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A contribuição da pós-graduação pesquisa em educação na Universidade Federal do Paraná

ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

A contribuição da pós-graduação pesquisa em educação na Universidade Federal do Paraná

Vermer Artur Conrado Barthelmese

Professor Adjunto do Departamento de Métodos e Técnicas da Educação do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná. Docente livre pela Universidade Federal do Paraná. Coordenador do Curso de Mestrado em Educação da Universidade Federal do Paraná

A universidade Federal do Paraná e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq realizaram em Curitiba, de 20 a 23 de maio de 1981, um seminário sobre Pesquisa. Na ocasião, todos os Coordenadores de Cursos de Pós-Graduação da Universidade foram convocados para discorrer sobre o impacto da pesquisa na respectiva área.

Este documento é a contribuição do Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Educação àquele evento.

Vejo a questão que me foi proposta para que sob ela discorresse neste momento, numa perspectiva um pouco diferente daquela que seu título parece sugerir. Não vejo um impacto da Pós-Graduação na pesquisa como algo linear ou direto, que fosse comparável a uma relação de causa e efeito.

Antes considero ambas, pós-graduação e pesquisa co-implicadas dentro do quadro maior da modernização geral do País, que se refletiu no âmbito universitário por uma mudança geral de mentalidade.

Verdade que sempre houve, no passado, trabalhos pioneiros de alto valor e grande seriedade cientifica, mas eram casos isoldos, que constituíam a exceção, nunca a regra, num tempo em que o pesquisador não encontrava qualquer respaldo institucional e quando a atividade de pesquisar, mormente quando seguida de publicação, podia resultar até em prejuízo para a carreira de quem a empreendia, dadas as emulações que poderia despertar num ambiente em que as hierarquias e os equilíbrios entre estas se baseavam mais nas condecorações que na competência.

Aqueles velhos tempos são idos: já não é uso esconder que se estuda, que se investiga, indaga, pesquisa e pode-se, mesmo, sem maior risco entregar à luz do dia o fruto dessa busca inquieta e sagrada. Toda uma macissa geração de novos professores universitários lastreia hoje moral e politicamente a pesquisa pós-graduada, fazendo dela uma realidade profundamente arraigada na consciência pública e que dificilmente qualquer imprevisto político ou administrativo poderá erradicar ou reverter.

Precisa-se, entretanto, também nesta nova fase em que a liberdade exterior parece assegurada, de um grau de audácia não menor, de não menor coragem moral especialmente quando se trata da pesquisa em educação que sempre envolve problemas de viver e conviver que incluem e envolvem o próprio pesquisador, impedindo-o de manter aquela postura de neutralidade ainda tão louvada em outras áreas da pesquisa científica onde envolvimento do pesquisador é menos aparente.

O campo da educação ê de tal modo carregado de opções para a nação e o mundo que a simples investigação sobre elas desperta sempre apreciações valorativas.

Neste particular está de parabéns o Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Paraná, que a generosidade de todos me permite presentemente coordenar e dirigir: nas pesquisas individuais e em equipe ora aqui em andamento, tem prevalecido, afortunadamente, a pesquisa séria e corajosa, a pesquisa realista e sincera que pode vir a apontar algumas das soluções que, em nome da responsabilidade social da inteligência, a comunidade tem direito de cobrar de suas lideranças culturais.

A pesquisa em educação, mormente na área de currículo sobre a qual se concentra a responsabilidade maior deste Programa, defronta-se com realidades cuja simples menção demonstra por si, a gravidade do desafio que representar. Darei aqui, para, ser breve, apenas algumas amostras do tipo de assuntos que podem desafiar o pesquisador em currículo.

Primeiro exemplo: todos sabem que faz dez anos que o ensino do segundo grau no Brasil se tornou profissionalizante. Entretanto a Universidade brasileira que tem entre suas tarefas a de formar professores para tal ensino não achou tempo, ainda, para tomar conhecimento da nova realidade: não se criou no país, nestes dois lustros, nenhum curso regular para formação dos professores profissionalizantes de que o 2º grau precisa, enquanto todas as Universidades, do Chui ao Oiapoque, continuaram e continuam ainda a formar, ano por ano, turmas e mais turmas do professores para o segundo grau antigo, há tanto tempo extinto. Os cursos universitários correspondentes são obviamente, fabricas de frustração, dada a perspectiva negativa dos egressos quanto a mercado de trabalho; há numerosos cursos, dentre esses com índice de evasão e transvação acima dos noventa porcento.

