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A percepção dos problemas ambientais urbanos em São Paulo

The perception of urban ambiental problems in São Paulo

Resumos

Este artigo analisa os resultados de uma pesquisa realizada pelo CEDEC sobre "Meio ambiente urbano e qualidade de vida na cidade de São Paulo". Os dados revelam que há uma percepção dos problemas ambientais urbanos amplamente disseminada entre os moradores e que há uma potencial dinâmica interativa que pode ser ativada para solucioná-los, envolvendo iniciativas do poder público, comunitárias e individuais.


Discussing the findings of a research on "Urban Environment and Quality of Life in São Paulo" carried out by CEDEC, the autor argues that there is a widespread perception of ambiental problems among the population. This is seen as revealing a potential interative dynamics involving public, communitarian and individual initiatives towards the solution of these problems.


QUALIDADE DE VIDA

A percepção dos problemas ambientais urbanos em São Paulo

The perception of urban ambiental problems in São Paulo

Pedro Jacobi

Professor da Faculdade de Educação da USP e pesquisador do CEDEC

RESUMO

Este artigo analisa os resultados de uma pesquisa realizada pelo CEDEC sobre "Meio ambiente urbano e qualidade de vida na cidade de São Paulo". Os dados revelam que há uma percepção dos problemas ambientais urbanos amplamente disseminada entre os moradores e que há uma potencial dinâmica interativa que pode ser ativada para solucioná-los, envolvendo iniciativas do poder público, comunitárias e individuais.

ABSTRACT

Discussing the findings of a research on "Urban Environment and Quality of Life in São Paulo" carried out by CEDEC, the autor argues that there is a widespread perception of ambiental problems among the population. This is seen as revealing a potential interative dynamics involving public, communitarian and individual initiatives towards the solution of these problems.

A maior parte do debate ambiental contemporâneo concentra-se nas questões globais que ameaçam o planeta e os grandes ecossistemas, deixando num plano secundário os efeitos adversos da degradação ambiental no contexto urbano, notadamente as relações entre o meio urbano e o cotidiano das famílias.

As cidades do Terceiro Mundo representam um dramático exemplo de uma dinâmica de urbanização predatória que gera graves problemas ambientais, afetando de forma mais intensa os setores mais pobres da população.

O fato da América Latina ser hoje de longe a área mais urbanizada do mundo, com quase 65% da população vivendo nas cidades, revela a prioridade do urbano no enfrentamento da questão ambiental, sobretudo quando se observa a perversa relação entre degradação do meio ambiente e pobreza.

Os problemas ambientais na cidade de São Paulo são principalmente um efeito da urbanização sobre o ecossistema, decorrente da utilização inadequada dos recursos físicos como a água. Um fator significativo de degradação ambiental, ao lado da contaminação da água, decorre da exiguidade da rede de esgotos, assim como do déficit de sistemas de tratamento dos esgotos e águas servidas e da descarga ainda muito pouco controlada dos dejetos tóxicos industriais e comerciais.

A deterioração ambiental resulta da precariedade dos serviços e da omissão do Poder Público na proteção/prevenção das condições de vida da população, mas também é reflexo do descuido e omissão dos próprios moradores de bairros carentes de infra-estrutura no tocante ao despejo de resíduos sólidos em locais públicos desrespeitando o coletivo local.

Não se deve, entretanto, ignorar o impacto da crise econômica que persiste desde a década de 80, e que faz que um número crescente de famílias não tenha outra opção senão ocupar solo urbano localizado em áreas de proteção de mananciais, provocando uma degradação de fontes de água potável e do seu entorno.

Embora no nível macro a deterioração ambiental seja extensiva a todo o município, penalizando globalmente todos os estratos sociais, as desigualdades imperantes fazem com que o impacto de tais agravos nas condições de vida sejam mais profundos nos estratos de menor renda.

Orientados por esta preocupação este texto apresenta algumas questões que foram objeto de análise em pesquisa recentemente concluída no CEDEC sobre "Meio Ambiente e Qualidade de Vida Domiciliar na Cidade de São Paulo"1 1 A pesquisa, coordenada pelo autor e que contou com a participação de Leonor Moreira Câmara e Yara Castro, consistiu no levantamento de uma amostra de 1.000 domicílios da cidade de São Paulo entre setembro de 1991 e janeiro de 1992. A amostra foi sorteada por zonas homogêneas que compõem no total seis estratos sócio-econômicos em 30 distritos e foi estruturada a partir de critérios estatísticos das regiões com índices aproximados de qualidade de vida, renda familiar, saneamento básico, densidade populacional e mortalidade infantil. A pesquisa é parte integrante de um projeto de avaliação das condições ambientais urbanas em cidade do Terceiro Mundo, e está sendo simultaneamente realizado nas cidades de Accra, em Ghana e em Jakarta, na Indonésia. O projeto é coordenado pelo Stockholm Envirnment Institute - SEI, da Suécia. Seu principal objetivo é a abordagem da questão ambiental na cidade de São Paulo tanto a partir do universo domiciliar no contexto da problemática urbana, quanto na percepção dessa questão pela população diretamente atingida. Foram analisados três aspectos. O primeiro refere-se ao conhecimento dos problemas ambientais do bairro e do domicílio a partir dos vínculos que os moradores estabelecem entre o significado do problema e sua repercussão no cotidiano. O segundo aspecto analisado são as práticas sociais face à dinâmica existente nas políticas públicas tendo-se como pressuposto conhecer as expectativas, a avaliação dos moradores sobre os serviços e o impacto dos problemas decorrentes no seu cotidiano. O terceiro aspecto refere-se às formas como a população resolve ou considera mais adequadas para resolver os problemas ambientais e quais os meios para fazê-lo.

Esta pesquisa analisa no contexto da cidade de São Paulo - um exemplo dos mais expressivos de degradação do meio ambiente urbano - a dimensão da sua vivência cotidiana no âmbito da unidade familiar.

Trata-se de um contexto bastante pouco estudado, cujo conhecimento abre fronteiras para uma reflexão a respeito das formas de enfrentar os problemas ambientais em contextos sociais marcados pela desigualdade no acesso aos bens da cidadania e dos condicionantes de estratégias de desenvolvimento sustentável no contexto urbano.

A pesquisa está centrada no local de moradia e nos determinantes do cotidiano doméstico e buscou apreender o problema a partir das percepções dos moradores.

Trata-se de uma cadeia de relações entre o que a população identifica como problemas relativos ao meio ambiente no cotidiano domiciliar e o que detecta como origem e causa dos problemas e formas de ação para resolvê-los.

A análise das práticas e percepções no cotidiano permite observar e analisar quais as diferenças entre as atitudes e práticas sociais das famílias dos diversos estratos sociais no município de São Paulo. Embora o cotidiano de cada família e seus condicionantes e estratégias assumam características específicas, a percepção e adoção de determinadas práticas face à existência de problemas ambientais e do seu impacto decorre do conjunto de relações sociais nos quais se inscrevem as famílias, notadamente aquelas que são parte componente de um universo de exclusão e parcos rendimentos.

A análise dos problemas ambientais do bairro e do domicílio possibilitou conhecer as percepções dos moradores em torno do acesso e da qualidade dos serviços urbanos pesquisados, assim como o nível de hierarquização dos aspectos positivos e negativos que interferem no entorno cotidiano das famílias.

Os dados relativos à infra-estrutura urbana mostram que as famílias, notadamente as de baixa renda, têm suas queixas principalmente face às precárias condições de urbanização. Os dois problemas mais enfatizados pela população dos bairros habitados pelos estratos de menor renda, que representam em torno de 65% da população da cidade, são falta de pavimentação e de cobertura da rede de esgotos. Outros aspectos da infra-estrutura urbana que tem vinculação com a questão ambiental, como é o caso do abastecimento de água e da coleta de lixo, não são explicitados como problemáticos.

