se inicia e o como ocorre a reorganização periodontal

2) Aplicações de forças melhor distribuídas na estrutura dentária, com redução da sintomatologia dolorosa e desconforto do paciente.

A hialinização ligamentar reduz a velocidade de movimentação dentária ou a bloqueia, podendo, ainda, se associar a severas reabsorções radiculares. O conhecimento dos fenômenos teciduais, celulares e moleculares envolvidos na movimentação dentária induzida fundamenta essas condutas clínicas.

No primeiro molar murino, com 5 raízes3,5,12, o aparelho ortodôntico experimental (Fig. 1) idealizado por Heller e Nanda5 aplica forças intensas em quatro raízes: distovestibular, intermediária, distopalatina e mesiopalatina (Fig. 2).


Na raiz mesial ou mesiovestibular, as forças aplicadas pelo aparelho se dissipam em uma estrutura radicular mais volumosa e comprida, refletindo-se nos tecidos periodontais como uma força leve ou moderada. Essas características significam que, nesse modelo experimental, permite-se analisar, ao mesmo tempo, os efeitos dos dois tipos de forças quanto à sua intensidade: leves/moderadas ou intensas.

Na raiz distopalatina, segundo o trabalho de Cardoso2, podem-se destacar as alterações morfológicas da reabsorção óssea à distância, na raiz distopalatina, em cortes transversais na região cervical da raiz e processo ósseo alveolar (ilustradas nas Figuras 3, 4, 5, 6, 7 e 8).




CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nas conclusões do referido trabalho, verificouse que:

1. Aos 3 dias de movimentação dentária induzida por forças intensas, a reabsorção óssea à distância ainda não se iniciou na maioria dos espécimes examinados, mas em alguns notavam-se discretos focos com unidades osteorremodeladoras instaladas (Fig. 4).

2. Apenas aos 5 dias havia clastos de unidades osteorremodeladoras instaladas nas superfícies ósseas circunvizinhas e na periferia das áreas hialinas. Nesse período, a reabsorção radicular ainda era incipiente e limitada ao cemento (Fig. 5).

3. Aos 7 dias, a reabsorção óssea à distância ocorre plenamente nas superfícies das trabéculas e cortical alveolar, mas distantes e subjacentes à cortical óssea alveolar associada ao segmento do ligamento periodontal hialinizado (Fig. 6). A reabsorção óssea no movimento ortodôntico, quando induzido por forças leves/moderadas, ocorre na superfície da cortical óssea alveolar em frente à área de compressão do ligamento periodontal, sendo, por isso, denominada reabsorção óssea frontal. Na reabsorção óssea à distância, a cortical óssea alveolar está sendo solapada em suas ligações com o osso vizinho e subjacente, pela ação de numerosas unidades osteorremodeladoras. As reabsorções radiculares estão ativas e ocorrendo em maior extensão, afetando a dentina mais profundamente.

4. Aos 9 dias de movimentação dentária induzida com forças intensas, as áreas hialinas já foram e continuam sendo parcialmente reabsorvidas (Fig. 7, 8). O ligamento periodontal está se reorganizando. A cortical óssea alveolar solapada mostra apenas sinais isolados de sua existência anterior, pois está sendo reformada completamente. As reabsorções radiculares ainda estavam ocorrendo ativamente.

  • 1. Alatli-Kut I, Hultenby K, Hammarstrom L. Disturbances of cementum formation induced by single injection of 1-hydroxyethylidene-1,1-bisphosphonate (HEBP) in rats: light and scanning electron microscopic studies. Scand J Dent Res. 1994;102(5):260-8.
  • 2. Cardoso LB. Análise morfológica da evolução da reabsorção óssea à distância na movimentação dentária induzida em molares murinos [dissertação]. Bauru: Universidade Sagrado Coração; 2011.
  • 3. Consolaro A. Reabsorções dentárias nas especialidades clínicas. 2ÂŞ ed. Maringá: Dental Press; 2005.
  • 4. Fracalossi ACC. Análise da movimentação dentária induzida em ratos: influência do alendronato nas reabsorções dentárias, estudo comparativo em cortes transversais e longitudinais e avaliação microscópica em diferentes períodos de observação [dissertação]. Bauru: Universidade de São Paulo; 2007.
  • 5. Heller IJ, Nanda R. Effect of metabolic alteration of periodontal fibers on orthodontic movement: an experimental study. Am J Orthod. 1979;75:239-58.
  • 6. Maldonado VB. Efeitos microscópicos do ácido salicílico (aspirina) e do acetaminofeno (tylenol) na movimentação dentária induzida e nas reabsorções radiculares associadas [dissertação]. Ribeirão Preto: Universidade de São Paulo; 2009.
  • 7. Mazziero ET. Bisfosfonato e movimentação dentária induzida: avaliação microscópica de seus efeitos [tese]. Bauru: Universidade de São Paulo; 1999.
  • 8. Ortiz MFM. Influência dos bisfosfonatos na movimentação dentária induzida, na frequência e nas dimensões das reabsorções radiculares associadas [tese]. Bauru: Universidade de São Paulo; 2004.
  • 9. Pereira ACC. Influência da gravidez e dos anticoncepcionais na reabsorção radicular e na remodelação óssea consequente à movimentação dentária induzida: avaliação microscópica [dissertação]. Bauru: Universidade de São Paulo;
  • 10. Ren Y, Maltha JC, Kuijpers-Jagtman AM. The rat as model for orthodontic tooth movement: a critical review and proposed solution. Eur J Orthod. 2004;26:483-90.
  • 11. Santamaria Jr M. Biologia da movimentação dentária induzida e das reabsorções radiculares associadas. Influência do gênero e dos bisfosfonatos [tese]. Bauru: Universidade de São Paulo; 2009.
  • 12. Schour I, Massler M. The teeth. In: Farris EJ, Griffith JK. The rat in laboratory investigation. 2nd ed. New York: Hafner; 1963. p. 104-65.
  • 13. Vasconcelos MHF. Análise morfológica comparativa do periodonto de sustentação submetido a forças biologicamente excessivas em ratas adultas sem e sob o uso de anticoncepcionais e ratas prenhas [dissertação]. Bauru: Universidade de São Paulo; 1996.
  • Endereço para correspondência:
    Alberto Consolaro
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2011
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