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Avaliação da aderência à diretriz de cuidados para náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a adesão dos médicos prescritores, de um centro privado especializado em oncologia, à diretriz de antiêmese profilática da American Society of Clinical Oncology, no primeiro ciclo de quimioterapia antineoplásica.

Métodos:

Foram avaliados retrospectivamente 139 esquemas de quimioterapia, de 105 pacientes, tratados no período de 2011 a 2013.

Resultados:

Foram observados 78% de taxa de não adesão à diretriz. As principais discordâncias com a diretriz foram prescrição de doses mais elevadas de dexametasona e uso excessivo de antagonista 5-HT3 para regimes de quimioterapia de risco emetogênico baixo. Pela análise univariada, malignidades hematológicas (p=0,005), uso de dois ou mais quimioterápicos (p=0,05) e regimes de alto risco emetogênico (p=0,012) foram fatores estatisticamente associados a maior adesão à diretriz. O tratamento baseado em paclitaxel foi o único fator estatisticamente significativo para a não adesão (p=0,02). Pela análise multivariada, a quimioterapia de alto risco emetogênico apresentou maior correlação com a adesão à diretriz (p=0,05).

Conclusão:

Houve maior aderência para a quimioterapia de alto risco emetogênico. Esforços educacionais devem se concentrar mais intensamente na gestão de regimes de quimioterapia com potencial emetogênico baixo e moderado. Talvez o desenvolvimento de lembretes gerados por sistemas informatizados possa melhorar a aderência à diretriz.

Descritores:
Náusea/induzido quimicamente; Vômito/induzido quimicamente; Protocolos clínicos; Adesão a diretivas antecipadas; Quimioterapia/efeitos adversos; Antieméticos

ABSTRACT

Objective:

To assess adherence of the prescribing physicians in a private cancer care center to the American Society of Clinical Oncology guideline for antiemetic prophylaxis, in the first cycle of antineoplastic chemotherapy.

Methods:

A total of 139 chemotherapy regimens, of 105 patients, were evaluated retrospectively from 2011 to 2013.

Results:

We observed 78% of non-adherence to the guideline rate. The main disagreements with the directive were the prescription of higher doses of dexamethasone and excessive use of 5-HT3 antagonist for low risk emetogenic chemotherapy regimens. On univariate analysis, hematological malignancies (p=0.005), the use of two or more chemotherapy (p=0.05) and high emetogenic risk regimes (p=0.012) were factors statistically associated with greater adherence to guidelines. Treatment based on paclitaxel was the only significant risk factor for non-adherence (p=0.02). By multivariate analysis, the chemotherapy of high emetogenic risk most correlated with adherence to guideline (p=0.05).

Conclusion:

We concluded that the adherence to guidelines is greater if the chemotherapy regime has high emetogenic risk. Educational efforts should focus more intensely on the management of chemotherapy regimens with low and moderate emetogenic potential. Perhaps the development of a computer generated reminder may improve the adherence to guidelines.

Keywords:
Nausea/chemically induced; Vomiting/chemically induced; Clinical protocols; Advance directive adherence; Drug therapy/adverse effects; Antiemetics

INTRODUÇÃO

O tratamento de suporte clínico é fundamental no combate ao câncer. Muito do estigma relacionado às neoplasias malignas deve-se aos efeitos colaterais do tratamento, principalmente as náuseas e os vômitos incontroláveis.(11. Hesketh PJ. Chemotherapy-induced nausea and vomiting. N Engl J Med 2008; 358(23):2482-94. Review.) O manejo adequado desses sintomas possibilita melhora na qualidade de vida e maior aderência ao tratamento oncológico.(11. Hesketh PJ. Chemotherapy-induced nausea and vomiting. N Engl J Med 2008; 358(23):2482-94. Review.,22. Basch E, Prestrud AA, Hesketh PJ, Kris MG, Feyer PC, Somerfield MR, Chesney M, Clark-Snow RA, Flaherty AM, Freundlich B, Morrow G, Rao KV, Schwartz RN, Lyman GH; American Society of Clinical Oncology. Antiemetics: American Society of Clinical Oncology clinical practice guideline update. J Clin Oncol. 2011;29(31):4189-98. Review. Erratum in: J Clin Oncol. 2014;32(19):2117.)

