Ocorrência de albinismo e estimação de endogamia em uma população de Euterpe edulis Mart.

Occurrence of albinism and estimative of endogamy coefficient in an population of Euterpe edulis Mart.

Resumo

O objetivo desse artigo foi avaliar a ocorrência do caráter albinismo e estimar a endogamia em uma população de palmito juçara (Euterpe edulis Mart.). Neste contexto, foram avaliadas progênies de polinização livre de 15 (quinze) matrizes da espécie, oriundas de população conservada. No teste de progênies, 13,3% das matrizes apresentaram indivíduos albinos e, portanto, heterozigotas para a característica. Com base na relação mudas albinas/normais, estimou-se uma taxa média de autofecundação de 10,0% e conseqüentemente, um valor de coeficiente de endogamia média de 0,05. Esses valores foram considerados limites para espécies alogâmicas.

Palavras-chaves
Palmito juçara; progênies de polinização livre; autofecundação parcial

Abstract

The aim of present research was to verify the occurrence of albinism character and to estimate the coefficient of endogamy of a juçara palm (Euterpe edulis Mart.) population. On this context, were evaluated fifteen free pollination progenies. The progeny test showed that 13.3% of the seed trees presented albino seedlings and therefore the heterozygous for the characteristic. Based on the ratio between albino and normal seedlings, was estematel that the average tax of self-fertilization was 10.0%. The average value of the endogamy coefficient was 0.05. These values are considered the above of the limits for an alogamous species.

Key words:
Juçara palm; free pollination progenies; partial self.

Introdução

A espécie Euterpe edulis Mart, comumente denominada palmito juçara pertencente à família Palmae, sub-família Arecoideae, nativa da Mata Atlântica, ocorre no litoral da região do sul da Bahia ao Rio Grande do Sul. A espécie possui alto valor comercial, tanto comestível quanto ornamental (Reis, 1996). Atualmente essa formação florestal está restrita a somente 12% da sua área original, especialmente pela ação antrópica.

O palmito juçara é uma espécie de grande abundância na floresta e foi inicialmente caracterizada nos trabalhos de Veloso e Klein (1957, 1959), citado por Reis (1996). Em seus levantamentos, aqueles autores observaram até 1.000 indivíduos por hectare, com altura superior a 1,5 m. A sua ocorrência em áreas de Mata Atlântica corresponde a mais de 25% dos indivíduos amostrados em diversos levantamentos fitossociológicos, nela realizados (Moraes e Delitti, 1996).

A ação antrópica em formações florestais resulta em conseqüências negativas nas estruturas genéticas de espécies alógamas, como é o caso da palmeira juçara, que possui sistema reprodutivo predominante por alogamia (Resende, 2002), conseqüentemente apresentando populações estruturadas em progênies provenientes de autofecundação e de fecundação cruzada (Falconer e Mackay, 1996).

A detecção da ocorrência de autofertilização nas espécies florestais tem sido observada a partir de estudos de avaliação de progênies, com genes marcadores (albinismo, cor de cotilédones, nanismo, etc), através da freqüência de óvulos abortados e com o emprego isoenzimas (Kageyama, l981). O albinismo também foi utilizado como instrumento para evidenciar a ocorrência de autopolinização por Andrade (1960) e Van Wyk (1980), dentre outros.

De acordo com Janick-Buckner et al.(1999), o albinismo é uma condição letal às plantas, com a morte de plântulas, logo após a exaustão do endosperma. Alguns trabalhos demonstram que o albinismo em plantas se dá pelo bloqueio da biossíntese de carotenóides (pigmentos fotoabsorvedores), cuja função no tecido vegetal é a proteção da clorofila à fotooxidação (Bartley e Scolnik, 1995; Demmig-Adams e Adams, 1996). Desta forma, como o caráter albinismo é invariante, é de se supor que o controle genético é monogênico, independente dos processos bioquímicos, envolvidos no processo, sendo, portanto de segregação esperada conhecida.

Com o intuito de se detectar a ocorrência do caráter albinismo e a partir deste, estimar a possível endogamia, por autofecundação parcial, ocorrida em uma população conservada de palmito juçara, foi conduzido um teste de progênies de polinização livre de 15 (quinze) matrizes de palmito juçara, oriundas da população do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, Teresópolis - RJ. Os frutos foram colhidos, individualizados por matriz, baseado na recomendação de Brune (1982), em janeiro de 2003. Em fevereiro deste mesmo ano, as sementes foram postas para germinação em viveiro de mudas, sob sombreamento de 50%, em tubetes plásticos de 280 ml e substrato florestal comercial.

Quatro meses pós-semeadura e constatado o fim do evento da germinação, foram avaliados os totais de germinação e a presença de plantas albinas, por matrizes, que se prestaram para a estimação da taxa de autofecundação e conseqüentemente do coeficiente de endogamia da população (Maêda, 1987).

