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Estruturação de comunicações: uma nova abordagem

ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

Estruturação de comunicações: uma nova abordagem

Ariclê Vechia

Mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná. Professora Assistente do Departamento de Métodos e Técnicas da Educação da Universidade Federal do Paraná

Introdução

Um dos temas mais discutidos por parte dos educadores, no que diz respeito ao planejamento e a implementação do currículo, tem sido a melhor maneira de apresentar o conteúdo da matéria de ensino ao aluno, de modo a facilitar a aquisição de conhecimentos (Bruner, 1973; Bloom, 1973; Travers, 1973).

A apresentação dos conteúdos propostos nos planos curriculares é feita pelo professor ao aluno, principalmente na forma verbal, quer pela exposição oral ou por meio de material escrito, tais como livros didáticos, textos elaborados pelo professor, modulos de ensino, etc.. Sendo assim, torna-se de suma importância examinar as varias formas de organização destas comunicações orais e escritas, bem como verificar sua influência sobre a aquisição de conhecimentos por parte do aluno. Pois, segundo Bruner (1968), citado por Ronca (1976).

A função adequada do professor é apresentar a Informação de tal forma, e através de tal estrutura, que o aprendiz possa obter o máximo progresso regenerativo do material a que foi exposto. Isso propõe, imediatamente, a complexa e produtiva questão da maneira de apresentar diferentes tipos de material, a fim de atender adequadamente a essa função especifica do ensino (p. 9).

Muitos teóricos, tais como Bruner (1973), Gagné (1971), Ausubel (1968) e outros, desenvolveram estudos destacando a importância da estrutura do conteúdo da matéria de ensino, para que o mesmo seja transmitido de maneira eficiente. Estes estudos foram desenvolvidos com base no princípio da facilitação proativa, ou seja, de que a aprendizagem anterior deve facilitar a aprendizagem posterior.

Baseado no mesmo Drincípio, porém a nível mais específico, Anderson (1969, 1971) introduziu no ensino um conceito sobre a estrutura da comunicação verbal denominada Estrutura Cinética (Kinetic Structure). Seu objeto de estudo é a estrutura das declarações contidas numa comunicação verbal de conteúdos curriculares.

O presente trabalho tem por objetivo apresentar o conceito de estrutura da comunicação verbal, proposto por Anderson, bem como relatar os resultados de uma pesquisa feita para testar o efeito de comunicações elaboradas segundo esse conceito sobre a aprendizagem dos alunos. O estudo propõe uma série de possibilidades para desenvolver uma linha de pesquisa sobre o assunto.

Teoria da Estrutura Cinética * * Este texto se constituí numa síntese das idéias de Anderson expressas em seus estudos publicados em 1963, 1970, 1971, 1972 e 1974.

O. Roger Anderson (1969, 1971) do Teachers College da Columbia University, desenvolveu, com base em certos princípios biológicos e psicológicos, uma teoria sobre a estrutura da comunicação verbal no ensino, bem como elaborou um método quantitativo de analise que permite determinar o grau de uma comunicação.

O conceito de estrutura no ensino, foi construído com base no pressuposto de que a aprendizagem anterior, quando bem organizada, irá facilitar a aprendizagem posterior. Para Anderson, esta facilitação proativa da aprendizagem ocorre quando declarações contíguas do professor contêm algum material verbal em comum. Desta forma, quando existe uma repetição de palavras em declaracões verbais consecutivas, a aquisição do conteúdo da segunda declaração será facilitada pela aquisição do conteúdo da primeira (1969, 1971).

Para desenvolver sua teoria, Anderson utilizou princípios da Biologia e da Psicologia, dos quais retirou algumas idéias básicas, que são as seguintes:

1. Os indivíduos possuem receptores e cadeias nervosas sensíveis aos estímulos Periódicos;

2. Durante a ontogenia humana, o repetido passar de olhos no ambiente produz na retina uma sucessão de imagens, nas quais cada imagem contém alguns elementos em comum com as imagens contíguas. Estas experiências predispõem o organismo a antecipar propriedades comuns, ou elementos comuns, em estímulos sucessivos.

