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A China e a desindustrialização brasileira: um olhar para além da especialização regressiva

China and Brazilian deindustrialization: a look beyond regressive specialization

Resumo

Este artigo analisa como o estreitamento das relações comerciais entre Brasil e China, a partir dos anos 2000, tem causado o aprofundamento de dois fenômenos característicos da economia brasileira desde os anos de 1980: a especialização regressiva e a desindustrialização. Em especial, para além dos impactos a respeito do papel chinês na especialização produtiva no período recente, argumenta-se que esses efeitos são estendidos para o desadensamento da estrutura produtiva. A partir da adaptação de indicadores de desadensamento industrial - coeficiente de desadensamento da indústria de transformação (CDIT) e coeficiente de participação relativa no desadensamento (CPRD) - utilizando como base de dados a World Input-Output Database (WIOD), este estudo aponta como o avanço chinês se deu de forma transversal (aumento da participação em todos os setores analisados) e heterogênea (observa-se um viés setorial) na indústria de transformação brasileira.

Palavras-chave:
Desindustrialização; mudança estrutural; comércio exterior; China

Abstract

The article analyzes how the strengthening of trade relations between Brazil and China, since the 2000s, has caused the deepening of two characteristic phenomena of the Brazilian economy since the 1980s: regressive specialization and deindustrialization. In particular, in addition to the impacts, which have been widely analyzed, regarding the Chinese role in productive specialization in the recent period, it is argued that these effects are extended to the densification of the productive structure. Based on the adaptation of industrial densification indicators - the manufacturing densification coefficient (CDIT) and the relative participation coefficient in the densification (CPRD) - using the World Input-Output Database (WIOD) as a database, the article points out how the Chinese advance occurred transversally (increased participation in all sectors analyzed) and heterogeneous (an important sectorial bias in this Chinese advance is observed) in the Brazilian manufacturing

Keywords:
De-industrialization; Structural Change; International Trade; China

1 Introdução

Ao contrário do observado nos países desenvolvidos, onde ocorreu um tipo de desindustrialização “normal” - na qual a queda da participação manufatureira em termos de emprego foi fruto de taxas de crescimento da produtividade manufatureira maior que nos outros setores e essa trajetória se iniciou a partir de patamares elevados de renda média per capita (Rowthorn; Ramaswamy, 1999ROWTHORN, R; RAMASWAMY, R. Growth, trade and deindustrialization. IMF Staff Papers, v. 46, n. 1, 1999.; Rowthorn; Coutts, 2004; Haraguchi, 2015HARAGUCHI, N. Patterns of structural change and manufacturing development. In: WEISS, J; TRIBE, M. Routledge Handbook of Industry and Development. London: Routledge, 2015.) -, a desindustrialização brasileira pode ser descrita como “prematura”, na medida em que a mudança estrutural em direção ao setor de serviços ocorre sem que o país tenha atingido o nível de maturidade industrial observado nos países desenvolvidos (Tregenna, 2009TREGENNA, F. Characterising deindustrialisation: An analysis of changes in manufacturing employment and output internationally. Cambridge Journal of Economics, Cambridge, n. 33, pp. 433-466, 2009.; Tregenna; Andreoni, 2020). No primeiro caso, segundo Palma (2005PALMA, J. G. Four sources of “de‐Industrialisation” and a new concept of the “Dutch disease”. In: OCAMPO, J. A. (Ed.). