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Ainda existem diferenças de sexo na funcionalidade dos idosos?

Resumo

Introdução:

O sexo é das caraterísticas demográficas que mais diferencia a independência dos idosos, apesar dessa distinção não ser consensual.

Objetivo:

Conhecer as diferenças da funcionalidade associadas ao sexo, de acordo com a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) em idosos com idade ≥ 65 anos.

Métodos:

Estudo observacional, analítico e transversal com uma amostra de 451 indivíduos. Os instrumentos utilizados foram um questionário sociodemográfico idêntico à checklist da CIF e o Método de Avaliação Biopsicossocial. Utilizaram-se os testes de T-Student, Mann-Whitney, Qui-Quadrado e Correlação de Spearman, considerando-se p < 0,05.

Resultados:

A média de idade foi de 79,5 ± 7,5 anos, observando-se uma prevalência feminina (62,1%). Das 43 variáveis estudadas, foram encontradas diferenças entre os sexos em 17 (39,5%). Nos fatores pessoais, as mulheres apresentaram maior vulnerabilidade na conjugalidade (p ≤ 0,001), na coabitação (p = 0,037) e no rendimento econômico (p = 0,002). Em todos os hábitos relacionados com a saúde, contudo, revelaram comportamentos mais saudáveis. Nos fatores ambientais e nas funções do corpo, observou-se novamente maior fragilidade nas mulheres: na necessidade de dispositivos de auxílio (p ≤ 0,001) e na incontinência urinária (p = 0,021). Nas atividades/participação, as mulheres apresentaram maior restrição na mobilidade e os homens na vida doméstica (lavar/secar roupa p = 0,022).

Conclusão:

As mulheres apresentam-se mais desprotegidas nas dimensões social e econômica, enquanto os homens manifestam hábitos de saúde mais vulneráveis. Estas diferenças estão ligadas às questões demográficas de longevidade e às diferenças culturais e de socialização. As diferenças nos domínios das atividades/participação tendem a diluir-se entre os sexos.

Palavras-chave:
Idoso; Fragilidade; CIF; Sexo

Abstract

Introduction:

Sex is one of the demographic characteristics that better differentiates the independence of the elderly, despite this distinction not being consensual.

Objective:

To know the differences in functioning associated with sex in elderly people aged ≥ 65 years according to the International Classification of Functioning, Disability, and Health (ICF).

Methods:

This was an analytical and cross-sectional observational study with a sample of 451 subjects. The instruments were a sociodemographic questionnaire identical to a ICF checklist and the Biopsychosocial Assessment Method. The student t, Mann-Whitney, chi-square, and Spearman correlation tests were used considering p < 0.05.

Results:

The average age was between 79.5 ± 7.5 years with a female prevalence (62.1%). Of the 43 variables studied, sex differences were found in 17 (39.5%). In the personal factors, women showed greater vulnerability in conjugality (p ≤ 0.001), cohabitation (p = 0.037), and economic income (p = 0.002). Nonetheless, they showed healthier behaviors in all health-related habits. As for environmental factors and body functions, greater fragility was once again observed in women: the need for assistive devices (p ≤ 0.001) and urinary incontinence (p = 0.021). In activities/participation, differences were found in mobility, where women experienced more restrictions, whereas men were more dependent on washing/drying clothes in domestic life (p = 0.022).

Conclusion:

Women are more unprotected in social and economic areas, while men showed more vulnerability in habits related to health. These differences are linked to demographic issues related to longevity, cultural differences, and socialization, and differences regarding activities/participation tend to dilute between sexes.

Keywords:
Elderly; Frailty; ICF; Sex

Introdução

A par da idade, o sexo é uma das caraterísticas demográficas com maior peso na diferenciação da funcionalidade dos idosos. A literatura, contudo, não é absolutamente consensual nessa distinção. Apesar de a maior parte dos estudos apontar vantagem para os homens,11 Boerma T, Hosseinpoor AR, Verdes E, Chatterji S. A global assessment of the gender gap in self-reported health with survey data from 59 countries. BMC Public Health. 2016;16:675. DOI
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2 Serrano-Alarcón, Perelman J. Ageing under unequal circumstances: a cross-sectional analysis of the gender and socioeco-nomic patterning of functional limitations among the Southern European elderly. Int J Equity Health. 2017;16(1):175. DOI
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3 Jacob ME, Marron MM, Boudreau RM, Odden MC, Arnold AM, Newman AB. Age, race, and gender factors in incident disability. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2018;73(2):194-7. DOI
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-44 Carmona-Torres JM, Rodríguez-Borrego MA, Laredo-Aguilera JA, López-Soto PJ, Santacruz-Salas E, Cobo-Cuenca AI. Disability for basic and instrumental activities of daily living in older individuals. PLoS One. 2019;14(7):e0220157. DOI
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em idades mais avançadas as diferenças tendem a desvanecer-se.55 Oliveira A, Nossa P, Mota-Pinto A. Assessing functional capacity and factors determining functional decline in the elderly: a cross-sectional study. Acta Med Port. 2019;32(10):654-60. Full text link
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,66 Fontes AP, Botelho MA, Fernandes AA. A funcionalidade dos mais idosos (≥75 anos): conceitos, perfis e oportunidades de um grupo heterogêneo. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2013;16(1): 91-107. DOI
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A funcionalidade é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um constructo multidimensional interativo e integrativo, onde interagem as dimensões individuais (biopsicossociais) e os fatores contextuais, ambientais e pessoais, cuja operacionalização se descreve no modelo conceitual da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF).77 World Health Organization. International Classification of Functioning, Disability and Health (ICF). Genebra: WHO; 2001. Full text link
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O sexo é um fator pessoal e, apesar deste componente ainda não estar codificado na CIF devido à sua grande variabilidade social e cultural, as suas variáveis devem ser sempre consideradas na avaliação da funcionalidade, pois aquelas que podem ser modificáveis ultrapassam a sua importância enquanto determinantes do estado de saúde ao poderem ser consideradas como uma mudança à gênese da incapacidade, sobretudo pela possibilidade de serem consideradas a gênese da intervenção.

