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Diversidade humana e interseccionalidade: problematização na formação de profissionais da saúde

Human diversity and intersectionality: problematization in the education of health professionals

Diversidad humana e interseccionalidad: problematización en la formación de profesionales de la salud

Resumos

Inspiradas em intervenções lúdicas no campo da Educação, relatamos a construção de um jogo de tabuleiro com personagens que apresentam algumas características de privilégios e desigualdades econômicas, sociais e históricas. Trata-se de um relato de experiência que objetiva descrever uma estratégia pedagógica, visibilizando a diversidade humana com graduandos de cursos da Saúde de uma universidade no Nordeste brasileiro. Foram debatidos temas relativos a diversidade, interseccionalidade e relações de poder, dialogando com o racismo, o machismo, o capacitismo, a operacionalização das políticas de saúde e sua influência na prática profissional. Consideramos que a estratégia pedagógica demonstra que essas questões são invisíveis nas práticas de saúde e quão, muitas vezes, são sustentados discursos que legitimam as desigualdades tomando-as como naturais, o que demonstra a importância da problematização dos temas abordados para a formação do profissional de saúde.

Palavras-chave
Diversidade humana; Interseccionalidade; Formação em Saúde; Jogo; Saúde Coletiva


Inspired by game-based learning interventions in the field of education, we describe the development of a board game with characters who have characteristics representing privilege and historical social and economic inequalities. This article is an experience report aimed at describing a pedagogical strategy that makes human diversity visible developed with undergraduate health students at a university in the northeast of Brazil. Topics related to diversity, intersectionality and power relations were debated in dialogue with racism, machismo, capacitism and the operationalization of health policies and their influence on professional practice. The pedagogical strategy demonstrates that these questions are invisible in health practices and just how much discourses that legitimize inequalities are often sustained, making them normal. This demonstrates the importance of problematizing the topics addressed by this study in the education of health professionals.

Keywords
Human diversity; Intersectionality; Health education; Games; Public health


Inspiradas en intervenciones lúdicas en el campo de la educación, relatamos la construcción de un juego de mesa con personajes que presentan algunas características de privilegios y desigualdades económicas, sociales e históricas. Se trata de un relato de experiencia cuyo objetivo es describir una estrategia pedagógica que visibiliza la diversidad humana ante los alumnos de graduación de cursos de salud de una universidad en el nordeste brasileño. Se discutieron temas relativos a la diversidad, interseccionalidad y relaciones de poder, dialogando con el racismo, el machismo, el capacitismo y la puesta en operación de las políticas de salud y su influencia en la práctica profesional. Consideramos que la estrategia pedagógica demuestra que esas cuestiones son invisibles en las prácticas de salud y hasta qué punto, muchas veces, se sostienen discursos que legitiman las desigualdades, viéndolas como si fueran naturales, lo que demuestra la importancia de la problematización de los temas abordados para la formación del profesional de salud.

Palabras clave
Diversidad humana; Interseccionalidad; Formación en salud; Juego; Salud colectiva


Introdução

A educação superior, ao longo do tempo, apresenta mudanças importantes em seu processo de ensino-aprendizagem. O ensino tradicional, centrado no conhecimento cognitivo e na figura do professor, tem dado lugar a uma nova perspectiva, na qual o ensino por competências é valorizado e o aluno passa a ser protagonista desse processo11 Alcantara A, Pereira E, Sá LHC. Ensinando & aprendendo: os fundamentos da docência no ensino superior. Fortaleza: Universidade de Fortaleza; 2017.. Essa tendência ainda enfrenta desafios e barreiras, e os cursos da área da Saúde também são afetados por esse processo.

Sendo assim, o ensino superior na área da Saúde tem sido ainda perpassado pelo modelo biomédico, centrado na doença, no diagnóstico clínico e na remissão do sintoma como alvo principal. O entendimento do homem como um ser social e a construção de um conceito ampliado de saúde, no qual as Ciências Sociais assumem um papel fundamental na análise dos processos saúde e doença, por vezes são negligenciados na formação de profissionais da saúde. A mudança para uma visão biopsicossocial tem sido lenta, mas esse caminho é possível e necessário.

Atenta a essas mudanças no cenário da educação superior, a Universidade de Fortaleza (Unifor), desde 2012, adota um currículo por competência e integrado, com o uso de metodologias ativas que buscam operacionalizar a construção de um sujeito mais crítico e humanizado11 Alcantara A, Pereira E, Sá LHC. Ensinando & aprendendo: os fundamentos da docência no ensino superior. Fortaleza: Universidade de Fortaleza; 2017..

Entendemos que o ambiente universitário não está imune a discriminações sociais, violência contra mulher, atitudes preconceituosas contra população LGBTQI+, capacitismo, atitudes de intolerância com as distintas classes sociais, ataques racistas entre outros22 Meneghel SN. Será a universidade imune às discriminações sociais? Interface (Botucatu). 2019; 23:e190577.. Desse modo, como reforça Meneguel22 Meneghel SN. Será a universidade imune às discriminações sociais? Interface (Botucatu). 2019; 23:e190577., cabe às universidades:

enfrentar violações de direitos humanos de gênero, raça, etnicidade, classe social ou de quaisquer outros tipos de discriminação; e que a universidade siga representando o lugar da produção de conhecimento e da defesa dos valores éticos, democráticos e igualitários, disposta a lutar contra as hierarquias patriarcais, racistas e classistas. (p. 4)

Tendo em vista o atual cenário social impactado pelo aumento de discursos e práticas preconceituosas e excludentes no ambiente universitário, levamos essa discussão e o enfrentamento para a sala de aula. Utilizamos uma estratégia lúdica que permite ao aluno vivenciar situações complexas a fim de criar ambientes potentes para que se processe uma aprendizagem dinâmica, crítica e reflexiva, com apresentação de conceitos que, sem o recurso da ludicidade, podem ser rejeitados ou negados pelos alunos. A ludicidade é uma estratégia que compõe um corpo de metodologias ativas necessárias para a construção de competências que possam suscitar no graduando em curso de Saúde uma reflexão crítica acerca dos processos saúde e doença, como aponta Gomes33 Gomes MPC, Ribeiro VMB, Monteiro DM, Leher EMT, Louzada RCR. O uso de metodologias ativas no ensino de graduação nas ciências sociais e da saúde: avaliação dos estudantes. Cienc Educ. 2010; 16(1):181-98.:

[...] mesmo no nível micropolítico, isto é, na reestruturação de uma disciplina, é possível instalar novas concepções de saúde e de educação, e democratizar as relações entre professores e estudantes, admitindo a parceria com a rede de assistência – tanto no campo do saber quanto institucional – para definir novos rumos para a formação profissional. (p. 181)

Diante do exposto, considerando a relevância do tema na formação de profissionais da saúde, este manuscrito trata-se de um relato de experiência e tem como objetivo descrever uma estratégia pedagógica lúdica que visibiliza a diversidade humana e seus atravessamentos de forma crítica e reflexiva com os alunos de graduação de cursos da saúde de uma universidade no Nordeste brasileiro.

Contextualização do cenário

Na Universidade de Fortaleza, tivemos em 2012 uma reestruturação curricular que propôs a organização do currículo integrado. Assim, a interação teoria e prática, a inclusão de estratégias diversas de aprendizagem e a integração entre os cursos se tornam efetivas. Conforme apontam Roegiers e De Ketele44 Roegiers X, Ketele JMD. Uma pedagogia da integração: competências e aquisições no ensino. Huang C, tradutor. Porto Alegre: Artmed; 2004., existem diferentes faces de integração: articulação da prática e da formação teórica (desde que a teoria esteja colocada a serviço da prática), integração didática (quando o aluno exercita o uso de diferentes estratégias de aprendizagem e aquisições) e integração interformadores ou interprofessores (quando se articulam diferentes pontos de vista para apreender uma situação).

Nessa perspectiva, a atividade relatada neste artigo é realizada desde 2017 como parte do módulo Diversidade Humana e Saúde Coletiva (DHSC), ofertado no segundo semestre dos cursos de Saúde, e tem como objetivos centrais: interpretar o conceito de subjetividade no processo saúde-doença à luz dos modelos explicativos de saúde; humanizar saúde e práticas de cuidado, e os aspectos da diversidade humana; apresentar atitude de respeito e tolerância com consideração aos aspectos da diversidade humana; criar estratégias para a promoção de mudanças e melhorias das condições de saúde e de qualidade de vida, com atenção ao contexto social em que a coletividade se insere; discutir as políticas públicas e os sistemas nacionais de saúde com ênfase no Sistema Único de Saúde (SUS).

Esse módulo está situado no Núcleo Comum do Centro de Ciências da Saúde (CCS), sendo teórico-prático e com carga horária de 72 horas, ofertado para os cursos de Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Nutrição e Odontologia. Cada turma desse módulo possui cerca de 40 alunos dos referidos cursos, favorecendo o interprofissionalismo. Com isso, essa atividade já atingiu cerca de 1.200 alunos.

O lúdico como estratégia de problematização: relato de experiência

O jogo foi elaborado pelas docentes, desde o tabuleiro, o material, as regras e as instruções, inspirado no vídeo publicado na internet pelo Observatoire des Inégalités55 Observatoire des inégalités. Le “Monopoly des inégalités”:un jeu de Société [Internet]. 2017 [citado 20 Jul 2020]. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=gZbfBg4s59g.
https://www.youtube.com/watch?v=gZbfBg4s...
, que teve o objetivo de problematizar a desigualdade social francesa, utilizando uma adaptação do jogo Banco Imobiliário. Contextualizamos o jogo com personagens e situações que aludem a aspectos acerca de diferença, desigualdade e diversidade existentes na nossa sociedade. Em uma turma da disciplina, temos de cinco a seis equipes (com seis alunos em cada uma) realizando o jogo. Todo aluno escolhe uma cor que representaria um personagem, a saber: Homem, branco, rico (laranja); Homem, pobre, negro (lilás); Mulher (azul); Pessoa com deficiência (preto); e Transgênero (verde). Porém, essa correspondência só é revelada ao final da atividade. Um outro aluno assume o papel de coordenador e vai organizando o processo e indicando o que é ou não permitido diante das possibilidades apresentadas a cada personagem em cada jogada.

No tabuleiro colocamos situações cotidianas como: comprar bens, seleção de emprego, ser preso, ganhar presentes, participar de festas de família, ganhar “vale night”, fazer sociedades, entre outros. Cada jogador, ao movimentar-se no tabuleiro, obedecia aos limites de cada personagem (cor), conforme descrição no Quadro 1 apresentado a seguir. Vale ressaltar que a intenção foi produzir características demarcadas socialmente, às vezes até de forma caricaturada.

Quadro 1
Descrição das características dos personagens do jogo

O propósito é criar um clima de desconforto entre os participantes que, ao se perceberem com possibilidades distintas, vão externalizando sentimentos de frustração, inveja, raiva, superioridade etc. Após o jogo, é iniciada uma discussão sobre quais sentimentos e conflitos surgiram e o grupo é convidado a identificar que personagens r epresentavam cada uma das cores. Em seguida, é realizada uma exposição dialogada sobre os conceitos de diversidade, diferença, interseccionalidade e a relação com a prática do profissional da saúde.

O jogo acontece em uma aula específica, mas os conteúdos são retomados ao longo do semestre articulados a outras temáticas do módulo, tais como subjetividade e prática de cuidado. Por exemplo, ao pensarmos em estratégias de promoção de saúde visando a melhoria das condições de saúde e de vida da população, retomamos os aspectos ligados à diversidade humana e às distintas visões de mundo. Na medida em que compartilhamos as práticas de cuidado, refletimos acerca de contextos diversos e/ou muitas vezes distantes do dia a dia do aluno, como atender/acolher uma mulher trans, negra e com diagnóstico de hipertensão; ou ainda, quando discutimos as políticas públicas e o SUS, visibilizamos a importância de políticas específicas direcionadas à população negra, indígena ou LGBTQi+.

Sublinhamos que, como o currículo da universidade se organiza por meio da integralidade, temos módulos que compõem uma sequência na aquisição de competências. No primeiro semestre o aluno cursa o módulo Universidade, Saúde e Sociedade (USS), tendo como objetivo, dentre outros: relacionar conhecimento, universidade, organização social e relações de poder; relacionar as ciências da saúde e as sociais, com base nos modelos explicativos e contextos histórico-sociopolítico-culturais; discorrer sobre a humanização do cuidado em saúde na perspectiva das dimensões histórico-sociopolítico-cultural; tornar-se um agente de transformação social nos diversos contextos de sua formação profissional. Os módulos seguintes ao de DHSC são organizados no campo da Saúde Coletiva, no qual são iniciadas visitas e atividades em equipamentos de saúde e sociais, como unidade básica, UPA, Caps, escolas etc. Assim, os módulos iniciais (USS e DHSC) apresentam metodologias ativas, situações-problema, vídeos, filmes, textos, jogos, perspectivas que coloquem o aluno diante de vivências que o auxiliarão nos semestres seguintes.

Ao final da atividade, intenta-se que o aluno identifique a diversidade humana como uma construção perpassada por dimensões econômicas, sociais, culturais e históricas, podendo relacioná-la com a prática dos profissionais da saúde.

Para avaliar essa atividade, solicitamos que os alunos escrevessem um texto com o objetivo de refletir sobre as sensações e percepções que a atividade mobiliza, bem como seus efeitos na formação de profissionais da saúde. A produção escrita é lida e comentada pelo docente responsável pela turma, posteriormente, de maneira individualizada.

A atividade tem uma boa receptividade por parte dos alunos mesmo que eles, a princípio, tivessem dificuldade de relacionar o jogo com sua prática profissional no campo da saúde. Muitos se dão conta de quanto invisibilizamos essas questões e nos colocamos à parte de uma discussão crítica. Os alunos relatam quanto são atravessados por espaços de privilégios e de exclusão e identificam situações reais e cotidianas nas quais vivenciam ou presenciam cenas semelhantes. Entretanto, nem todos se sentem à vontade ou avaliam como positiva essa experiência. Alguns alunos insistem em sustentar discursos que legitimam as desigualdades, tomando-as como naturais. Outros, ainda, se retiram da sala e verbalizam total descontentamento com a atividade.

A seguir destacamos a importância de experiências reflexivas no ensino da graduação em Saúde e discutiremos conceitualmente temas como interseccionalidade, relações de poder e decolonialidade. Vale ressaltar que o conceito de interseccionalidade, relações de poder e os processos de inclusão e exclusão são debatidos com os alunos na construção do conhecimento. Contudo, o tema da decolonialidade aparece mais como uma chave de leitura crítica para problematizar a realidade, utilizado pelas autoras na escrita deste artigo, não sendo explicitado aos alunos, considerando sua densidade teórica para a graduação(d (d) Inclusive, as referências bibliográficas listadas fundamentam a análise dessa intervenção e não são trabalhadas em sala com os alunos, com exceção do artigo “Diferença e Interseccionalidade” (MELLO, 2010), que corresponde ao texto sugerido aos alunos. ).

O que queremos visibilizar

Aluno bate na mesa e grita: “Não quero mais jogar, eu não consigo ter nada e vou de novo pra prisão!”, enquanto o outro ri e diz: “Se acostuma”!

E o aluno retruca: “Você diz isso porque pode tudo, não perde nada!” E outra aluna complementa: “Dá raiva mesmo! Queria ter ficado com a cor laranja, ter tudo, não passar vontade! A minha cor é muito ruim, nem minha família gosta de mim”. Diálogos como esses surgem durante o jogo, que convida os alunos a se depararem com situações e contextos que muitas vezes são tão distantes que nem parecem existir, mas existem.