Os indicadores de infra-estrutura e de condições de urbanização refletem as características de exclusão/inclusão quanto à infra-estrutura urbana e uma homogeneidade espacial nas condições de acesso/não acesso.

A dinâmica da homogeneidade territorial quanto às carências reforça uma situação de precariedade-regionalização das carências, uma vez que as famílias mais carentes são as mais afetadas por uma somatória dos componentes da urbanização precária tais como várzeas, córregos, lixões e outros fatores agravantes do meio ambiente urbano a nível domiciliar.

O que se observa é uma dinâmica de convergências. Uma primeira quanto aos agravos sócio-ambientais que afetam os domicílios dos estratos de menor renda, o que torna ainda mais dramático o cotidiano dos seus moradores. Uma segunda convergência é entre a ausência de agravos e condições propícias de urbanização - proximidade de áreas verdes e acesso a serviços e infra-estrutura urbana - nas regiões onde habitam os estratos de renda alta e média.

Quanto aos principais problemas do bairro a pesquisa mostra as percepções diferenciadas dos moradores dos bairros centrais e os periféricos. Os resultados mostram, por um lado, um retrato sem retoques das desigualdades no acesso aos equipamentos urbanos e por outro as diferenças entre estratos sócio-econômicos quanto ao impacto da degradação ambiental.

As áreas melhor equipadas, onde habitam os estratos de maior renda, expressam uma preocupação quanto à poluição do ar e sonora realmente diferenciada se comparadas aos bairros habitados pelos estratos de menor renda. Já os moradores dos bairros mais pobres enfatizam uma preocupação perante as carências estruturais - falta de esgotos, abastecimento irregular de água, falta de equipamentos urbanos básicos - que afetam o seu cotidiano mais imediato e reforçam a existência de desiguais condições de vivência dos diversos problemas que comprometem o meio ambiente urbano.

FORMAS DE AÇÃO SEGUNDO OS MORADORES

A análise das formas de resolução dos problemas ambientais -soluções e meio de ação - mostra através da percepção dos moradores o significado do agravo e a hierarquização das soluções sugeridas. Existe muito pouco conhecimento a respeito das percepções e atitudes dos moradores dos diversos níveis de renda e situações domiciliares face aos problemas ambientais e os resultados permitem conhecer seus níveis de preocupação, motivação e envolvimento.

As respostas, apesar das diferenças entre os estratos sócio-econômicos, mostram que existe uma preocupação por parte dos moradores a respeito da degradação das fontes de água, poluição do ar, falta de cuidado com o despejo de resíduos sólidos, precariedade da rede de esgotos e presença de insetos e roedores.

Consultados sobre qual o meio de ação mais efetivo para resolver os problemas referentes aos cinco aspectos a ênfase recaiu de forma significativa na ação governamental, conforme se pode observar no quadro 1.


A opção pela ação comunitária, que lhe segue em ordem de preferência, é quase sete vezes menor.

Os moradores enfatizam uma maior presença da ação governamental na solução de problemas de água, esgoto e ar. Já quanto aos problemas relacionados com lixo e vetores de insetos e roedores, embora o maior volume de respostas se concentre na ação governamental, as respostas que enfatizam a ação comunitária sofrem uma alteração, o mesmo ocorrendo com aquelas que destacam a ação individual.

A atitude menos dependente da ação governamental provavelmente decorre do fato de tratar-se de dois aspectos que dizem respeito mais diretamente do que os outros aos hábitos e práticas dos moradores tanto no universo domiciliar quanto na relação com os vizinhos nas áreas de uso comum - ruas, calçadas, terrenos baldios, córregos, represas etc. A explicação desta situação - a prevenção da degradação do meio ambiente no entorno do domicílio - depende muito dos hábitos e atitudes de cada família, ou seja dos interesses individuais, face à necessidade de garantir o interesse coletivo, as áreas de interesse comum acima descritas.

