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Interdependência e autonomia na gestão pública da saúde

Interdependence and autonomy in public health management

Resumos

O princípio da descentralização está presente tanto na organização federativa do Estado nacional quanto nas diretrizes básicas do sistema de saúde no Brasil. Como ele se apresenta apresenta em cada uma dessas dimensões e como ambas se articulam entre si? Com base no exame dessa questão a autora analisa o Sistema Único de Saúde - SUS no seu contexto político-institucional e no seu funcionamento. Categorias básicas da sua análise são interdependência e autonomia.


The decentralization principle is found both in the federative organization of the national State and in the basic directions of the health system in Brazil. How does it present itself in each of these dimensions and how are they connected? On the basis of an examination of this question the author analyses the Brazilian national Unitary Health System (Sistema Único de Saúde - SUS) taking account of its politico-institutional context and of its functioning. Basic categories of her analysis are interdependence and autonomy.


FEDERAÇÃO E POLÍTICAS

Interdependência e autonomia na gestão pública da saúde* * Apresento neste artigo algumas das reflexões realizadas para a minha tese de doutoramento defendida na Faculdade de Medicina da USP- Departamento de Medicina Preventiva, sob o título: "SUS, Gestão Pública da Saúde e Sistema Federativo no Brasil".

Interdependence and autonomy in public health management

Vânia Barbosa do Nascimento

Professora na Faculdade de Medicina do ABC e pesquisadora do CEDEC

RESUMO

O princípio da descentralização está presente tanto na organização federativa do Estado nacional quanto nas diretrizes básicas do sistema de saúde no Brasil. Como ele se apresenta apresenta em cada uma dessas dimensões e como ambas se articulam entre si? Com base no exame dessa questão a autora analisa o Sistema Único de Saúde - SUS no seu contexto político-institucional e no seu funcionamento. Categorias básicas da sua análise são interdependência e autonomia.

ABSTRACT

The decentralization principle is found both in the federative organization of the national State and in the basic directions of the health system in Brazil. How does it present itself in each of these dimensions and how are they connected? On the basis of an examination of this question the author analyses the Brazilian national Unitary Health System (Sistema Único de Saúde - SUS) taking account of its politico-institutional context and of its functioning. Basic categories of her analysis are interdependence and autonomy.

Democracia e descentralização política e territorial são, conforme a Constituição de 1988, os princípios fundamentais tanto do sistema federativo de organização do poder nacional quanto das diretrizes que nortearam a reorganização do sistema de saúde no Brasil. Embora muitos estudos sobre políticas públicas setoriais, em especial sobre a saúde, já tenham sido realizados enfocando a descentralização, poucos dentre eles tratam de analisar a correlação entre os significados da descentralização em cada um dos sistemas - o da saúde e o das relações territoriais de poder. Entretanto, sem o exame dessa correlação, que remete ao contexto no qual foi possível institui-los no plano jurídico-institucional, não há como tratar adequadamente das possibilidades e dos limites à implementação de uma inovação tão importante no quadro das políticas de saúde como é o Sistema Único de Saúde -SUS. é nessa perspectiva que examinarei em seguida algumas questões básicas para o entendimento da articulação entre a organização das relações territoriais de poder e a organização da gestão pública da saúde. Para isso traçarei primeiro um esboço da questão da descentralização na Constituição de 1988. Em seguida examinarei a inserção do SUS no seu contexto político-institucional, pela ótica das relações que se estabelecem nesse processo entre os princípios da autonomia e da interdependência.

A DESCENTRALIZAÇÃO NO SISTEMA FEDERATIVO

O processo de descentralização envolve tanto questões relativas às estruturas sócio-econômica e política como definições sobre o papel e ação do Estado. Além disso, envolve a questão das pressões externas para que os países adotem um conjunto de reformas que imprimam um determinado sentido ao modo de funcionamento do Estado. Assim é que atualmente a tendência já não se limita à máxima redução das funções estatais, segundo os preceitos neoliberais do Estado mínimo. Coloca-se mais recentemente a necessidade de um Estado mais flexível, de acordo com um redimensionamento de suas funções e da reestruturação das suas ações, por meio da descentralização dos serviços sociais básicos para os governos subnacionais e da flexibilização gerencial do setor público. Com apoio na ampliação da concepção de "público", isso se daria mediante o estímulo às parcerias com o setor privado e com organizações não governamentais. O preceito envolvido é o de que a mudança nos procedimentos da administração pública, a partir de redefinições da competência administrativa, da descentralização e da flexibilização, provocará impactos não só na qualidade dos serviços prestados como na redução do custeio para gerir a máquina estatal e, sobretudo, na democratização do poder público.

Está claro, no entanto, o caráter paradoxal de tais medidas quando, no início da década de 90, o país adotara como estratégia o ajuste macroeconômico, a partir de planos de estabilização monetária e da abertura da economia para atrair capitais externos e de redução dos gastos públicos, e que acabaram por acentuar os problemas e estimular as demandas por programas sociais. Essa conjuntura, associada à escassa tradição democrática e à debilidade das estruturas de governo, principalmente das esferas subnacionais, tem se traduzido na baixa capacidade dos governos para enfrentar a complexidade daquelas questões e as conseqüências da autonomia conferida constitucionalmente às esferas subnacionais. Isso, por sua vez, acaba também por colocar sérios constrangimentos ao processo de descentralização das políticas públicas.

Além das grandes questões referentes à capacidade econômica e fiscal, à estrutura administrativa condições políticas e de cultura cívica dos diversos contextos onde ocorrem os processos descentralizadores, Arretche (1998) introduz, para efeitos de análise, outros condicionantes de caráter institucional, tais como o legado das políticas anteriormente implementadas, as regras constitucionais e a própria engenharia operacional de cada política social. Diante de um processo de reforma do Estado em país es como Brasil, que adotaram o modelo federativo quando marcados por heterogeneidades e diferenças regionais e com numerosos municípios sem capacidade fiscal e administrativa, o recurso às estratégias de indução pode compensar os obstáculos à descentralização, sustenta ela. "Assim, ao contrário das análises que consideram que uma reforma desta extensão pudesse ocorrer a partir de iniciativas espontâneas dos governos locais, ou ainda, ao contrário das expectativas que julgavam ser suficiente descentralizar recursos e liberar as unidades subnacionais de governo das 'amarras' do governo central, esse trabalho concluiu que estratégias de indução eficientemente desenhadas e implementadas são decisivas para o sucesso de processos de transferência de atribuições" (p. 252).

Seria importante no entanto verificar se isso efetivamente conduz à integração política e à promoção da eqüidade social, uma vez que tais mecanismos de indução podem ser formulados dissociados dos mecanismos de distribuição territorial do poder e dos recursos. Isso pressupõe analisar se as estratégias de indução não estariam significando uma tendência à recentralização do poder e dos recursos, conflitante muitas vezes com a autonomia conquistada pelos entes subnacionais. Neste caso, os mecanismos utilizados pela estratégia de indução seriam contrários aos mecanismos de cooperação, que se propõem estabelecer uma série de regras às relações intergoverna-mentais, geralmente acordadas entre as partes envolvidas. A alternativa seria talvez, em se tratando de regimes democráticos em países com as nossas características, pensar-se na possibilidade de se estabelecer estratégias de cooperação ou indução, desde que pactuadas socialmente, assegurando o respeito à autonomia política dos governos subnacionais.

Mesmo assim a efetivação de um processo de negociação e cooperação intergovernamental fundamentais à descentralização das políticas sociais envolve questões que vão até a necessidade de uma revisão dos principais constrangimentos colocados pelo arcabouço jurídico-institucional que define o sistema federativo brasileiro. De qualquer forma, a relação entre descentralização e sistema federativo não parece ser tão simples, quando se trata de conceber essa relação como uma condição indispensável à democracia e à redução das desigualdades sociais. E isso só pode ser feito mediante uma análise sobre o modo efetivo de funcionamento do sistema federativo em questão. No entanto, a perspectiva de análise que vem sendo aqui desenvolvida não exige um estudo detalhado da federação, mas tão somente o exame dos principais mecanismos relativos aos interesses conflitantes na arena política e institucional num contexto federativo.

Vários dos princípios democráticos que condicionam os sistemas federativos foram incorporados na Constituição de 1988, freqüentemente traduzidos durante os debates constitucionais pelo ângulo da descentralização. Contavam para isso com a motivação dos governadores, que lutavam para restabelecer as oportunidades de disputa pelo poder político e econômico. Eis aí uma das principais vias pelas quais a descentralização territorial, política e econômica tornou-se sinônimo de democracia, de "devolução" da cidadania política que havia sido suprimida pelo regime militar. De fato, "segundo a percepção oposicionista dominante da época, a descentralização era condição para o aumento da participação, e ambas compunham uma utopia democrática cujo horizonte remoto era o autogoverno dos cidadãos" (Almeida 1995: 91).

Estabelece-se, desta forma, a relação entre democracia, descentralização e autonomia política - elementos constitutivos do federalismo, embora com pesos distintos - , articulados numa complexa equação, que resulta num desenho de organização territorial do poder, que por sua vez influencia os processos de desenvolvimento e alcance dos objetivos das políticas sociais. A atribuição desses pesos, no entanto, remete aos parâmetros estabelecidos pelos princípios democráticos que inspiraram a forma clássica federal de organização territorial do poder frente à tradição democrática, às disputas e correlações políticas em jogo, ao contexto histórico e seus condicionamentos econômico, ético-cultural e político-social, bem como frente às metas de reorganização do território, dadas as suas características (metas de governabilidade, segurança nacional, integração política e territorial, redução das desigualdades, etc).

Assim, o equilíbrio entre descentralização e centralização pode manifestar-se de diferentes formas, dependendo do sistema de governo: apresenta-se com distintas configurações quando se trata de um Estado federal, ou de uma confederação de estados, ou de estados unitários. Mas isso remete a diferenças conceituais e estratégicas, o que implica que a descentralização não pode ser utilizada como um termo genérico, nem meramente como um dos princípios que regem a organização territorial do poder. Daí a importância de se diferenciar descentralização política de descentralização administrativa. Segundo Roversi e Monaco (1995), "descentralização política expressa uma idéia de direito autônomo, enquanto na descentralização administrativa específica temos um fenômeno de derivação dos poderes administrativos que, por sua vez, derivam do aparelho político-administrativo do Estado, isto é, do Estado-pessoa. A descentralização política não coincide com o federalismo. Um Estado federal é, certamente, politicamente descentralizado, mas temos estados politicamente descentralizados que não são federais. Somente quando a descentralização assume os caracteres da descentralização política podemos começar a falar de federalismo ou, em nível menor, de uma real autonomia política das entidades territoriais. (...) as tentativas dirigidas ao descongestionamento da administração pública central, multiplicando no interior da administração do Estado os órgãos periféricos, sem incidir de maneira substancial sobre o poder de decisão e sem se sobrepujar à ordem hierárquica, dão finalmente lugar a medidas de desconcentração ou, se preferirmos, de descentralização hierárquica" (pp. 331-334).

Trata-se, portanto, para efeito da análise, de considerar a descentralização política-territorial com um significado muito distinto de descentralização administrativa ou, simplesmente, de descentralização fiscal, o que remete em última instância à análise das possibilidades e dos limites de autonomia das esferas regionais e locais para organizar e manter um governo próprio e independente, especialmente no caso brasileiro.

Recentemente a exigência de mecanismos de cooperação passou a qualificar a forma federal de distribuição do poder territorial em termos de federalismo cooperativo, conceito este cada vez mais presente na literatura sobre o tema. Segundo Almeida (1995), "o federalismo cooperativo comporta graus diversos de intervenção do poder federal e se caracteriza por formas de ação conjunta entre instâncias de governo, nas quais as unidades subnacionais guardam significativa autonomia decisoria e capacidade própria de financiamento" (p. 90).