Baseado nestes argumentos extrapolou e concluiu que:

- linguagem e pensamento são produtos desta influência genética. Em parte, ambos são processos seriados, nos quais unidades contíguas contêm elementos em comum;

- a aquisição de material verbal é sujeita à mesma influência, de tal maneira que a aquisição do material verbal é reforçada quando unidades verbais contíguas (declarações) de uma comunicação contêm elementos verbais (palavras) idênticos ou outras propriedades em comum (1971, p. 1).

O termo Estrutura Cinética foi escolhido uma vez que o objeto de analise é o número de idéias interligadas, como que em movimento, de uma declaração a outra numa comunicação. Portanto, quanto maior o número de idéias repetidas, representadas pelo que Anderson chama de Elementos Verbais, em pares consecutivos de declarações, maior serã o grau de Estrutura Cinética.

Um Elemento Verbal é qualquer nalavra ou termo significativo em um campo específico do conhecimento, ou ainda, é uma palavra - substantivo, adjetivo ou verbo - representando uma idéia substantiva (1971, p. 7).

Estrutura Cinética em comunicação verbal é, portanto, a organização serial da comunicação e a relação entre declarações contíguas, mediante atributos (palavras) mantidas em comum (Anderson, 1971, p. 7).

Este conceito está ilustrado na Figura 1.


Cada retângulo representa uma unidade de discurso ou declaração e as letras representam elementos verbais. Para simplificar, foram colocados apenas três elementos verbais em cada retângulo. As flechas entre as declarações mostram a presença de elementos verbais comuns. Como pode-se notar, a serie de quatro declarações varia em quantidade de elementos verbais repetidos em declarações contíguas. Desta forma, a quantidade de estrutura de uma comunicação pode ser determinada pelo numero de elementos verbais que unem os pares de declarações contíguas, possíveis numa comunicação.

A presença de elementos verbais mantidos em comum, isto é, a ocorrência da mesma idéia em declarações contíguas numa comunicação é chamada commonality (1971, p.7). Existe uma relação direta entre commonality e aquisição de conhecimentos. Pois, segundo a teoria, quando duas declarações contíguas contêm alguns elementos verbais comuns, a aquisição do conteúdo da primeira irá facilitar a aquisição do conteúdo da segunda (1971, p. 8).

Commonality é um conceito básico pelo qual é identificada a presença de estrutura numa comunicação. Portanto, pode-se afirmar que a quantidade de commomtity representa o grau de estrutura de uma comunicação. Logo, segundo a teoria, a aquisição de conhecimentos e sua estabilidade na memoria será diretamente relacionada ao grau de estrutura de uma comunicação. Uma comunicação considerada de alta estrutura, irá produzir maior aquisição de conhecimentos do que uma comunicação considerada de baixa estrutura (1969, p. 22; 1971, p. 14).

Estrutura máxima ocorre quando um par de declarações consecutivas contem o mesmo ou quase o mesmo grupo de elementos verbais. Neste caso, a estrutura é máxima porque a reiteração de idéias substantivas produzirá uma forte união ou ligação neste ponto da serie de declarações. No entanto, uma estrutura muito alta irá diminuir a quantidade de aquisição de conhecimentos, pois, apesar deste tipo de repetição ser efetivo para comunicar uma quantidade reduzida de conteúdo verbal, durante breves períodos de tempo, não é eficiente para manter a atenção do aluno e comunicar grande quantidade de informação. Da mesma forma, estrutura muito baixa - insuficiente continuidade de idéias - irá diminuir a aquisição de conhecimentos. Este fato ira produzir fadiga, pois a pessoa que recebe a comunicação terá que suprir a 0,5 numa escala variando de 0 a 1.0 (1972, p. 1.6).

Método de Análise

1. Preparação da comunicação para analise.

Para que se possa proceder à analise da estrutura, a sequência de uma comunicação, apresentada em protocolo escrito, deve ser quebrada em declarações individuais ou unidades de discurso, segundo regras elaboradas para a identificação das mesmas.

