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AS ELEIÇÕES DOS ANOS 1930: COORDENAÇÃO PRÉ-ELEITORAL EM TEMPOS DE VOTO SECRETO* * Este texto é produto da pesquisa realizada no âmbito do projeto “Partidos, fraude e mobilização eleitoral entre 1889 e 1964.

The elections of the 1930s: pre-electoral coordination in times of secret ballots

Las elecciones de la década de 1930: coordinación preelectoral en tiempos de voto secreto

RESUMO

Este artigo investiga se a previsão do voto secreto em 1932 constitui uma ruptura do modelo adotado na Primeira República, em que os partidos organizavam os eleitores, mobilizando-os e controlando-os no ato de votar. A partir de uma análise dos jornais da época e dos resultados eleitorais da eleição de 1934, constatou-se o exíguo impacto da reforma. Apesar de a lei determinar que o eleitor votasse em um ambiente isolado, ficou mantida a prática da impressão e distribuição das cédulas pelos partidos. Organizando de forma eficiente a preparação e distribuição delas, candidatos e partidos logravam agregar e mobilizar os eleitores nas eleições.

PALAVRAS-CHAVE:
Vargas; Voto Secreto; Eleições; Democracia; Partidos; Cidadania

ABSTRACT

This article investigates whether the introduction of the secret ballot in 1932 constitutes a change to the model adopted in the First Republic, where parties organized voters, mobilizing and controlling them in the act of voting. Based on an analysis of the newspapers at that time and the electoral results of the 1934 election, I show that the effect of the reform is not significant. Even though voters cast their votes in an isolated environment, ballots were printed and distributed by parties. Candidates and parties managed to bring together and mobilize voters in elections by organizing the preparation and distribution of ballots.

KEYWORDS:
Vargas; Secret Vote; Elections; Democracy; Parties; Citizenship

RESUMEN

Este artículo investiga si la introducción del voto secreto en 1932 constituye un cambio frente el modelo adoptado en la Primera República, donde los partidos organizaban a los votantes, movilizándolos y controlándolos en el acto de votar. El análisis de los periódicos de la época y del resultado electoral de las elecciones de 1934 mostró el bajo impacto de la reforma. Aunque los cuartos oscuros permitieron la privacidad a la hora de votar, la impresión y distribución de las papeletas electorales era hecho pelos partidos. La preparación y distribución eficiente de los mismos permitió a los candidatos y partidos agregar y movilizar a los votantes en las elecciones.

PALABRAS CLAVE:
Vargas; Voto Secreto; Elecciones; Democracia; Partidos; Ciudadanía

INTRODUÇÃO

Como o eleitor vota? As teorias sobre o comportamento eleitoral configuram enfoques diversos. Existem inúmeras explicações para decifrar os padrões de ação dos eleitores, como os valores políticos, o grau de socialização do eleitor, as regras formais, a religião, a ideologia (Dalton e Klingemann, 2007DALTON, R. J., KLINGEMANN, H.-D. The Oxford handbook of political behavior. Oxford: Oxford University Press, 2007.). A despeito da amplitude do debate, tais interpretações partem de uma premissa: o eleitor é autônomo e livre para escolher. Como bem ponderou Bernard Manin, “os traços distintivos daqueles que são eleitos devem, na medida do possível, resultar de uma escolha consciente e deliberada do eleitorado” (Manin, 1997MANIN, B. The principles of representative government. Cambridge: Cambridge University Press, 1997.: 160).

Entretanto nem sempre foi assim. No século XIX — isto é, desde que as eleições se tornaram o único mecanismo de escolha dos representantes — a ideia do eleitor como indivíduo “não é nada mais do que uma abstração” (Romanelli, 1998ROMANELLI, R. (ed.). How did they become voters? The history of franchise in modern European representation. Netherlands: Kluwer Law International, 1998.: 4). Essa forma de participar da vida política chama em causa a ideia de uma representação coletiva, em que o voto não era um exercício privado, individual, mas público e coletivo, fortemente enraizado na comunidade local (Ricci, 2019aRICCI, P. Political representation as collective representation. Considerations based on the Brazilian case. Representation, London, v. 55, n. 3, p. 265-83, 2019a. https://doi.org/10.1080/00344893.2019.1594351.
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). Como afirmam para o caso argentino Hilda Sabato e Marcela Ternavasio (2015SABATO, H.; TERNAVASIO, M. El voto en la República. Historia del sufrágio en el siglo XIX. In: SABATO, H.; TERNAVASIO, M.; DE PRIVITELLIO, L; PERSELLO, A. V. Historia de las elecciones en la Argentina. Buenos Aires: Editorial el Ateneo, 2015. p. 17-134.: 99), “analisar os votantes individualmente em função da respectiva ocupação e procedência social é enganoso: votar era um ato coletivo e os eleitores votavam organizados em grupos previamente constituídos como força eleitoral”1 1 Na América Latina, tais interpretações remetem à abordagem da Nueva História Política, que deslocou o foco sobre o indivíduo para a ação do coletivo, da sociedade, dos grupos que a compõem (Annino, 1995; Posada-Carbó, 2000; Sabato, 2018). . O caso europeu não é tão diferente. Estudos sobre Itália (Romanelli, 1995ROMANELLI, R. Il comando impossibile: stato e società nell’Italia liberale. Bologna: Il Mulino, 1995.), França (Garrigou, 1992GARRIGOU, A. Le vote et la vertu. Comment les Français sont devenus électeurs. Paris: Les Presses de Sciences Po, 1992.) e Alemanha (Anderson, 2000ANDERSON, M. L. Practicing democracy: elections and political culture in Imperial Germany. Princeton: Princeton University Press, 2000.) revelam que as performances de partidos e candidatos dependiam da capacidade de mobilizar coletivamente os eleitores. O Brasil não destoa desse quadro. O trabalho seminal de Victor Nunes Leal (1997)LEAL, V. N. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fronteira, 1997 [1947]. sobre a Primeira República tem pormenorizado o alto grau de controle exercido pelos coronéis sobre os eleitores, enquanto estudos mais recentes apontam que a mudança de regime nos anos 1930 não produziu uma ruptura do padrão anterior (Ricci, 2019aRICCI, P. Political representation as collective representation. Considerations based on the Brazilian case. Representation, London, v. 55, n. 3, p. 265-83, 2019a. https://doi.org/10.1080/00344893.2019.1594351.
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; 2019bRICCI, P. O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Appris, 2019b.). Portanto, pode-se afirmar que na época o voto não decorria da identificação partidária2 2 Em que, por identificação partidária, entendemos a proximidade psicológica e emocional do eleitor com o partido que representaria suas visões e crenças e que, em última instância, manifestar-se-ia em um voto regular em termos de preferências eleitorais. , sendo a participação eleitoral um instrumento de troca para benfeitorias e benefícios materiais momentâneos (Leal, 1997LEAL, V. N. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fronteira, 1997 [1947].). Visto sob o ângulo da participação política, a história das eleições no século XIX e no início do século XX é mais do que uma escolha entre opções políticas; é uma história de como os partidos organizavam os eleitores, mobilizando-os e controlando-os desde o alistamento até o ato de votar. Nesse sentido, a palavra-chave para pensar as eleições nessa época é coordenação eleitoral, entendida como conjunto de recursos que os candidatos e os respectivos políticos adotavam para organizar os eleitores e fazer com que votassem “corretamente”.