Um aspecto que chama atenção é a baixa incidência, quando de uma hierarquização das respostas relativas à forma de solução dos problemas relativos aos cinco temas, daquelas alternativas vinculadas com esforços de mobilização da comunidade para reivindicar e sugerir soluções assim como para denunciar agressões ao meio ambiente.

O quadro 2 possibilita observar a coincidência das respostas e sua restrita repercussão junto aos moradores, uma vez que somadas não representam sequer 10% do total de respostas relativas a outras alternativas apresentadas enquanto possibilidade de resposta.


Observa-se, portanto, um baixo nível de referência e identificação dos moradores com práticas de mobilização, reivindicação e denúncias que implicam formas de organização coletiva.

As diferenças de atitude entre os estratos refletem os contrastes no quadro de condições de vida. No item relativo a mobilização da comunidade com o objetivo de reivindicar soluções os estratos de menor renda mostram maior ênfase com relação a todos os aspectos. Já no item relativo à mobilização da comunidade com o objetivo de denunciar agressões ao meio ambiente são os estratos de renda mais alta, principalmente quanto ao tema da poluição do ar.

O que se observa é que os estratos de menor poder aquisitivo localizados em regiões de condições urbanas mais precárias, apesar de serem afetados com mais intensidade não explicitam uma disposição para participar de ações coletivas que poderiam modificar a situação.

No intuito de aprofundar a reflexão considera-se necessário especificar a hierarquização das formas de resolução apresentadas pelos moradores para três dos problemas analisados — água, lixo e ar.

Com relação às percepções e propostas dos moradores face ao problema da água nas suas diversas configurações - qualidade, quantidade da poluição de fontes, controle e prevenção de emissão de poluentes - a maior ênfase dentre sete alternativas apresentadas é a necessidade de uma maior fiscalização pelo Poder Público da emissão de esgotos nos rios e córregos e uma maior eficácia na aplicação das leis sobre a proteção dos mananciais. A segunda solução mais destacada é a mudança de atitude das pessoas que jogam lixo nos córregos. A somatória destas duas alternativas representa 60% do total das respostas. Enquanto na primeira solução se verifica uma homogeneidade entre os estratos, na segunda solução se observa como o assunto mobiliza mais de perto a população dos bairros mais carentes. A terceira e quarta soluções mais enfatizadas são "campanhas educativas" e "informar a população sobre os problemas de meio ambiente causados pela poluição das águas.

As respostas vinculadas com práticas mobilizatórias, seja para reivindicar soluções seja para denunciar agressões ao meio ambiente, representam mais de 10% do total das respostas.

Observa-se que existe uma percepção por parte dos moradores a respeito da degradação das fontes de água e da necessidade de mudar as atitudes e informar a população sobre os riscos implícitos na deterioração da água necessária ao consumo. Além disso, as pequenas variações quanto à interpretação e a atitude em face do problema entre os estratos de maior e menor renda configura a predominância, apesar de tratar-se de contextos sócio-econômicos tão opostos, da existência de um nível geral de preocupação entre os moradores.

A ênfase dos domicílios é principalmente nas soluções provindas do Poder Público, com quase 90% das respostas. A ênfase é a solução onde este desempenhe sua função de 1) informar, orientar e através de campanhas educativas, 2) fiscalizar e monitorar a execução das políticas públicas e 3) estimular uma dinâmica da co-responsabilização da comunidade na prevenção da desordem ambiental.