Daí o traço conflituoso intrínseco à própria relação federativa, que, ao demandar a necessidade de pactos, coloca em evidência a divisão e a disputa de poder (horizontal e vertical) entre esferas de governo na busca da conciliação entre autonomia e interdependência. Por outro lado, segundo os estudiosos da questão federativa, as relações intergovernamentais nem sempre caminham na direção de uma ação conjunta dos governos, de forma pactuada. No geral, a dinâmica que se estabelece é a de um continuum competição-cooperação. Todavia, Camargo (1999), ao analisar as lógicas que determinam os modelos de federalismo cooperativo e de federalismo competitivo adverte que a combinação de ambos mantém-se em permanente tensão: "há um limite para a capacidade redistributiva do governo federal, que não pode suprir de maneira ilimitada as carências profundas e as demandas crescentes que, na instância inferior, não conseguem ser atendidas" (pp. 94-95).

Ao analisar os pactos federativos no Brasil, Abrucio (1998:30) avalia que não foram capazes de alcançar uma distribuição mais equilibrada de poder e de engendrar relações intergovernamentais mais cooperativas e baseadas no controle mútuo. Souza (1998:586), entretanto, reconhece que a descentralização do poder no Brasil após a Constituição de 88 fortaleceu as possibilidades de consolidação democrática e do federalismo mediante incorporação de vários centros de poder na arena política e decisoria, mas adverte que as limitações de recursos econômicos afetam as parcerias entre os governos, ao obstar uma efetiva descentralização financeira.

Registre-se, no entanto, que com relação às atuais condições regionais no Brasil existem interpretações divergentes. Milton Santos, por exemplo, é otimista com relação ao processo de descentralização que vem ocorrendo no país, enfatizando exatamente as limitações da esfera local para dar conta das necessidades e demandas da população. Em entrevista ao IBASE ele afirma: "A situação de distribuição de recursos públicos está criando em alguns lugares uma efervescência e vai levar, creio eu, à produção de uma nova federação. Que vai ser primeiro de lugares e posteriormente vai ser a federação brasileira renovada. Porque os lugares não podem responder às demandas das populações locais. Então, canhestra-mente, eles vão buscando soluções" (pp. 78-79).

Contudo, ainda são poucos os estudos que procuram enfocar experiências brasileiras que tratam da cooperação intergovernamental de âmbito local ou regional. Isto pode ser atribuído à circunstância de as iniciativas de gestão, coordenação e cooperação entre esferas de governo não terem sido consideradas exitosas, como sugere Souto-Maior (1992:49-65). Algumas iniciativas formais que procuram articular interesses e desenvolver ações conjuntas no âmbito dos governos locais e regionais podem ser encontradas no setor saúde, tais como: os consórcios intermunicipais de saúde; os conselhos intermunicipais regionais de saúde (CIRs), vinculados aos órgãos estaduais de saúde; as comissões bipartite (esta composta por representantes das esferas estaduais e municipais de governo) e tripartite (composta por representantes das três esferas de governo); os conselhos municipais, estaduais e nacional de saúde1 1 Os conselhos de saúde (federal, estaduais e municipais) são instâncias colegiadas que participam das deliberações do SUS e atuam na fiscalização do sistema. A Lei 8142/90 estabelece, ainda, a composição paritaria dos conselhos: representantes dos gestores e prestadores de serviços médico-assistenciais, de um lado, e do outro representantes da comunidade. ; e as associações de secretários municipais (CONASEMS) e estaduais de saúde (CONASS). Dentre elas, os consórcios intermunicipais têm se colocado como uma alternativa para a gestão compartilhada entre municípios de serviços de saúde com caráter regional. Segundo o Ministério da Saúde2 2 http://www.saude.gov.br/descen/sitconso.htm , em dezembro de 1998 existiam 143 casos de Consórcio Intergestores Regional de Saúde, com um total de 1740 municípios participantes, a maioria deles localizados nos estados de Minas Gerais e do Paraná, com 71 e 20 consórcios, respectivamente. Apesar do número crescente desses consórcios, algumas avaliações sugerem que eles apresentam baixa sustentabilidade, e outras consideram que, apesar da sua fragilidade institucional, contribuem para o estímulo à cooperação entre gestores em termos da governabilidade de questões que fogem do domínio municipal (Costa et al 1999:33). Os conselhos de saúde, por sua vez, enquanto instâncias de participação e controle social, vêm se constituindo mais em um espaço de vocalização das demandas do que propriamente de fiscalização e definição política das prioridades de governo na área da saúde. Na maioria das vezes, acabam por assumir a função de legitimação das decisões estabelecidas pelo Executivo, dada a exigência legal de homologação pelos seus membros.

Outras iniciativas que contemplam a integração das instâncias governamentais vêm emergindo na dependência do cenário político e da capacidade conjuntural de articulação dos estados e dos municípios. Todavia, a maioria delas tem sido ditada centralmente pela ênfase do governo federal no privilegiamento da relação direta com as esferas municipais ou estaduais. Isso reflete em grande medida o caráter não pactuado dos mecanismos de cooperação que caracteriza a relação entre os entes federados, agravado ainda pela crise fiscal dos três níveis de governo, ao que se associa a indefinição de competências entre essas esferas governamentais (Cohn 1996:207).

Esses desafios que se colocam aos sistemas federativos serão aqui tratados, no âmbito da federação brasileira, em termos das formas específicas que assumem a autonomia e a interdependência com relação à reforma da saúde, tendo como referência o Sistema Único de Saúde. Assim, os aspectos relacionados à repartição de encargos, à estrutura financeira e fiscal, bem como aos mecanismos de pactuação e de cooperação são tratados como partes constitutivas e essenciais do processo de autonomia e das condições de interdependência.

O CONTEXTO DO PACTO CONSTITUCIONAL

No Brasil o conceito de governo local vem associado ao de governo da cidade e ao de gestão urbana. Em termos administrativos, a partir da Constituição de 88, todos os municípios brasileiros, independente do tamanho, da característica demográfica ou do grau de desenvolvimento, passaram a adquirir o status de ente autônomo para o desenvolvimento de uma política urbana capaz de propiciar o acesso da sua população aos bens e serviços considerados fundamentais ao bem-estar dos cidadãos locais.

Entretanto, questiona-se o caráter autônomo das instâncias locais - o município no caso brasileiro -, quando se trata de uma sociedade em processo de globalização, na medida da configuração de grandes espaços e de sociedades abertas. O fato é que já ocorre um importante intercâmbio dos aspectos da vida social entre as comunidades, facilitadas pelo desenvolvimento das comunicações, da ciência, da tecnologia e da economia, introduzindo novas pautas culturais e modos de vida comuns, em que as demandas sociais passam a assumir proporções que extrapolam a capacidade de solução no âmbito restrito dos territórios municipais. Registra-se, ainda, que políticas de transporte mais eficientes interferem sobremaneira na possibilidade autônoma de gestão das cidades, já que as distâncias deixam de constituir barreiras ao deslocamento da população para suprir suas necessidades. Daí Zicardi (1999) concluir que atualmente o processo de urbanização experimentado é muito diferente daquele do início deste século, não só em termos de sua fisionomia, mas sobretudo em termos da sua própria natureza, principalmente em função das mudanças ocorridas no processo de produção e de ocupação do território. Neste sentido, as relações da sociedade com o território são agora qualitativamente diferentes do que aquelas que surgiram com o desenvolvimento da cidade manufatureira. Segundo a autora, um dos principais processos que vem contribuindo para essa mudança, e que acaba por influenciar as práticas políticas e sociais, tem sido o da globalização da.economia, com as transformações nas tarefas produtivas, já que os fluxos e redes de capital tendem a flexibilizar e a desterritorializar o processo de produção.-Tal fato vem provocando, principalmente nas grandes cidades, um processo irreversível de terceirização das suas economias, contribuindo para o desemprego, para a diminuição dos empregos formais e melhor remunerados, assim como para a proliferação do mercado informal (p. 4). Por outro lado, as riquezas continuam sendo distribuídas de forma desigual internamente e entre as nações, estimulando os fluxos migratórios e imigratórios, que contribuem ainda mais para acentuar o contingente de populações excluídas dos direitos constitucionalmente definidos.

Paradoxalmente, as localidades passam a ser colocadas como estratégicas no sentido de superar os índices de pobreza, incluindo ações que visem à geração de emprego e renda e a retomada do desenvolvimento econômico local, além de programas específicos de habitação, segurança, qualificação profissional, etc.

Acrescente-se ainda que o próprio desenvolvimento científico e tecnológico vem interferindo de modo acentuado nos padrões de vida das populações, assim como no seu perfil demográfico (envelhecimento da população e diminuição da fecundidade). Ao mesmo tempo, a tecnologia informacional aumenta a cada dia a sua capacidade de difusão de estilos de vida idealizados, que acaba por uniformizar gostos e preferências, gerando demandas de direito a uma cidade sem fronteiras, história ou identidade cultural. Tornam-se, por sua vez, mais complexas as exigências no campo da saúde, previdência, cultura, lazer, entre outras.

Essa nova realidade repercute diretamente em vários setores da vida social. No setor da saúde, eleva muito os custos da prestação de serviços e torna cada vez mais complexa a resolução dos problemas, diante da mudança no perfil demográfico, da carência acumulada da oferta de serviços associada a medicalização da sociedade, dos problemas decorrentes da urbanização, da incorporação tecnológica acentuada no processo produtivo e do aumento da exigência de capacitação profissional, propiciando a constituição de reservas de mercado e de interesses corporativos de muitas categorias profissionais na área da saúde. Tais fatos vêm desafiando os governos locais, e deve-se estar atento na atribuição de responsabilidade a esses governos, que muitas vezes têm pouco controle sobre esses processos.

Há que se considerar que o modelo de organização dos serviços de saúde estrutura-sé de forma hierarquizada, de acordo com níveis de distintas densidades tecnológicas. Preconiza-se, para efeitos de racionalidade, a organização de um sistema que articule os diferentes níveis de complexidade tecnológica. "Por conseqüência, os serviços de saúde devem estar distribuídos otimamente no espaço, segundo os níveis primário, secundário e terciário.-Se a atenção primária deve necessariamente ser prestada o mais descentralizadamente possível, os níveis secundário e terciario organizam-se obedecendo aos princípios de disponibilidade de recursos e de economia de escala. é irracional descentralizar, no limite, serviços de maior densidade tecnológica como atenção hospitalar, atenção ambulatorial especializada, sistemas de apoio diagnóstico e terapêutico, etc." (Mendes 1998:33).

Esse modelo tem sido adotado pelo Sistema Único de Saúde. A última norma operacional básica (NOB-01/96), editada pelo Ministério da Saúde, procura estabelecer critérios para a adequação desse modelo ao SUS, mediante duas modalidades de gestão municipal: Gestão Plena da Atenção Básica e Gestão Plena do Sistema Municipal, considerando as distintas realidades dos municípios brasileiros. Nessa regulamentação do sistema os municípios podem requerer o seu enquadramento em uma das duas modalidades, mediante a comprovação da sua capacidade de gestão e da complexidade da rede de saúde no seu âmbito. Após dois anos dessa experiência de habilitação dos municípios pelo Ministério da Saúde em uma das condições de gestão, é possível verificar que, dos 5.506 municípios brasileiros, a grande maioria (76,8%) foi enquadrada na condição plena da atenção básica, e apenas 7,9% na condição plena do sistema municipal (Ministério da Saúde 1998:5). Nota-se a limitação das cidades em assumir isoladamente a complexidade que o sistema de saúde requer para resolver a maioria dos problemas de saúde da população.

De qualquer forma, o governo local vem assumindo cada vez mais uma posição de destaque no que diz respeito à busca de estratégias políticas voltadas para a busca da eqüidade e da promoção dos direitos básicos de cidadania, pois se acredita que é no âmbito das cidades onde estão colocadas as melhores condições para a prática da democracia, favorecendo a participação dos cidadãos na elaboração dos projetos, na tomada das decisões e no controle da execução das políticas de alcance social. Todavia, Abrucio e Couto (1996) consideram que o processo de descentralização, diante dos impasses políticos e financeiros da federação brasileira, onde as políticas públicas acabam sendo assumidas pelo poder público municipal, pode acarretar aprofundamento das heterogeneidades do território nacional. Afirmam que "nos municípios ricos a descentralização potencializa a ação social do Estado; nos pobres, aumenta a escassez e a precariedade da prestação dos serviços públicos" (p. 35).