Os estudos acerca das diferenças entre homens e mulheres estão além do conhecimento epidemiológico que oferecem. A sua importância e conclusões devem focar-se predominantemente na possibilidade de diminuírem diferenças sociais e culturais, nomeadamente ao nível das instituições sociais, de identidade e de relações de poder,88 Fernandes AA, Burnay R. Homens saudáveis, mulheres doentes? Um estudo sobre a esperança de vida e a saúde da população portuguesa. Rev Bras Pesq Saude. 2019;21(2):17-28. Full text link
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,99 Zheng Z, Gao J, Yang Y. The enigma of gender differences in an environment-behavior-health model of elderly people: the choice between individually and sociality. Int J Environ Res Public Health. 2020;17(10):3483. DOI
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cujos resultados se projetarão na saúde e funcionalidade.

Dessa forma, apesar de o sexo ser um fator pessoal não modificável, a determinação da sua influência na funcionalidade/incapacidade na população idosa deve continuar a ser investigada, pois poderá ser um contributo para intervenções mais sistematizadas ao nível dos serviços, sistemas e políticas.

O objetivo deste estudo é conhecer as diferenças da funcionalidade associadas ao sexo, de acordo com a CIF, em idosos com idade ≥ 65 anos.

Métodos

Trata-se de um estudo observacional do tipo analítico e transversal, de cuja amostra fazem parte idosos com idade igual ou superior a 65 anos, a viverem anteriormente em domicílio e posteriormente internados nas Unidades de Convalescença e de Média Duração e Reabilitação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (Rede) da região do Algarve, Portugal, após um episódio agudo de doença, lesão ou trauma.

Os dados foram coletados nas primeiras 48 horas de entrada na Rede e dizem respeito exclusivamente à condição pré-morbidade. Coletou-se informação acerca dos diferentes componentes e domínios da funcionalidade. O estudo foi previamente autorizado pela Comissão de Ética da Administração Regional de Saúde do Algarve, referência 013/10 DEP, de 15/10/2010, e obtido o consentimento informado de todos os participantes.

O método de amostragem foi não probabilístico e os instrumentos utilizados foram um questionário de caracterização sociodemográfica, com uma estrutura idêntica à checklist da CIF,1010 World Health Organization. ICF Checklist: version 2.1a, Clinician Form for International Classification of Functioning, Disability and Health. 2003 [cited 2020 Aug 29]. Available from: https://tinyurl.com/345u3p4d
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e o Método de Avaliação Biopsicossocial (MAB), desenvolvido por Botelho.1111 Botelho MA. Autonomia funcional em idosos: caracterização multidimensional em idosos utentes de um centro de saúde urbano. Porto: Laboratórios Bial; 2002. 197 p.

O MAB é um “método estruturado, uniformizado, de avaliação tipo rastreio e classificação biopsicossocial de adultos”1111 Botelho MA. Autonomia funcional em idosos: caracterização multidimensional em idosos utentes de um centro de saúde urbano. Porto: Laboratórios Bial; 2002. 197 p. e é o instrumento adotado a nível nacional pela Rede. Ele permite caraterizar estados biopsicossociais e funcionais, bem como descrever e detectar perturbações da funcionalidade. Tal como o nome indica, contém três áreas de avaliação, com 12 domínios que aglutinam 19 variáveis, perfazendo na totalidade 56 questões. A pontuação é efetuada numa escala que pode ter até quatro graduações, consoante às caraterísticas das variáveis, que no seu conjunto permitem atribuir um score aos diferentes domínios, originando por sua vez o perfil funcional do indivíduo. O MAB foi sujeito a um processo de ligação com a CIF,1212 Fontes AP, Botelho MA, Fernandes AA. A biopsychosocial evaluation method and the International Classification of Functioning, Disability and Health (ICF). Educ Gerontol. 2014; 40(9):686-99. DOI
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revelando boa estrutura conceitual e de conceitos significativos, apresentando-se como um instrumento abrangente e integrador da avaliação da funcionalidade, conforme preconizado pela OMS.

As variáveis dos domínios locomoção, autonomia física e autonomia instrumental, que no instrumento são pontuadas em quatro níveis, foram dicotomizadas em “incapaz/dependente” (pontuações 0 = incapaz e 1 = dependente de terceiros) e “autônomo/independente” (pontuações 2 = autônomo com meios auxiliares e 3 = independente). As demais variáveis seguiram a cotação original.11

No total foram estudadas 43 variáveis, as quais foram divididas pelos diferentes componentes e domínios da CIF, conforme apresentado na Tabela 1.