Podemos analisar essa cena com base nas contribuições foucaultianas acerca das relações de poder e das regras de formação do discurso. Para o autor, o discurso corresponde a práticas discursivas que estão conectadas aos seus contextos de produção, observando os seguintes elementos: quem enuncia (direito privilegiado do sujeito que fala), onde enuncia (em que época histórica, em que contingência) e o que se enuncia. “Sabe-se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância; que qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa”66 Foucault M. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola; 2011. (p. 9). Dessa forma, escolhemos essa cena para demarcar os lugares de existência diferentes dos personagens: o laranja (melhor salário, bônus, não perde nem vai para a prisão) em relação ao verde (salário baixo, sem direito a bônus, não ganha presente, “família não gosta” etc.). Por isso, o personagem laranja, privilegiado, se alegra e afirma que o jogo é divertido. Já os outros sujeitos, alvos de sistemas de exclusão, relatam, nessa cena, sua insatisfação e julgam o jogo injusto. Segundo França77 França LC. Usuário ou traficante? Critérios utilizados por operadores do direito no julgamento de adolescentes flagrados com drogas ilícitas no município de Fortaleza/CE [tese]. Fortaleza: Centro de Humanidades, Universidade Federal do Ceará; 2019.:

O que formulamos como “cena” corresponde a mais do que uma mera interação de personagens, em um dado cenário. Ligada às contribuições foucaultianas acima descritas, a cena é definida como produto e produtora de um emaranhado de forças que atuam como uma maquinaria que “faz ver e falar” um conjunto de práticas que enunciam lugares políticos, modos de subjetivação, discursos hibridizados, enfim – uma teia complexa que nos propomos analisar. (p. 47)

Os lugares políticos exemplificados por laranja (homem branco) e verde (transgênero), por exemplo, são produzidos nas relações sociais, balizados por discursos preconceituosos, racistas, sexistas e coloniais. Essa discussão é incentivada no momento em que solicitamos aos alunos que compartilhem como se sentiram ocupando seu personagem, como foi estar em um lugar de privilégio ou de opressão e de que forma isso os afeta.

Ao aprofundarmos, na sala de aula, a crítica acerca da produção social da saúde e dos sujeitos, percebemos que a própria visão de ciência e de homem é tida como universal e inquestionável. Torna-se necessária a problematização da compreensão eurocêntrica que produz o homem branco como um ser universal, que narra e “outrifica” todos os outros corpos88 Kilomba G. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Oliveira J, tradutor. Rio de janeiro: Cobogó; 2019.. A própria noção de modernidade e razão privilegia determinadas narrativas (dos “colonizadores”) em detrimento de outras (dos “colonizados”). Nossa intenção é que o aluno reflita sobre como as noções de verdade, do certo, do belo, são efeitos de práticas discursivas concebidas nos tensionamentos das relações de poder99 Foucault M. O sujeito e o poder. In: Dreyfus H, Rabinow P. Michel Foucault, uma trajetória filosófica. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2013.. Por isso, não podem ser tomadas como inquestionáveis ou essenciais, mas como contingentes.

Essa reflexão é alicerçada com base em uma perspectiva decolonial, efeito de um movimento político-teórico que visibiliza como o processo de colonização legitimou genocídios, inclusive epistemológicos, de forma que os “colonizados” foram sendo silenciados e seus conhecimentos deslegitimados como se a Europa fosse um centro de gravidade1010 Santos BS, Meneses MP. Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez; 2010.,1111 Mbembe A. Crítica da razão negra. São Paulo: N-1 edições; 2018.. Assim, a discursividade europeia organizou o mundo por meio de práticas divisórias “civilizados” e “não civilizados” em um cenário colonial1212 Quijano A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina [Internet]. In: Lander E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latinoamericanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: CLACSO; 2005 [citado 13 Jul 2020]. (Colección Sur). Disponível em: http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar
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, acoplando a sua imagem à noção de humanismo e de humanidade, difundindo um “projeto moderno de conhecimento – mas também de governo”1212 Quijano A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina [Internet]. In: Lander E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latinoamericanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: CLACSO; 2005 [citado 13 Jul 2020]. (Colección Sur). Disponível em: http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar
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(p. 12)

A elaboração intelectual do processo de modernidade produziu uma perspectiva de conhecimento e um modo de produzir conhecimento que demonstram o caráter do padrão mundial de poder: colonial/moderno, capitalista e eurocentrado1212 Quijano A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina [Internet]. In: Lander E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latinoamericanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: CLACSO; 2005 [citado 13 Jul 2020]. (Colección Sur). Disponível em: http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar
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. (p. 115)

Nesse projeto de modernidade, há uma produção seletiva de privilégios, de forma que os conhecimentos produzidos por mulheres, negros, indígenas, LGBTQIA+, entre outros corpos não brancos, não homens, não heterossexuais são constantemente desautorizados. Essa seletividade é elucidada tanto nas referências bibliográficas das universidades, que são majoritariamente constituídas por autores brancos europeus ou norte-americanos, quanto pelos próprios corpos que conseguem ingressar no ensino superior. Exemplifica-se no caráter de exceção de acesso e permanência desses corpos na universidade (em especial em cursos da área da Saúde, que são ocupados, historicamente, por uma elite branca).