Diante desses aspectos, coloca-se a seguinte questão: quais seriam então as possibilidades e os limites para o exercício descentralizado do poder loco-regional na saúde, considerando a existência de profundas diferenças na estrutura econômica, sócio-política, cultural e física das unidades que compõem a federação brasileira? Isso conduz a uma análise das possibilidades de autonomia local e dos seus limites, como também das formas de relação político-institucional entre as esferas de governo, com vistas à promoção da eqüidade.

HETEROGENEIDADE E ATENÇÃO À SAÚDE

Para além da dimensão territorial, o Brasil apresenta significativa diversidade e complexidade na sua estrutura social e político-administrativa. Mesmo dividindo os seus mais de 5000 municípios em cinco macro-regiões, as disparidades são notáveis, seja em termos de extensão territorial, seja em termos de indicadores sócio-econômicos.

Essa realidade demanda mais do que uma rede de atenção básica de saúde. Exige serviços de atenção médica de alta complexidade tecnológica, e que são oferecidos de forma muito desigual no conjunto do território nacional. O modo de distribuição dos equipamentos de maior complexidade, e que não atende aos mínimos critérios de racionalidade, dificulta ainda mais o acesso a eles da população. E essa desigualdade na sua distribuição pode ser verificada tanto entre as macro-regiões brasileiras, como entre áreas urbanas e rurais e mesmo entre setores ricos e pobres das cidades. Traduz-se nisso a lógica da expansão do setor privado de saúde, financiado fundamentalmente com recursos públicos nas décadas de 70 e 80, e que privilegiou os seus investimentos nas áreas de maior dinamismo econômico. Em 1989, por exemplo, dos 7.127 estabelecimentos hospitalares do país, 26,5% eram públicos e 73,5% eram privados. Destes, nenhum se encontrava em mais de um terço dos municípios brasileiros. A região Sudeste dispunha do dobro de leitos por habitante (4,34 por mil habitantes) em relação à região Norte, com apenas 2,12 por mil. Quando analisadas as internações gerais, assim como as internações proporcionadas pelo SUS, em 1991, pode-se observar que a taxa de internações variou de 5,58 internações por 100 habitantes na região Norte a 10,85 na região Sul. Tomadas isoladamente, essas diferenças são ainda maiores entre os estados do Amapá e Goiás, com índices de 3,56 e 11,76 respectivamente (Buss 1995:84-88).

A diversidade também pode ser vista quando se trata da oferta de serviços ambulatoriais entre áreas urbanas e rurais, apesar da expansão dos serviços básicos de atendimento nos últimos dez anos. Todavia, quando se trata de serviços ambulatoriais especializados, estes continuam sendo oferecidos nos grandes centros urbanos, de difícil acesso para grande parte da população, lógica esta determinada também por um complexo conjunto de outros fatores sócio-econômicos e culturais.

Nesse sentido, cumpre examinar a Constituição de 1988, cuja obra política, fruto de embates, conflitos e negociações entre as diversas forças no processo constituinte, produziu um arcabouço jurídico-legal com forte incidência na realização dos objetivos descentralizadores. Uma vez que a descentralização da gestão da saúde nela aparece vinculada ao grau de autonomia dos entes federados, cumpre verificar, do ponto de vista político, os aspectos referentes à autonomia das unidades de governo para formular e implantar escolhas políticas; a respectiva capacidade financeira e a liberdade para estabelecer os critérios de aplicação dos recursos; a capacidade técnica e administrativa para a elaboração de projetos; e, finalmente, a liberdade para a adoção de estratégias de implantação e de acompanhamento das ações a serem desenvolvidas. As dimensões e principais questões presentes nesse conjunto serão tratadas, a seguir, em três.grandes eixos: a divisão de encargos e responsabilidades; a descentralização dos recursos fiscais no sistema tributário brasileiro; e a dinâmica das relações de poder no atual federalismo brasileiro.

A divisão de encargos e responsabilidades

Uma das grandes inovações que a Constituição de 88 trouxe foi a equivalência do município, como ente federativo, aos estados e ao governo federal. Como parte integrante da Federação, essas três esferas de governo passaram a constituir-se entes autônomos.

Além disso, a Constituição delegou competências comuns aos municípios, estados, Distrito Federal e União, totalizando cerca de trinta funções concorrentes, deixando para regulamentar as normas de cooperação entre os níveis de governo em legislação complementar, tendo em vista o necessário equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

O município ganhou destaque, ainda, não só pelo status garantido na Constituição, como também por adquirir, dentre outras competências, a responsabilidade clara e definida pela saúde. Assim, entende-se constitucionalmente que compete aos municípios prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do estado, serviços de atendimento à saúde da população, conforme reza o artigo 30, inciso VIL No que se refere à competência comum das três esferas de governo para a saúde, ela apresenta-se de forma genérica, nos seguintes termos: ''cuidar da saúde e assistência pública" (art. 23, II, C. F.). Isto talvez explique a tendência à associação da descentralização à autonomização (Sato 1993:9). Essa associação tornou-se ainda mais evidente na disputa política que ocorreu durante o processo constituinte, no qual estava presente a "Frente Municipalista", que defendia claramente a autonomia municipal frente aos outros poderes, a ampliação das competências do município no campo social e gerencial, è um federalismo fiscal favorável aos entes locais.

Essa disputa, por sua vez, teve repercussões nas definições da saúde. Vianna (1994:142) demonstra como a Assembléia Nacional Constituinte entendeu que o sistema de saúde deveria ser descentralizado, estendendo mesmo este conceito de descentralização para o de municipalização do atendimento à saúde. Todavia, esta decisão só foi consagrada durante a aprovação final do texto constitucional. De fato, a intenção presente até a última versão do projeto da Constituição era a de uma municipalização "mitigada", limitada aos serviços de atenção básica, ou seja, aos serviços de menor complexidade tecnológica.

O resultado disso seria o que Elias (1996) identificou. "A instituição explícita em termos jurídicos legais da descentralização da saúde entra em conflito com a tradição centralizadora de nossa história gerando uma situação de descompasso entre o setor da saúde e a tradição do Estado brasileiro, restringindo acentuadamente as possibilidades de se alcançar uma efetiva descentralização da saúde, em obediência aos preceitos constitucionais, prevista para ocorrer apenas setorialmente frente a um emaranhado de leis, decretos e portarias, com forte tônica centralizadora, e que regulamentam de forma ampliada as relações entre as esferas de governo. Nesse sentido, essa possibilidade de descentralização setorial termina sempre sendo rapidamente questionada, justa ou injustamente, inclusive em sua base local, por qualquer instância ou setor que tenha seus interesses contrariados" (p. 150-151).

Tal evidência não poderia ser diferente, uma vez que, nos termos de Schubert (1998:14), a "margem de manobra autonômica" dá-se em função do grau de centralização ou de descentralização, sendo permeado por um real campo de tensão, que tanto pode unir como dividir as estruturas sociais e políticas no alcance dos objetivos comuns. Nessa perspectiva, o autor acredita que o federalismo proporciona uma flexibilidade aos processos de estruturação política resultante das relações de conflitos que envolvem perspectivas de espaço e tempo de um determinado ordenamento, bem como a possibilidade de dispor de uma certa margem de manobra à prática social e política, necessária em toda situação (p. 10).

Nessa mesma linha de reflexão Camargo (1999) observa que o federalismo não pode significar apenas arranjos formais, uma vez que os "maus arranjos" podem favorecer um acirramento de tensões e hostilidades, comprometendo a governabilidade, fragilizando as lealdades internas e estimulando a recentralização em nome do interesse público. Ao contrário, deve ser concebido através de uma engenharia política flexível capaz de acomodar e absorver permanentes tensões de natureza centrípeta e centrífuga, capaz de lidar com a extensão e a heterogeneidade social e espacial (p. 84-95). Nesse sentido, a autora manifesta a sua preocupação com os riscos e irracionalidades do pacto federativo brasileiro, ainda presentes na distribuição de competências, nos artigos 23, 24 e 30 da Constituição. "Alguns desses artigos ainda não foram regulamentados por Lei Complementar prevista, deixando o país entregue à 'desordem federativa', resultante de uma indefinição de funções entre as três instâncias federativas, da superposição de ações e da inflação de transferências voluntárias, por pressões políticas descoordenadas e incoerentes" ( p. 102-103).

Lobo (1993:123) também considera que a distribuição de encargos governamentais deve ser vista como um importante mecanismo para a restauração e conformação do pacto federativo no país, a partir de diretrizes que orientem o processo político de definição das competências, tais como: gradualismo; flexibilidade; transparência do processo decisório e controle social. Introduz, ainda, questões mais complexas, como a avaliação de vantagens comparativas, a eqüidade na prestação dos serviços, a distinção entre provisão e produção de serviços e a accountability.

Por vários ângulos manifestam-se as ambigüidades, omissões e superposições de atribuições entre os entes federativos, que têm tornado o processo de descentralização das políticas públicas extremamente frágil e oscilante entre o municipalismo crescente e a descentralização radical, e também permeável a uma cultura política com tendência fortemente centralizadora.

A par da discussão sobre a descentralização de responsabilidades e a definição quanto à repartição dos encargos coloca-se uma importante questão, que se refere ao federalismo fiscal, considerado a espinha dorsal do sistema federativo. Segundo Almeida (1995), "a maneira como são gerados e distribuídos entre as esferas de governo os recursos fiscais e parafiscais, define, em boa medida, as características próprias dos diferentes arranjos federativos" (p. 90).

Sabendo-se, contudo, que a nova Constituição aprofundou a descentralização fiscal, resta então verificar em que medida isto vem contribuindo para o exercício de um maior grau de autonomia dos entes federados para a realização das tarefas que lhes foram conferidas constitucionalmente.

A descentralização dos recursos fiscais

Registra-se na história do federalismo brasileiro que desde a Constituição de 1946 o Brasil vem adotando um modelo de compensação horizontal e vertical das receitas públicas, a partir da distribuição da receita nacional de regiões mais desenvolvidas do país para as menos desenvolvidas.

Não se trata, entretanto, de uma lógica consolidada e progressiva, considerando que nas últimas décadas o sistema tributário brasileiro vem passando por uma série de reformulações, no sentido de compatibilizá-lo aos interesses políticos e econômicos presentes na arena decisória do país. As alterações apresentam-se acompanhadas, no geral, de uma tendência, em graus distintos, à descentralização ou à centralização dos recursos fiscais. Dentre as principais mudanças verificadas, destaca-se a que ocorreu em 1966, quando o regime militar centralizou os recursos fiscais a favor da União, como uma medida fundamental às suas estratégias políticas. Ocorre que, alguns anos após, acompanhando o processo de liberalização do regime autoritário, o modelo centralizador do sistema tributário foi progressivamente incorporando medidas mais flexíveis, na medida em que avançavam as negociações do governo central com as elites estaduais, pressionando as necessárias reformas do sistema tributário em vigor. A Emenda Constitucional Passos Porto, de 1983, por exemplo, com tendência descentralizadora dos recursos fiscais, aprovada um ano após as eleições diretas para governador e a vitória da oposição, representou o poder de influência dos governadores. Já em 1985 ocorreram novas mudanças aprofundando as medidas já estabelecidas por aquela emenda, ampliando as competências tributárias a favor dos estados e municípios, e elevando os percentuais para o cálculo do Fundo de Participação.

A tendência à descentralização dos recursos tributários acompanhou os trabalhos de elaboração da Constituição de 88, quando mudanças de fato significativas nessa tendência foram incorporadas ao texto constitucional, tanto no que se refere à ampliação da autonomia das esferas subnacionais para fins de tributação, como também no tocante ao papel redistributivo desempenhado pela União.

Estudos voltados para o período posterior à Constituição demonstram o impacto das medidas descentralizadoras na composição das receitas governamentais. A comparação dos dados sobre as finanças das três esferas de governo, no período de 1980 a 1993, mostram um incremento significativo da participação dos estados e municípios nas receitas da federação, na ordem de 18% e 78%, respectivamente, assim como uma redução na receita total da União na ordem de 16% (Abrucio e Couto 1996:10).