Tabela 1
Componentes, domínios e variáveis do estudo de acordo com a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF)

Os fatores pessoais não foram até ao momento classificados pela OMS, no entanto, devem ser incluídos em qualquer processo de avaliação/intervenção no sentido de se conhecer a sua contribuição e influência na funcionalidade. Eles são o histórico particular da vida e do estilo de vida de um indivíduo e englobam as caraterísticas que não são parte de uma condição ou estado de saúde.77 World Health Organization. International Classification of Functioning, Disability and Health (ICF). Genebra: WHO; 2001. Full text link
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Por uma questão de organização e semelhança entre si, os fatores pessoais foram agrupados em duas dimensões: sociais, culturais e econômicos, e comportamentos e eventos relacionados com a saúde.

Análise estatística

As variáveis categóricas foram analisadas através de frequências absolutas e relativas; as numéricas, por medidas de tendência central e de dispersão. As análises comparativas entre os sexos envolveram o teste de Mann-Whitney para variáveis categóricas e o T-Student para amostras independentes para as variáveis numéricas. Para analisar a independência entre o sexo e as variáveis em estudo utilizou-se o teste do Qui-Quadrado, e para avaliar seu nível de associação recorreu-se ao coeficiente de correlação de Spearman. A análise estatística teve em conta um nível de significância de 0,05.

Resultados

A amostra foi constituída por 451 indivíduos, cuja média de idade foi de 79,48 ± 7,46 anos, observando-se uma prevalência feminina (62,1%). A média de idade das mulheres foi relativamente superior a dos homens (p = 0,037; 80,5 ± 7,38 para 78,5 ± 7,52 anos).

Das 43 variáveis estudadas, foram encontradas diferenças de sexo em 17 (39,5%). Foram estudadas 19 variáveis incluídas nos fatores pessoais, cujas diferenças ocorreram em 11 (57,9%), nomeadamente na conjugalidade (p ≤ 0001) e na coabitação (p = 0,037), sendo que em ambas as situações as mulheres se apresentaram mais sós, e ainda no rendimento econômico (p = 0,002), com valores mais desfavoráveis para estas. Em todos os hábitos relacionados com a saúde, contudo, as mulheres revelaram comportamentos mais saudáveis.

A independência relativamente ao sexo teve comportamento idêntico às diferenças encontradas na comparação entre homens e mulheres, com exceção para o consumo de tabaco (número de unidades maço/ano - UMA) (x2 = 0,211) e número de quedas (x2 = 0,023). A intensidade da associação encontrada variou de fraca a moderada: de rS = 0,098 (com quem vive) a rS = 0,572 (consumo de álcool). Nas Tabelas 2.1 e 2.2 apresenta-se a distribuição da amostra em relação aos fatores pessoais, bem como as diferenças encontradas entre os sexos e a sua associação.

Tabela 2.1
Estatística descritiva e inferencial das variáveis do componente fatores pessoais: fatores sociais, econômicos e culturais

Tabela 2.2
Estatística descritiva e inferencial das variáveis do componente fatores pessoais: comportamentos e eventos relacionados com a saúde

Nos fatores ambientais, as mulheres apresentaram-se com mais necessidade de dispositivos de auxílio (p ≤ 0,001) e a distribuição de “quem ajuda nas atividades” igualmente revelou diferenças (p ≤ 0,001): as mulheres recebem auxílio fundamentalmente dos filhos, enquanto os homens o recebem dos cônjuges. A independência relativamente ao sexo teve comportamento idêntico às diferenças encontradas na comparação entre homens e mulheres, e a intensidade da associação para ambas as variáveis deste componente revelou-se fraca. Os resultados referentes aos fatores ambientais estão apresentados na Tabela 3.

Tabela 3
Estatística descritiva e inferencial das variáveis do componente fatores ambientais

As diferenças encontradas nas funções do corpo ocorreram na incontinência urinária (p = 0,021), onde as mulheres revelaram uma frequência superior nesta disfunção; contudo, o sexo não se associou à presença desta condição. Os resultados referentes a este componente estão apresentados na Tabela 4.

Tabela 4
Estatística descritiva e inferencial das variáveis do componente funções do corpo

Das 20 variáveis das atividades/participação, foram encontradas diferenças em três (15%): na mobilidade, as mulheres se apresentaram mais vulneráveis (andar na rua p = 0,034 e usar transportes p = 0,004); na vida doméstica, os homens revelaram maior dependência na variável lavar/secar roupa (p = 0,022). Em relação à independência das variáveis, observou-se comportamento idêntico às diferenças encontradas na comparação entre homens e mulheres, e a intensidade da associação variou de fraca a moderada. Na Tabela 5 apresenta-se a distribuição da amostra relativa às variáveis das atividades/participação, bem como as diferenças encontradas entre os sexos e a sua associação.

Tabela 5
Estatística descritiva e inferencial das variáveis do componente atividades/participação

Discussão

As maiores diferenças entre homens e mulheres ocorreram no componente fatores pessoais. Este resultado corrobora a literatura, que enfatiza a importância de se estudarem as assimetrias sociais, econômicas e culturais como determinantes para o estado de saúde e funcionalidade das populações,88 Fernandes AA, Burnay R. Homens saudáveis, mulheres doentes? Um estudo sobre a esperança de vida e a saúde da população portuguesa. Rev Bras Pesq Saude. 2019;21(2):17-28. Full text link
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pois quando modificáveis podem exercer um poder igual ou superior àqueles relacionados com diferenças biológicas e fisiológicas.