Considerando a constituição da “supremacia branca”, acima descrita, não por acaso que a cor laranja, que corresponde ao “Homem branco” e necessariamente “rico”, acumula privilégios no jogo, como mesmo ao cair na indicação de ir para prisão pode jogar novamente o dado e continuar o jogo. Já o homem negro tem uma série de restrições e acessos, não podendo nunca fazer sociedade ou adquirir algum bem. A intenção é trazer a discussão de que mesmo com atributos individuais de superação, o homem negro sempre estará em uma condição de inferioridade, diante de uma sociedade que produz o branco como o “comum” e o negro como “outro”. Na discussão que fazemos após a simulação do jogo, muitas vezes o personagem lilás é visto como marginal ou bandido e ao ser desvendada sua condição ligada a questão racial, o grupo de alunos sente-se constrangido de alguma forma. Segundo Kilomba88 Kilomba G. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Oliveira J, tradutor. Rio de janeiro: Cobogó; 2019., esse “constrangimento” é decorrente da negação (a crença de que somos todos iguais e não há diferenças de oportunidades) ou da culpa (consciência da produção social do privilégio branco) experimentada pela branquitude perante o racismo. Nesse sentido, ao verbalizar esse constrangimento, busca que o aluno faça uma autocrítica com outras experiências que já vivenciou.

Segundo França77 França LC. Usuário ou traficante? Critérios utilizados por operadores do direito no julgamento de adolescentes flagrados com drogas ilícitas no município de Fortaleza/CE [tese]. Fortaleza: Centro de Humanidades, Universidade Federal do Ceará; 2019., identificamos instituídos negativos exemplificados nas expressões “situação tá preta”, “cor do pecado”, “inveja branca”, “magia negra”, “negro de alma branca”, presentes no racismo cotidiano que pode ser somado a outras exclusões, como: “coisa de mulher”, “mulherzinha”, “viado”, “aleijado”, “doido”, “pecador”, “é homem ou mulher?”, “anormal”, entre outros.

[...] só o fato de deixar invisível o vetor racismo, na constituição das relações sociais, já diz de uma geopolítica colonial. Por isso, essa perspectiva é fundamental para compreender como se naturalizou, desde a colonização, uma classificação hierárquica entre grupos, a partir do argumento da raça – que irá balizar as relações sociais77 França LC. Usuário ou traficante? Critérios utilizados por operadores do direito no julgamento de adolescentes flagrados com drogas ilícitas no município de Fortaleza/CE [tese]. Fortaleza: Centro de Humanidades, Universidade Federal do Ceará; 2019.. (p. 151)

Importante ressaltar que as cores representam personagens que assumem possibilidades de existências produzidas por jogos de relações de poder e regimes de dominação1313 Foucault M. História da sexualidade: vontade de saber. Rio de Janeiro: GRALL; 2010., que acionam mecanismos de controle ininterruptos, invisíveis (e visíveis), engendrados pela “[...] implantação progressiva e dispersa de um novo regime de dominação”1414 Deleuze G, Guattari F. Mil platôs. Rio de Janeiro: 34 Letras; 1995. v. 1. (p. 225), alicerçados em sociedades de controle.

Por exemplo, socialmente, o direito ao lazer, ao “vale night”, é concedido de forma diferente em relação a homens e mulheres, devido a um regime de dominação patriarcal-machista1515 Akotirene C. Interseccionalidade. São Paulo: Sueli Carneiro, Pólen; 2019.. Mas será que o machismo atravessa todos os corpos de mulheres de forma similar? Será que além do machismo, uma mulher negra nordestina surda não seria alvo de outros regimes de dominação? Não seria também captada por discursos racistas xenofóbicos e capacitistas?