Nesse contexto, as transferências constitucionais, através dos Fundos de Participação Estadual e Municipal (FPE e FPM), têm sido os principais mecanismo de uma melhor distribuição dos recursos no sentido de diminuir as desigualdades entre as unidades da federação. Os cálculos que estabelecem o montante dos recursos a serem distribuídos são baseados em critérios que compensem os desequilíbrios fiscais: o governo federal compensa os estados mais pobres, repassando-lhes recursos arrecadados dos estados mais ricos através das transferências constitucionais e negociadas.

Nesse sentido, os conflitos e tensões visíveis no cenário sócio-político brasileiro exigem análises não só de âmbito estrutural como também da perspectiva político-institucional, ou seja, a partir de questões identificadas por Kugelmas e Sola (1999) como "um quadro de clivagens regionais notoriamente marcado por notáveis desigualdades, a fragmentação do sistema político, as dificuldades da representação e a questão da indefinição -não apenas institucional ou administrativa - do escopo e alcance da atividade estatal da divisão de competências entre os três níveis de poder" (p. 67).

A "guerra fiscal" entre os estados é um exemplo notório dos conflitos entre instâncias de governo no Brasil, que diariamente ocupa as páginas dos jornais e os debates que ocorrem na arena política e institucional. No âmbito das políticas públicas, e mais especificamente no caso da política de saúde, também vêm sendo presenciadas acirradas disputas de natureza federativa, na medida do aumento das responsabilidades dos municípios pela prestação dos serviços de saúde e gestão do SUS. A tônica de tais disputas remete geralmente aos mecanismos de financiamento estabelecidos pela Constituição de 1988, às suas leis regulamentadoras e às normas gerais de distribuição dos recursos do Fundo Nacional de Saúde às instâncias subnacionais. Os grandes problemas da estrutura de financiamento do SUS são os seguintes:

• apesar da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO, que estabelece a fixação de 30% do Orçamento da Seguridade Social (OSS) para o financiamento da saúde, ela tem se mostrado ineficaz, diante das características da própria estrutura financeira da Seguridade Social, para evitar a retração e instabilidade de recursos destinados à saúde. O governo federal tem utilizado parte desses 30% do OSS para o pagamento dos encargos previdenciários da União, e que deveriam ser pagos com. recursos fiscais (Ugá 1997:201-203);

• a insatisfação quanto aos repasses realizados pelo governo federal aos demais gestores governamentais (estados e municípios) do SUS, bem como à redução dos gastos com as suas próprias atividades na saúde. Apesar de a União contribuir com cerca de 70% dos gastos totais com saúde no Brasil, é notória a diminuição dos recursos aplicados a.esse setor pelo governo federal durante a década de 90, demonstrando a pouca prioridade que a saúde representa no conjunto das prioridades do governo nacional, pelo menos em termos financeiros. Por outro lado, é evidente a maior disponibilidade de recursos municipais destinados ao setor saúde, correspondente ao acréscimo da carga tributária estabelecida constitucionalmente. Já para os estados esse movimento foi ao contrário: os seus gastos sofreram uma acentuada diminuição, quando comparados ao acréscimo da sua receita. Esse quadro denota os conflitos inerentes a um arcabouço político-institucional que definiu com regras claras apenas a responsabilidade do município pela prestação dos serviços de atenção à saúde quando certamente os recursos próprios municipais são insuficientes para gerir o conjunto das tarefas a ele delegado (Vianna e Piolla 1993:151-158);

• as críticas com relação aos mecanismos de repasse dos recursos financeiros do governo federal às demais esferas de governo, segundo as quais eles não favorecem o processo de descentralização na saúde. Uma das principais críticas aí presentes está relacionada aos critérios para se estimar o teto financeiro máximo dos estados e municípios, com base nas séries históricas dos seus respectivos gastos com internações e atendimento ambulatorial. E, ainda, para cada procedimento é estipulado um valor pelo Ministério da Saúde considerando-se a série histórica de produção, o que acaba por privilegiar as unidades da federação com maior capacidade instalada de serviços e maior complexidade tecnológica, reforçando as desigualdades de acesso da população às necessárias ações de saúde. Segundo Elias (1996), persiste o modo de operar o sistema público de saúde, ou seja, "há décadas, vêm sendo implementadas estas políticas, sob o estrito controle da esfera central e operadas através do financiamento. Isso ocorreu com as AIS, com o SUDS, e agora repete-se na implementação do SUS" (p. 161);

• registra-se, ainda, uma tendência à dependência dos entes sub-nacionais ao poder central, na medida da insuficiência dos recursos no âmbito local para manter de forma autônoma a complexidade que o sistema de saúde requer. Esta dependência tanto pode comprometer as relações entre as esferas de governo, como também desestimular os responsáveis pela gestão do SUS de prosseguir com o processo de descentralização. Os estados e municípios, ao incorporarem a lógica de financiamento do sistema sem assumirem as suas reais responsabilidades, enfraquecem o processo de negociação entre eles, fundamental ao aperfeiçoamento do SUS.

Em suma, as questões aqui tratadas sobre a descentralização dos recursos fiscais e os mecanismos de financiamento do Sistema Único de Saúde permitem afirmar que ainda não foram construídos instrumentos cooperativos mais eficazes para se enfrentar os dilemas decorrentes das desigualdades entre as esferas governamentais, uma vez que dependem não somente de critérios econômico-financeiros, mas sobretudo de instâncias políticas em que os conflitos possam ser explicitados e solucionados.

A dinâmica das relações de poder

O estudo da dimensão dos processos de descentralização, além de envolver os aspectos referentes à delegação de responsabilidades, às condições sócio-econômicas e à repartição de recursos financeiros de cada ente que integra a Federação brasileira, requer ainda uma análise de como as relações intergovernamentais de poder são processadas diante dos principais aspectos que caracterizam o sistema de representação política no país.

é praticamente consensual que a Carta de 1988 avançou no que se refere às liberdades civis e aos direitos sociais, mas não no tocante à estruturação de um arcabouço político-institucional que possa garantir a sustentação de uma agenda democrática e descentralizadora. Nessa direção, considera-se não o fato de se ter garantido um maior grau de autonomia e um maior aporte de recursos fiscais às esferas subnacionais, mas os problemas decorrentes da forma como foram tratadas as instituições políticas durante a constituinte, principalmente no tocante aos critérios de representação da população, aos mecanismos de divisão dos espaços territoriais e à conformação político-partidária.

Segundo Leme (1992), o grande problema da organização do Estado brasileiro, decorrente dos trabalhos da Constituinte, foi a questão regional. As propostas para enfrentar os profundos desequilíbrios regionais não avançaram de modo a contemplar as prioridades regionais e propiciar mecanismos democráticos capazes de equacionar as complexas variáveis que envolvem um processo de desenvolvimento mais equilibrado do território nacional. "A articulação centrada no regionalismo, que subordinou partidos e ideologias, acabou conferindo um comportamento lobbysta nos recursos públicos, o que acarretou a perda da dimensão nacional dos problemas em vários momentos do processo constituinte" (p. 185).

O resultado dessa disputa pelos recursos na Constituição garantiu a liberalidade para a criação de novos estados e municípios, sem qualquer exigência quanto a aspectos demográficos ou econômicos. No caso do desmembramento de municípios, a lógica tem sido a mesma: diante das novas regras, foram inúmeros os processos emancipatórios após a Constituição. Assim, de 1988 a 1995, 1248 novos municípios foram criados, geralmente municípios sem capacidade arrecadatória e dependentes do FPM e do repasse da cota do ICMS (Abrucio e Couto 1996:26-27).

Além disso, a tradicional atuação dos governadores no cenário político brasileiro no que diz respeito ao controle das bancadas legislativas acentuou as disputas por poder e recursos durante a Constituinte. Segundo Abrucio (1998), a prática dos executivos estaduais sempre consistiu em controlar uma fatia considerável dos recursos para fazer frente às bases eleitorais dos legisladores, e assim garantir a lealdade do parlamentar para o encaminhamento dos interesses estaduais. O autor salienta, ainda, que "as bancadas estaduais no Congresso têm se constituído num forte poder de veto a serviço de estados e municípios, fazendo com que o Executivo federal tenha menos capacidade de aprovar as políticas públicas que afetam os interesses dos dois outros níveis de governo" (p. 29).

Tais fatos remetem para uma outra questão fundamental inerente ao federalismo, e que diz respeito à representação dos estados no Legislativo Federal, o que no caso brasileiro vem se revelando como um dos principais fatores de desequilíbrio político e de fragilidade do princípio de representação democrática.

Outro aspecto bastante complexo nas relações entre os poderes constituintes da Federação brasileira diz respeito ao acentuado desequilíbrio de poder entre o Executivo e o Legislativo, no âmbito nacional, embora não seja dele exclusivo.

Por outro lado, o sistema partidário brasileiro influencia sobremaneira o processo de decisão governamental. Além das suas insuficiências estruturais freqüentemente assinaladas, cabe observar que, durante a década de 80, em pleno processo de transição democrática, os partidos políticos foram praticamente absorvidos pelas funções executivas de governo. E isto constitui um dos aspectos fundamentais que nortearam a vida partidária no país, uma vez que demonstra a face perversa da prática política, reforçando as relações clientelistas por disputa de posição na máquina estatal e por favorecimentos advindos do poder. Mas por outro, existem aqueles que defendiam a ocupação dos principais espaços na estrutura burocrática de governo por indivíduos comprometidos com a retomada da democracia no país, entendendo que essa estratégia seria fundamental para no mínimo influenciar os cargos efetivos de decisão à adoção de medidas de caráter democratizante.

Nessa direção, Nogueira (1998) aponta algumas conseqüências para as estruturas partidárias do país. "Em boa medida, entregaram-se ao aparato estatal, pondo-se em condição de fraqueza e subserviência diante dele. Negando-se a si mesmos como instâncias de representação, os partidos tenderam a 'enfeudar' os órgãos públicos, ajudando a ampliar os conflitos burocráticos e a privatizar o Estado.(...) Na outra ponta, cederam aos interesses organizados e se corporificaram. Em conseqüência, viram dissolver-se os vínculos com suas bases sociais e reduzir-se sua capacidade de unificar os setores sociais e, ao mesmo tempo, de orientar o Estado e unificar as políticas governamentais. Enfrentaram-se como direção, como sujeitos autônomos de proposta de decisão, perdendo propulsão e capacidade de reinventar a política e de se auto-reinventar. Em decorrência dessa situação, cresceria na sociedade uma imagem negativa dos partidos e manifestar-se-ia no sistema político uma perda da importância do sistema partidário. Pulverizado em bancadas a-partidárias ou suprapartidárias, o Congresso tenderia a inviabilizar-se como principal instância de representação política, deixando o processo político sem muitas possibilidades de controle e ao sabor de fatos criados pelo Executivo" (p. 161).

É dentro desse panorama político-institucional que têm início as primeiras medidas de efetiva implantação do Sistema Único de Saúde.

O SUS: IMPASSE POLÍTICO E AJUSTE ADMINISTRATIVO

A aprovação do Capítulo da Saúde no texto constitucional de 1988 representou uma vitória do Movimento da Reforma Sanitária brasileira, dada a incorporação da maioria dos preceitos que vinham sendo reafirmados desde a VIII Conferência Nacional de Saúde. Mas já no ano seguinte, quando ainda eram comemoradas as vitórias conquistadas na Constituição, defrontava-se com uma conjuntura extremamente complexa, justamente no momento em que se fazia necessário realizar o equaciona-mento jurídico-legal do SUS nas leis complementares.

Entretanto, a racionalidade da "Constituição Cidadã", assim denominada por Ulisses Guimarães, começava a dar sinais de difícil operacionalização, entrando em compasso de espera frente à dinâmica político-eleitoral, à rearticulação por interesses específicos e à prioridade governamental no combate à inflação (Nogueira 1998:114-115). Nesse mesmo contexto deparava-se com um verdadeiro refluxo da mobilização política que dera sustentação à formulação do arcabouço técnico e político do SUS. Cohn (1995:234) aponta mesmo um esgotamento do Movimento da Reforma Sanitária com a promulgação da Constituição de 88.