Um segundo tema abordado é o dos resíduos sólidos. A solução mais apontada é educar as pessoas para que não joguem lixo nos terrenos baldios e córregos, representando quase 50% do total das respostas, com poucas diferenças entre os estratos. Outras soluções apontadas referem-se à necessidade de instalar pontos de coleta em áreas de difícil acesso e de manter limpos os terrenos baldios, representando pouco mais de 30% do total das respostas. Quanto ao meio de ação para solucionar os problemas existentes os moradores destacam a ação governamental, porém com menor ênfase, sendo que os estratos de mais alta renda enfatizam mais esta opção do que os da menor renda. O quadro 1 indica que a solução de problemas relacionados à questão dos resíduos sólidos é vista pelos moradores sob uma perspectiva que reforça bastante a contribuição da ação individual e coletiva na preservação do meio ambiente, explicitando uma percepção menos dependente da ação governamental.

Quanto à forma como o problema deveria ser resolvido a maior ênfase, com 35% das respostas, recai nas soluções relacionadas com campanhas educativas, seguidas daquelas que exigem um maior envolvimento da comunidade para garantir melhores condições sanitárias - evitar acúmulo de lixo no bairro e acondicionar adequadamente o lixo. As respostas relacionadas com o papel do Poder Público como agente fiscalizador e de manutenção da limpeza pública representam quase 30%, enquanto aquelas relacionadas com mobilizações comunitárias para reivindicar soluções e denunciar problemas não atinge sequer 8%.

As escolhas feitas pelos domicílios em todos os estratos recaem prioritariamente na responsabilização do Poder Público pelas soluções campanhas educativas e agente fiscalizador e gerenciador dos serviços. As respostas não só mostram que existe uma preocupação com os agravos ambientais resultantes da omissão e desinteresse dos moradores face ao problema do despejo e disposição irregular do lixo no entorno do seu local de moradia, mas que existe um estímulo e uma legitimidade para que o Poder Público exerça um papel orientador e disseminador de informação.

O terceiro aspecto abordado é o da poluição do ar. Todas as respostas destacam, com respeito às formas de ação, um papel de co-responsabilização entre a esfera pública e a privada, na medida em que tratam de questões como fiscalização, implantação de políticas específicas e melhoria da qualidade dos serviços e mudança de atitudes dos usuários de automóveis. Trata-se de uma interação entre as duas esferas, na medida em alguns aspectos só poderão ser atenuados numa perspectiva de colaboração mútua e resposta individual às iniciativas emanadas do Poder Público. Neste sentido e tendo como referência a alternativa de diminuir o volume de automóveis em circulação, representando o desafio de concretizar mudanças tanto no plano sócio-cultural comportamento e atitudes a nível individual como das políticas públicas, observa-se muito menos ressonância entre os moradores do que nas soluções que dependem principalmente da ação do Poder Público.

Quanto ao principal meio de ação os moradores mais uma vez apontam para a ação governamental, representando quase 90% das respostas e o maior índice dentre todos os problemas que foram objeto da pesquisa.

A forma de resolução do problema da poluição do ar mais enfatizada é a fiscalização da emissão de poluentes no ar, seguido de políticas públicas de urbanização e de campanhas educativas.

As três alternativas acima apresentadas mostram que os moradores enfatizam uma maior presença da ação governamental enquanto agente responsável pela gestão, manutenção, fiscalização e monitoramento de uma política ambiental. O pressuposto da ação governamental se explicita, segundo os moradores através do controle e da punição dos agentes poluidores e do fortalecimento dos instrumentos legais para reduzir a poluição do ar.

DINÂMICA INTERATIVA

A percepção predominante pela ótica dos moradores não é, portanto, a da solução dos problemas por meio de mobilizações coletivas, mas a de soluções induzidas e dirigidas por um agente nucleador a ação governamental mediante um estímulo às mudanças de comportamento, co-responsabilização e colaboração promovendo o envolvimento e motivação dos cidadãos para um processo mais interativo. A ênfase posta pelos moradores nas campanhas educativas e de informação à cidadania mostram a existência de um potencial para ampliar a dinâmica interativa entre estes e o Poder Público. Isto permite uma estreita colaboração da população com o Poder Público, verificando-se uma disponibilidade da mesma para aceitar um envolvimento em iniciativas inovadoras que representem o desenvolvimento de práticas preventivas no plano ambiental urbano, no nível do bairro e do domicílio.