Neste artigo, investigo se o voto secreto previsto pelo Código Eleitoral de 1932 constitui uma ruptura desse modelo que até então predominava no país. Trata-se de um dos aspectos menos debatidos na literatura sobre democratização — cuja ênfase recaiu por muitos anos no sufrágio universal —, mas que vem sendo redescoberto (Aidt e Jensen, 2017AIDT, T. S.; JENSEN P. S. From open to secret ballot: vote buying and modernization. Comparative Political Studies, Thousand Oaks, v. 50, n. 5, p. 555-593, 2017. https://doi.org/10.1177/0010414016628268.
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; Teorell, Ziblatt e Lehoucq, 2017TEORELL, J.; ZIBLATT, D.; LEHOUCQ, F. An introduction to special issue: the causes and consequences of secret ballot reform. Comparative Political Studies, Thousand Oaks, v. 50, n. 5, p. 531-554, 2017. https://doi.org/10.1177/0010414016641977.
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). Os vários mecanismos de tutela do segredo do voto aumentariam os custos de monitoramento dos eleitores, garantindo a integridade do indivíduo diante de pressões externas (Ferejohn, 2015FEREJOHN, J. Secret votes and secret talk. In: ELSTER, J. (ed.). Secrecy and publicity in votes and debates. Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 230-248.; Manin, 2015MANIN, B. Why open voting in general elections is undesirable. In: ELSTER, J. (ed.). Secrecy and publicity in votes and debates. Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 209-214.). Entretanto, estudos recentes mostram que as mudanças em prol do voto secreto produzem no curto prazo efeitos mistos (Mares, 2015MARES, I. From open secrets to secret voting: democratic electoral reforms and voter autonomy. Cambridge: Cambridge University Press, 2015.). No caso inglês, por exemplo, o voto secreto foi introduzido em 1872, mas, como mostram alguns estudos, apenas as formas de intimidação dos eleitores diminuíram no tempo, mas não o suborno que atingia sobretudo os analfabetos (Kam, 2017KAM, C. The secret ballot and the market for votes at 19th-century British elections. Comparative Political Studies, Thousand Oaks, v. 50, n. 5, p. 594-635, 2017. https://doi.org/10.1177/0010414015626451.
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). Há também quem considere que a plena autonomia ao eleitor foi garantida apenas com a fixação dos tetos de gastos de campanha previstos pelo Anti-corruption Act em 1883 (Rix, 2008RIX, K. The elimination of corrupt practices in British elections? Reassessing the impact of the 1883 Corrupt Practices Act. The English Historical Review, v. 123, n. 500, p. 65-97, 2008. https://www.jstor.org/stable/20108376.
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). Outros casos informam que o voto secreto não foi assegurado por uma única legislação, mas alcançado por várias reformas em épocas diferentes, que “gradualmente aumentaram em sofisticação” (Crook e Crook, 2011CROOK, M.; CROOK, T. Reforming voting practices in a global age: the making and remaking of the modern secret ballot in Britain, France and the United States, c.1600–c.1950. Past & Present, Oxford, v. 212, n. 1, p. 199-237, 2011. https://doi.org/10.1093/pastj/gtr008.
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: 236). Como veremos, a compreensão desse gradualismo é central para (re)pensar o caso brasileiro.

Há 90 anos da introdução do voto secreto no Brasil, ainda sabemos pouco ou quase nada sobre essa medida. Uma constatação invariavelmente repetida é que o grande divisor de águas foi o Código Eleitoral outorgado em 1932. Inicialmente, porém, o Código apenas determinou que se votasse em cabines indevassáveis e que o eleitor depositasse as cédulas eleitorais em envelopes oficiais (denominados de sobrecartas) distribuídos na seção eleitoral pelos presidentes das mesas eleitorais (Schlegel e Nobrega, 2019SCHLEGEL, R.; NOBREGA J. Qual voto secreto? O Código Eleitoral de 1932 e as transformações no voto secreto. In: RICCI, P. (org.). O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Editora Appris, 2019. p. 83-108.). Foi em 1955 que o legislador garantiu plenamente o voto secreto, adotando a cédula oficial. Na eleição presidencial daquele ano, os eleitores recebiam as cédulas não mais a boca de urna, impressas pelos partidos, mas pelas mãos dos representantes legais das mesas eleitorais. Neste artigo, minha preocupação está restrita à reforma de 1932, implementada pela primeira vez nos anos 1930. Ela, de fato, teria desarticulado a coordenação eleitoral dos partidos sobre os eleitores?

O artigo está organizado em quatro seções, além desta introdução. Na próxima, esclareço brevemente o conceito de voto secreto e na seção seguinte descrevo como se chegou à institucionalização dele no Brasil. Ainda que este artigo se concentre nos anos 1930, é importante repercorrer a história do voto secreto de modo a elucidar a natureza incremental de sua adoção e, também, deixar claro que em 1932 a reforma introduziu um voto parcialmente secreto. Sucessivamente apresento alguns dados. Inicialmente trago algumas evidências colhidas em jornais da época para mostrar as diversas formas de coordenação pré-eleitoral de que os partidos despendiam para garantir que o voto dos eleitores não fosse desperdiçado. A avaliação do sucesso dessas medidas é feita olhando os resultados eleitorais para o pleito de 1934. Aqui, analiso o voto dividido, isto é, se os eleitores decidem votar em candidatos de diferentes partidos; um resultado que mostraria as dificuldades decorrentes da reforma enfrentadas pelas forças políticas. Nas conclusões, teço algumas considerações sobre a introdução do voto secreto, sugerindo alguns caminhos para pensar a reforma de 1955, que introduziu a cédula oficial.

O VOTO SECRETO: CONCEITO

O que entendemos por voto secreto? A literatura associa o voto secreto ao Australian ballot, adotado inicialmente na Austrália em 1856 e que se constituía em:

  • adotar cédulas eleitorais oficiais, isto é, impressas e distribuídas pelo poder público;

  • distribuir as cédulas aos eleitores no dia da eleição, no lugar de votação;

  • prever a inclusão dos nomes dos candidatos/partidos nas cédulas oficiais (possibilitando a livre escolha deles);

  • garantir o segredo no ato do voto, votando em lugar privado, fora do alcance de outras pessoas3 3 Alguns países estabeleceram garantias ulteriores, como a de depositar a cédula em um envelope antes de sair do lugar privado em que havia se votado. Como veremos esse será o caso do Brasil, em 1932. .

As primeiras duas medidas contribuem para diminuir o poder de manobra dos partidos. A proibição da elaboração e distribuição das cédulas pelos partidos tem como consequência a anulação da influência sobre o eleitor, algo que frequentemente ocorria à boca de urna, antes de o cidadão ingressar na seção eleitoral, quando os correligionários e mandatários dos candidatos distribuíam as cédulas contendo as chapas de candidatos pré-fabricadas. Na Alemanha, os eleitores frequentemente recebiam as cédulas na seção eleitoral, pouco antes de votar, mas o voto com cédulas de tamanho ou cor diferente facilitava o monitoramento por parte dos candidatos e mandatários (Mares, 2015MARES, I. From open secrets to secret voting: democratic electoral reforms and voter autonomy. Cambridge: Cambridge University Press, 2015.). A última medida eliminava o controle dos eleitores na própria seção eleitoral, no ato do voto. O Australian ballot foi sucessivamente exportado para Nova Zelândia (1870), Reino Unido (1872), Canadá (1874) e Bélgica (1877). Nos Estados Unidos, o Australian ballot foi introduzido em todos os estados entre 1888 e 1909. Nem todas as medidas foram implementadas simultaneamente. Como veremos na próxima seção, esse é o caso do Brasil. Vejamos em detalhes como o voto secreto foi se firmando na nossa legislação eleitoral4 4 Para uma reconstrução dos debates acerca das propostas visando modificar a legislação eleitoral em defesa do voto secreto até 1930, ver Schlegel e Nobrega (2019). .

O VOTO SECRETO NO BRASIL: O LONGO CAMINHO

O termo “escrutínio secreto” não era incomum na legislação eleitoral imperial. Ainda no Brasil colonial, o decreto de 7 de março 1821 fixava as normas para a nomeação dos deputados às cortes portuguesas, determinando que os representantes brasileiros fossem eleitos “por escrutínio secreto, por meio de bilhetes, nos quais esteja escrito o nome da pessoa, que cada um elege” (art. 73). Nesse sistema de votação, a ideia do voto como ato secreto se restringia ao momento em que o eleitor depositava a cédula eleitoral na urna. Em outras palavras, essa forma de votar contrastava com o voto aberto, feito levantando a mão ou declarando o voto na frente dos demais.

Após a Independência, várias leis eleitorais foram criadas. Nem todas falavam explicitamente em voto ou escrutínio secreto. Entretanto isso não deve ser lido como um desvio do padrão observado até então. O Decreto n. 3.029, de 09 de janeiro de 1881, mais conhecido como Lei Saraiva, por exemplo, introduziu o voto direto, mas não mencionava diretamente o voto secreto. Em conformidade com as práticas da época, determinava-se que cada eleitor depositasse “sua cédula em urna, que deverá conservar-se fechada a chave durante a votação, e em cuja parte superior haverá uma simples abertura pela qual uma só cédula possa passar” (art. 140). Foi o Decreto n. 8.213, de 13 de agosto de 1881, que determinou que o eleitor colocasse as cédulas em um invólucro trazido de casa.