Cada declaração é posteriormente examinada para a identificação dos elementos verbais, de acordo com os critérios estabelecidos por Anderson (1971, 1972). Uma vez identificado, cada Elemento Verbal é assinalado com um numero código. Este numero é usado para representar o elemento verbal, cada vez que ele apareça numa dada declaração. Os numeros-código para todos os elementos verbais contidos numa declaração são listados na margem direita do protocolo escrito, ao lado da declaração em que aparecem. Cada elemento verbal é codificado, somente uma vez por declaração, independentemente do número de vezes que apareça na mesma. Após a codificação dos Elementos Verbais, os coeficientes de estruturas poderão ser computados.

2. Coeficientes de estruture

Com base em sua teoria, Anderson (1969, 1971) desenvolveu alguns coeficientes matemáticos que permitem avaliar quantitativamente a estrutura de uma comunicação. Os dois coeficientes básicos desenvolvidos são: o Coeficiente Fundamental (B1) e o Coeficiente de Peso (B2).

2.1. Coeficiente Fundamental (B1).

O coeficiente de estrutura (B1) é chamado de fundamental porque é uma expressão quantitativa de commonality entre duas declarações consecutivas. É computado, por se dividir o número total de elementos verbais emparelhados (repetidos) num par de declarações pela soma de todos os elementos verbais (emparelhados e não emparelhados) contidos nas mesmas. A fórmula para o coeficiente fundamental e:

Onde n1 é o número total de elementos Verbais emparelhados num par de declarações o n0 é o número de elementos verbais não comuns ao par. Esta fórmula e aplicada aos pares de declarações em sucessão, começando com a primeira e a segunda, depois com a segunda e a terceira, a terceira e a quarta e assim por diante, ate que a sequência total seja avaliada. Um exemplo do cálculo do coeficiente B1 são calculados para cada par de declaração (Tabela 1).

Existem três elementos verbais na primeira declaração. Eles são: cromossomos, traço e pais que recebem, respectivamente, os números 1, 2 e 3. Existem quatro elementos verbais na segunda declaração que receberam os números códigos 4, 5, 6 e 7. Portanto, não há nenhum elemento comum ao par. A segunda declaração contém um conjunto de elementos verbais diferente do conjunto contido na primeira declaração. O coeficiente fundamental para este par de declarações é B1 = 0/ (7 + 0)= 0. Porem, no próximo par (declarações 2 e 3), os elementos verbais 4 e 7 são repetidos e, por conseguinte, comuns ao par. Uma vez que a ocorrência total de elementos compartilhados (n1) é igual a 4, dois em cada declaração do par, e n0=2, ja que existem dois elementos não comuns, B1 = 4/ (2 + 4)=0,67, como um valor arredondado.

A commonality é apreciável neste par de declarações, porque está acima de 0,5. Desta forma, pode-se estabelecer que o grau de estrutura neste par de declarações é alto, com base no coeficiente fundamental que é = 0,67.

Quando todos os pares de declarações tiverem sido examinados, é conveniente obter-se a média do coeficiente fundamental (B1) como um índice da estrutura total da comunicação.

2.2. Coeficiente de peso (B2).

Um segundo coeficiente é computado para cada par de declarações, para se obter uma medida que combine commonality e o que Anderson chama de potência dos elementos verbais nos pares de declarações. O chamado coeficiente B2 é um modificador da commonality, pois dá uma medida da mesma, porém ajustada pela freqüência em que os elementos verbais aparecem na comunicação total.

A suposição é que, quanto mais frequentemente um elemento verbal é usado, mais ele se salienta ou mais potente ele é para o aluno que ouve a comunicação (Anderson, 1974, p. 224). O coeficiente de peso é usado, principalmente, para traçar um gráfico chamado Cinetogramo, o qual representa a estrutura total da comunicação e é utilizado como um instrumento para análise da mesma.

A fórmula para o coeficiente de peso (B2) é:

Neste contexto, n1 é o número total de elementos verbais emparelhados num par de declarações e o n0 é o número de elementos verbais não comuns ao par. O F' corresponde à freqüência de mais alto valor, entre as freqüências dos elementos verbais não-emparelhados, encontrados na primeira declaração. O F" corresponde à freqüência de mais alto valor, entre as freqüências dos elementos verbais não-emparelhados, encontrados na segunda declaração.

f representa a soma de todas as freqüências, para todos os elementos verbais.