Tal fato pode ser explicado pelo contexto político da transição brasileira e pela perspectiva dos atores políticos. Há que se considerar que as principais lideranças do MRS estavam naquele momento mergulhadas na máquina estatal, enfrentando as questões operacionais do setor, elaborando as propostas de leis complementares e os conteúdos referentes à saúde, que passariam a compor as constituições estaduais e as leis orgânicas municipais. Diante disso, o MRS, constituído durante a década de 70 e 80, priorizava cada vez mais a militância institucional, resultado ainda de uma prática política e de uma visão institucional setorial das estratégias de reforma do Estado. Entretanto, para além de uma reforma setorial, a Constituição tratava de um projeto mais amplo de reorganização política do Estado brasileiro, sendo que apenas uma ênfase no arcabouço institucional seria incapaz de processar as mudanças necessárias para cumprir com os objetivos constitucionais para a saúde no país.

Isso não significa que o MRS não priorizara a dimensão política da reforma; tanto é que a democracia constituía-se no eixo fundamental da reforma, como também a ampliação dos mecanismos de participação e controle social. Todavia, não se tratou de vincular essas propostas a um projeto de reorientação democrática das demais instituições de representação política da sociedade.

Por outro lado, os dirigentes municipais de saúde permaneciam organizados, ampliando a sua base de representação, envolvendo lideranças do MRS e novos adeptos interessados na municipalização da saúde, geralmente integrantes dos órgãos de governo municipal e estadual. Os municipalistas desta vez organizavam-se para colocar em prática as conquistas constitucionais pertinentes à saúde.

Em 1989, ainda na vigência do SUDS, eram visíveis as primeiras repercussões do novo ordenamento constitucional no âmbito local, diante das novas responsabilidades atribuídas ao município na área da saúde. Isto ocorreu ao lado da euforia de muitos prefeitos, dado o aumento acentuado das receitas municipais que propiciava um avanço dos projetos para a saúde e que minimizava, até certo ponto, a preocupação dos secretários municipais de saúde, diante de um quadro já perceptível, na medida do afastamento dos governos estaduais da responsabilidade pela prestação dos serviços de saúde e pelo financiamento do setor.

Nesse mesmo período, a relação entre as instâncias estaduais de saúde, em especial a SES-SP e o MPAS, foi se tornando cada vez mais difícil, dada a irregularidade e diminuição do repasse dos recursos previdenciários aos estados como pagamento dos serviços prestados à clientela previdenciária. Por outro lado, o governo federal acusava a instância estadual pelo uso indevido dos recursos do INAMPS, que deveriam ser utilizados unicamente para cumprir com as obrigações da saúde.

Os governos estaduais, por sua vez, alegavam dificuldades financeiras para suprir as necessidades do setor saúde, sendo que seus argumentos giravam em torno dos conflitos com o INAMPS e das dificuldades frente à "crise fiscal". Nesse sentido, a esfera estadual foi paulatinamente se eximindo da sua responsabilidade de ordenador do processo de municipalização e da sua competência pelo pagamento e compra de serviços complementares. "Tal postura dificultava a gerência do sistema, já que, como se sabe, o setor privado é responsável por grande parte dos serviços prestados. Ademais, inviabilizava o planejamento integrado da rede e o gestor único. O planejamento ascendente, tão preconizado, ficava na dependência das definições do Estado" (Junqueira 1996:163).

Associa-se a esse quadro o grande vazio político herdado do desfecho da transição democrática, que acabou por eleger nas primeiras eleições diretas para presidente da República, em 1989, Fernando Collor de Mello. Este soube capitalizar o descrédito e a desconfiança de grande parte da população à política, colocando-se acima dos interesses políticos e comportando-se como um representante "não político", capaz de adotar medidas modernizadoras e a integração do país ao Primeiro Mundo. Deste modo, o necessário aprofundamento das reformas de caráter democrático escapava das possibilidades políticas presentes no início dos anos 90. Mesmo assim, foram aprovadas e sancionadas as Leis Orgânicas da Saúde (8080 e 8142), em 1990, e que se caracterizam, sintomaticamente, pela falta de precisão no que diz respeito à definição das competências e à origem dos recursos financeiros na gestão do SUS. Elias (1996) entende que "mais uma vez o texto aprovado acomodava interesses os mais diversos, dentre eles até mesmo aqueles supostamente contraditórios entre si, de modo a exprimir uma espécie de grande acordo político entre as partes envolvidas, o que se do ponto de vista do processo de negociação parlamentar havia chegado a bom termo, o mesmo não se pode afirmar quando se trata da perspectiva da descentralização e das medidas necessárias à implantação do SUS" (p. 155).

Não obstante, tornara-se então fundamental que as L.O.S. avançassem nos aspectos referentes a um melhor ordenamento das competências e atribuições entre as esferas governamentais expressas na Constituição, e não foi isso o que ocorreu: de fato reafirmou-se o caráter descentralizador, ao conferir as responsabilidades pela gestão da saúde à esfera municipal, mas mantiveram-se as indefinições e generalidades das competências conferidas às instâncias de âmbito estadual e federal. Por outro lado, no tocante às diretrizes de financiamento do setor, Piola (1993:99) ressalta o viés centralizador das L.O.S.: o artigo 35 da Lei 8080, seguida da Lei 8142, instituída para provisoriamente regular as transferências, que por comportarem diferentes interpretações, nunca foram cumpridas na sua totalidade. Diante disso, a lógica que sempre prevaleceu foi a do pagamento por produção, utilizada no relacionamento com o setor privado, sendo agora uma vez mais reproduzida para o setor público.

Todavia o processo de implantação do SUS já estava sendo deflagrado por todo o território nacional, em ritmos distintos; onde porém ele se apresentava em estágio mais adiantado, evidenciava-se o descontentamento dos gestores municipais pela situação de "caos" que começava a se esboçar. Ou seja, quando o Estado repassava os seus serviços de saúde para a administração dos municípios, sem a adequada contrapartida financeira, ou quando os governos estaduais passavam a exercer uma política de descredenciamento não explícito do setor privado contratado pelo INAMPS, que naquele momento já se encontrava sob a gestão estadual.

Nascimento (1994), ao estudar a oferta da assistência hospitalar ria Região do ABC, nesse período, analisa a situação caótica da assistência hospitalar que começava a ser delineada já em 1989. "A falta de uma política-.mais clara para o setor hospitalar tem configurado uma situação de falência do sistema de saúde, traduzida pelo sucateamento e má administração dos hospitais públicos, e agravada pelo descredenciamento acelerado, dado o desinteresse do setor privado em manter-se credenciado ao setor público. O 'caos' gerado pela falta de leitos para internação da população vem mobilizando inclusive a grande imprensa no sentido de denunciar o quadro de calamidade instalado a partir da implementação do Sistema Único de Saúde (...) Com isso a sociedade civil vem exigindo dos seus dirigentes mais próximos uma atitude frente a essa situação" (p. 139-140).

Nesse contexto, em que se explicitava uma grande insatisfação dos dirigentes municipais com a Lei Orgânica da Saúde, foi editada a Norma Operacional Básica 01/91 (NOB 01/91), ainda no governo Collor. A NOB 01/91 promoveu uma profunda mudança na lógica de financiamento do SUS, repercutindo no modo de relacionamento das instâncias governamentais. As principais mudanças ocorridas referem-se à adoção de critérios de financiamento do setor público, semelhantes aos do setor privado através do pagamento por serviços produzidos; a recentralização para o âmbito federal do controle do repasse dos recursos, nos órgãos centrais do INAMPS; e a retomada dos convênios de municipalização, que passam a ser realizados diretamente entre o Ministério da Saúde e os municípios, sem qualquer participação dos estados.

Essa nova normatização representa um movimento de recentralização, contrário mesmo ao estabelecido pela Lei Orgânica, que previa o repasse direto dos recursos sem o mecanismo convenial. Assim, a NOB 01/91 altera substantivamente as relações entre as esferas de governo se comparadas àquelas que vigoravam no SUDS. Entretanto, Junqueira (1996) avalia que não houve uma grande resistência por parte dos governos estaduais à regulamentação da NOB 01/91, já que os seus representantes tinham acabado de assumir o governo. Destaca, ainda, que a maioria dos estados não havia incorporado as ações regionais do INAMPS, não acarretando a eles portanto sérios prejuízos financeiros, dado o fato de o governo federal recentralizar as ações do INAMPS. "Aí foi a vez dos municípios. Os municípios apoiaram a decisão do governo Collor, ao perceberem a oportunidade de se ter recursos fluindo diretamente da esfera federal, sem passar por canais clientelistas dos estados" (p. 135). E, segundo Costa (1997:24), a equiparação do tratamento do setor público com o privado foi de certa forma bem recebida pelos secretários municipais, que tinham a expectativa de contar com a força do setor privado para evitar o constante atraso no repasse dos recursos federais.

O período de vigência da NOB 01/91 foi marcado por uma séria crise política, que resultou no afastamento do presidente Collor em fins de 1992, sendo acompanhada ainda por uma elevação acentuada dos índices inflacionários. Após o impeachment algumas medidas começaram a ser adotadas pelo novo governo, provocando mudanças no modo como vinham sendo orientadas as relações intergovernamentais. Kugelmas e Sola (1999) apontam que "por um lado multiplicam-se as tentativas da tecnoburocracia federal para enquadrar as finanças estaduais, mas por outro a importância dos governadores como atores políticos lhes dá condições de resistências. Através das intervenções do Senado Federal, que tem entre suas competências privativas a de dispor sobre os limites e condições do endividamento dos entes subnacionais, facilitava-se a rolagem das dívidas assumidas com a União" (p. 70). Os autores avaliam ainda que, diante dessa situação e do temor da explosão inflacionária, já no novo governo Itamar Franco em meados de 1993, medidas fiscais foram adotadas no sentido de dar maior credibilidade ao plano de estabilização que estava sendo preparado, que configurava uma reversão na trajetória descentralizadora que se iniciara nos últimos anos do regime militar (p. 70-71).

Apesar da tendência recentralizadora que se esboçava com maior intensidade, na arena setorial da saúde o movimento parecia contrário, quando o governo federal procurou aprofundar o processo de descentralização, cujas estratégias compunham o documento publicado pelo Ministério da Saúde: "Descentralização das ações e serviços de saúde. A ousadia de cumprir e fazer cumprir a lei". A elaboração desse documento ocorreu numa conjuntura ainda especial, após o impeachment e a substituição do presidente Collor, quando a primeira estratégia do recém-empossado ministro da saúde, Jamil Haddad, foi constituir um grupo técnico formado por representantes do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde, do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde e do Conselho Nacional de Saúde, sob a coordenação da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde. Uma das atribuições deste grupo ampliado foi redigir a NOB 01/93, regulamentando o teor do documento "A ousadia de cumprir e fazer cumprir a lei".

Na realidade, mais do que uma tentativa de radicalizar o processo de descentralização, a Portaria Ministerial que colocou em vigor a NOB 01/93 visava disciplinar o relacionamento entre as esferas de governo, criar novos espaços de negociação e decisão, assim como estabelecer critérios para o repasse dos recursos financeiros. E assim, foram criadas a Comissão Intergestora Tripartite e a Bipartite, com composição paritária, sendo a primeira formada por representantes dos governos municipal, estadual e federal, e a segunda por representantes do governo estadual e municipal.

O movimento municipalista na saúde, além de apoiar a criação dessas comissões, colocou-se à frente do processo de sua formação, por entender que esses espaços seriam fundamentais para a regularização do SUS. Goulart (1996) refere que "logo o movimento se dá conta de que há muito entulho a remover para que o novo sistema de saúde possa avançar. Surgem então lutas institucionais e políticas específicas. Das primeiras, cumpre lembrar, entre outras: a elaboração dos novos contratos de prestação de serviços de direito público, mediante licitação; a estruturação de um Sistema Nacional de Auditoria condizente com a nova realidade do SUS; a eliminação dos convênios como instrumentos de repasse; a elaboração e viabilização de instrumentos jurídicos e administrativos que pudessem garantir o repasse entre fundos de saúde; a adequação anual da Lei de Diretrizes Orçamentárias, buscando atender às necessidades de saúde; a reversão da lógica das tabelas do ex-INAMPS, que privilegiavam procedimentos de alta complexidade em detrimento, por exemplo, das consultas médicas, etc." (p. 29).