Na Primeira República (1889–1930), a legislação em matéria eleitoral mudou frequentemente, mas em sua essência o voto continuava sendo um ato público, controlado pelos coronéis responsáveis por conduzir “magotes de eleitores como quem toca tropa de burros” (Leal, 1997LEAL, V. N. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fronteira, 1997 [1947].: 63). Dos inúmeros mecanismos previstos pela Lei Eleitoral que faziam do voto um ato público, destaco dois procedimentos. Por um lado, o formato das cédulas eleitorais. A Lei Eleitoral nunca definiu um formato específico, limitando-se à regulamentação de eventuais falhas meramente formais, como a escrita dos nomes dos candidatos5 5 A Lei de 1892, no art. 43, § 14, estabelecia que as cédulas não fossem apuradas quando contivessem o nome riscado ou substituído, declaração contrária ao rótulo, ou quando os escrutinadores encontrassem mais de uma cédula dentro de um só invólucro. As mesmas normas se encontram na Lei Rosa e Silva, de 1904, art. 75, § 3, e na Lei n. 3.208, art. 17, § 12. . As cédulas eram impressas pelos próprios partidos, que as entregavam já preenchidas com os nomes dos candidatos aos eleitores. Como lembrava o deputado incumbido de examinar as eleições no Paraná, em 1927:

É costume remeter aos chefes políticos do centro as cédulas impressas, para serem distribuídas no interior aos seus correligionários, e estes, sem solicitação de ninguém, para a partilha dos sufrágios, os levam às urnas como os receberam. Não é isso decerto o ideal de democracia e do regime representativo; mas não é motivo de nulidade, porque a lei não prescreve particularidades para a distribuição dos votos, a não ser a do número dos apuráveis em cada cédula (Anais da Câmara dos Deputados, 23 abr. 1927ANAIS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1927.: 88).

O segundo mecanismo foi introduzido na Lei Eleitoral de 1896 e estabelecia que o eleitor votasse a descoberto, “apresentando duas cédulas, que assignará perante a Mesa, uma das quais será depositada na urna e a outra lhe será restituída depois de datada e rubricada pela Mesa e pelos fiscais”6 6 Lei n. 426, de 7 de dezembro de 1896, art. 8. . Em 1916 o voto a descoberto foi limitado à situação em que o eleitor fosse impedido de votar na seção eleitoral. Nesse caso, o eleitor podia dirigir-se à seção eleitoral mais próxima para votar a descoberto. Naturalmente esse era um mecanismo que tornava legalmente prevista em lei a exposição pública do eleitor, constrangendo-o no ato do voto.

A Revolução de Outubro de 1930 marcou o fim daquela experiência republicana e o início da Segunda República (1930–1937). A disputa inicial entre dois projetos de regime, um de cunho autoritário e outro representativo, culminou no sucesso do segundo (Zulini e Ricci, 2020ZULINI, P. J.; RICCI, P. O Código Eleitoral de 1932 e as eleições da Era Vargas: um passo na direção da democracia? Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 33, n. 71, p. 600-623, 2020. https://doi.org/10.1590/S2178-14942020000300009.
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)7 7 De um lado, os tenentistas, encabeçados por Juarez Távora, que defendiam um projeto de Estado forte e o prolongamento da ditatura. De outro lado, quem advogava para um governo constitucional livremente eleito. Para uma compreensão das tensões e disputas políticas nos primeiros anos do Governo Provisório entre esses dois grupos, ver Lopes (2019). . O Governo Provisório, presidido por Getúlio Vargas, caminhou para a constitucionalização da revolução e outorgou o Código Eleitoral, em 1932. Este serviu de base para as eleições de 1933 e 1934. O Código Eleitoral era o resultado de um debate intenso travado durante a Primeira República que girava em torno da importância de combater as fraudes eleitorais maciçamente praticadas naquele regime (Ricci, 2019bRICCI, P. O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Appris, 2019b.)8 8 O Código Eleitoral de 1932 inovou adotando um sistema eleitoral (quase) proporcional, o voto secreto, o voto feminino, a representação classista, criou a Justiça Eleitoral e instituiu o voto obrigatório. Geralmente apresentado como obra de Assis Brasil, estudo recente tem revelado a multiplicidade dos atores envolvidos na redação desse Código, apontando para a participação de vários juristas e políticos (Zulini, 2019a). . O debate em torno do voto secreto durante a Primeira República se intensificou a partir dos anos 1920 (Schlegel e Nobrega, 2019SCHLEGEL, R.; NOBREGA J. Qual voto secreto? O Código Eleitoral de 1932 e as transformações no voto secreto. In: RICCI, P. (org.). O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Editora Appris, 2019. p. 83-108.). O próprio modelo australiano era conhecido e debatido. Em 1910, o senador Moniz Freire, por ocasião de uma conferência realizada no Instituto da Ordem dos Advogados, dizia-se surpreso ao descobrir que “mais da metade da Europa civilizada já consagrou” o voto secreto, e fora dela a “Australia lhe servira de berço” (Freire, 1910FREIRE, M. O voto secreto e a revisão constitucional. Rio de Janeiro: Jornal do Commercio, 1910.: 57-58).

Em 1932, porém, não se adotou o Australian ballot. Duas garantias formais em defesa do voto secreto foram adotadas: a sobrecarta oficial e um lugar privado onde votar. Para manter o sigilo do voto, o presidente da seção ficava encarregado de numerar as sobrecartas oficiais, uniformes e opacas, de 1 a 9, e rubricá-las. O eleitor deveria, então, pegar uma sobrecarta diretamente das mãos do presidente da seção, entrar em um lugar privado (denominado gabinete indevassável), de dimensões fixadas em lei, para simplesmente depositar a sua cédula na sobrecarta dentro do prazo máximo de um minuto. Quando saísse da cabine indevassável, o eleitor teria de mostrar ao presidente da seção a sobrecarta para que o segundo conferisse sua numeração e rubrica e, sucessivamente, inserisse-a na urna9 9 A lei exigia que a seção contasse com uma urna suficientemente ampla para que não se acumulasse as sobrecartas na ordem de depósito de modo a facilitar o monitoramento dos eleitores. Essa era outra medida em favor do sigilo do voto, mas que já havia sido adotada na Primeira República. .

O Autralian ballot era, porém, incompleto. Isso porque ficou mantida a prática da impressão e distribuição das cédulas pelos partidos. Nesse aspecto, os formuladores do Código Eleitoral estavam cientes da vigência de um dos principais mecanismos para monitorar os eleitores10 10 Interessante a esse propósito a posição de Assis Brasil, que ao publicar a primeira versão do projeto do Código Eleitoral, em 1931, afirmava que o Australian ballot não era conhecido e que no Brasil e “outros países retardatários” o voto secreto correspondia apenas ao voto fechado, definido pelo ato de “meter a cédula numa sobrecarta antes de a depositar na urna” (Brasil, 1931: 75-76). Talvez essa afirmação deva ser lida considerando o momento em que Assis escreve. Ao ser encarregado de elaborar o Código Eleitoral por Getúlio Vargas, sua repulsa ao voto australiano era notória por privar o eleitor de votar em quem quisesse. . No limite, até o próprio eleitor podia confeccionar as cédulas em sua residência. Entretanto a exigência de a cédula ser impressa ou datilografada elevava os gastos, facilitando o protagonismo dos partidos políticos que acabavam por confeccioná-las11 11 O Código Eleitoral determinava que as cédulas fossem (art. 71): a) de forma retangular; b) de cor branca; c) de dimensões tais que, dobradas ao meio, ou em quatro, coubessem nas sobrecartas oficiais; d) impressas ou datilografadas e sem mais dizeres ou sinais que os nomes dos candidatos e uma legenda devidamente registrada. . As cédulas eram sucessivamente disponibilizadas nos escritórios políticos dos próprios candidatos e nas sedes dos partidos. Após 1945, o eleitor, caso precisasse, podia encomendá-las por telefone12 12 Era comum o candidato publicar anúncios nos jornais informando os contatos telefônicos para pedidos de cédulas ou o endereço para retirá-las pessoalmente. Ver a título de exemplo, Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 23 set. 1950, p. 3, edição 08566; Diário da Tarde, Paraná, 2 set. 1950, p. 4, edição 17111. . Nesse sentido, podemos dizer que o Código Eleitoral de 1932 apenas parcialmente introduziu o voto secreto.