Pode-se considerar a proporção (F'+F"/ f)½ um fator de peso, ou seja, a proporção da freqüência de certos elementos verbais não-emparelhados num par de declarações para a freqüência total de elementos na comunicação.

Para computar este coeficiente é necessário contar a freqüência de cada elemento verbal em toda a comunicação e a freqüência total dos elementos na comunicação (f). A seguir, dado um par de declarações, encontrar os elementos verbais não-emparelhados; indicar a freqüência de mais alto valor entre as freqüências dos elementos verbais não-emparelhados, encontrados na primeira e na segunda declaração.

O coeficiente B2 é calculado da seguinte maneira: A amostra de protocolo mencionada na página 45 será usada para ilustrar este método. As duas primeiras declarações não contêm elementos verbais emparelhados (comuns), logo n1= O e n0=7. Suponha que cada elemento tem uma frequência de ocorrência na lição, como mostra a Tabela 2.

A frequencia mais alta entre os três elementos não-emparelhados da primeira declaração é 38, para o elemento 1. Logo F'=38. Na segunda declaração, a freqüência de ocorrência mais alta para um elemento não-emparelhado é 54, para o elemento 4. Logo, F"=54. Suponha, também que a freqüência total dos elementos verbais na lição é f=450. Assim,

Este procedimento é repetido até que todos os pares de declarações tenham recebido um valor B2. A média do coeficiente B2 pode ser computada para a comunicação total, porém, esses valores obtidos para as diferentes comunicações não podem ser comparados (Anderson, 1972, p. 2:9).

Os coeficientes são dispostos num grafico chamado Cinatogramo. Veja o exemplo na Figura 2.


Em um Cinetogramo, a abscissa aparece no cume do grafico e é dividida em unidades, representando as declarações com limites de 0 a N, onde N é o número máximo de declarações a serem analisadas. A ordenada representa os valores B2 e é dividida em 10 unidades, com intervalos de 0 a 1.0. O valor B2 é computado para cada declaração e traçado como um ponto no gráfico. Os pontos são conectados por linhas retas. O mais importante elemento na interpretação de um Cinetoqramo é a posição da linha do gráfico em relação à abscissa.

Uma vez traçado o gráfico, os spans devem ser identificados. Um span é um segmento ou uma sequência da comunicação que demonstra alguma relação interna - um tema ou uma série de declarações altamente integradas - que permite separá-lo do restante da comunicação, semelhante a um parágrafo em uma comunicação escrita (Anderson, 1970, p. 231). Os limites dos spans são marcados no Cinetogramo com linhas verticais sólidas.

Na Figura 2 três tipos de estrutura são mostradas.

Na primeira seção (spans), a linha do gráfico é baixa em relação à abscissa, indicando baixa estrutura em comparação com a linha do gráfico da segunda seção que indica alta estrutura. A organização do traçado na primeira seção indica a introdução de muitas idéias novas na comunicação e que os elementos verbais potentes não estão sendo usados como elemento de união entre as declarações. A segunda seção (spans) representa uma parte da comunicação ccm uma sequência de declarações fortemente relacionadas. Os elementos verbais potentes, se presentes, são utilizados como elementos de união entre as declarações. A terceira seção (spans) ilustra um segmento da comunicação no qual as idéias são apresentadas de maneira inesperada ou em unidades quebradas. Cada traçado em forma de V que desce, representa a introdução de novo conteúdo; a subida imediatamente apôs indica que a idéia foi reiterada e reelaborada.

Teoricamente, um equilíbrio pode ser encontrado pela introdução de novos conteúdos na comunicação, representados por uma descida brusca no traçado do gráfico, seguidos por uma seqüência de idéias conectadas, representada pelo traçado prõximo à abscissa.

É interessante notar que os coeficientes matemáticos e o Cinetogramo foram inicialmente desenvolvidos com o objetivo de analisar comunicações orais utilizadas no processo normal de ensino em sala de aula. Posteriormente, passaram a ser utilizados como instrumentos para auxiliar a montagem de comunicações.