Ao longo do tempo, diversas medicações foram desenvolvidas para prevenir náusea e vômito relacionados à quimioterapia.(33. Hesketh PJ, Kris MG, Grunberg SM, Beck T, Hainsworth JD, Harker G, et al. Proposal for classifying the acute emetogenicity of cancer chemotherapy. J Clin Oncol. 1997;15(1):103-9. Review.) As três principais classes de drogas usadas para tal objetivo são os glicocorticoides, os antagonistas dos receptores de 5-hidroxitriptamina (5-HT3) e os antagonistas dos receptores de neurocinina 1 (NK-1).(33. Hesketh PJ, Kris MG, Grunberg SM, Beck T, Hainsworth JD, Harker G, et al. Proposal for classifying the acute emetogenicity of cancer chemotherapy. J Clin Oncol. 1997;15(1):103-9. Review.) Uma vez que essas medicações não são isentas de efeitos colaterais e muitas delas possuem custo elevado, faz-se necessário o uso racional e fundamentado nas melhores evidências científicas.

Em 1997, foi proposta uma estratificação do potencial emetogênico dos agentes quimioterápicos de maneira isolada ou de suas combinações.(33. Hesketh PJ, Kris MG, Grunberg SM, Beck T, Hainsworth JD, Harker G, et al. Proposal for classifying the acute emetogenicity of cancer chemotherapy. J Clin Oncol. 1997;15(1):103-9. Review.) Mais recentemente, em 2011, Grunberg et al.(44. Grunberg SM, Warr D, Gralla RJ, Rapoport BL, Hesketh PJ, Jordan K, et al. Evaluation of new antiemetic agents and definition of antineoplastic agent emetogenicity–state of the art. Support Care Cancer. 2011;19 Suppl 1:S43-7. Review.) atualizaram a classificação e dividiram os quimioterápicos em alto, moderado, baixo ou mínimo potencial emetogênico. A partir dessa proposta, foram desenvolvidas recomendações para padronização do uso de antieméticos de maneira profilática.(55. Schnipper LE, Lyman GH, Blayney DW, Hoverman JR, Raghavan D, Wollins DS, et al. American Society of Clinical Oncology 2013 top five list in oncology. J Clinl Oncol. 2013;31(34):4362-70.77. Stefani SD, Brum C. Uso de antieméticos. Rev Bras Cuidados Paliativos. 2011: (3):5-11.)

OBJETIVO

Avaliar a adesão dos médicos prescritores, de um centro privado especializado em oncologia, à diretriz de antiêmese profilática da American Society of Clinical Oncology (ASCO), no primeiro ciclo de quimioterapia antineoplásica. Após, caracterizar as diferenças entre as condutas sugeridas pela diretriz e as realizadas na prática clínica, e avaliar os fatores que contribuíram para adesão ou não aos protocolos.

MÉTODOS

Tratou-se de um estudo retrospectivo e descritivo, em que foram coletados dados das prescrições do primeiro ciclo de quimioterapia das unidades de internação do Hospital Israelita Albert Einstein e do setor de quimioterapia ambulatorial de pacientes que realizaram quimioterapia entre setembro de 2011 e fevereiro de 2013. Foram incluídos pacientes de modo consecutivo, com 18 anos ou mais, que receberam tratamento oncológico tanto para neoplasias hematológicas quanto sólidas. Pacientes que realizaram mais de uma linha de quimioterapia durante o período tiveram todos os primeiros ciclos incluídos e analisados, uma vez que a diretriz utilizada foi publicada em 2011. Foram excluídos pacientes com informação insuficiente sobre o tratamento, em quimioterapia e radioterapia concomitantes, e em tratamentos com droga-alvo exclusivamente (por exemplo: anticorpos monoclonais e inibidor de tirosina quinase). Os agentes antieméticos utilizados para profilaxia foram avaliados com relação à classe terapêutica e à dose. Foi analisado apenas o uso de antieméticos endovenosos prescritos na quimioterapia realizada no hospital. A diretriz utilizada para avaliar a adequação das prescrições foi a recomendação definida pela ASCO em 2011.(22. Basch E, Prestrud AA, Hesketh PJ, Kris MG, Feyer PC, Somerfield MR, Chesney M, Clark-Snow RA, Flaherty AM, Freundlich B, Morrow G, Rao KV, Schwartz RN, Lyman GH; American Society of Clinical Oncology. Antiemetics: American Society of Clinical Oncology clinical practice guideline update. J Clin Oncol. 2011;29(31):4189-98. Review. Erratum in: J Clin Oncol. 2014;32(19):2117.)