A necessidade de um fortalecimento do contexto institucional é inquestionável e a permeabilidade de referenciais qualitativos às atitudes e percepções da população em face dos problemas ambientais abre um vasto campo de análise. Esta perspectiva reconhece a importância de uma simultaneidade de ações que consideram as necessidades e expectativas da população, explicitando direções de mudança e avaliando as conseqüências de propostas para a gestão dos problemas ambientais e seus impactos sócio-culturais.

Os determinantes da degradação ambiental são conhecidos, assim como os obstáculos institucionais. A busca de soluções alternativas tem sido uma constante de muitas administrações locais, tendo na participação popular seu principal referencial. O desafio que se coloca é de superar as barreiras existentes, estimulando um processo interativo baseado na multiplicação dos recursos internacionais e de envolvimento e participação da comunidade enquanto interlocutora válida do Poder Público.

A possibilidade de maior acesso à informação, notadamente dos grupos sociais mais excluídos, potencializa mudanças comportamentais necessárias para um agir mais orientado para o interesse geral. Cidadãos bem informados têm mais condições de pressionar autoridades e poluidores e de motivar-se para assumir ações de co-responsabilização e participação comunitária.

Os resultados da pesquisa mostram que os moradores têm consciência dos riscos gerados pela degradação ambiental e da necessidade de mudar as atitudes perante os problemas. Dentre os diversos aspectos a serem contemplados está o de reduzir por um lado a dependência da população com relação ao Poder Público e por outro o de romper com as práticas de desresponsabilização dos moradores. Uma vez que existe um potencial a ser aproveitado, o desafio da ação governamental é criar estímulos e legitimidade para acentuar o potencial de consciência existente. Não deve ser escamoteado o potencial de articulação de ações conjuntas com diversos atores abertamente motivados visando multiplicar informações, decodificá-las e superar tanto a desinformação como o desinteresse, por meio de um processo de implementação de políticas públicas crescentemente pautadas por uma lógica de co-responsabilização na prevenção e solução dos problemas ambientais no contexto urbano.

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    A pesquisa, coordenada pelo autor e que contou com a participação de Leonor Moreira Câmara e Yara Castro, consistiu no levantamento de uma amostra de 1.000 domicílios da cidade de São Paulo entre setembro de 1991 e janeiro de 1992. A amostra foi sorteada por zonas homogêneas que compõem no total seis estratos sócio-econômicos em 30 distritos e foi estruturada a partir de critérios estatísticos das regiões com índices aproximados de qualidade de vida, renda familiar, saneamento básico, densidade populacional e mortalidade infantil. A pesquisa é parte integrante de um projeto de avaliação das condições ambientais urbanas em cidade do Terceiro Mundo, e está sendo simultaneamente realizado nas cidades de Accra, em Ghana e em Jakarta, na Indonésia. O projeto é coordenado pelo Stockholm Envirnment Institute - SEI, da Suécia. Seu principal objetivo é a abordagem da questão ambiental na cidade de São Paulo tanto a partir do universo domiciliar no contexto da problemática urbana, quanto na percepção dessa questão pela população diretamente atingida.
    Foram analisados três aspectos. O primeiro refere-se ao conhecimento dos problemas ambientais do bairro e do domicílio a partir dos vínculos que os moradores estabelecem entre o significado do problema e sua repercussão no cotidiano. O segundo aspecto analisado são as práticas sociais face à dinâmica existente nas políticas públicas tendo-se como pressuposto conhecer as expectativas, a avaliação dos moradores sobre os serviços e o impacto dos problemas decorrentes no seu cotidiano. O terceiro aspecto refere-se às formas como a população resolve ou considera mais adequadas para resolver os problemas ambientais e quais os meios para fazê-lo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 1993
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