Segundo exemplo, derivado do primeiro: as Universidades não tomaram conhecimento, também, dessa mudança ocorrida no ensino de segundo grau, quando se trata da elaboração dos quesitos para os vestibulares. Em sua maioria os assuntos cobrados no vestibular costumam ainda ser catados nos programas do antigo e tão longamente extinto curso científico, quando não mesmo nos próprios programas da disciplina universitária em que o redator do quesito é casualmente especializado. Não se aceita a situação: não se recebe o aluno como ele é, como o recebem, humildemente, europeus e americanos que transferiram para dentro da Universidade a tarefa de dar ao aluno o preparo científico básico de que necessitará nas fases de seu curso.

Aqui, o aluno, para entrar, tem de fingir que é aquilo que não é; que sabe aquilo que na realidade não lhe foi ensinado. Desse mal entendimento básico é que vive em todas as metrópoles brasileiras e multimilionária industria dos assim denominados cursinhos, nos quais a fração mais promissora da mocidade brasileira investe anualmente milhões de horas retiradas da força de trabalho bem como fortunas incalculáveis em dinheiro, na maratona estéril de adquirir mediante memorização e domínio de macetes, a aparência fugaz de um conhecimento, que, por falta de raízes, fenece no dia seguinte.

Neste particular está de parabéns o Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Paraná, que a generosidade de todos me permite presentemente coordenar e dirigir: nas pesquisas individuais e em equipe ora aqui em andamento, tem prevalecido, afortunadamente, a pesquisa séria e corajosa, a pesquisa realista e sincera que pode vir a apontar algumas das soluções que, em nome da responsabilidade social da inteligência, a comunidade tem direito de cobrar de suas lideranças culturais.

A pesquisa em educação, mormente na área de currículo sobre a qual se concentra a responsabilidade maior deste Programa, defronta-se com realidades cuja simples menção demonstra por si, a gravidade do desafio que representar. Darei aqui, para, ser breve, apenas algumas amostras do tipo de assuntos que podem desafiar o pesquisador em currículo.

Primeiro exemplo: todos sabem que faz dez anos que o ensino do segundo grau no Brasil se tornou profissionalizante. Entretanto a Universidade brasileira que tem entre suas tarefas a de formar professores para tal ensino não achou tempo, ainda, para tomar conhecimento da nova realidade: não se criou no país, nestes dois lustros, nenhum curso regular para formação dos professores profissionalizantes de que o 2º grau precisa, enquanto todas as Universidades, do Chui ao Oiapoque, continuaram e continuam ainda a formar, ano por ano, turmas e mais turmas do professores para o segundo grau antigo, há tanto tempo extinto. Os cursos universitários correspondentes são obviamente, fabricas de frustração, dada a perspectiva negativa dos egressos quanto a mercado de trabalho; há numerosos cursos, dentre esses com índice de evasão e transvasão acima dos noventa porcento.

Segundo exemplo, derivado do primeiro: as Universidades não tomaram conhecimento, também, dessa mudança ocorrida no ensino de segundo grau, quando se trata da elaboração dos quesitos para os vestibulares. Em sua maioria os assuntos cobrados no vestibular costumam ainda ser catados nos programas do antigo e tão longamente extinto curso científico, quando não mesmo nos próprios programas da disciplina universitária em que o redator do quesito é casualmente especializado. Não se aceita a situação: não se recebe o aluno como ele é, como o recebem, humildemente, europeus e americanos que transferiram para dentro da Universidade a tarefa de dar ao aluno o preparo científico básico de que necessitará nas fases de seu curso.

Aqui, o aluno, para entrar, tem de fingir que é aquilo que não é; que sabe aquilo que na realidade não lhe foi ensinado. Desse mal entendimento básico é que vive em todas as metrópoles brasileiras e multimilionária industria dos assim denominados cursinhos, nos quais a fração mais promissora da mocidade brasileira investe anualmente milhões de horas retiradas da força de trabalho bem como fortunas incalculáveis em dinheiro, na maratona estéril de adquirir mediante memorização e domínio de macetes, a aparência fugaz de um conhecimento, que, por falta de raízes, fenece no dia seguinte.