As seguintes variáveis foram investigadas com relação à adesão à diretriz: sexo; idade; tumores sólidos (incluindo carcinoma de pulmão de células não pequenas, mama, ovário, cólon, cervical, sítio primário indefinido, bexiga e pâncreas); e tumores hematológicos (incluindo mieloma múltiplo, linfomas não Hodgkin e leucemias, fonte pagadora - particular ou plano de saúde, regime quimioterápico, idade do prescritor, potencial emetogênico e o objetivo da quimioterapia - adjuvante, neoadjuvante, remissiva ou paliativa).

Os dados categóricos foram apresentados na forma de percentagem. Para avaliação de correlações entre variáveis categóricas, utilizou-se o teste de χ2 ou Fisher. Cada variável foi analisada em modelo univariado e aquelas que atingiram nível de significância ≤0,2 foram analisadas em modelo multivariado. Foi considerado resultado com significância estatística quando p≤0,05.

Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein (número 567.613, em 25 de março de 2014, CAAE: 25697213.8.0000.0071)), com isenção de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, pois se tratou de projeto retrospectivo e de caráter epidemiológico. Foram utilizados dados historicamente registrados em bancos de dados, não havendo, assim, nenhuma manipulação de informações individuais, identificação nominal dos pacientes ou nenhum tipo de experimento com seres humanos, de modo que não houve risco individual envolvido.

RESULTADOS

Entre janeiro a novembro de 2013, 208 prescrições de 186 pacientes foram avaliadas. Dessas, 139 prescrições de quimioterapias, em 105 pacientes, preencheram os critérios de inclusão. Eram do sexo masculino 51% dos pacientes. A idade mediana dos pacientes foi 56 anos (19 a 89 anos). Os tumores sólidos foram as neoplasias mais comuns (56%); dentre estes; as neoplasias de pulmão de células não pequenas (16%), mama (14%) e cólon (6,5%) foram as mais frequentes, enquanto que o linfoma não Hodgkin foi a neoplasia hematológica mais frequente (13,5%). Com relação ao tratamento, 43% tinham moderado potencial emetogênico, 48% tinham intuito paliativo e 84% foram financiados por planos de saúde (Tabela 1).

Tabela 1
Características dos pacientes e dos tratamentos

Com relação à adesão aos protocolos, 78% (109/139) estavam em desacordo com as diretrizes da ASCO de 2011.(22. Basch E, Prestrud AA, Hesketh PJ, Kris MG, Feyer PC, Somerfield MR, Chesney M, Clark-Snow RA, Flaherty AM, Freundlich B, Morrow G, Rao KV, Schwartz RN, Lyman GH; American Society of Clinical Oncology. Antiemetics: American Society of Clinical Oncology clinical practice guideline update. J Clin Oncol. 2011;29(31):4189-98. Review. Erratum in: J Clin Oncol. 2014;32(19):2117.) O principal motivo de não adesão foi a prescrição de fármacos (dexametasona, antagonistas 5-HT3 e NK-1) em dose maior que a preconizada em todos os casos de grau emetogênico (mínimo, baixo, moderado ou alto), ou seja, em 44% (48/109) dos casos. O fármaco mais prescrito em doses acima do preconizado foi a dexametasona, ou seja, em 81% (39/48) das vezes. Cerca de 30% das prescrições apresentaram duplo desacordo (associação de duas discordâncias), sendo, altas doses de dexametasona e uso indiscriminado de antagonistas 5-HT3 a combinação mais comum, encontrada em 35% (11/31) do casos (Tabela 2).