A conjugalidade viúvo/solteiro/separado foi superior nas mulheres, fruto da sua maior longevidade, situação que tende a progredir com o avançar da idade devido, sobretudo, à viuvez.

Não foram encontradas diferenças na escolaridade, sendo o seu índice muito baixo na totalidade da amostra (mais de 90% dos indivíduos não tinham escolaridade ou esta era inferior ou igual a 4 anos), apesar de no Censos de 2011 concluir-se que a taxa de analfabetismo das mulheres é cerca do dobro em relação a dos homens (6,8% contra 3,5%). Apesar das conclusões censitárias de 2011 terem revelado um recuo global na taxa de analfabetismo de 9,0% para 5,2% em comparação a 2001, Portugal mantém elevada proporção de portugueses sem escolaridade ou com fracas competências escolares nas gerações mais velhas. Este aspeto deverá constituir um desafio para o desenvolvimento de políticas educacionais para as futuras gerações idosas, pois a extensão da escolaridade é um determinante que trará vantagens ao nível da literacia em saúde e, por conseguinte, da saúde das populações,1313 Fernandes AA. Determinantes da mortalidade e da longevidade: Portugal numa perspectiva europeia (UE15, 1991-2001). Anal Soc. 2007;42(183):419-43. Full text link
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diminuindo paralelamente a sobrecarga dos serviços de saúde.22 Serrano-Alarcón, Perelman J. Ageing under unequal circumstances: a cross-sectional analysis of the gender and socioeco-nomic patterning of functional limitations among the Southern European elderly. Int J Equity Health. 2017;16(1):175. DOI
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A percentagem de idosos a viverem sozinhos no domicílio foi mais acentuada entre as mulheres, resultado que deve estar relacionado com a maior longevidade feminina que, precipitando a sua viuvez, faz com que vivam também mais isoladas. No entanto a percentagem de indivíduos a passarem mais de oito horas sozinhos foi mais elevada do que a dos indivíduos que vivem sós (32,8% e 29,7%, respectivamente), levando-nos a supor que mesmo aqueles que vivem acompanhados passam muito tempo sós. Serão provavelmente os idosos viúvos que vivem com os filhos, cuja grande parte do tempo é passada fora de casa a trabalhar.

As mulheres revelaram possuir mais crença religiosa e maior prática de culto, se bem que esta última em um valor acentuadamente inferior (90,7% para 58,2%). O interesse e o número de estudos sobre religiosidade e espiritualidade no envelhecimento cresceram exponencialmente nos últimos anos, encontrando-se numerosos trabalhos que estudam a sua associação com a funcionalidade, o bem-estar, a participação ou a qualidade de vida, quer no contexto da saúde, quer no contexto da doença. A crença e as práticas religiosas são comuns em Portugal, sobretudo nos grupos etários mais velhos e nas mulheres. Apesar de se observar uma queda “inter” e “intra” geracional da prática religiosa, a religiosidade dos portugueses mantêm-se elevada nas práticas, nas atitudes em relação à igreja e na autoperceção das pessoas enquanto religiosas.1414 Menéndez MA. Religiosidade e valores em Portugal: comparação com a Espanha e a Europa católica. Anal Soc. 2007;42(184):757-87. Full text link
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O desenvolvimento espiritual e a religiosidade tendem a acentuar-se com o envelhecimento, existindo alguns aspectos da espiritualidade que se intensificam e se associam a este processo. Na essência, a espiritualidade nos últimos anos de vida consiste em encontrar um significado nuclear da vida e dar esse significado à relação com Deus e com os outros.1515 Manning LK. Spirituality as a lived experience: exploring the essence of spirituality for women in late life. Int J Aging Hum Dev. 2012;75(2):95-113. DOI
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As mulheres aparecem habitualmente nas pesquisas como possuindo mais religiosidade. Esta conclusão é argumentada pelo fato de muitos dos aspetos sociais da religião conterem traços femininos, como a obediência e o carinho pelos outros. Outra razão relacionada com esta distinção prende-se à socialização: as mulheres tendem a possuir laços sociais e sistemas de apoio social mais abrangentes, quer dentro da igreja, quer em outros ambientes laicos, o que as torna mais participativas e coletivas.99 Zheng Z, Gao J, Yang Y. The enigma of gender differences in an environment-behavior-health model of elderly people: the choice between individually and sociality. Int J Environ Res Public Health. 2020;17(10):3483. DOI
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A prática de culto revelou uma adesão menor por parte dos constituintes da amostra, provavelmente por terem alguma dificuldade em deslocar-se aos locais de culto ou mesmo porque genericamente tem-se observado globalmente um decréscimo na sua participação.