Na Terceira República, apenas com a Lei n. 2.582/1955 se introduziu um modelo de cédula oficial para a eleição presidencial. A medida era amplamente defendida pela União Democrática Nacional (UDN) e acabou sendo endossada pelo Partido Social Democrático apenas quando se garantiu que a preparação e distribuição das cédulas não fossem manipuladas em favor do candidato da UDN (Limongi, 2015LIMONGI, F. Fazendo eleitores e eleições: mobilização política e democracia no Brasil Pós-Estado Novo. Dados, Rio de Janeiro, v. 58, n. 2, p. 371-400, 2015. https://doi.org/10.1590/00115258201547.
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). As cédulas eram impressas pelo poder público e distribuídas pela Justiça Eleitoral aos presidentes das mesas eleitorais. Aos partidos era permitido imprimi-las, desde que fossem do mesmo modelo, mas não podiam estar pré-preenchidas (art. 2)13 13 Ver a resolução do Tribunal Superior Eleitoral n. 5.050, de 16 de setembro de 1955, Instruções para apuração das eleições de 3 de outubro de 1955. . Realizado pela primeira vez nas eleições presidenciais de 1955, o uso da cédula oficial foi inicialmente estendido a todas as eleições majoritárias em 1958 (Lei n. 2.982, 30 nov. 1956) e às proporcionais em 1962 (Lei n. 4.109, 20 jul. 1962), ainda que restrito às capitais, ao estado de Guanabara e São Paulo. A cédula oficial para todas as eleições e em todo o país foi prevista pelo Código Eleitoral de 1965, adotando formalmente o modelo do voto secreto previsto pelo Australian ballot. A história do voto secreto no Brasil, portanto, caracteriza-se por um longo processo de sucessivas reformas, adotadas em regimes e contextos políticos diferentes.

AS ELEIÇÕES DOS ANOS 1930 E O VOTO SECRETO

Nesta seção serão apresentados alguns dados que mostram o resultado da reforma de 1932. A ideia é ir além da percepção de que se tratou de algum avanço nos procedimentos eleitorais (Carvalho, 2003CARVALHO, J. M. Cidadania no Brasil: o longo caminho. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.; Nicolau, 2012NICOLAU, J. Eleições no Brasil: do Império aos dias atuais. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.; Sadek, 1995SADEK, M. T. A justiça eleitoral e a consolidação da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Fundación Konrad Adenauer, 1995.; Schwarcz e Starling, 2015SCHWARCZ, L. M.; STARLING, H. M. Brasil: uma biografia – com novo pós-escrito. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.; Silva e Silva, 2015SILVA, T.; SILVA, E. Eleições no Brasil antes da democracia: o Código Eleitoral de 1932 e os pleitos de 1933 e 1934. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 23, n. 56, p. 75-106, 2015. https://doi.org/10.1590/1678-987315235604.
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), enfatizando o controle que os políticos continuavam exercendo sobre os eleitores. Poucos estudos empíricos foram desenvolvidos sobre o tema do voto secreto nas eleições dos anos 1930. Schlegel e Nobrega (2019)SCHLEGEL, R.; NOBREGA J. Qual voto secreto? O Código Eleitoral de 1932 e as transformações no voto secreto. In: RICCI, P. (org.). O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Editora Appris, 2019. p. 83-108., ao analisar a eleição de 1933, observam que em vários estados houve denúncias veiculadas pelos jornais do uso irregular das sobrecartas, apontando para as imperfeições na proteção ao sigilo no voto. Não se tratava de meras críticas ao modelo adotado, mas de denúncias específicas mostrando certa facilidade no monitoramento dos eleitores por cabos e fiscais de partido. Utilizando-se das denúncias formais apresentadas perante o Tribunal de Justiça Superior Eleitoral, outros autores evidenciaram que a violação do sigilo do voto era um tipo de denúncia comum (Ricci, 2019cRICCI, P. As eleições da Era Vargas: que regime representativo é esse? In: RICCI, P. O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Appris, 2019c. p. 229-247.; Zulini e Ricci, 2020ZULINI, P. J.; RICCI, P. O Código Eleitoral de 1932 e as eleições da Era Vargas: um passo na direção da democracia? Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 33, n. 71, p. 600-623, 2020. https://doi.org/10.1590/S2178-14942020000300009.
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). Os estratagemas usados para burlar o sigilo do voto eram variados e incluíam: irregularidades na numeração e rubrica das sobrecartas, sobrecartas de tamanho e cor diferente do oficial, formato transparente delas e maior número de sobrecartas depositadas na urna em respeito ao número de eleitores que votaram, entre outros. O desrespeito à regra foi tamanho no Espírito Santo que o próprio Tribunal de Justiça Superior Eleitoral decidiu pela anulação das eleições. As eleições em Santa Catarina tiveram o mesmo desfecho14 14 Estudos regionais confirmam essa análise. No Rio Grande do Sul, os dois maiores partidos no estado, o Partido Republicano Liberal e a Frente Única Gaúcha, usaram cédulas em papel diferente. Pela dobra da sobrecarta, os fiscais de partido poderiam identificar facilmente o voto do eleitor (Cortés, 2007; Lapuente, 2018). .

O estudo das fraudes é promissor, revelando as práticas utilizadas pelos candidatos para se adaptarem às inovações introduzidas na legislação eleitoral, mas pouco nos informa a respeito da eficácia do voto secreto. A questão é entender se a sobrecarta oficial e o lugar privado onde votar foram suficientes para afetar o padrão de votação típico da Primeira República, isto é, aquele em que os partidos mobilizavam e controlavam os eleitores desde o alistamento até o momento em que se depositava a cédula eleitoral na urna. Quanto a isso, o fato de que a preparação das cédulas continuasse a cargo dos partidos relativiza a reforma de 1932. Duas formalidades previstas pelo Código Eleitoral exigiam certa coordenação por parte dos partidos. Em primeiro lugar, determinou-se que as cédulas seguissem determinados padrões — de forma retangular, de cor branca, de dimensões tais que, dobradas ao meio, ou em quatro, coubessem nas sobrecartas oficiais — e que fossem “impressas ou datilografadas e sem mais dizeres ou sinais que os nomes dos candidatos e uma legenda devidamente registrada” (art. 71). Tratava-se de normas tão rígidas que dificultavam a preparação pelos próprios eleitores. Além disso, era também possível organizar cédulas com listas nominais de candidatos diferentes daquelas apresentadas pelos partidos ou, ainda, a legislação permitia candidaturas avulsas. Esse foi o caso do Centro Espírita de Uberaba, que, tendo em vista a eleição de 1934, organizou as cédulas obedecendo ao critério inicial de se dar votação em primeiro turno ao candidato avulso Alan Kardec, homônimo do fundador do espiritismo, para depois incluir os nomes dos demais candidatos de partidos diferentes15 15 A pedidos. Política de Uberaba, Lavoura e Comércio, Minas Gerais, 13 out. 1934, p. 4, edição 06732. . Portanto, era crucial para o partido coordenar a distribuição das cédulas em que constasse a lista pré-ordenada dos nomes da chapa oficial, previamente escolhida em convenções partidárias.

Por ocasião das eleições de 1933 e 1934, vários recursos eram utilizados pelos partidos para a confecção das cédulas. Como na época a imprensa tinha forte conotação partidária, as sedes dos jornais se transformaram em local de alistamento e distribuição de cédulas eleitorais. Várias notícias publicadas nos jornais esclareciam os lugares de retirada das cédulas. Às vésperas das eleições de outubro de 1934, a Coligação Republicana por Santa Catarina informava que as cédulas para votação podiam ser retiradas no escritório de Arthur Müller e nas demais zonas designadas pelo diretório do partido e, caso o eleitor, por qualquer motivo, precisasse de auxílio no dia da eleição, em cada mesa eleitoral estaria disponível um fiscal do partido16 16 Aviso, Correio do Povo, Santa Catarina, 13 out. 1934, p. 3, edição 00752. . O Partido Social Democrático do Espírito Santo era mais generoso nas informações veiculadas ao eleitorado, publicando um conjunto de instruções sobre como iria se processar a votação. Quanto às cédulas, as instruções deixavam bem claro que o eleitor que “não tiver consigo a cédula do partido poderá apanhá-la com as pessoas abaixo indicadas”17 17 Instruções aos eleitores correligionários, Diário da Manhã, Espírito Santo, 03 maio 1933, p. 2, edição 03200. . A Federação, órgão oficial do Partido Republicano Liberal no Rio Grande do Sul, informava diariamente aos seus correligionários para comparecer no segundo andar do edifício do jornal para retirar os títulos eleitorais, garantindo o atendimento ininterrupto até o dia do pleito, das 8 da manhã até as 24 horas, inclusive domingo18 18 Aviso aos eleitores do Partido Republicano Liberal, A Federação, Rio Grande do Sul, 29 abr. 1933, p. 2, edição 00100. Sobre a dificuldade dos partidos cearenses na elaboração das cédulas, ver Lima (2020). .