Apesar de a NOB 01/93 manter o pagamento por produção de serviços, ela introduziu uma série de novas regras para a transferência dos recursos da União, baseadas em critérios que envolviam a capacidade dos gestores subnacionais para assumirem determinadas responsabilidades de gestão dos serviços de saúde. Com esse objetivo a norma estabeleceu três formas de gestão - semi-plena, parcial e.incipiente - , definidas segundo o grau de capacitação técnica e gerencial apresentada pelo Estado ou município que pretendesse assumir a atribuição de gerir o sistema de saúde no âmbito de sua atuação.

Há que se considerar, no entanto, que a NOB 01/93 apresentou como fator positivo estimular os municípios a se responsabilizarem pela saúde, através das inúmeras tarefas exigidas como condição para o repasse dos recursos, tais como: instituir o Conselho de Saúde e o Fundo de Saúde; realizar minimamente um planejamento das suas ações; fortalecer a sua capacidade técnica e gerencial; controlar a rede privada contratada, entre outros. No entanto, Elias (1996:160-165) considera que a norma apresentou um importante "viés" centralizador pela preponderante presença da esfera federal nas definições e aprovação dos programas das demais esferas, na auditagem, na fixação de critérios e valores para remuneração de serviços, na definição de tetos de cobertura assistencial e na manutenção da modalidade convenial para as transferências de grande parte dos recursos, naquelas situações em que a gestão era enquadrada como incipiente ou parcial. Segundo o autor, ela não apontava, ainda, para uma solução quanto à transferência de recursos financeiros para as localidades com baixo investimento na área da saúde, uma vez que a fórmula instituída para o cálculo do montante dos recursos a ser repassado baseava-se na fixação de tetos financeiros máximos para os estados e municípios, considerando-se a série histórica de produção hospitalar e ambulatorial. Isto significou que tal estratégia para o repasse dos recursos financeiros, na sua maioria, privilegiava as unidades federadas com maior capacidade instalada de serviços de saúde e aquelas com maior complexidade tecnológica.

Durante os anos seguintes, os gestores da saúde viram-se mergulhados na elaboração e negociação de planos, na realização de conferências de saúde, na organização de conselhos, na preparação de minutas e projetos de lei para cumprir os requisitos da NOB 01/93, e assim tentar elevar o status do seu município ou estado no que diz respeito à sua condição de gestão.

Esse processo vinha sendo acompanhado de significativas mudanças no plano político e econômico: o êxito do Plano Real e a queda dos índices inflacionários, que abriram caminho para a eleição do novo presidente da República - Fernando Henrique Cardoso. Retoma-se, agora nessa nova conjuntura de legitimidade do presidente recém-eleito, a tradicional cultura política brasileira da Presidência forte, trazendo uma série de implicações para as relações intergovernamentais. Kugelmas e Sola (1999) afirmam que "durante todo o período do primeiro mandato FHC a questão do novo padrão a ser buscado nas relações entre a União e estados foi marcada pelas tentativas de enquadramento dessas esferas pelo poder central, em nome da busca de soluções dos desequilíbrios fiscais. Se a partilha tributária se realizara em um momento de notável fraqueza do poder central, seria a capacidade regulatória no campo macroeconômico do governo federal, reforçada pelo êxito do Plano Real que daria os traços definidores da nova etapa" (p.71). Segundo os autores, essa estratégia colocava-se no escopo de uma profunda reforma do aparato estatal e da integração competitiva na ordem econômica internacional globalizada (p.71).

As iniciativas que daí decorreram vieram atingir especialmente as finanças estaduais, uma vez que implicavam a reestruturação da dívida dos estados com a União, a limitação de empréstimos, de programas de apoio do governo federal aos estados, condicionados às medidas locais de ajuste fiscal, o controle da folha salarial e o apoio ao programa nacional de privatizações.

Se por um lado essas medidas vêm limitando a ação dos governadores na utilização da força política dos estados para a obtenção de empréstimos financeiros ou rolagem da dívida e conseqüente possibilidade de ampliação dos seus gastos para além dos limites da sua receita fiscal, por outro as estratégias utilizadas pelo governo federal não apontam a favor da cooperação intergovernamental. Ao contrário, a lógica estabelecida acaba por promover uma estreita correlação entre a magnitude das dificuldades financeiras dos estados e o acirramento das disputas por recursos a serem atribuídos a cada esfera de governo, acentuando-se os conflitos em torno da "guerra fiscal".

Nesse contexto, apesar de os municípios terem assumido com muito entusiasmo as tarefas da saúde, a partir da NOB 01/93, a dinâmica predatória nas relações intergovernamentais passou a influenciar a própria adoção de medidas mais efetivas para a implantação do SUS. E essa dinâmica passou a prevalecer, uma vez que, em primeiro lugar, os estados deixaram cada vez mais de cumprir parte da sua responsabilidade para com a saúde, quer seja pelo repasse adicional de recursos aos municípios, quer seja por maiores investimentos na gerência direta dos seus serviços ou na ampliação da sua capacidade técnica e operacional às ações de controle e planejamento, fundamentais à articulação das ações e serviços no âmbito estadual. Em segundo lugar porque, quando as principais diretrizes do modelo de organização dos serviços de atenção à saúde são estabelecidas centralmente, no âmbito federal, e operadas através da lógica do financiamento (Elias 1996:161), elas tendem a gerar uma disputa pelos recursos disponíveis entre as esferas de governo, acabando por reforçar os desequilíbrios na oferta e atendimento das necessidades, historicamente presentes no modelo de assistência à saúde do país.

Isto pode ser verificado pelo fato de que a ampliação da capacidade para operar o seu sistema de saúde de vários dos municípios brasileiros, principalmente aqueles com maior autonomia para o atendimento das novas exigências e demandas, aumenta por conseqüência a busca por recursos adicionais, o que em si não constitui um grande problema a ser equacionado. Mas, quando se associa esta questão à ausência de mecanismos políticos e institucionais que propiciem o exercício da coordenação, planejamento e racionalidade, prevalece entre os gestores do sistema de saúde a lógica autárquica, do ponto de vista político-territorial de organização do sistema de saúde, uma vez que cada um tende a agir isoladamente na tentativa de solucionar os seus impasses financeiros.

Esses problemas, associados à retração dos recursos federais destinados à saúde, e que vinham diminuindo a cada ano (R$ 24,3 bilhões, em 1994; R$ 18,4 bilhões, em 1995; e, R$ 15,9 bilhões, em 1996), levaram o Ministério da Saúde a interromper os processos de habilitação de gestão, previstos pela NOB 01/93 (CONASEMS 1998:14-15).

Não é casual que aquelas cifras tenham sido tiradas de uma publicação do CONASEMS. Os gestores municipais manifestavam a sua insatisfação diante da insegurança quanto aos repasses de recursos financeiros pelo Ministério da Saúde através dessa sua entidade nos diversos espaços em que participavam, incluindo sua presença institucional na Comissão Tripartite. Através dela exigiam mudanças na lógica de financiamento do SUS, no sentido de estabelecer uma política mais estável de financiamento e uma maior autonomia dos municípios para a alocação dos recursos na saúde.

Surgiram daí algumas iniciativas, tais como: a busca de uma contribuição destinada exclusivamente à saúde, dentre elas, a proposta de transformação do IPMF (Imposto Provisório sobre a Movimentação Financeira) em CPMF; a retomada da Proposta de Emenda Constitucional 196/93, de autoria dos deputados Waldir Pires (ex-ministro da Previdência) e Eduardo Jorge, e que fixava uma porcentagem das Contribuições Sociais da Seguridade e 10% dos impostos-da União, dos estados e dos municípios; e, ainda, a edição de uma nova norma operacional, que já vinha sendo proposta, estabelecendo um valor per capita a ser destinado ao financiamento das ações básicas de saúde, a NOB 01/96.

Dentre essas iniciativas, a CPMF, que vinha sendo defendida desde 1995, veio a ser aprovada em 1996, após grande pressão do então ministro da Saúde, Adib Jatene, que enfrentou enormes resistências para a sua aprovação. Alegava-se que seria mais um tributo para o cidadão; que seria responsável por elevar os índices inflacionários, que até então permaneciam estáveis; e, que não existiam garantias para impedir que os recursos arrecadados por esse instrumento viessem a substituir os recursos de outras fontes já existentes para a saúde. Uma vez aprovada a CPMF, o que se temia acabou ocorrendo: uma vez vigente, o aumento da arrecadação da CPMF -R$ 6,7 milhões e R$ 8,2 milhões, em 1997 e 1998, respectivamente - não foi proporcionalmente repassado para a saúde. Ao contrário, apesar da recuperação dos valores aplicados, constata-se uma retração dos recursos quando comparados aos que já vinham sendo aplicados, totalizando ém 1997, R$ 18,5 bilhões e em 1998, R$ 19,5 bilhões (CONASEMS 1998:14).

Ao lado dessas iniciativas continuavam as negociações entre os gestores da saúde no sentido de fazer prevalecer as novas regras para o financiamento do setor propostas pelo Ministério da Saúde através da NOB 96/01. Uma vez editada em 6 de novembro de 1996, ela promove mudanças substanciais no processo de descentralização da saúde. Todavia, ela somente passa a ser efetivamente implantada no início de 1998, dada a resistência de alguns gestores estaduais. Estes a viam como uma ameaça aos estados, donos de uma rede de serviços com maior capacidade resolutiva em termos de atos médicos mais complexos, e por conseqüência mais onerosos, como é o caso de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Essa resistência pautava-se nas alterações propostas pela Norma Operacional, ao introduzir o PAB - Piso Ambulatorial Básico, na medida em que não havia segurança quanto ao aumento dos recursos financeiros da União para sustentá-la, com o que o financiamento dos procedimentos especializados poderia ficar comprometido.

Por outro lado, o PAB significou para os gestores municipais um certo avanço, dada a garantia do repasse automático e regular dos recursos através do Fundo Nacional de Saúde diretamente para os municípios habilitados. Esses recursos seriam destinados aos procedimentos básicos de vacinação, consultas médicas ambulatoriais, atendimento ao pré-natal, atividades preventivas, ações de vigilância epidemiológica e sanitária, considerados de competência tipicamente municipal. O valor da transferência para o município passou a ser calculado com base na população residente por meio de um valor per capita nacional de R$ 10,00 por ano. Para a habilitação do município ao PAB exige-se o cumprimento de alguns requisitos, tais como comprovar o funcionamento do Conselho Municipal de Saúde e do Fundo Municipal de Saúde, apresentar o Plano Municipal de Saúde e comprovar capacidade técnica e administrativa para a gestão dos serviços.

Costa et al. (1999) qualificam a NOB 01/96 como uma estratégia indutiva, uma vez que compromete o gestor municipal com buscar atingir uma maior eficácia da gestão com os cuidados básicos de saúde, ao introduzir mecanismos que direcionam o modelo assistencial para o fortalecimento da atenção básica e para as ações de caráter coletivo (p. 41).

Dentre esses mecanismos de indução, além do PAB, estaria o incentivo financeiro, propiciado por recursos federais, aos municípios que venham a adotar os programas de Saúde da Família (PSF) e de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), assim como a transferência regular e automática de recursos Fundo a Fundo destinados às ações básicas de vigilância sanitária e epidemiológica.

No geral esses mecanismos têm sido interpretados como urna possibilidade de tornar a distribuição dos recursos mais eqüitativa e de conferir uma maior autonomia ao município para a gestão da atenção básica à saúde. Todavia a questão mais polêmica, que tem gerado uma série de conflitos entre os secretários da saúde das distintas esferas de governo e até mesmo entre os secretários de um mesmo nível governamental, diz respeito exatamente aos recursos transferidos para a atenção mais complexa do sistema. Entre eles3 3 Fração Assistencial Especializada (FAE) é um montante de recursos que corresponde a procedimentos ambulatoriais de média complexidade, medicamentos e insumos excepcionais, órteses e próteses ambulatoriais e Tratamento Fora do Domicílio (TFD), sob gestão do Estado. Remuneração por Serviços Produzidos: significa o pagamento direto aos prestadores estatais ou privados, contratados e conveniados, contra apresentação de faturas, referente a serviços realizados conforme programação e mediante prévia autorização do gestor, segundo valores fixados em tabelas editadas pelo órgão competente do Ministério (SAS/MS). Remuneração de Internações Hospitalares', consiste no pagamento dos valores apurados por intermédio do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), englobando o conjunto de procedimentos realizados em regime de internação, com base na autorização de Internação Hospitalar (AIH), documento este de autorização e fatura de serviços. Remuneração de Procedimentos de Alto Custo (APAC): significa o pagamento de procedimentos ambulatoriais integrantes do SIA/SUS definidos pela Comissão Tripartite e formalizados por portaria do órgão competente do Ministério da Saúde. estão: a Fração Assistencial Especializada (FAE); a remuneração por serviços produzidos; a remuneração pelas internações hospitalares; a remuneração pelos procedimentos ambulatoriais de alto custo/complexidade (APAC).