Os estudos são unânimes em referir menor rendimento econômico às mulheres idosas, derivado da precaridade de sua escolaridade e especialização profissional,66 Fontes AP, Botelho MA, Fernandes AA. A funcionalidade dos mais idosos (≥75 anos): conceitos, perfis e oportunidades de um grupo heterogêneo. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2013;16(1): 91-107. DOI
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,88 Fernandes AA, Burnay R. Homens saudáveis, mulheres doentes? Um estudo sobre a esperança de vida e a saúde da população portuguesa. Rev Bras Pesq Saude. 2019;21(2):17-28. Full text link
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se bem que no presente estudo nem a escolaridade nem a profissão se revelaram distintas quanto ao sexo. Os idosos, e sobretudo as mulheres, constituem um dos grupos mais vulneráveis à pobreza devido aos baixos valores de suas pensões,88 Fernandes AA, Burnay R. Homens saudáveis, mulheres doentes? Um estudo sobre a esperança de vida e a saúde da população portuguesa. Rev Bras Pesq Saude. 2019;21(2):17-28. Full text link
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,1313 Fernandes AA. Determinantes da mortalidade e da longevidade: Portugal numa perspectiva europeia (UE15, 1991-2001). Anal Soc. 2007;42(183):419-43. Full text link
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,1616 Lima ALB, Espelt A, Bosque-Prous M, Lima KC. Gender differences in disability among older adults in the context of social gender and income inequalities: 2013 Brazilian Health Survey. Rev Bras Epidemiol. 2020;23:e200002. DOI
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vulnerabilidade essa que tem acentuado-se com a conjuntura econômica e social atual. A decomposição de índices de desigualdade confirma a vulnerabilidade da população idosa à pobreza, bem como situações mais desfavorecidas ao estado de saúde e aos níveis de instrução, verificando-se igualmente uma grande disparidade entre sexos, em desfavor das mulheres, sobretudo quando se considera a população idosa no primeiro decil da pobreza.88 Fernandes AA, Burnay R. Homens saudáveis, mulheres doentes? Um estudo sobre a esperança de vida e a saúde da população portuguesa. Rev Bras Pesq Saude. 2019;21(2):17-28. Full text link
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,1313 Fernandes AA. Determinantes da mortalidade e da longevidade: Portugal numa perspectiva europeia (UE15, 1991-2001). Anal Soc. 2007;42(183):419-43. Full text link
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Estes dados refletem a história da acessibilidade à escolaridade em Portugal nas primeiras décadas do século passado, materializada sobretudo no sexo feminino.

Da mesma forma que observou-se uma escolaridade global baixa, também encontrou-se uma diferenciação profissional pobre (77,4% dos indivíduos com profissões não qualificadas). A escolaridade é seguramente indis-sociável da qualificação e diferenciação profissional, cuja manifestação observa-se nas gerações mais velhas, sobretudo se levarmos em conta a percentagem desses indivíduos que estiveram ligados ao setor primário. O estatuto socioeconômico refletido pela educação, rendimento e atividade profissional devem ser considerados como determinantes da longevidade e da mortalidade,88 Fernandes AA, Burnay R. Homens saudáveis, mulheres doentes? Um estudo sobre a esperança de vida e a saúde da população portuguesa. Rev Bras Pesq Saude. 2019;21(2):17-28. Full text link
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pois, para além da relação importante e intrincada que estabelecem entre si, projetam a possibilidade de acesso aos cuidados de saúde e relacionam-se com a condição de saúde e funcionalidade dos indivíduos.22 Serrano-Alarcón, Perelman J. Ageing under unequal circumstances: a cross-sectional analysis of the gender and socioeco-nomic patterning of functional limitations among the Southern European elderly. Int J Equity Health. 2017;16(1):175. DOI
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,44 Carmona-Torres JM, Rodríguez-Borrego MA, Laredo-Aguilera JA, López-Soto PJ, Santacruz-Salas E, Cobo-Cuenca AI. Disability for basic and instrumental activities of daily living in older individuals. PLoS One. 2019;14(7):e0220157. DOI
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,1616 Lima ALB, Espelt A, Bosque-Prous M, Lima KC. Gender differences in disability among older adults in the context of social gender and income inequalities: 2013 Brazilian Health Survey. Rev Bras Epidemiol. 2020;23:e200002. DOI
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A perceção do estado de saúde física e mental é um indicador recomendado na monitorização da saúde das populações, sendo reconhecida a sua predição na morbidade, no declínio funcional e na mortalidade,55 Oliveira A, Nossa P, Mota-Pinto A. Assessing functional capacity and factors determining functional decline in the elderly: a cross-sectional study. Acta Med Port. 2019;32(10):654-60. Full text link
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,1616 Lima ALB, Espelt A, Bosque-Prous M, Lima KC. Gender differences in disability among older adults in the context of social gender and income inequalities: 2013 Brazilian Health Survey. Rev Bras Epidemiol. 2020;23:e200002. DOI
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bem como a sua relação com a qualidade de vida no que tange a saúde.88 Fernandes AA, Burnay R. Homens saudáveis, mulheres doentes? Um estudo sobre a esperança de vida e a saúde da população portuguesa. Rev Bras Pesq Saude. 2019;21(2):17-28. Full text link
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A perceção da saúde mental foi mais positiva do que a da saúde física e em ambas os homens revelaram valores mais positivos, se bem que sem diferenças significativas. Grande parte dos estudos revela perceção mais desfavorável para as mulheres; percepção essa não apenas associada à sua maior longevidade, como também à presença superior de condições crônicas.11 Boerma T, Hosseinpoor AR, Verdes E, Chatterji S. A global assessment of the gender gap in self-reported health with survey data from 59 countries. BMC Public Health. 2016;16:675. DOI
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,1616 Lima ALB, Espelt A, Bosque-Prous M, Lima KC. Gender differences in disability among older adults in the context of social gender and income inequalities: 2013 Brazilian Health Survey. Rev Bras Epidemiol. 2020;23:e200002. DOI
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No presente estudo, o sexo feminino apresentou hábitos ou comportamentos mais saudáveis no que diz respeito ao consumo de refeições, fumo e álcool. A média do número de refeições por dia corresponde à toma das quatro principais refeições diárias, sendo que um número elevado de refeições por dia é uma das variáveis contempladas nos hábitos e nas dietas alimentares equilibradas, constituindo uma referência na triagem dos grupos de risco e da funcionalidade.1717 Sugiura Y, Tanimoto Y, Imbe A, Inaba Y, Sakai S, Shishikura K, et al. Association between functional capacity decline and nutritional status based on the nutrition screening initiative checklist: a 2- year cohort study of Japanese community dwelling elderly. PLoS One. 2016;11(11):e0166037. DOI
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Este fator, juntamente à qualidade dos nutrientes, pode melhorar o controle das doenças crônicas, a saúde e a funcionalidade em qualquer idade. Culturalmente, as mulheres estão mais associadas à aquisição e preparação dos alimentos, o que por si só as predispõe a uma maior tendência para consumir mais refeições.