Tabela 2
Motivos de não adesão ao protocolo da American Society of Clinical Oncology

Do total de prescrições, 47 continham erro de indicação de droga (falta ou excesso), sendo os cenários mais frequentes o uso indiscriminado de antagonistas 5-HT3 (16/47; 34%) para regimes de baixo potencial emetogênico e antagonistas NK-1 (7/47; 15%) para regimes de moderado potencial emetogênico.

Fatores associados a não adesão às diretrizes

Em análise univariada, idade (< ou ≥65 anos), sexo do paciente, idade do prescritor (< ou ≥45 anos) e fonte pagadora (plano de saúde ou particular) não tiveram impacto quanto à aderência ao protocolo. No entanto, tratamentos de tumores hematológicos (36% versus 15%; p=0,005), tratamentos de alto potencial emetogênico (34% versus 15%; p=0,013) e tratamentos com dois ou mais agentes quimioterápicos (26% versus 9%; p=0,05) tiveram associação com maior taxa de adesão ao protocolo.

Tratamentos que incluíram taxanos (0% versus 25%; p=0,02) tiveram menor aderência (Tabela 3). Não houve associação estatisticamente significativa entre a prescrição de cisplatina e a aderência ao protocolo da ASCO (p=0,27).

Tabela 3
Correlação de fatores e adequação de Protocolo Brasileiro e da American Society of Clinical Oncology – análise univariada e multivariada

Em análise multivariada, a única variável que tendeu a associação significativa à adesão ao protocolo de êmese foi a quimioterapia de alto potencial emetogênico (p=0,05). As demais variáveis que tinham sido significativas na análise univariada não foram determinantes após a análise multivariada para adesão ou não às diretrizes (Tabela 3).

DISCUSSÃO

O controle de náusea e vômito depende de diversos fatores, com destaque para a doença de base (envolvimento do trato gastrintestinal), as classes de agentes quimioterápicos e a predisposição individual de cada paciente. A fim de otimizar o manejo desse efeito colateral, muito se investiga a respeito dos mecanismos desencadeadores, do potencial emetogênico de cada agente neoplásico e da melhor estratégia para a prevenção da êmese.

Para isso, as sociedades mundiais de oncologia e de cuidados paliativos desenharam diretrizes para indicar o regime(22. Basch E, Prestrud AA, Hesketh PJ, Kris MG, Feyer PC, Somerfield MR, Chesney M, Clark-Snow RA, Flaherty AM, Freundlich B, Morrow G, Rao KV, Schwartz RN, Lyman GH; American Society of Clinical Oncology. Antiemetics: American Society of Clinical Oncology clinical practice guideline update. J Clin Oncol. 2011;29(31):4189-98. Review. Erratum in: J Clin Oncol. 2014;32(19):2117.,66. Roila F, Herrstedt J, Aapro M, Gralla RJ, Einhorn LH, Ballatori E, Bria E, Clark-Snow RA, Espersen B T, Feyer P, Grunberg SM, Hesketh PJ, Jordan K, Kris MG, Maranzano E, Molassiotis A, Morrow G, Olver I, Rapoport BL, Rittenberg C, Saito M, Tonato M, Warr D; ESMO/MASCC Guidelines Working Group. Guideline update for MASCC and ESMO in the prevention of chemotherapy-and radiotherapy-induced nausea and vomiting: results of the Perugia consensus conference. Ann Oncol. 2010;21 Suppl 5:v232-43. Review.,77. Stefani SD, Brum C. Uso de antieméticos. Rev Bras Cuidados Paliativos. 2011: (3):5-11.) antiemético mais apropriado para cada agente antineoplásico isoladamente ou em associação e, assim, facilitar o manejo de paciente oncológico, baseando-se nas melhores evidências científicas.