A germinação por matrizes, por não apresentar distribuição normal, foi avaliada por meio da estatística não paramétrica, mais precisamente pelo teste de adequação de ajustamento (χ ² ), conforme Ribeiro Jr (2001) e a taxa de autofecundação foi obtida pela relação da segregação do F₁, procedimento este consagrado pela genética mendeliana. O valor da taxa de autofecundação parcial foi aplicado à expressão $$F_t=\frac{S}{2}(1+F_{t-1})$$, baseado em Kageyama (1981), sendo S a taxa de autofecundação parcial e F o valor do coeficiente de endogamia da população. Ressalte-se que, no presente trabalho, a população atual foi considerada como a de primeira geração de endogamia.

Os resultados referentes à germinação de sementes de matrizes (Tabela 1), em termos percentuais apresentou valor médio de 42,78%. A análise desses valores pelo teste do Qui-quadrado, apresentou o valor χ ² = 214,1714 ^{, significativo a 1%, demonstran-} do alta variação entre matrizes, para essa característica.

Duas matrizes apresentaram mudas albinas (Figura 1) e foram consideradas heterozigotas para a característica, com valores de germinação, respectivamente, de 48,15 e 64,20%.

Reaplicando o teste, somente com os valores das oito matrizes de maiores valores, dentre elas as ditas heterozigotas, obteve-se o valor χ ² = 11,9699 ^{, não} significativo, indicando que a condição de heterozigose do gene não implica nenhuma conseqüência na germinação de sementes.

Tabela 1
Valores de germinação e de plântulas albina em matrizes de E. edulis, com as respectivas estimativas de taxa de autofecundação (S).
Table 1
Germination and albino seedlings values in seed trees of E. edulis with the respective selffertilization index (S) estimates.

Matriz	Germinação (%)	albinos (%)	S (%)
1	59,88	0,00	-
2	20,37	0,00	-
3	8,64	0,00	-
4	16,67	0,00	-
5	45,68	0,00	-
6	66,67	0,00	-
7	62,35	0,00	-
8	77,52	0,00	-
9	48,15	3,85	15,4
10	73,46	0,00	-
11	5,56	0,00	-
12	4,32	0,00	-
13	38,89	0,00	-
14	64,20	0,96	3,84
15	49,38	0,00	-
Média	42,78	2,405	9,62

Figura 1
Planta albina de palmito juçara (em primeiro plano), aos 4 meses de idade.
Figure 1.
Albino seedling of juçara palm at four months old.

As duas matrizes classificadas de heterozigotas para albinismo correspondem a 13,33% do total de matrizes avaliadas e as duas, conjuntamente, apresentaram quatro mudas albinas, que representaram média de taxa de autofecundação de 10,0% e conseqüentemente, o valor do coeficiente de endogamia média estimada foi de 0,05. O número de matrizes heterozigotas pode ser considerado baixo, quando analisado sob ótica da segregação esperada para características monogênicas. No entanto, este fato está em perfeita consonância com a afirmação de Falconer e Mackay (1996) de que, a constante eliminação dos indivíduos homozigotos recessivos na população (caso dos albinos em plantas), há redução drástica nos indivíduos heterozigotos para a característica considerada.

Por sua vez, o valor da taxa de autofecun-dação e do coeficiente de endogamia, estão no limiar superior da faixa de 5 a 10% e de 0,025 a 0,05, respectivamente, que significam as perdas percentuais de heterozigose nas características, encontrados por diversos autores em espécies florestais e citados por Kageyama (1981). Estes valores também indicam ocorrência de intenso fluxo gênico entre indivíduos, que garantem a estabilidade genética da população, que, por sua vez, ressaltam a importância de áreas protegidas, pois garantem reservas genéticas de espécies que as compõem.

Conclusões

A avaliação de características determinadas por genes marcadores via teste de progênies é uma metodologia importante para se determinar o grau de endogamia que ocorre em populações de espécies alogâmicas e, conseqüentemente é eficaz também para se avaliar a perda de heterose por características, como em caso de resposta às ações antrópicas.

Em termos práticos, os valores obtidos em tais estudos subsidiam estratégias de coleta de germoplasmas para diversos fins; além de evidenciar a importância das florestas protegidas na conservação genética de recursos florestais.

Os resultados obtidos no presente trabalho enfatizam a necessidade de ampliação de estudos genéticos nas espécies nativas, especialmente na detecção de outras características que contribuam no aumento da precisão dos resultados.

Agradecimentos

Os autores expressam agradecimentos ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e Florestais da UFRRJ, à Administração do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, à Fundação CSN e ao Centro Universitário Geraldo di Biase, pela viabilização da pesquisa.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Nov 2023
• Data do Fascículo
  Dec 2005

Histórico

• Recebido
  23 Nov 2005