Em relação ao consumo de tabaco, na presente pesquisa foram encontrados valores baixos (15,5% para a amostra total). Seu consumo tende a diminuir com a idade, sendo quase inexistente no sexo feminino. Por questões culturais e no que diz respeito aos grupos etários mais velhos, o consumo do tabaco é mais comum entre os homens e indivíduos mais escolarizados, havendo a acrescentar a estes últimos a superioridade econômica que facilita a sua aquisição. Contudo, apesar de observarem-se diferenças significativas no número de UMA, este revelou-se independente do sexo.

Em Portugal e nas gerações mais velhas o consumo de álcool aparece ligado substancialmente ao sexo masculino, por questões culturais, econômicas e de socialização, sendo prova disso as doenças e a mortalidade que lhe estão associadas. Conclui-se ainda que o consumo do álcool foi superior ao do tabaco (28,8% versus 15,5%), resultado que não será alheio ao fato de Portugal ser um país com uma produção importante de vinho e ter enraizado o seu consumo nas principais refeições.

Mais da metade dos indivíduos referiu necessidade de ajuda no desempenho das atividades diárias, sobretudo as mais complexas; não verficou-se, no entanto, diferenças entre os sexos. Como veremos posteriormente na análise das diferentes atividades, as diferenças na funcionalidade entre sexos ocorreram basicamente ligadas à mobilidade/locomoção, sendo que esta poderá ser a razão por também não encontrarem-se diferenças de sexo na necessidade e tipo de ajuda para o desempenho das atividades.

Apesar do número de quedas não ter sido significativamente diferente entre homens e mulheres, as sequelas observadas foram superiores no sexo feminino. Na literatura é habitualmente referenciado que as mulheres caem mais,1818 Elias Filho J, Borel WP, Diz JBM, Barbosa AWC, Britto RR, Felício DC. Prevalence of falls and associated factors in community-dwelling older Brazilians: a systematic review and meta-analysis. Cad Saude Publica. 2019;35(8):e00115718. DOI
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se bem que em idades mais avançadas essa diferenciação tenda a esgotar-se,66 Fontes AP, Botelho MA, Fernandes AA. A funcionalidade dos mais idosos (≥75 anos): conceitos, perfis e oportunidades de um grupo heterogêneo. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2013;16(1): 91-107. DOI
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conforme observado no presente estudo. A justificação para que as sequelas tenham sido superiores nas mulheres pode residir na sua maior fragilidade e prevalência de sarcopénia ou osteoporose,1818 Elias Filho J, Borel WP, Diz JBM, Barbosa AWC, Britto RR, Felício DC. Prevalence of falls and associated factors in community-dwelling older Brazilians: a systematic review and meta-analysis. Cad Saude Publica. 2019;35(8):e00115718. DOI
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,1919 Ek S, Rizzuto D, Fratiglioni L, Calderón-Larrañaga A, Johnell K, Sjöberg L, et al. Risk factors for injurious falls in older adults: the role of sex and length of follow-up. J Am Geriatr Soc. 2019;67(2):246-53. DOI
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mas também, como observado no presente estudo, pode estar ligada às dificuldades na mobilidade e ao estado civil. Com efeito, a incapacidade na dinâmica da marcha (por exemplo, mudanças na direção e velocidade) tende a provocar sequelas mais graves após quedas.55 Oliveira A, Nossa P, Mota-Pinto A. Assessing functional capacity and factors determining functional decline in the elderly: a cross-sectional study. Acta Med Port. 2019;32(10):654-60. Full text link
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Por outro lado, alguns estudos sugerem que a presença de um (a) companheiro (a) ou a coresidência podem constituir um fator protetor para este risco,55 Oliveira A, Nossa P, Mota-Pinto A. Assessing functional capacity and factors determining functional decline in the elderly: a cross-sectional study. Acta Med Port. 2019;32(10):654-60. Full text link
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,1919 Ek S, Rizzuto D, Fratiglioni L, Calderón-Larrañaga A, Johnell K, Sjöberg L, et al. Risk factors for injurious falls in older adults: the role of sex and length of follow-up. J Am Geriatr Soc. 2019;67(2):246-53. DOI
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assente no apoio e supervisão que podem proporcionar.