Contexto do Problema

Anderson (1969, 1971) com a proposição de sua teoria, procura explicar como as comunicações podem ser estruturadas de modo a facilitar a aquisição de conhecimentos. Segundo sua teoria, uma comunicação que apresente alta estrutura irá aumentar a aquisição de conhecimentos por parte dos alunos em comparação com uma comunicação que apresente baixa estrutura.

Várias pesquisas têm investigado os efeitos da aplicação desta teoria. Estes estudos são classificados em duas categorias: descritivos e experimentais.

O objetivo dos estudos descritivos é aplicar a teoria da Estrutura Cinética na análise da organização de comunicações orais utilizadas no processo normal de ensino. Os primeiros estudos desenvolvidos estabeleceram a validade dos coeficientes B1 e B2 análise da comunicação do professor em sala de aula (Anderson, 1966, 1967, 1969 e 1970) e na análise da interação verbal entre professor e aluno (Anderson, 1972). Outros estudos (Sharp, 1972; Ntuehlke, 1973; Garrigan, 1974) permitiram conhecer os padrões de organização das comunicações de professores de Física, Biologia e Química, respectivamente.

Paralelamente a estes estudos, foram desenvolvidos estudos experimentais. Estes, por sua vez, baseados na montagem de comunicações que foram aplicadas com o objetivo de testar o efeito do grau de estruturação das mesmas sobre a aprendizagem dos alunos.

Um primeiro grupo de estudos desta natureza testou o efeito do grau de estrutura de comunicações orais sobre a aquisição de conhecimentos das disciplinas de Biologia (Trindade, 1972; Anderson e Lee, 1975) e de Astronomia (Lu, 1976). Ampliando o campo de aplicação da teoria, um segundo grupo de estudos demonstrou que comunicações com alta estrutura tem um efeito positivo não só em termos cognitivos, mas também no domínio afetivo e psicomotor (Butterworth, 1974; Simmons, 1975). Um terceiro grupo de estudos investigou o efeito que comunicações estruturadas têm quando relacionados com materiais subsidiários sobre a aquisição de conhecimentos e estado afetivo do aluno (Mae Lee, 1977; Simmons, 1980).

Finalmente, a mais importante pesquisa desenvolvida para a realização do presente estudo foi a de Kittrell (1977) que, utilizando uma variação da teoria, investigou os efeitos do grau de estrutura de comunicações na modalidade escrita sobre aquisição e retenção de conhecimentos.

Todos os estudos desenvolvidos demonstraram uma relação positiva entre grau de estrutura e aquisição de conhecimentos. Porem, todas as pesquisas conhecidas até o momento foram realizadas nos Estados Unidos da América e possuem determinadas características: foram desenvolvidas através de conteúdos da área de Ciências Físicas e Biológicas, e, na sua maioria, com a utilização de comunicações na modalidade oral. Porém Anderson (1974) sugere que o campo de aplicação de sua teoria seja ampliado, não sé para o ensino de disciplinas de outras áreas de conhecimento, mas também para comunicações na modalidade escrita (p. 227-28).

Contudo, conhece-se apenas a pesquisa de Kittrell (1977) que, seguindo a sugestão de Anderson (1974). investigou os efeitos de materiais escritos estruturados sobre a aquisição e retenção de conhecimentos, fornecendo indícios da validade da aplicação desta teoria a comunicações na modalidade escrita.

Com base nas considerações anteriormente feitas, o problema da pesquisa delimita as seguintes questões:

1 - Qual o efeito do grau de estrutura de uma comunicação sobre a aquisição de conhecimentos, quando aplicada a conteúdos de disciplinas da área de Ciências Sociais?

2 - Na área de Ciências Sociais, uma comunicação estruturada, transmitida na modalidade escrita, teria o mesmo efeito sobre a aquisição de conhecimentos que uma comunicação transmitida na modalidade oral?

Este estudo teve, portanto, por objetivo verificar se a teoria proposta por Anderson é válida, quando aplicada:

1 - a conteúdos da ãrea de Ciências Sociais;

2 - a comunicações na modalidade escrita.