São inegáveis os benefícios trazidos pelo PAB aos municípios, principalmente no caso daqueles que não possuem a mínima capacidade para a manutenção de uma rede de serviços básicos de atendimento à saúde. Independente da discussão de ser o valor per capita repassado suficiente ou não para manter os serviços dentro de padrões aceitáveis, o PAB representa uma garantia de estabilidade de recursos para que o município possa planejar as suas atividades em saúde, bem como possibilitar um controle público mais efetivo de suas ações. Por outro lado, as evidências assinalam que a NOB 01/96 pouco avançou na direção de solucionar os impasses resultantes do desequilíbrio da oferta dos serviços ambulatoriais especializados e de internações hospitalares pelo SUS. Os critérios que regulamentam tais atividades ainda são insuficientes quando se tem por objetivo propiciar uma oferta de serviços mais equânime e resolutiva à população. Isso decorre de uma série de fatores que tem dificultado o equacionamento desta questão por parte dos gestores da saúde, que pode ser analisada sob diversas perspectivas, tais como:

• do desenvolvimento social, econômico e cultural, que resulta em transformações nas relações sociais, no meio ambiente, no modo de produção, nas exigências securitárias, nas lógicas de mercado, nas estruturas de morbi-mortalidade e no perfil demográfico. Além disso, o avanço tecnológico e da informação tornam cada vez mais complexa a prática médica, gerando uma demanda mais sofisticada por incorporação crescente de tecnologias ao prolongamento da vida e ao alívio dos transtornos físicos. Estas questões vêm desafiando, sobremaneira, os responsáveis pela tarefa pública da saúde, na busca de meios mais eficazes e racionais para a garantia do acesso da população à tecnologia disponível, de modo a enfrentar os custos cada vez mais elevados com a assistência médica, sendo que em alguns casos pouco dependem de uma política governamental no âmbito local;

• da lógica de inserção da assistência médico-hospitalar e especializada no modelo de organização da oferta de serviços de saúde no país, a partir da década de 60, baseada nos recursos previdenciários e incentivos à iniciativa privada para a expansão e manutenção dos seus serviços, através de investimentos financeiros e do pagamento por ato médico, a fim de propiciar o atendimento da população urbana inserida no mercado formal de trabalho. Em 20 anos esse modelo consolidou práticas e lógicas de difícil reversão. Destacam-se aqui, a seletividade do direito; a centralização no processo de decisão; privilégios corporativos; a hegemonia do setor privado no ramo da prestação dos serviços médico-hospitalares, possibilitando-lhes a imposição de regras favoráveis ao mercado; distorções na distribuição territorial dos equipamentos de maior densidade tecnológica, concentrando-os nos grandes centros urbanos. Após duas décadas de descentralização da gestão na saúde, estes fatos ainda impõem sérias dificuldades ao gerenciamento descentralizado das ações de saúde, diante das exigências de racionalização dos custos e ampliação dos direitos, na medida em que se tornam necessários investimentos que propiciem uma melhor distribuição e oferta mais equânime dos serviços; capacidade gerencial; parcerias entre o poder público e organizações da sociedade; e, sobretudo de cooperação e coordenação intergovernamental, desafios estes de caráter menos técnico e mais político, por se tratar de estratégias que afetariam diretamente muitos interesses e lógicas já cristalizadas, mas que continuam determinando as distintas realidades que compõem o país;

• do âmbito nacional. Cohn e Elias (1999) analisam as diretrizes contidas na NOB 01/96, mostrando sua consonância com a estratégia política adotada pelo governo Fernando Henrique Cardoso, uma vez que as alterações substantivas no processo de reformulação do sistema de saúde brasileiro atendem de certa forma as prescrições das agências multilaterais para os países em desenvolvimento, a partir do incentivo à descentralização e da garantia de um pacote mínimo de atenção básica na saúde à população de baixa renda. Além disso, identificam na atual estratégia política para a área da saúde um componente muito mais racionalizador do que de incremento da democracia. "Os principais problemas da NOB 01/96 residem, inicialmente, na persistência da concepção da descentralização tutelada pela esfera federal e operada por meio do financiamento, esta uma das principais características das políticas de saúde que se mantém desde 1930. Em segundo lugar, a manutenção praticamente intocada da sistemática de remuneração mercantilizada dos procedimentos hospitalares, ou seja, pagamento por produção através da Tabela do SUS, de abrangência nacional e tomada como referência mínima para cada procedimento" (p. 126-129).

Por outro lado, a tendência que conduz a uma descentralização tutelada não ocorre sem tensionar as relações entre as esferas de governo envolvidas no processo, principalmente naquelas negociações que envolvem os recursos destinados à atenção ambulatorial e hospitalar, quando as esferas subnacionais de governo radicalizam as suas propostas em direção a uma descentralização autárquica.

As conseqüências dessa dinâmica levam a admitir, em consonância com vários autores, que no Brasil o processo de descentralização na saúde assume um caráter tutelado, mas incorporando como eixo estratégico o caráter competitivo de gestão na esfera pública. Não se pode descartar, no entanto, que a competição entre os agentes de governo pode estimular a racionalização e a melhoria da qualidade dos serviços públicos, desde que esteja integrada em um projeto de descentralização político-administrativa com vistas à democratização da sociedade, uma vez que é exatamente essa dinâmica que possibilitaria o controle da população sobre os serviços prestados. Por outro lado, de pouco adianta o estímulo à competição para a execução de uma determinada política, visando um melhor desempenho institucional, se grande parte dos-governos locais não detém os recursos físicos, tecnológicos e gerenciais necessários para efetivá-la. A competição, neste caso, tende a converter-se em mera disputa por recursos destinados à sobrevivência daquilo que já vinha sendo realizado, fortalecendo cada vez mais os processos autárquicos de descentralização, inviável num modelo que vise o acesso da população à atenção integral à saúde.

Surge daí o grande foco de tensão instalado nas arenas de negociação previstas pela NOB 01/96. O modelo adotado para o financiamento da assistência especializada, através do pagamento por procedimentos, bem como seus instrumentos de fatura e controle, além das críticas do setor público e do privado contratado quanto aos valores defasados atribuídos a eles, não demonstram uma lógica compreensível sobre os seus cálculos. Apesar dos investimentos realizados pelo governo federal nesses últimos anos no que diz respeito ao aperfeiçoamento da tabela de procedimentos e à informatização dos instrumentos de controle e pagamento, os modelos de faturamento e remuneração dos procedimentos realizados continuam extremamente complexos, dificultando sobremaneira a compreensão da sua lógica, e ainda mais a avaliação e o controle da sociedade sobre os atos praticados. São milhares de procedimentos codificados e estratificados no âmbito da assistência ambulatorial e hospitalar (SIA e AIH), demandando redes de informática e estruturas de apoio e auditoria. Diante disto, as discussões nos colegiados que reúnem os gestores da saúde tornam-se cada vez mais especializadas, demandando o conhecimento dos instrumentos para nortear a leitura e interpretação das inúmeras planilhas apresentadas. Esse emaranhado de códigos, as faturas, as siglas, os procedimentos, os tetos financeiros e as AIHs acabam por amortecer os conflitos e dissimular a tensão que existe entre a capacidade e possibilidade da oferta de serviços e as alternativas de como enfrentar a distribuição desigual dos recursos.

Mesmo considerando que a expectativa da NOB 01/96 consistia em trazer um certo alívio no impasse relativo ao financiamento do setor saúde, principalmente para os municípios, nela estava embutida uma preocupação quanto à atribuição de competências das distintas esferas de governo e ao modo de relacionamento entre elas, no processo de implantação do SUS. Para tanto, primeiramente procurou-se consolidar o pleno exercício do poder municipal como gestor da atenção à saúde aos seus munícipes, estabelecendo duas condições de habilitação: Gestão Plena de Atenção Básica e Gestão Plena do Sistema Municipal, de acordo com a declaração dos compromissos assumidos por parte do gestor perante os outros gestores e à população sob sua responsabilidade. Em segundo lugar, ficou evidente a necessidade de se estabelecerem papéis e competências aos gestores estaduais e federal, e nesses casos a NOB pouco avança, mantendo-se as mesmas generalidades das legislações anteriores. A ênfase dada pela norma a estes entes federados trata da coordenação técnica e política do processo de implantação do "SUS- Municipal"; além disso, tal competência se dilui ao depender, no caso dos estados, do Conselho Estadual de Saúde e da Comissão Bipartite, e no caso federal, do Conselho Nacional de Saúde e da Comissão Tripartite, para a viabilização do pacto com os diversos atores envolvidos. Em decorrência, quando as responsabilidades são compartilhadas, mais difícil tornam-se o controle e a capacidade de fiscalização do cumprimento das respectivas funções.

Todavia, percebe-se que, dentre as esferas estaduais e federal, a que menos vem desempenhando o seu papel de cooperação e coordenação no âmbito do SUS é a estadual. Abrucio (1998), ao estudar a questão federativa no país, assinala a pequena presença dos estados nas funções de governo que deveriam ser compartilhadas. Assim, analisa a conformação do poder dos governadores na Federação brasileira, cujos desempenhos no Executivo estadual estariam condicionando a sua atuação no cenário político nacional. Dentre elas, destacam-se:

• a função reservada pela Constituição de 1988 ao Legislativo, tornando-o o locus das decisões legislativas terminativas, e aumentando o poder de fiscalizar o Executivo. Registra, no entanto, como esse processo acabou se dando de forma diferenciada entre as unidades federadas, o que se evidencia quando se analisa a questão das mudanças das funções do Legislativo da perspectiva do equilíbrio dos poderes. "Pode-se dizer que no nível federal os três poderes tornaram-se eqüipotentes (...) tendo o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal se fortalecido perante a Presidência da República. Nos estados, ao contrário, não é eqüipotência entre os Poderes, mas sim uma hipertrofia do Executivo, configurando um sistema ultrapresidencial" (p. 110-111);

• o aumento do poder financeiro dos governadores, por contarem, na maioria das vezes, com bancos estaduais que aumentam o fôlego financeiro dos estados, independente da situação do Tesouro Nacional, propiciando com isso a realização de promessas e de acordos políticos;

• o peso da máquina administrativa e burocrática, devido ao grande número de cargos de confiança, que acabam sendo distribuídos aos correligionários, que com freqüência atuam com pequena capacidade gerencial e baixa transparência de seus atos;

• a baixa visibilidade política dos estados, em função do pequeno número de atribuições materiais e competências legislativas próprias. Além disso, a pouca fiscalização dos tributos pela opinião pública, uma vez que o principal tributo - ICMS - é indireto e pouco percebido pela população, enquanto que os principais tributos cobrados pela União e pelos municípios - IRRF e IPTU - são diretos. Há ainda que se considerar o controle dos meios de comunicação, sendo que significativa parcela da imprensa regional brasileira depende de verbas publicitárias dos governos estaduais;

• a neutralização dos órgãos de fiscalização institucional do Executivo estadual - Tribunal de Contas do Estado (TCE) e Ministério Público (MP), uma vez que os seus conselheiros são escolhidos em parte pelo governador e em parte pela Assembléia Legislativa, comprometendo a autonomia destes órgãos no exercício da fiscalização e do cumprimento das leis (p. 122-143).