A preparação das cédulas não era garantia de que o eleitor votasse corretamente. Em primeiro lugar, porque a distribuição delas era feita de forma maciça, nas ruas, dias antes da eleição, como noticiava o jornal A Noite, relatando quanto acontecia em São Paulo, onde “os estudantes das escolas superiores são vistos em todos os postos da cidade a sobraçarem maços de cédulas que distribuem fartamente”19 19 Em São Paulo, A Noite, Rio de Janeiro, 02 maio 1933, p. 5, edição 07699. . Mas, também, no dia da eleição, vários mandatários de candidatos operavam nas seções eleitorais tentando convencer o eleitor a trocar a cédula por outra. Nesse aspecto, o próprio Código viabilizava a incerteza ao permitir que os partidos enviassem as cédulas prontas aos Tribunais Regionais para serem postas à disposição dos eleitores no gabinete indevassável (art. 70). A Vida Capichaba, ironicamente, retratava as vicissitudes de um eleitor “estreante” que ao demorar para sair do gabinete indevassável se explicou perante o fiscal da mesa nestes termos: “Seu dotô, tou atrapaiado, aqui tem tanto papé que nem sei quá ei de escoiê”20 20 A estréa do voto secreto, Vida Capichaba, Espírito Santo, 15 maio 1933, p. 13, edição 00340. .

Coordenar os eleitores no dia da eleição era então fundamental para evitar desperdiçar votos. Nesse aspecto, a entrega das cédulas pré-fabricadas à boca de urna constituía uma das práticas mais comuns. Daí a preocupação dos partidos em deixar claro quem eram os encarregados dessa tarefa no dia da eleição. Para tanto, na semana que antecedia o pleito, os jornais de partido publicavam as listas oficiais dos distribuidores de chapas visando facilitar a vida ao eleitor. A competição era acirrada. Perante a seção eleitoral, evidentemente, havia distribuidores de chapas de diferentes partidos que operavam tentando impedir que o eleitor votasse pelos adversários. Nesse caso, as estratégias eram variadas. Havia quem tentasse confundir o eleitor. O Correio Paulistano, órgão do Partido Republicano Paulista, denunciava a distribuição de cédulas falsificadas, isto é, composta de nomes estranhos à lista oficial do partido; algo que podia invalidar o voto na hora da apuração21 21 Cédulas falsificadas, Correio Paulistano, São Paulo, 12 out. 1934, p. 5, edição 24095. . Daí as instruções para impedir que isso acontecesse. Às vésperas das eleições de 1933, o Boletim Cívico, publicado por Alberto Silvares no Distrito Federal, alertava os eleitores que colocassem a cédula pronta em um bolso “previamente escolhido e, à porta das seções, assediado naturalmente por uma chusma de interessados, aceite-as [as outras cédulas] por delicadeza, colocando-as no bolso de fora”22 22 Appareceu o 13° número do “Boletim Civico”, A Noite, Rio Grande do Sul, 05 abr. 1933, p. 13, edição 340. . Mais enfaticamente, O Combate, órgão do Partido Republicano do Maranhão, alertava contra a falsificações das cédulas sugerindo, em primeiro lugar, decorar os nomes dos candidatos, checando as cédulas quando no gabinete indevassável. Entretanto a melhor estratégia seria adquirir a cédula de antemão dos chefes ou correligionários e levá-la consigo para a seção eleitoral23 23 O negreiro PSD, O Combate, Maranhão, 03 out. 1934, p. 1, edição 2669. .

Todos esses exemplos caracterizam a coordenação partidária visando organizar o voto dos eleitores. A fórmula da Primeira República — quando a organização dos eleitores era gerenciada localmente pelos partidos locais (Ricci e Zulini, 2017RICCI, P.; ZULINI, J. P. The meaning of electoral fraud in oligarchic regimes: lessons from the Brazilian case (1899–1930). Journal of Latin American Studies, Cambridge, v. 49, n. 2, p. 243-68, 2017. https://doi.org/10.1017/S0022216X16001371.
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) — teria se mantido nos anos 1930. Como fazia notar o deputado constituinte Leão Sampaio, o eleitor votava de forma inconsciente, sem conhecer os candidatos, seguindo “necessariamente a indicação do seu chefe de quem recebia a cédula para depor nas urnas com todos os aparatos do voto secreto”24 24 Annaes da Assembleia Nacional Constituinte, 1936, v. XVII, p. 373. . Sendo assim, é razoável supor que as inovações previstas pelo Código pouco tenham afetado o domínio dos partidos sobre a lógica do voto25 25 Isso não quer dizer que o domínio partidário fosse o mesmo em todas as unidades da federação, nem que o instrumental adotado pelos candidatos para controlar o eleitor fosse igual ao registrado na Primeira República. Afinal, como estudo recente mostrou (Zulini e Ricci, 2020), o número dos partidos em disputa aumentou significativamente nas eleições de 1933 e 1934 em comparação ao regime anterior. Futuras pesquisas deverão analisar como esse fenômeno, com a criação de partidos pelos interventores e o incremento da própria competição política, pode ter influenciado na adoção de diferentes e novos instrumentos de controle dos eleitores, sobretudo em comparação à Primeira República. A esse respeito, talvez seja promissor pensar na maior ênfase posta pelos partidos na distribuição das cédulas eleitorais à boca de urna como forma mais eficaz para compensar a perda de controle dentro da seção eleitoral, tendo em conta que o eleitor agora passa a votar fora do alcance público, na cabine indevassável. .

Minha preocupação é ir além das referências encontradas nos jornais e avaliar o grau de efetividade no processo de coordenação dos eleitores. Para tanto, sugiro fazer um teste considerando a situação em que o eleitor tem que votar na mesma eleição para dois cargos diferentes, utilizando-se de cédulas separadas. Um exemplo esclarece o ponto. Considera-se a situação em que o eleitor tenha que escolher entre dois partidos políticos, A e B, que disputam simultaneamente dois cargos distintos, x e y. Cada eleitor possui dois votos, um para o cargo x e outro para o y. Caso a coordenação partidária tenha sido eficaz, o eleitor despejará suas preferências para os candidatos do mesmo partido. Uma falha na coordenação resultaria em um voto dividido, isto é, na escolha de um candidato do partido A para o cargo x e um candidato do partido B para o cargo y26 26 Esse tipo de voto é denominado na literatura de voto dividido (no inglês: split ticket vote). . O teste será feito inicialmente considerando a eleição para presidente e vice-presidente na Primeira República, quando o voto era um ato público. Na Primeira República, os presidentes e seus vices eram eleitos simultaneamente, mas, conforme estabelecido pela legislação eleitoral, cada eleitor votava em cédulas diversas27 27 De acordo com o art. 2, da Lei n. 3.208, de 27 dezembro de 1916; art. 56 da Lei n. 1.269, de 15 de novembro de 1904; art. 10, Decreto n. 1.668, de 7 de fevereiro de 1894. . A ideia é mostrar como o controle sobre os eleitores era altíssimo e se transformava em adesão total a apenas uma chapa.