A realização do estudo justifica-se, principalmente, pelo fato deste ser - apesar do estudo de Kottrell (1977) - um dos primeiros sobre a aplicação da teoria de Anderson a comunicações escritas. Portanto, os resultados e as conclusões desta pesquisa poderão contribuir para o desenvolvimento da área de Currículo, fornecendo subsídios ao professor ou especialista na elaboração de materiais curriculares escritos - mõdulos de ensino, textos e outros, no que diz respeito ã quantidade de estrutura a ser utilizada nas comunicações de sala de aula.

As hipóteses da pesquisa foram as seguintes:

1 - A aquisição de conhecimentos do grupo que recebe urna comunicação com alta estrutura é significativamente maior que a do grupo que recebe uma comunicação com baixa estrutura.

2 - Existe uma diferença significativa entre a aquisição de conhecimentos do grupo que recebe uma comunicação escrita estruturada e a do grupo que recebe uma comunicação oral correspondente.

Neste estudo fora m indicadas como variáveis independentes o grau de estrutura e a modalidade da comunicação e como variável dependente, a aquisição de conhecimentos. Esta variável dependente foi representada por dois indicadores: (1) número de idéias e (2) número de elementos verbais, recordados através de um teste de recordação espontânea.

Portanto para fins de analise, destas hipóteses de pesquisa, derivaram-se dois conjuntos de hipóteses estatísticas. O primeiro conjunto foi elaborado para testar o efeito do grau de estrutura e da modalidade da comunicação sobre o numero de idéias recordadas e o segundo, para testar o efeito destas mesmas variáveis sobre o numero de elementos verbais recordados.

Métodologia

Trata-se de um estudo comparativo usando um split píot design. Na pesquisa foram utilizados dois grupos equiparados. Os dois grupos foram testados, sendo que cada um deles recebeu dois tratamentos cada qual com diferente modalidade de comunicação (Winer, 1971).

Os sujeitos da pesquisa foram 46 alunos de 1ª. série do 2º grau - Habilitação Magistério - de uma Escola da Rede Estadual de Ensino no Município de Curitiba. Esses alunos formaram dois grupos equiparados, com 23 elementos cada. O emparelhamento dos sujeitos em 23 pares, foi feito de acordo com o nível de inteligência e compreensão de leitura que foram determinadas usando-se como base o resultado do PMA (Primary Mental Abilities Test) e o resultado do teste CLOZÉ, respectivamente (Taylor, 1953). Os sujeitos que constituiam os pares equiparados foram distribuídos, aleatoriamente, entre o grupo I e grupo II. A equiparação dos grupos foi confirmada através da aplicação do teste "t" de Student aos resultados do teste PMA e do teste CLOZE.

A designação de que grupo receberia comunicações com alta ou com baixa estrutura foi determinada aleatoriamente.

Para a testagem das hipóteses foram elaborados dois pares de comunicações, cada um tratando de um tema de História, uma das disciplinas integrantes da área de Ciências Sociais. Os temas escolhidos foram o Império Inca e o Império Maia. Para o primeiro par de comunicações sobre o Império Inca, uma das comunicações foi elaborada com alta estrutura e a outra com baixa estrutura. Da mesma forma, para o outro par de comunicações sobre o Império Maia, uma das comunicações foi elaborada com alta estrutura e a outra com baixa estrutura.

Segundo o design da pesquisa foi necessário assegurar que as comunicações fossem equivalentes. Portanto, os dois pares de comunicações foram similares quanto ao tema, extensão (numero de declarações), número de elemento verbais e repetição dos elementos verbais pela comunicação toda, variando apenas um grau de estrutura. No entanto, as duas comunicações com alta estrutura e as duas com baixa estrutura, foram equiparadas estatisticamente quanto ao coeficiente B1.

Estas comunicações foram apresentadas nas modalidades oral e escrita, individualmente, a cada um dos elementos dos grupos. Na primeira fase da pesquisa, os elementos do grupo I ouviram através de gravação uma comunicação com alta estrutura e os do grupo II uma comunicação correspondente com baixa estrutura. Da mesma forma, na segunda fase, os elementos do Grupo I receberam uma comunicação escrita com alta estrutura e os do grupo II uma comunicação correspondente com baixa estrutura.