Ao problematizar o papel da mulher como submissa, cuidadora e “do lar”, abrimos espaço para refletir sobre o papel da mulher na sociedade e os atravessamentos que existem nesses cenários. É muito interessante perceber que algumas alunas muitas vezes verbalizam que não foi tão ruim assim ocupar esse lugar “de mulher”, porque de certa forma possuíam acesso a bens, trabalhos e presentes. Por outro lado, alguns alunos, homens, verbalizam quanto se sentiram excluídos e injustiçados. Nesse momento, refletimos sobre como as marcações sociais são naturalizadas e ou mascaradas por outros “benefícios” ou privilégios.

Para lidar com os atravessamentos dos “marcadores” de gênero/sexualidade, raça, etnia, entre outros, que operam sobre os corpos e produzem práticas discursivas, utilizamos o conceito de interseccionalidade. “A interseccionalidade visa dar instrumentalidade teórico-metodológica à inseparabilidade estrutural do racismo, capitalismo e cisheteropatriarcado”1515 Akotirene C. Interseccionalidade. São Paulo: Sueli Carneiro, Pólen; 2019. (p. 19). Conceito oriundo do campo de estudos do feminismo negro, que demarca a existência de um sistema de opressão interligado1616 Collins PH. Aprendendo com a outsider within: a significação sociológica do pensamento feminista negro. Soc Estado. 2016; 31(1):99-127. que assola mulheres negras e que considera

[...] os diversos “marcadores” que são socialmente definidos para delimitar, classificar, hierarquizar e padronizar. Referimo-nos aos eixos dos sistemas de gênero, da “raça”, da etnia, da sexualidade, da idade/geração, da localidade geográfica, da classe, do estado civil ou conjugal, dentre muitos outros1717 Mello L, Gonçalves E. Diferença e interseccionalidade: notas para pensar práticas em saúde. Rev Cronos. 2010; 2(11):163-73.. (p. 164)

Segundo Akotirene1515 Akotirene C. Interseccionalidade. São Paulo: Sueli Carneiro, Pólen; 2019., a sobreposição de gênero, raça e classe configura “modernos aparatos coloniais” que naturalizam e legitimam o “merecimento” de determinados corpos em detrimento de outros. Dessa forma, pensando interseccionalmente, como as políticas públicas acessam deficientes lésbicas? Será que o trato social do transgênero feminino e do masculino é o mesmo?

Nesse contexto, a discussão em sala, por meio do jogo, nos leva a problematizar a sobreposição de papeis e a necessidade do reconhecimento do profissional da saúde, em formação, em buscar o entendimento do sujeito com todas as suas especificidades, sejam singulares ou coletivas. Não se trata “apenas” de uma mulher trans, mas de uma mulher que traz consigo uma história, que sofre, que adoece, que precisa de orientação em relação aos seus processos de saúde-doença. E que todos esses atravessamentos são também resultado de uma construção social, histórica, política e cultural.

Outro personagem visibilizado no jogo se refere a uma pessoa com deficiência. Essa escolha oportuniza também uma reflexão acerca do capacitismo. Esse tema tem sido discutido e problematizado por Campbell1818 Campbell FK. Inciting legal fictions: disability date with ontology and the ableist body of the law. Griffith Law Rev. 2001; 10(1):42-62.,1919 Campbell FK. Exploring internalized ableism using critical race theory. Disabil Soc. 2008; 23(2):151-62., que teoriza como o sujeito com deficiência é traduzido pela sociedade como desigual e menos apto. A autora aponta ainda que o capacitismo opera exclusões similarmente ao racismo e ao machismo na produção de lugares e significados. Segundo Vendramin2020 Vendramin C. Repensando mitos contemporâneos: o capacitismo. In: Anais do 3o Simpósio Internacional Repensando Mitos Contemporâneos; 2019; Campinas. Campinas: Universidade de Campinas; 2019.,