Cerca de dois terços dos indivíduos (65,6%) referiram necessitar de um dispositivo de auxílio, sendo que essa utilização foi superior nas mulheres. A facilidade no acesso e o desenvolvimento tecnológico dos dispositivos de auxílio têm aumentado a sua utilização, permitindo à população idosa manter níveis de independência cada vez mais elevados e prolongados. O recurso a ortóteses visuais, auditivas e auxiliares de marcha aumenta com a idade, fruto das alterações estruturais e fisiológicas a ela associadas. Tendo em conta que na presente amostra as mulheres se apresentaram mais velhas e com mais dificuldades na locomoção, poderá ser esta a explicação para que tenham revelado maior necessidade de dispositivos de auxílio. Alguns estudos especificam também uma prevalência superior do sexo feminino associada a uma maior procura dos cuidados de saúde, o que faz aumentar a oportunidade de utilizarem estes dispositivos.11 Boerma T, Hosseinpoor AR, Verdes E, Chatterji S. A global assessment of the gender gap in self-reported health with survey data from 59 countries. BMC Public Health. 2016;16:675. DOI
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,2020 Vela C, Samson E, Zunzunegui MV, Haddad S, Aubin MJ, Freeman EE. Eye care utilization by older adults in low, middle, and high income countries. BMC Ophthalmol. 2012; 12:5. DOI
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A necessidade de auxílio no desempenho das atividades é prestada fundamentalmente pelos filhos (34,0%) no caso das mulheres e pelos cônjuges (30,9%) no grupo dos homens. O apoio dos familiares correspondeu no seu conjunto a 80,9% dos casos, enquanto o prestado por via institucional foi observado em 5,3% das situações. A literatura é unânime em reconhecer que o papel do cuidador informal principal liga-se fundamentalmente às mulheres,2121 Hirata H. Care work: a comparison of Brazil, France and Japan. SUR 24. 2016;13(24):53-63. Full text link
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22 Giacomin KC, Oliveira Duarte YA, Camarano AA, Pires Nunes D, Fernandes D. Cuidado e limitações funcionais em atividades cotidianas - ELSI-Brasil. Rev Saude Publica. 2018;52(Supl 2):9s. DOI
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-2323 Verbakel E. How to understand informal caregiving patterns in Europe? The role of formal long-term care provisions and family care norms. Scand J Public Health. 2018;46(4):436-47. DOI
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sendo que as explicações para as diferenças do cuidado informal relativas ao sexo assentam sobretudo em argumentações redundantes que indicam que o cuidado não faz parte das expectativas sociais e culturais do homem. A afinidade entre a longevidade, as mulheres e a viuvez propicia que a ajuda familiar seja disponibilizada fundamentalmente pelas filhas. Pela mesma proximidade, mas por motivos contrários, os mais novos, sobretudo os homens, com maior possibilidade de terem companheira, veem a necessidade de o apoio poder ser por elas concedido. Além da relação familiar e de sexo, a coresidência é também um fator decisivo para a opção do cuidador,2121 Hirata H. Care work: a comparison of Brazil, France and Japan. SUR 24. 2016;13(24):53-63. Full text link
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,2222 Giacomin KC, Oliveira Duarte YA, Camarano AA, Pires Nunes D, Fernandes D. Cuidado e limitações funcionais em atividades cotidianas - ELSI-Brasil. Rev Saude Publica. 2018;52(Supl 2):9s. DOI
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pressupondo uma vivência em comum cuja proximidade física e afetiva se estabelece no cuidar e que para os viúvos se reflete nos filhos, enquanto para os casados, nos cônjuges. A manutenção do apoio informal tem suscitado nos últimos anos várias questões e debates que assentam, entre outras, na sua sustentabilidade. As mudanças verificadas nos últimos anos nas esferas demográfica, social, familiar e econômica mostram uma indisponibilidade cada vez maior para o denominado “potencial de cuidados familiares”, que compromete o tão desejado “envelhecer em casa”.2424 Canga A, Vivar C, Durán CN. Dependencia y familia cuidadora: reflexiones para un abordaje familiar. An Sist Sanit Navar. 2011;34(3):463-9. DOI
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Por outro lado, a sustentabilidade dos recursos institucionais, apoiada pelo estado social, tem progressivamente e de uma forma cada vez mais vertiginosa dado mostras da sua falência. Encontrar o equilíbrio entre o apoio institucional e o suporte e o apoio informal é um grande desafio das políticas sociais do envelhecimento para os próximos anos.