Este estudo utilizou as diretrizes da ASCO(22. Basch E, Prestrud AA, Hesketh PJ, Kris MG, Feyer PC, Somerfield MR, Chesney M, Clark-Snow RA, Flaherty AM, Freundlich B, Morrow G, Rao KV, Schwartz RN, Lyman GH; American Society of Clinical Oncology. Antiemetics: American Society of Clinical Oncology clinical practice guideline update. J Clin Oncol. 2011;29(31):4189-98. Review. Erratum in: J Clin Oncol. 2014;32(19):2117.) para avaliar a adesão dos oncologistas às recomendações preconizadas. Embora essas informações sejam amplamente disponíveis, constatamos que a adesão à diretriz foi baixa (22%). Estudo europeu, que considerou apenas esquemas de moderado e alto potencial emetogênico, encontrou taxas de adesão de 55%, ou seja, superiores às nossas.(88. Aapro M, Molassiotis A, Dicato M, Peláez I, Rodríguez-Lescure Á, Pastorelli D, Ma L, Burke T, Gu A, Gascon P, Roila F; PEER investigators. The effect of guideline-consistent antiemetic therapy on chemotherapy-induced nausea and vomiting (CINV): the Pan European Emesis Registry (PEER). Ann Oncol. 2012;23(8):1986-92.)

Essa diferença talvez seja decorrente da inclusão de esquemas de mínimo e baixo potencial emetogênico em nossa análise (32/139; 23%) e da constatação de que regimes de alto potencial emetogênico foram os únicos com tendência de associação à adesão em análise multivariada (p=0,05). Outros estudos tiveram taxa de aderência a diretrizes de antieméticos variando entre 3 a 42%.(88. Aapro M, Molassiotis A, Dicato M, Peláez I, Rodríguez-Lescure Á, Pastorelli D, Ma L, Burke T, Gu A, Gascon P, Roila F; PEER investigators. The effect of guideline-consistent antiemetic therapy on chemotherapy-induced nausea and vomiting (CINV): the Pan European Emesis Registry (PEER). Ann Oncol. 2012;23(8):1986-92.1212. Koch S, Wein A, Siebler J, Boxberger F, Neurath M F, Harich HD, et al. Antiemetic prophylaxis and frequency of chemotherapy-induced nausea and vomiting in palliative first-line treatment of colorectal cancer patients: the Northern Bavarian IVOPAK I Project. Support Care Cancer. 2013;21(9):2395-402.)

A taxa de aderência a diretrizes, em geral, varia também dentro de cada especialidade médica.(1313. Kenefick H, Lee J, Fleishman V. Barriers to guidelines adherence. Improving physician adherence to clinical practice guidelines: barriers and strategies for change. Cambridge: New England Healthcare Institute; 2008.) Segundo estudo inglês, 70% dos cardiologistas e 25% dos ortopedistas aderem a protocolos. Neste estudo, não foi mencionado especificamente a aderência de oncologistas.(1313. Kenefick H, Lee J, Fleishman V. Barriers to guidelines adherence. Improving physician adherence to clinical practice guidelines: barriers and strategies for change. Cambridge: New England Healthcare Institute; 2008.) Este mesmo estudo discute alguns pontos que podem dificultar a aderência, como o sistema de pagamento baseado em volume e não em performance; a barreira tecnológica, ainda realidade para alguns profissionais, dificultando o acesso aos protocolos; fatores culturais de médicos que se baseiam fundamentalmente na experiência pessoal para definição de sua prática clínica; e, finalmente, nas próprias limitações de algumas diretrizes, que têm pouca flexibilidade de condutas e não refletem a complexidade do mundo real.(1313. Kenefick H, Lee J, Fleishman V. Barriers to guidelines adherence. Improving physician adherence to clinical practice guidelines: barriers and strategies for change. Cambridge: New England Healthcare Institute; 2008.)

O principal motivo para a não adesão às diretrizes neste estudo foi a prescrição de maior dose de droga (44%). Foi observado também que os erros de indicação de drogas ocorreram em 34% (47/139) das prescrições, sendo mais frequente o uso indiscriminado de antagonistas 5-HT3, para regimes de baixo potencial emetogênico, e de antagonistas NK-1, para regimes de moderado potencial emetogênico.