A deficiência está relacionada a uma compreensão normatizada e autoritária sobre o padrão corporal humano, que deflagra uma crença de que corpos desviantes serão consequentemente insuficientes, seja diminuindo seus direitos e mesmo o direito à vida em si, seja de maneira conceitual e estética, na realização de alguma tarefa específica, ou na determinação de que essas sejam pessoas naturalmente não saudáveis. (p. 24)

Na discussão com os alunos buscamos apontar como os processos de exclusão tanto limitam as possibilidades e oportunidades de vida (socialização, trabalho, lazer, deslocamento etc.), quanto inviabilizam, em muitos casos, a sua condição de sujeito, reduzindo-o a sua própria deficiência. Como salienta Dias2121 Dias A. Por uma genealogia do capacitismo: da eugenia estatal a narrativa capacitista social. In: Anais do 1o Simpósio Internacional de Estudos sobre a Deficiência; 2013; São Paulo. São Paulo: SEDPcD/Diversitas/USP Legal; 2013,

o capacitismo é profundamente subliminar e embutido dentro da produção simbólica social. Faz parte de uma “grande narrativa”, uma concepção universalizada e sistematizada de opressão sobre o conceito da deficiência. (p. 2)

Há também, segundo a autora2121 Dias A. Por uma genealogia do capacitismo: da eugenia estatal a narrativa capacitista social. In: Anais do 1o Simpósio Internacional de Estudos sobre a Deficiência; 2013; São Paulo. São Paulo: SEDPcD/Diversitas/USP Legal; 2013, a visão da pessoa com deficiência como um super-herói, um sujeito que precisaria sempre estar em constante “superação”, sendo grato às oportunidades como, por exemplo, conseguir um emprego. Essa ideia é exemplificada no jogo quando o deficiente só ganha livros de autoajuda.

Lições aprendidas como considerações finais

A utilização do lúdico para problematizar um assunto tão complexo tem sido alternativa didática para que o aluno possa desempenhar, com base em representações de papéis, situações comparáveis às vivenciadas na sociedade. Nessa perspectiva, viabilizamos uma reflexão sobre a desigualdade e seus múltiplos atravessamentos, convidando os alunos a se identificarem como sujeitos implicados na manutenção ou na ruptura desses processos. Temos como objetivo o desenvolvimento de um compromisso ético, no qual os alunos possam assumir uma nova postura de enfrentamento e trato da diversidade, ao invés de ratificar, em suas práticas acríticas, o lugar da diferença como desigual e excludente. Não assumindo só um lugar de aceitação e respeito, mas conseguindo analisar esses contextos de forma reflexiva em prol de um mundo mais igualitário e justo.

Por fim, salientamos que essa estratégia deve ser sempre revisitada, já que novos regimes de dominação são atualizados e outros corpos passam a ser excluídos socialmente. Estamos atentas ao nosso lugar de narrativas como mulheres cis, docentes, brancas, pertencentes à classe média, como também reconhecemos a importância da criação de condições para que essa discussão seja visibilizada no espaço acadêmico de uma universidade privada.

A vivência, de forma isolada, não garante uma postura mais empática ou problematizadora dos acadêmicos, por isso a necessidade de ser retomada e associada a outras experiências e teorizações no decorrer da graduação. Essa intervenção promove que novos olhares sejam oportunizados, que corpos silenciados e excluídos possam se sentir representados, que corpos privilegiados possam refletir sobre as desigualdades estruturadas na sociedade. E, principalmente, que os alunos compreendam que os profissionais de saúde são atores fundamentais na luta pelo combate à exclusão e pela construção de uma sociedade mais ética e alicerçada a coletividades plurais.

  • (d)
    Inclusive, as referências bibliográficas listadas fundamentam a análise dessa intervenção e não são trabalhadas em sala com os alunos, com exceção do artigo “Diferença e Interseccionalidade” (MELLO, 2010), que corresponde ao texto sugerido aos alunos.
  • Almeida AMB, França LC, Melo AKS. Diversidade humana e interseccionalidade: problematização na formação de profissionais da saúde. Interface (Botucatu). 2021; 25: e200551 https://doi.org/10.1590/interface.200551

Referências

  • 1
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Editado por

Editor
Antonio Pithon Cyrino
Editora associada
Márcia Alves

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    04 Ago 2020
  • Aceito
    12 Abr 2021
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