Há uma ressalva a se fazer. Esse teste não pode prescindir da existência de candidatos competitivos. Caso contrário, não se poria o problema do voto dividido. Ainda que estudos recentes tenham mostrado níveis consistentes de competição política para a Câmara dos Deputados (Pinto, 2011PINTO, S. C. S. Só para iniciados… o jogo político na antiga capital federal. Rio de Janeiro: Mauad Editora, 2011.; Ricci e Zulini, 2014RICCI, P.; ZULINI, J. P. Partidos, competição política e fraude eleitoral: a tônica das eleições na Primeira República. Dados, Rio de Janeiro, v. 57, n. 2, p. 443-79, 2014. https://doi.org/10.1590/0011-5258201414.
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; Viscardi e Soares, 2018VISCARDI, C. M. R.; SOARES, L. F. P. Votos, partidos e eleições na Primeira República: a dinâmica política a partir das charges de O Malho. Revista de História, São Paulo, v. 177, a04517, 2018. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9141.rh.2018.134470.
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), esse não era o caso da disputa presidencial. Mais exatamente, meses antes da data prevista para as eleições, os líderes políticos se reuniam em convenções acordando-se em torno da futura presidência e vice-presidência (Viscardi, 2012VISCARDI, C. M. R. O teatro das oligarquias: uma revisão da “Política do Café com Leite”. 2. ed. Belo Horizonte: Fino Traço, 2012.; 2017VISCARDI, C. M. R. Unidos perderemos: a construção do federalismo Republicano brasileiro. Curitiba: CRV, 2017.). Assim, o resultado da eleição era conhecido de antemão. Aqui, portanto, analisaremos apenas as eleições de 1910, 1922 e 1930, tidas como as mais competitivas no período. Em 1910, Hermes da Fonseca derrotou Ruy Barbosa com cerca de 64,4% dos votos naquela que ficou conhecida como umas das primeiras eleições em que os candidatos fizeram campanha eleitoral (Borges, 2011BORGES, V. L. A batalha eleitoral de 1910: imprensa e cultura política na Primeira República. Rio de Janeiro: Apicuri, 2011.). Em 1922, São Paulo e Minas Gerais lançaram a candidatura de Artur Bernardes em oposição a um movimento dissidente denominado Reação Republicana, que apoiava Nilo Peçanha. O primeiro ganhou por 59,5% dos votos (Ferreira, 1993FERREIRA, M. M. A reação republicana e a crise política dos anos 20. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 6, n. 11, p. 9-23, 1993.). Em 1930, no pleito que dividiu o país, Getúlio Vargas foi derrotado por 59,4% dos votos pelo candidato paulista Júlio Prestes. Trata-se, portanto, de três eleições em que os atores políticos estatais não alcançaram um acordo prévio para a sucessão presidencial, resultando em disputa eleitoral. No Quadro 1 se encontram as informações relativas às chapas em disputa.

Quadro 1
Candidaturas para a presidência e vice-presidência da República.

O Gráfico 1 organiza as informações considerando a votação obtida pelas primeiras duas chapas. Denominei de chapa vitoriosa aquela que elege o presidente. A votação obtida pelos vice-presidentes (eixo x) e pelos presidentes (eixo y) é calculada sobre o número total de votantes em cada estado. As bolinhas no gráfico representam a votação para presidente e o respectivo vice em um estado. Se a proporção de votos do presidente e do vice for a mesma, a bolinha estará na linha diagonal tracejada e isso significa que não houve voto dividido28 28 Poder-se-ia argumentar que a ausência de voto dividido seria o resultado da fraude maciça praticada na apuração dos votos. Entretanto há que se considerar que, em primeiro lugar, conforme observado em estudos recentes (Ricci, 2019c; Zulini e Ricci, 2020), as alegações de fraude na contagem dos votos são menores em comparação a demais denúncias. Além disso, a contagem dos votos estava nas mãos da justiça eleitoral, sendo mais difícil de sofrer interferência externa em comparação a outras etapas do processo eleitoral, particularmente o alistamento que restava a cargo dos partidos. . Se a bolinha estiver acima da diagonal, significa que o presidente foi mais votado que o vice; se ela estiver abaixo da diagonal, o vice teve mais votos que o presidente. Em ambos os casos, houve voto dividido.

Gráfico 1
Voto dividido para presidente e vice-presidente da República (1910, 1922, 1930).

O padrão encontrado na Primeira República é nítido e era esperado. O eleitor despejava suas preferências conforme instruções pré-definidas sob o olhar atento dos fiscais de partido29 29 Uma correspondência perfeita entre os votos para presidente e vice resultaria em uma correlação igual a 1. Os valores das correlações (Pearson) para as chapas vitoriosas e as derrotadas são de 0,98 em 1910, 0,75 em 1922 e 0,99 em 1930. O valor de 1922 é relativamente baixo por causa de dois outliers: Mato Grosso e Goiás. Não encontrei explicações para esses casos, sugerindo que, na verdade, trata-se de problemas na divulgação dos resultados. .

Esse teste não pode ser replicado para o período da Segunda República. Entre 1933 e 1937 houve eleições em todos os níveis (federal, estadual e municipal), mas o presidente da República, Getúlio Vargas, foi escolhido de forma indireta pelo Congresso Nacional em julho de 1934. A eleição direta prevista para 1938 nunca aconteceu por causa do golpe de 1937. A solução encontrada foi analisar o pleito de 14 de outubro de 1934. Naquela ocasião houve eleição simultânea para deputados federais e deputados constituintes estaduais, conforme previsto pela Carta Constitucional de 1934. De acordo com as regras eleitorais, o eleitor votava em duas cédulas separadas, uma vez para deputado federal e outra para deputado estadual30 30 O Código Eleitoral de 1932 disciplinava aquelas eleições. O Tribunal Superior de Justiça Eleitoral emitiu uma resolução específica para o pleito de 1934 publicada em 14 de agosto daquele ano no Boletim Eleitoral n. 72. Para uma discussão acerca das eleições ver Ricci e Silva, 2019. Para um enquadramento geral sobre as eleições dos anos 1930, ver Ricci, 2019b. . Assim sendo, é então possível observar um eventual voto dividido comparando a votação nos dois cargos. O Gráfico 2 apresenta esses dados para os dois partidos mais votados, conforme a metodologia especificada anteriormente31 31 Os valores das correlações (Pearson) para as chapas vitoriosas e derrotadas são, respectivamente, de 0,91 e 0,93. Os dados foram coletados em nível estadual. . O padrão observado para a Primeira República se confirma para as eleições dos anos 1930. Salvo casos excepcionais, o voto é dado para o mesmo partido nos dois cargos em disputa.

Gráfico 2
Voto dividido na eleição de 1934.

Para termos resultados mais confiáveis, a análise deveria comparar os resultados eleitorais em um nível inferior ao estado32 32 Trata-se do problema de inferência ecológica: uma correlação forte em nível agregado (no estado) pode esconder uma ausência de correlação em nível individual. Uma solução é utilizar dados agregados em um nível inferior, como as seções eleitorais. . Infelizmente, as informações para os anos 1930 são limitadas. A seguir, apresento no Gráfico 3 os dados coletados para seis estados em nível de município (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo), seção eleitoral (Rio de Janeiro e Sergipe) e zona eleitoral (Piauí). A tendência é confirmada: quando se registra alta percentual de votos na chapa para deputados federais, também se observa uma concomitante alta percentual de votos na chapa do mesmo partido para deputados estaduais33 33 Os valores das correlações (Pearson) para as chapas vitoriosas e derrotadas são, respectivamente, de 0,942 e 0,969. .

Gráfico 3
Voto dividido na eleição de 1934.

CONCLUSÃO

As reformas implementadas em prol do voto secreto ganharam espaço na literatura sobre a democratização (Teorell, Ziblatt e Lehoucq, 2017TEORELL, J.; ZIBLATT, D.; LEHOUCQ, F. An introduction to special issue: the causes and consequences of secret ballot reform. Comparative Political Studies, Thousand Oaks, v. 50, n. 5, p. 531-554, 2017. https://doi.org/10.1177/0010414016641977.
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). O argumento geral de que à medida que o eleitor ganha autonomia diante de pressões e intimidações externas o incumbente tem suas chances de sucesso diminuídas (Przeworski, 2015PRZEWORSKI, A. Suffrage and voting secrecy in general elections. In: ELSTER, J. (ed.). Secrecy and publicity in votes and debates. Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 97-107.) deve ser relativizado. Como este artigo mostrou, muito depende de como as reformas são adotadas e se de fato o legislador opta pelo Australian ballot. No Brasil, o ato de votar foi, em sua essência, público até 1932, parcialmente privado entre 1932 e 1955, secreto para as eleições presidenciais em 1955 e, finalmente, secreto para todos os pleitos a partir de 1965. Nesse sentido, as eleições de 1930 não apontam um momento de transição de um “exercício limitado da cidadania para outro, mais maduro, marcado pela autonomia política” (De Hollanda, 2009DE HOLLANDA, C. B. Modos da representação política: o experimento da Primeira República brasileira. Belo Horizonte: UFMG, 2009.: 259), nem podemos afirmar que “o voto secreto protegia o eleitor das pressões das elites regionais em meio às disputas políticas regionais” (Schwarcz e Starling, 2015SCHWARCZ, L. M.; STARLING, H. M. Brasil: uma biografia – com novo pós-escrito. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.: 362). Tais afirmações são frequentemente elaboradas a partir de um diagnóstico mais amplo sobre as democracias, que associa a reforma do voto secreto ao processo de democratização. Entretanto estudos recentes conduzidos sobre regimes autoritários mostram que a decisão de reescrever as regras eleitorais não coincide necessariamente com o interesse real dos governantes em tornar o regime mais aberto e participativo (Gandhi e Lust-Okar, 2009GANDHI, J.; LUST-OKAR, E. Elections under authoritarianism. Annual Review of Political Science, Palo Alto, v. 12, p. 403-22, 2009. https://doi.org/10.1146/annurev.polisci.11.060106.095434.
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). A manutenção da distribuição das cédulas pelos partidos em 1932 deve ser entendida como uma decisão consciente por parte dos políticos da época visando manter elevado o controle sobre o eleitor. Assim sendo, levando-se em conta os maiores níveis de competição eleitoral e a instituição da justiça eleitoral nos anos 1930, sugerem-se pesquisas futuras para investigar como mudaram as práticas de controle sobre o eleitor.