O uso de mais drogas que o preconizado foi mostrado em outros estudos, como o de Burmeister et al., (99. Burmeister H, Aebi S, Studer C, Fey M F, Gautschi O. Adherence to ESMO clinical recommendations for prophylaxis of chemotherapy-induced nausea and vomiting. Support Care Cancer. 2012;20(1):141-7.) em que 72% dos pacientes submetidos à quimioterapia de baixo risco emetogênico receberam antagonistas de serotonina e 24% dos que realizaram tratamento de moderado poder emetogênico utilizaram antagonistas NK-1.(99. Burmeister H, Aebi S, Studer C, Fey M F, Gautschi O. Adherence to ESMO clinical recommendations for prophylaxis of chemotherapy-induced nausea and vomiting. Support Care Cancer. 2012;20(1):141-7.)

O uso excessivo de dose ou de agentes farmacológicos encarece o tratamento e não traz beneficio no controle dos sintomas. Estima-se que 30% do dinheiro investido em saúde poderia ser economizado sem a redução da qualidade da assistência oferecida, se houve aderência às diretrizes médicas.(1313. Kenefick H, Lee J, Fleishman V. Barriers to guidelines adherence. Improving physician adherence to clinical practice guidelines: barriers and strategies for change. Cambridge: New England Healthcare Institute; 2008.)

Em 2013, a ASCO publicou uma lista de cinco práticas importantes em oncologia, a qual contemplava o uso abusivo ou inadequado de testes e/ou procedimentos que oferecem pouco benefício e podem até ser prejudiciais aos pacientes.(55. Schnipper LE, Lyman GH, Blayney DW, Hoverman JR, Raghavan D, Wollins DS, et al. American Society of Clinical Oncology 2013 top five list in oncology. J Clinl Oncol. 2013;31(34):4362-70.) Um dos pontos discutidos nesta lista é o uso de antieméticos indicados para quimioterapias de alto poder emetogênico em esquemas com baixo ou moderado poder, refletindo exatamente o principal motivo de não adesão em nosso estudo: o excesso de medicação (dose e/ou número de agentes).

Acreditamos que, a partir dos resultados expostos, náuseas e vômitos são frequentes efeitos colaterais de quimioterápicos e, pelo incômodo que causam nos pacientes, os médicos tendem a utilizar todos os recursos disponíveis com o intuito de preservar a qualidade de vida e de garantir o sucesso do tratamento oncológico.

Este estudo contém limitações, pois se tratou de uma análise retrospectiva e baseada na experiência de uma única instituição. Não pretendemos definir de maneira absoluta a prática clínica em nosso meio, mas nossos resultados vão ao encontro de dados da literatura e, portanto, em conjunto, demonstram que muito pode ser feito para aproximar a prática clínica da medicina baseada em evidência.

A criação de mecanismo de incentivo e a checagem da adesão aos protocolos podem ser estratégias para o contínuo aprimoramento da assistência à saúde prestada. Medidas como educação médica continuada, com ênfase para manejo de náuseas e vômitos de regimes quimioterápicos de moderado e baixo risco emetogênico, avaliação profissional por fatores de qualidade e performance, e criação de programas de informática que gerem lembretes quando houver desacordo entre a prescrição e às recomendações das sociedades médicas devem ser encorajadas, a fim de melhorar a adesão às diretrizes.

CONCLUSÃO

A adesão às diretrizes de antiêmese profilática da American Society of Clinical Oncology foi baixa, no primeiro ciclo de quimioterapia antineoplásica. A droga mais frequentemente prescrita em dose inadequada foi a dexametasona. A única variável que tendeu a associação significativa em análise multivariada em relação à adesão ao protocolo de êmese foi a quimioterapia de alto potencial emetogênico.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos à enfermeira Alessandra Cristina Mansur e à técnica administrativa Jacilene Marques de Morais do Ambulatório de Quimioterapia do Hospital Israelita Albert Einstein, por terem ajudado a levantar os registros dos pacientes tratados na instituição.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    26 Mar 2014
  • Aceito
    24 Abr 2015
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