As duas aplicações foram levadas a efeito com um intervalo de 20 dias entre ambas para evitar transferência de aprendizagem da primeira para a segunda comunicação.

Na apresentação das comunicações orais cada aluno foi chamado e, sozinho com o aplicador, ouviu a gravação da comunicação com fones de ouvido para evitar interferência externa. Os alunos receberam instruções para ouvir a gravação por duas vezes, com muita atenção, preparados para falar sobre todas as idéias ou frases que conseguissem recordar, apos terem ouvido a mesma.

Imediatamente apôs as duas audições da fita, cada sujeito discorreu sobre o que conseguia recordar espontaneamente, sem interferência por parte do aplicador, sobre o tema ouvido, e sua exposição foi gravada em fita cassete.

Posteriormente, as gravações foram transcritas e cada idéia e elemento verbal emitido foi comparado com a transcrição original da comunicação ouvida.

Os escores foram obtidos:

1 - pela contagem do numero de idéias emitidas, consideradas corretas de acordo com a comunicação original e;

2 - pela contagem de todos os elementos verbais corretos emitidos.

Na apresentação das comunicações escritas, cada sujeito recebeu instruções semelhantes às dadas na fase da comunicação oral, ou seja, que deveriam ler o texto silenciosamente, com muita atenção, e estar preparados para falar sobre o que conseguissem recordar, apôs a leitura do mesmo. Idêntico procedimento foi empregado para a modalidade das comunicações orais, no que se refere à gravação, transcrição e contagem dos pontos obtidos pelos sujeitos da pesquisa.

O tratamento estatístico utilizado foi a Análise de Variância para split-plot-designs, aplicado para testar os efeitos principais do grau de estrutura e da modalidade de comunicação e o efeito da interação entre ambos, sobre a aquisição de conhecimentos.

Os resultados das análises estatísticas demonstraram que a aquisição de conhecimentos - indicada pelo numero de idéias e de elementos verbais que o aluno foi capaz de recordar - do grupo que recebeu uma comunicação com alta estrutura foi, significativamente, maior que a do grupo que recebeu uma comunicação com baixa estrutura. Demonstraram, também, que a aquisição de conhecimentos do grupo que recebeu uma comunicação escrita estruturada foi, significativamente, maior que a do grupo que recebeu uma comunicação oral estruturada. Não foram observados efeitos de interação.

Conclusões

Os resultados deste estudo reforçam a teoria proposta por Anderson, demonstrando que a quantidade de conhecimentos adquiridos esta diretamente relacionada com o grau de estrutura de uma comunicação. Desta forma, pode-se concluir que a teoria da Estrutura Cinêtica é válida quando aplicada a comunicação com conteúdos da área de Ciências Sociais (História) e a comunicações na modalidade escrita, produzindo inclusive um aumento em termos de quantidade de conhecimentos adquiridos em relação aos resultados obtidos com as comunicações orais.

Uma vez que os resultados encontrados demonstram que o grau de estrutura de uma comunicação, tanto oral como escrita, influi na aquisição de conhecimentos, os professores e especialistas na elaboração de materiais escritos deveriam considerar a quantidade de estrutura utilizada nas comunicações de sala de aula, visando a transmissão de conteúdos propostos nos currículos quando se espera que os alunos recordem e apliquem o conhecimento adquirido, em outras situações de aprendizagem.

O ensino de Ciências Sociais está mudando; as extensas exposições orais, visando apenas transmitir conhecimentos, estão sendo postas de lado para dar lugar ao uso de métodos que enfatizam o desenvolvimento de habilidades mentais. No entanto, esses métodos, de um modo geral, não podem prescindir de uma pequena apresentação oral por parte do professor ou da utilização de materiais escritos que proporcionem o conhecimento básico necessário ao desenvolvimento das tarefas propostas.