Tudo considerado, o próximo passo é entender como a cédula eleitoral, a partir de 1955, influenciou o comportamento de partidos e candidatos34 34 Quanto aos eleitores, Gingerich (2019) e Gingerich e Medeiros (2020) argumentam que a adoção da cédula oficial tem funcionado como um teste de educação. Os eleitores menos educados encontraram um obstáculo no ato do voto por causas das maiores dificuldades no preenchimento das cédulas, testemunhado pelo aumento dos votos brancos e nulos, particularmente em regiões com altas taxas de analfabetismo. . Sobretudo, trata-se de validar as assertivas de que “o voto secreto forçou adaptações, mas não alterou o essencial: o controle sobre o comportamento dos eleitores” (Limongi, 2015LIMONGI, F. Fazendo eleitores e eleições: mobilização política e democracia no Brasil Pós-Estado Novo. Dados, Rio de Janeiro, v. 58, n. 2, p. 371-400, 2015. https://doi.org/10.1590/00115258201547.
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: 391) ou de quem argumenta em direção oposta, afirmando que a “grande transformação que se processou na política brasileira durante a Terceira República foi a diminuição do controle exercido pelos partidos/chefes políticos, nem tanto sobre o processo de alistamento, mas sim sobre o voto dos eleitores” (Gomes e Ferreira, 2018GOMES, A. C.; FERREIRA, J. Brasil, 1945–1964: una democracia representativa en consolidación. Estudios del ISHiR, Rosário, v. 8, n. 20, p. 53-74, 2018.: 263). As análises historiográficas sugerem um caminho nesta última direção. Carlos Olímpio, um político local baiano que desde 1934 estava ao lado dos autonomistas, escrevendo a Otávio Mangabeira explicava que a derrota do brigadeiro Eduardo Gomes na Bahia em 1945 se devia à atuação de vários atores: “Escrevo-lhe ainda atordoado das pauladas recebidas nas eleições, vibradas pelos frades, vigários, comunistas, integralistas, passadistas [sic] etc.” (apud Batista, 2017BATISTA, E. E. O declínio do Estado Novo, a legislação eleitoral e a atuação de Otávio Mangabeira na campanha da UDN Baiana – 1945. Oficina do Historiador, Porto Alegre, v. 10, n. 2, p. 9-27, 2017. https://doi.org/10.15448/2178-3748.2017.2.27430.
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: 24). Na Terceira República, diversos atores disputavam entre si a mobilização do eleitor, adotando mecanismos de mobilização diferentes das velhas práticas clientelísticas típicas da Primeira República. Se acrescentarmos a isso o aumento do eleitorado registrado a partir de 1945, é fácil entender que a coordenação eleitoral se tornara cada vez mais uma tarefa extremamente custosa. Portanto, a questão, meramente empírica, é investigar os diversos mecanismos de coordenação encapados por partidos e candidatos, como observar se de fato a introdução da cédula eleitoral em 1955 representa um momento de ruptura.