Esses fatores têm significativo impacto no desempenho dos governos estaduais quando se trata da sua participação conjunta com outras esferas de governo no processo de desenvolvimento de políticas públicas. Aquela condição política, associada à relativa indefinição das competências dos estados na área social, abre um intervalo amplo no grau maior ou menor de atuação dos governos estaduais no desempenho das suas funções.

Na saúde, a NOB 01/96 propõe uma revisão do papel dos estados para a gestão do SUS, estabelecendo duas condições de gestão: Gestão Avançada do Sistema Estadual (GASE) e Gestão Plena do Sistema Estadual (GPSE), estabelecendo entre as principais responsabilidades comuns a ambas:

• quanto à execução e gestão: gerenciar os serviços próprios relacionados à política do sangue e dos laboratórios de referência para o controle de qualidade; executar a política estadual de assistência farmacêutica e as políticas de integração das ações de saneamento às da saúde; controlar as doenças que envolvem operações complexas, que se possam beneficiar da economia de escala; realizar ações básicas de vigilância sanitária aos municípios não habilitados e as ações de média e alta complexidade de vigilância sanitária, exceto aquelas realizadas pelos municípios habilitados na condição de gestão plena do sistema municipal; normalizar e operar a câmara de compensação; operar o SIA/SUS no caso da GASE, e operar o SIA/SUS e AIH/SUS, no caso da GPSE;

• quanto ao planejamento: elaborar o plano estadual da saúde; organizar o sistema de referência; realizar a Programação Pactuada Integrada (PPI);

• quanto à coordenação: coordenar as atividades de vigilância epidemiológica e sanitária;

• quanto à cooperação técnica e financeira: com o conjunto dos municípios, consolidar o processo de descentralização, investindo na organização da rede regionalizada e hierarquizada de serviços, realizando as ações de epidemiologia, o controle de doenças e de vigilância sanitária, bem como o pleno exercício das funções gestoras de planejamento, controle, avaliação e auditoria.

Além destas atribuições, o Estado deve atuar na elaboração da Programação Pactuada Integrada (PPI), harmonizando e compatibilizando as programações municipais e incorporando as ações sob sua responsabilidade direta, mediante negociação na CIB e aprovação pelo CES.

Como se observa, a atuação do governo do Estado fica bastante restrita na norma em vigor, ressaltando-se o seu papel nas atividades de gestão dos seus equipamentos próprios não municipalizados e alguns de especificidade tecnológica. E, no que se refere à coordenação, mantém as mesmas generalidades estabelecidas pela Constituição de 1988. Isto está de acordo com os estudos de Rovera (1996:60) sobre a perspectiva cooperativa das relações intergovernamentais, quando afirma que a cooperação, nos termos de uma ação conjunta, quando não definidos constitucionalmente os regimes de atribuições, só deverá ocorrer mediante o livre acordo entre as partes.

Nessa perspectiva, quando se trata da indefinição das competências estaduais, a conseqüência imediata reside na dificuldade de avaliação do cumprimento do papel dos estados no SUS, embora tenha sido possível verificar que a partir da NOB 01/96 os estados não demonstraram as condições mínimas exigidas para sua habilitação à gestão do SUS. Isto só passou a ocorrer posteriormente em ritmo muito lento, trazendo à tona a sua falta de atuação mesmo nas tarefas de coordenação e planejamento. Outros estudos sobre a atuação da esfera estadual no processo de implantação do SUS também demonstraram a baixa institucionalidade das secretarias estaduais para o desenvolvimento de ações executivas, de coordenação, articulação e estruturação dos sistemas inter-regionais ou regionais de saúde.

Entretanto, como afirma Rovera (1996); a cooperação entre esferas de governo pode se manifestar de distintos modos: auxílio; coordenação; e, ação conjunta ou cooperação no sentido regulamentar. O auxílio seria uma condição em que as diversas instâncias colocariam à disposição das demais seus próprios meios materiais e recursos humanos para o cumprimento com eficácia e com eficiência das suas funções e tarefas, muitas vezes para evitar duplicidades que envolvem custos, não funcionalidades e conflitos. Quanto à coordenação, Rovera (1996) entende ser este um mecanismo de cooperação que trata de embasar os ajustes dos objetivos a serem alcançados, os meios a serem empregados e oferecer parâmetros a serem utilizados nas diversas ações realizadas entre as distintas administrações que concorrem ou intervêm em um determinado setor para que, com base no livre acordo, a ação pública produza um resultado harmônico e coerente. A coordenação obrigatória, como competência de uma das partes, não modifica o caráter de um processo de coordenação delegada a partir de um comum acordo, quando o objetivo é o da colaboração. Para tanto, é necessária a presença da paridade entre as partes, da manutenção das competências e da liberdade de decisão. Isto significa que as partes podem recuperar a sua capacidade autônoma de atuação, naqueles casos em que não se chegue a um acordo. é exatamente por isso que coordenação eqüivale ao diálogo, à persuasà negociação, ao acordo e ao consenso, contrários aos conceitos de hierarquia, direção, mando, imposição e maioria.

Todavia, a cooperação formal, ainda segundo Rovera (1996:60), é qualitativamente diferente daquela, uma vez que consiste na tomada conjunta de decisões e no co-exercício de competências, de tal forma que a ação pública concreta, que se coloca sob um regime desta natureza, só pode ser exercida de modo conjunto ou acordado. Rompe-se, assim, o princípio de alternância que inspira em geral a distribuição e conseqüente aceitação de competências das diversas instâncias de governo. Substitui-a uma atribuição conjunta, que exige uma atuação efetivamente conjunta, entendida como único modo de exercício da competência assim assumida. Daí poder-se afirmar que, mais que uma mera relação de colaboração, consiste numa integração de poderes, num verdadeiro regime de atribuições e exercício acordado de competências, ou seja, que só pode ser estabelecido com caráter obrigatório pela Constituição.

No caso da descentralização da saúde no Brasil a integração entre os poderes foi prevista constitucionalmente, ao atribuir ao município a responsabilidade pelas ações e serviços de saúde, mediante a cooperação técnica e financeira da União e dos estados, de modo a constituir um sistema único de saúde. Esta alternativa consistiu em preservar a autonomia dos entes federados, integrando as ações necessárias à execução da tarefa pública na saúde, no âmbito das três esferas de governo, através das estratégias de cooperação. Todavia, após dez anos de implantação do SUS, tais estratégias vêm ocorrendo de modo bastante diverso no território nacional, especialmente no que diz respeito ao envolvimento dos estados brasileiros. Isso talvez ocorra, utilizando-se as definições de Rovera, pela ausência de um regime de atribuições mais explícito, destinado a regular a competência de cada ente federativo, de forma a compor um conjunto de atribuições articuladas à execução de um objetivo comum.

Vários estudos realizados no período mais recente tratam das relações intergovernamentais na saúde, em particular aqueles voltados para os aspectos referentes à atuação do governo do Estado no SUS. Eles no geral apontam para distintas modalidades de participação entre as unidades federadas, relacionadas às responsabilidades estabelecidas pelas regulamentações do sistema quanto à cooperação, coordenação e articulação do sistema de saúde intermunicipal ou regional. A partir deles, e diante da análise anterior, propõe-se uma classificação de acordo com as variáveis de atuação, dentre elas:

• cooperativa: quando o governo do Estado procura integrar-se às instâncias municipais, procurando exercer a coordenação, a pactuação e a negociação, assumindo parte das tarefas ou apoiando os municípios através de recursos materiais, financeiros, técnicos e de subsídio ao planejamento, de modo a atender as necessidades de saúde no âmbito local e regional. Segundo Arretche (1998:218), os estados onde esse modelo vem sendo colocado em prática são aqueles em que houve uma forte participação dos dirigentes municipais, que se colocaram como interlocutores frente aos governos estaduais, a exemplo dos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Ceará;

• cooperação tutelada: nos casos em que o Estado define as diretrizes e as tarefas que os seus municípios deverão desenvolver. Isso ocorre naquelas situações em que o estado comporta um grande número de municípios completamente dependentes das receitas extramunicipais, ou em situações permeadas por tradicionais interesses políticos, quando os dirigentes municipais se aliam aos governadores para a obtenção de vantagens;

• competitiva: quando os estados competem com a instância municipal, no sentido de assumir a gestão direta de alguns serviços de saúde, e que muitas vezes implicam recursos financeiros adicionais, dada a lógica de financiamento do SUS, assim como por interesses políticos, que envolvem cargos na máquina burocrática estadual. (Cohn et al 1996; Heimann et al 1998; Costa 1997). Estariam incluídos neste perfil os estados que apresentam uma expressiva rede privada contratada pelo SUS, bem como unidades estaduais que tiveram uma grande inserção institucional na área da saúde;

• jurídico-formal: quando o governo do Estado simplesmente cumpre as exigências formais estabelecidas pelas normas e regulamentações gerais de operacionalização do SUS, e apenas coloca-se à frente do processo na vigência de situações que envolvam problemas de governabilidade.

Esse esforço para estabelecer modelos de atuação dos governos estaduais de uma perspectiva cooperativa expõe as debilidades do sistema de saúde brasileiro, na medida em que a esfera estadual na organização política e territorial da Federação na nossa realidade poderia representar o nível de poder intermediário, fundamental ao equilíbrio e integração das distintas ações de governo, dado o caráter autônomo do sistema federativo brasileiro. Todavia, ainda são poucos os estudos que abordam questões desta natureza, fundamentais à reflexão e ao equacionamento de uma série de problemas que decorrem da especificidade e da complexidade do arranjo político-institucional da saúde, quando se trata de conciliar os distintos graus de autonomia entre as esferas de governo e os necessários elos de conexão entre elas.

Diante desse quadro, que demonstra uma grande fragilidade do papel da esfera estadual no processo de implantação do SUS, coloca-se o desafio de procurar compreender as lógicas de relacionamento entre as esferas de governo, reconhecendo de antemão que apenas o enfoque econômico ou mesmo do plano institucional vêm se revelando insuficientes para a análise do atual processo de descentralização da saúde, quando se trata de verificar os meios pelos quais os múltiplos interesses e vontades são processadas na arena político-institucional correspondente.

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  • __________(1999). "Relações intergovernamentais e a reforma da administração pública, in Melo, M. A. (org.). Reforma do Estado e mudança institucional no Brasil. Recife. Ed. Massangana, pp. 99-223.
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  • ZICCARDI, A. (1999). "Las ciudades y la cuestión social". Instituto de Investigaciones Sociales - Universidad Nacional Autónoma de México.
  • *
    Apresento neste artigo algumas das reflexões realizadas para a minha tese de doutoramento defendida na Faculdade de Medicina da USP- Departamento de Medicina Preventiva, sob o título: "SUS, Gestão Pública da Saúde e Sistema Federativo no Brasil".
  • 1
    Os conselhos de saúde (federal, estaduais e municipais) são instâncias colegiadas que participam das deliberações do SUS e atuam na fiscalização do sistema. A Lei 8142/90 estabelece, ainda, a composição paritaria dos conselhos: representantes dos gestores e prestadores de serviços médico-assistenciais, de um lado, e do outro representantes da comunidade.
  • 2
  • 3
    Fração Assistencial Especializada (FAE) é um montante de recursos que corresponde a procedimentos ambulatoriais de média complexidade, medicamentos e insumos excepcionais, órteses e próteses ambulatoriais e Tratamento Fora do Domicílio (TFD), sob gestão do Estado.
    Remuneração por Serviços Produzidos: significa o pagamento direto aos prestadores estatais ou privados, contratados e conveniados, contra apresentação de faturas, referente a serviços realizados conforme programação e mediante prévia autorização do gestor, segundo valores fixados em tabelas editadas pelo órgão competente do Ministério (SAS/MS).
    Remuneração de Internações Hospitalares', consiste no pagamento dos valores apurados por intermédio do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), englobando o conjunto de procedimentos realizados em regime de internação, com base na autorização de Internação Hospitalar (AIH), documento este de autorização e fatura de serviços.
    Remuneração de Procedimentos de Alto Custo (APAC): significa o pagamento de procedimentos ambulatoriais integrantes do SIA/SUS definidos pela Comissão Tripartite e formalizados por portaria do órgão competente do Ministério da Saúde.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Maio 2010
    • Data do Fascículo
      2001
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