A frequência de incontinência urinária revelou-se diferente entre homens e mulheres, contudo independente do sexo. A prevalência da incontinência urinária apresenta resultados muito diferentes na literatura, reflexo das diferentes abordagens metodológicas e das variáveis de associação, porém sendo unânime que é mais prevalente no sexo feminino e que aumenta exponencialmente com a idade e dependência funcional. Contudo a linearidade e a causalidade entre a funcionalidade e a incontinência urinária continua por esclarecer, mantendo-se a dúvida se é esta quem determina níveis de funcionalidade mais baixos ou se são estes que predispõem para a deficiência, se bem que as suas presenças coexistam e sejam muitas vezes contemporâneas. As causas estruturais e fisiológicas associadas à incontinência urinária feminina são o enfraquecimento dos músculos vesicais e dos esfíncteres, atrofia vaginal e uretral, dificuldade na retenção e esvaziamento da bexiga e aumento do volume residual de urina, além da multiparidade, histerectomia e alterações hormonais decorrentes da menopausa.2525 Alperin M, Burnett L, Lukacz E, Brubaker L. The mysteries of menopause and urogynecologic health: clinical and scientific gaps. Menopause. 2019;26(1):103-11. DOI
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Menos prevalente do que a incontinência urinária, e por isso sujeita a menos estudos, a incontinência fecal aparece na literatura quase exclusivamente associada à idade e a algumas condições específicas de saúde, como a diarreia crônica ou a diabetes.2626 Manuelyan Z, Muñiz KS, Stein E. Common urinary and bowel disorders in the geriatric population. Med Clin North Am. 2020;104(5):827-42. DOI
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A par da idade, o sexo é uma das características demográficas com maior peso na diferenciação da independência dos idosos, tendendo globalmente e positivamente para os homens.11 Boerma T, Hosseinpoor AR, Verdes E, Chatterji S. A global assessment of the gender gap in self-reported health with survey data from 59 countries. BMC Public Health. 2016;16:675. DOI
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2 Serrano-Alarcón, Perelman J. Ageing under unequal circumstances: a cross-sectional analysis of the gender and socioeco-nomic patterning of functional limitations among the Southern European elderly. Int J Equity Health. 2017;16(1):175. DOI
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-33 Jacob ME, Marron MM, Boudreau RM, Odden MC, Arnold AM, Newman AB. Age, race, and gender factors in incident disability. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2018;73(2):194-7. DOI
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Não é possível afirmar que os resultados do presente estudo corroboram esta conclusão, pois, das 20 tarefas analisadas, só foram encontradas diferenças em três (15%). Esta conclusão já foi observada por outros autores, sobretudo em idades mais avançadas.55 Oliveira A, Nossa P, Mota-Pinto A. Assessing functional capacity and factors determining functional decline in the elderly: a cross-sectional study. Acta Med Port. 2019;32(10):654-60. Full text link
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,66 Fontes AP, Botelho MA, Fernandes AA. A funcionalidade dos mais idosos (≥75 anos): conceitos, perfis e oportunidades de um grupo heterogêneo. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2013;16(1): 91-107. DOI
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O pior desempenho observado nas mulheres em relação à mobilidade associa-se habitualmente a determinadas condições de saúde mais prevalentes no sexo feminino: condições artríticas, artroses, depressão, marcadores biológicos decorrentes da menopausa (sarcopénia e osteoporose), maior longevidade11 Boerma T, Hosseinpoor AR, Verdes E, Chatterji S. A global assessment of the gender gap in self-reported health with survey data from 59 countries. BMC Public Health. 2016;16:675. DOI
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,22 Serrano-Alarcón, Perelman J. Ageing under unequal circumstances: a cross-sectional analysis of the gender and socioeco-nomic patterning of functional limitations among the Southern European elderly. Int J Equity Health. 2017;16(1):175. DOI
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e, conforme alguns autores, vulnerabilidade socio-econômica.33 Jacob ME, Marron MM, Boudreau RM, Odden MC, Arnold AM, Newman AB. Age, race, and gender factors in incident disability. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2018;73(2):194-7. DOI
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Nas restantes atividades/participação analisadas, só foram encontradas diferenças na atividade lavar/secar roupa, cujos resultados foram mais desfavoráveis para os homens. Habitualmente, estes apresentam maiores dificuldades nas atividades relacionadas com a vida doméstica, mais por questões culturais e educacionais do que por incapacidades neuromotoras. A tarefa lavar/secar roupa pode ser um exemplo desta diferença, pois mantém-se socialmente muito ligada às mulheres, mesmo nas gerações mais novas.

O American College of Sports Medicine e a American Heart Association2727 American College of Sports Medicine, Chodzko-Zajko WJ, Proctor DN, Singh MAF, Minson CT, Nigg CR, et al. American College of Sports Medicine position stand. Exercise and physical activity for older adults. Med Sci Sports Exerc. 2009;41(7):1510-30. DOI
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recomendam para a população idosa e para que se observem benefícios para a saúde, a prática regular de 150 minutos de exercício de intensidade moderada por semana. Perante estas recomendações, pode-se reconhecer que os resultados revelados foram positivos e que terão contribuído para o desempenho observado nas atividades enquanto variável protetora da incapacidade.2828 Sjölund BM, Wimo A, Engström M, von Strauss E. Incidence of ADL disability in older persons, physical activities as a protective factor and the need for informal and formal care - results from the SNAC-N Project. PloS one. 2015;10(9): e0138901. DOI
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A ruralidade da amostra poderá também ter contribuído para esta observação, na medida que tem subjacente o hábito das pessoas se deslocarem sobretudo a pé por proximidades relacionais e por escassez de transportes coletivos.

Consideram-se como limitações do estudo: i) o fato de a coleta de dados ter sido realizada através do autorrelato, o que poder ter causado algum viés de informação; ii) não terem sido consideradas as comorbidades e a dor enquanto variáveis habitualmente relacionadas com o perfil de funcionalidade.

Conclusão

As mulheres apresentam-se mais desprotegidas nas dimensões social e econômica, enquanto os homens manifestam hábitos de saúde mais vulneráveis. Estas diferenças estão ligadas às questões demográficas da longevidade e às diferenças culturais e de socialização. As diferenças nos domínios das atividades/participação tendem a diluir-se entre os sexos.

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Editado por

Editora associada:

Angélica Cavalcanti de Sousa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    16 Nov 2020
  • Revisado
    03 Dez 2021
  • Aceito
    06 Dez 2021
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