NOTAS

  • 1
    Na América Latina, tais interpretações remetem à abordagem da Nueva História Política, que deslocou o foco sobre o indivíduo para a ação do coletivo, da sociedade, dos grupos que a compõem (Annino, 1995ANNINO, A. Historia de las elecciones en Iberoamérica, siglo XIX: de la formación del espacio político nacional. Ciudad de Mexico: Fondo de Cultura Económica, 1995.; Posada-Carbó, 2000POSADA-CARBÓ, E. Electoral juggling: a comparative history of the corruption of suffrage in Latin America, 1830–1930. Journal of Latin American Studies, Cambridge, v. 32, n. 3, p. 611-44, 2000. https://doi.org/10.1017/S0022216X00005782.
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    ; Sabato, 2018SABATO, H. Republics of the new world: the revolutionary political experiment in nineteenth-century Latin America. Princeton: Princeton University Press, 2018.).
  • 2
    Em que, por identificação partidária, entendemos a proximidade psicológica e emocional do eleitor com o partido que representaria suas visões e crenças e que, em última instância, manifestar-se-ia em um voto regular em termos de preferências eleitorais.
  • 3
    Alguns países estabeleceram garantias ulteriores, como a de depositar a cédula em um envelope antes de sair do lugar privado em que havia se votado. Como veremos esse será o caso do Brasil, em 1932.
  • 4
    Para uma reconstrução dos debates acerca das propostas visando modificar a legislação eleitoral em defesa do voto secreto até 1930, ver Schlegel e Nobrega (2019)SCHLEGEL, R.; NOBREGA J. Qual voto secreto? O Código Eleitoral de 1932 e as transformações no voto secreto. In: RICCI, P. (org.). O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Editora Appris, 2019. p. 83-108..
  • 5
    A Lei de 1892, no art. 43, § 14, estabelecia que as cédulas não fossem apuradas quando contivessem o nome riscado ou substituído, declaração contrária ao rótulo, ou quando os escrutinadores encontrassem mais de uma cédula dentro de um só invólucro. As mesmas normas se encontram na Lei Rosa e Silva, de 1904, art. 75, § 3, e na Lei n. 3.208, art. 17, § 12.
  • 6
    Lei n. 426, de 7 de dezembro de 1896, art. 8.
  • 7
    De um lado, os tenentistas, encabeçados por Juarez Távora, que defendiam um projeto de Estado forte e o prolongamento da ditatura. De outro lado, quem advogava para um governo constitucional livremente eleito. Para uma compreensão das tensões e disputas políticas nos primeiros anos do Governo Provisório entre esses dois grupos, ver Lopes (2019)LOPES, R. O poder discricionário: ditadura e constitucionalização no Governo Provisório. In: RICCI, P. (org.). O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Appris, 2019. p. 19-40..
  • 8
    O Código Eleitoral de 1932 inovou adotando um sistema eleitoral (quase) proporcional, o voto secreto, o voto feminino, a representação classista, criou a Justiça Eleitoral e instituiu o voto obrigatório. Geralmente apresentado como obra de Assis Brasil, estudo recente tem revelado a multiplicidade dos atores envolvidos na redação desse Código, apontando para a participação de vários juristas e políticos (Zulini, 2019aZULINI, P. J. Obra de Assis Brasil? A tramitação do Código Eleitoral de 1932. In: RICCI, P. (org.). O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Editora Appris, 2019a. p. 41-59.).
  • 9
    A lei exigia que a seção contasse com uma urna suficientemente ampla para que não se acumulasse as sobrecartas na ordem de depósito de modo a facilitar o monitoramento dos eleitores. Essa era outra medida em favor do sigilo do voto, mas que já havia sido adotada na Primeira República.
  • 10
    Interessante a esse propósito a posição de Assis Brasil, que ao publicar a primeira versão do projeto do Código Eleitoral, em 1931, afirmava que o Australian ballot não era conhecido e que no Brasil e “outros países retardatários” o voto secreto correspondia apenas ao voto fechado, definido pelo ato de “meter a cédula numa sobrecarta antes de a depositar na urna” (Brasil, 1931BRASIL, A. Democracia representativa: do voto e do modo de votar. Rio de Janeiro: Imprenta Nacional, 1931.: 75-76). Talvez essa afirmação deva ser lida considerando o momento em que Assis escreve. Ao ser encarregado de elaborar o Código Eleitoral por Getúlio Vargas, sua repulsa ao voto australiano era notória por privar o eleitor de votar em quem quisesse.
  • 11
    O Código Eleitoral determinava que as cédulas fossem (art. 71): a) de forma retangular; b) de cor branca; c) de dimensões tais que, dobradas ao meio, ou em quatro, coubessem nas sobrecartas oficiais; d) impressas ou datilografadas e sem mais dizeres ou sinais que os nomes dos candidatos e uma legenda devidamente registrada.
  • 12
    Era comum o candidato publicar anúncios nos jornais informando os contatos telefônicos para pedidos de cédulas ou o endereço para retirá-las pessoalmente. Ver a título de exemplo, Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 23 set. 1950, p. 3, edição 08566; Diário da Tarde, Paraná, 2 set. 1950, p. 4, edição 17111.
  • 13
    Ver a resolução do Tribunal Superior Eleitoral n. 5.050, de 16 de setembro de 1955, Instruções para apuração das eleições de 3 de outubro de 1955.
  • 14
    Estudos regionais confirmam essa análise. No Rio Grande do Sul, os dois maiores partidos no estado, o Partido Republicano Liberal e a Frente Única Gaúcha, usaram cédulas em papel diferente. Pela dobra da sobrecarta, os fiscais de partido poderiam identificar facilmente o voto do eleitor (Cortés, 2007CORTÉS, C. E. Política Gaúcha: 1930–1964. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007.; Lapuente, 2018LAPUENTE, R. S. A espada de Dâmocles: as eleições de 1933 no Rio Grande do Sul-entre o exílio, repressão e conspiração. Antíteses, Londrina, v. 11, n. 21, 2018. http://dx.doi.org/10.5433/1984-3356.2018v11n21p267.
    http://dx.doi.org/10.5433/1984-3356.2018...
    ).
  • 15
    A pedidos. Política de Uberaba, Lavoura e Comércio, Minas Gerais, 13 out. 1934, p. 4, edição 06732.
  • 16
    Aviso, Correio do Povo, Santa Catarina, 13 out. 1934, p. 3, edição 00752.
  • 17
    Instruções aos eleitores correligionários, Diário da Manhã, Espírito Santo, 03 maio 1933, p. 2, edição 03200.
  • 18
    Aviso aos eleitores do Partido Republicano Liberal, A Federação, Rio Grande do Sul, 29 abr. 1933, p. 2, edição 00100. Sobre a dificuldade dos partidos cearenses na elaboração das cédulas, ver Lima (2020)LIMA, J. R. A Liga Eleitoral Católica é partido político? A LEC e as eleições no Ceará (1933–1934). 2020. 329 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2020..
  • 19
    Em São Paulo, A Noite, Rio de Janeiro, 02 maio 1933, p. 5, edição 07699.
  • 20
    A estréa do voto secreto, Vida Capichaba, Espírito Santo, 15 maio 1933, p. 13, edição 00340.
  • 21
    Cédulas falsificadas, Correio Paulistano, São Paulo, 12 out. 1934, p. 5, edição 24095.
  • 22
    Appareceu o 13° número do “Boletim Civico”, A Noite, Rio Grande do Sul, 05 abr. 1933, p. 13, edição 340.
  • 23
    O negreiro PSD, O Combate, Maranhão, 03 out. 1934, p. 1, edição 2669.
  • 24
    Annaes da Assembleia Nacional Constituinte, 1936, v. XVII, p. 373.
  • 25
    Isso não quer dizer que o domínio partidário fosse o mesmo em todas as unidades da federação, nem que o instrumental adotado pelos candidatos para controlar o eleitor fosse igual ao registrado na Primeira República. Afinal, como estudo recente mostrou (Zulini e Ricci, 2020ZULINI, P. J.; RICCI, P. O Código Eleitoral de 1932 e as eleições da Era Vargas: um passo na direção da democracia? Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 33, n. 71, p. 600-623, 2020. https://doi.org/10.1590/S2178-14942020000300009.
    https://doi.org/10.1590/S2178-1494202000...
    ), o número dos partidos em disputa aumentou significativamente nas eleições de 1933 e 1934 em comparação ao regime anterior. Futuras pesquisas deverão analisar como esse fenômeno, com a criação de partidos pelos interventores e o incremento da própria competição política, pode ter influenciado na adoção de diferentes e novos instrumentos de controle dos eleitores, sobretudo em comparação à Primeira República. A esse respeito, talvez seja promissor pensar na maior ênfase posta pelos partidos na distribuição das cédulas eleitorais à boca de urna como forma mais eficaz para compensar a perda de controle dentro da seção eleitoral, tendo em conta que o eleitor agora passa a votar fora do alcance público, na cabine indevassável.
  • 26
    Esse tipo de voto é denominado na literatura de voto dividido (no inglês: split ticket vote).
  • 27
    De acordo com o art. 2, da Lei n. 3.208, de 27 dezembro de 1916; art. 56 da Lei n. 1.269, de 15 de novembro de 1904; art. 10, Decreto n. 1.668, de 7 de fevereiro de 1894.
  • 28
    Poder-se-ia argumentar que a ausência de voto dividido seria o resultado da fraude maciça praticada na apuração dos votos. Entretanto há que se considerar que, em primeiro lugar, conforme observado em estudos recentes (Ricci, 2019cRICCI, P. As eleições da Era Vargas: que regime representativo é esse? In: RICCI, P. O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Appris, 2019c. p. 229-247.; Zulini e Ricci, 2020ZULINI, P. J.; RICCI, P. O Código Eleitoral de 1932 e as eleições da Era Vargas: um passo na direção da democracia? Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 33, n. 71, p. 600-623, 2020. https://doi.org/10.1590/S2178-14942020000300009.
    https://doi.org/10.1590/S2178-1494202000...
    ), as alegações de fraude na contagem dos votos são menores em comparação a demais denúncias. Além disso, a contagem dos votos estava nas mãos da justiça eleitoral, sendo mais difícil de sofrer interferência externa em comparação a outras etapas do processo eleitoral, particularmente o alistamento que restava a cargo dos partidos.
  • 29
    Uma correspondência perfeita entre os votos para presidente e vice resultaria em uma correlação igual a 1. Os valores das correlações (Pearson) para as chapas vitoriosas e as derrotadas são de 0,98 em 1910, 0,75 em 1922 e 0,99 em 1930. O valor de 1922 é relativamente baixo por causa de dois outliers: Mato Grosso e Goiás. Não encontrei explicações para esses casos, sugerindo que, na verdade, trata-se de problemas na divulgação dos resultados.
  • 30
    O Código Eleitoral de 1932 disciplinava aquelas eleições. O Tribunal Superior de Justiça Eleitoral emitiu uma resolução específica para o pleito de 1934 publicada em 14 de agosto daquele ano no Boletim Eleitoral n. 72. Para uma discussão acerca das eleições ver Ricci e Silva, 2019RICCI, P.; SILVA, G. A representação (quase) proporcional e os pleitos de 1933 e 1934. In: RICCI, P. O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Editora Appris, 2019. p. 61-81.. Para um enquadramento geral sobre as eleições dos anos 1930, ver Ricci, 2019bRICCI, P. O autoritarismo eleitoral dos anos trinta e o Código Eleitoral. Curitiba: Appris, 2019b..
  • 31
    Os valores das correlações (Pearson) para as chapas vitoriosas e derrotadas são, respectivamente, de 0,91 e 0,93. Os dados foram coletados em nível estadual.
  • 32
    Trata-se do problema de inferência ecológica: uma correlação forte em nível agregado (no estado) pode esconder uma ausência de correlação em nível individual. Uma solução é utilizar dados agregados em um nível inferior, como as seções eleitorais.
  • 33
    Os valores das correlações (Pearson) para as chapas vitoriosas e derrotadas são, respectivamente, de 0,942 e 0,969.
  • 34
    Quanto aos eleitores, Gingerich (2019)GINGERICH, D. W. Ballot reform as suffrage restriction: evidence from Brazil's Second Republic. American Journal of Political Science, Oxford, v. 63, n. 4, p. 920-35, 2019. https://doi.org/10.1111/ajps.12438.
    https://doi.org/10.1111/ajps.12438...
    e Gingerich e Medeiros (2020)GINGERICH, D. W.; MEDEIROS, D. Vote secrecy with diverse voters. Comparative Political Studies, Thousand Oaks, v. 53, n. 3-4, p. 567-600, 2020. https://doi.org/10.1177/0010414019859040.
    https://doi.org/10.1177/0010414019859040...
    argumentam que a adoção da cédula oficial tem funcionado como um teste de educação. Os eleitores menos educados encontraram um obstáculo no ato do voto por causas das maiores dificuldades no preenchimento das cédulas, testemunhado pelo aumento dos votos brancos e nulos, particularmente em regiões com altas taxas de analfabetismo.
  • *
    Este texto é produto da pesquisa realizada no âmbito do projeto “Partidos, fraude e mobilização eleitoral entre 1889 e 1964.
  • Fonte de financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (processo n. 18/23060-2) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico na modalidade Bolsa Produtividade Nível 2 (processo n. 307864/2020-0).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Fev 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    10 Set 2021
  • Aceito
    05 Nov 2021
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