Se, entretanto, levarmos adiante nossa indagação, para saber por que agem assim tantas cabeças, quanto ao mais, lúcidas e tantas instituições de renome, logo descobrimos que na realidade não são elas que agem: elas são "agidas", há sempre no caminho de qualquer iniciativa, o momento centralizador, o instante em que a decisão se transfere do plano dos mortais normais para o cume insondável de um olimpo burocrático qualquer donde descem, depois, os decretos dos deuses, do que a própria lei 5692, que impôs o ensino dito profissionalizante é o exemplo mais exemplar.

O ensino de segundo grau, convertido, ex magica, de acadêmico em profissionalizante (mas com os mesmos professores), passou a oferecer opções de profissionalização nominal, escolhidas ao sabor de outras tantas conveniências burocráticas, sem qualquer correlação com o mercado de trabalho e com ignorância juramentada do fato de que o aluno que, no Brasil, procura o 2º grau é, no fundo, sempre um aspirante ao ensino superior e continuará sendo, a menos que pudéssemos atraí-lo com propostas novas, realmente interessantes tanto do ponto de vista espiritual como econômico. É uma lástima, neste sentido que não se tenha implantado o profissionalizante progressivamente, partindo dos excelentes núcleos já em funcionamento no país, nas diferentes Escolas Técnicas distribuídas pelos vários Estados e a partir de cuja incrementação e multiplicação teria sido possível, em menos, talvez, que dez anos, alcançar uma solução autêntica, que o mero fingir-que mudou- porque-o-ministro-mandou não poderá suprir, de nenhuma maneira, nem num século.

Escaparia, então, talvez, desta safra de espantos, o primeiro grau escolar, aquele que, há mais tempo, vem sendo objeto da preocupação de governos e pedagogos? Que o digam alguns números: uma criança em cada duas, reprovada no primeiro ano escolar; outro fosso de reprovações no quinto ano, antigo primeiro de ginásio, indicando, salvo melhor juízo dos clínicos e cirurgiões presentes a este ilustre seminário, que o enxerto está sendo rejeitado pelo organismo.

Para não falar do fato de que a nação se industrializa e moderniza e que o filho do bóia-fria, expulso do campo pela máquina agrícola, hoje menor suburbano, constitue o grande manacial da mão de obra de que necessitarão nos próximos anos, nossa indústria, nosso comércio e mesmo nossa lavoura mecanizada. Será que os conteúdos e métodos do ensino que essa população recebe têm qualquer relação com o real projeto de vida dessas criaturas?

O pouco que havia de confiável neste terreno estava nos Cursos do Senai, mas já não estará, pois todos sabemos que estes, justamente, estão sendo rapidamente desativados, para cobertura do déficit de caixa de terceiros organismos. A restante escola ou seja na prática a escola toda, ensina a dizer conjunto disjunto e conjunto vazio, mas não chega ao domínio das primeiras operações sem as quais ninguém faz compras na feira de legumes.

Não sejam, entretanto, estas minhas palavras entendidas como sinal de desalento ou menos ainda, de crítica desavisada e gratuita. Ao contrario quer-se ser entendido como a voz que já não clama num deserto. Se aqui acorrestes, a este Seminário interdisciplinar de Pesquisa, não foi para ver o mero vai e vem de algum caniço seco, agitado pelo vento.

Eu vos convoco e concito, em nome de minha exaltação eu vos conjuro a acreditar neste País, que tão grande vitalidade tem demonstrado ao superar outros desafios igualmente assombrosos e que seguramente superara, em breve, a selva curricular que nos assola e que só, agora, mercê da pesquisa começa a enxergar-se com toda a cruel clareza, para que seja assegurado a nossos filhos e netos o País digno do desvelo que lhes temos.

Que a tanto nos ajude a boa vontade dos homens e nos valha a misericórdia de Deus.

Dito em Curitiba, Brasil, aos 22 de maio de 1981.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1981
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