Principalmente no contexto educacional brasileiro, onde encontra-se um elevado fiúmero de alunos e um número insuficiente de professores e, em decorrência desta e de outras causas, o baixo rendimento escolar, os textos elaborados pelo professor e os contidos nos livros didáticos deveriam ser estruturados, de forma a proporcionar maior aquisição de conhecimentos por parte dos alunos. Desta maneira, o professor deixaria de ser o transmissor de conhecimentos, seu tempo e suas potencialidades poderiam ser utilizados no desenvolvimento de tarefas visando desenvolver no aluno processos mentais mais elevados.

Os materiais curriculares estruturados poderão, também, ser utilizadas no atendimento a alunos de zonas rurais, onde a relação níímero de professor e alunos se faz sentir de maneira marcante.

No caso específico de módulos de ensino, que têm por objetivo permitir que o aluno aprenda com a mínima interferência do professor (aprendizagem para o domínio), o problema básico é o de encontrar meios de reduzir o tempo requerido pelos estudantes mais lentos. Pois, existem alunos que podem aprender muito bem mediante esforço independente, enquanto outros precisam de situações de ensino altamente estruturadas (Vilarinho, 1976, p. 25). Os textos/contidos nos módulos de ensino, se organizados segundo a técnica de Anderson, poderiam auxiliar os alunos de aprendizagem lenta e os alunos de modo geral, a adquirir conhecimentos básicos necessários ao prosseguimento das demais tarefas propostas.

Os resultados obtidos sugerem, também, que os coeficientes B1 e B2 têm-se demonstrado instrumentos úteis para a elaboração de comunicações. Esses coeficientes poderão, portanto, auxiliar professores e especialistas na elaboração de materiais curriculares, provendo uma fundamentação científica para a sua organização.

Sugestões para pesquisas futuras

Com base neste e em outros estudos relacionados com a aplicação da teoria de Anderson, foi levantada uma serie de perguntas, que podem servir como problemas para pesquisas futuras. Estas perguntas são, a seguir, apresentadas:

1 - A relação estatisticamente significante encontrada neste estudo entre comunicações com alta estrutura e aquisição de conhecimentos se mantêm verdadeira para diferentes tipos de conteúdos? Isto é, esta relação se matem verdadeira, utilizando-se conteúdos de outras disciplinas da área de Ciências Sociais, tais como Sociologia, Antropologia, etc.? O mesmo resultado será mantido utilizando-se outros temas de Historia, por exemplo, Capitalismo, Mercantilismo, etc.?

2 - Quais as implicações da aplicação da teoria de Anderson numa situação normal de sala de aula? Por exemplo: um texto de um livro didático, reformulado segundo a teoria de Anderson, aumentará a aquisição de conhecimentos por parte dos alunos?

3 - As características dos alunos tais como sexo, idade, nível de escolaridade, etc., estão de alguma forma relacionada com a aprendizagem de uma comunicação estruturada? Por exemplo: qual o efeito de materiais estruturados, segundo Anderson, sobre a aprendizagem dos alunos dos vários níveis de escolaridade? A aplicação da teoria de Anderson terá o mesmo efeito no primeiro grau quanto no segundo grau? Será que o sexo ou a idade nas para alunos com alto nível de inteligência? Oual o efeito de uma comunicação estruturada sobre a aquisição de conhecimentos de alunos com aprendizagem lenta?

4 - Qual o efeito do grau de estrutura de uma comunicação na retenção de conhecimentos? Isto é, os resultados obtidos logo apos a apresentação das comunicações se mantêm constantes apos um determinado período de tempo? Por quanto tempo?

5 - Comunicações estruturadas, relacionadas com outros materiais didáticos, tais como diagramas, diapositivos, etc., podem aumentar a aquisição de conhecimentos?

A pesquisa realizada por Lee (1977) demonstrou que o uso de diapositivos aliados a comunicações estruturadas é mais eficiente apenas com comunicações de baixa estrutura. Será que outros estudos confirmam estes resultados? Qual será a maneira mais eficaz de combinar o uso destes materiais com comunicações estruturadas, para produzir melhores resultados em termos de aquisição e retenção de conhecimentos?

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    Este texto se constituí numa síntese das idéias de Anderson expressas em seus estudos publicados em 1963, 1970, 1971, 1972 e 1974.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Mar 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1982
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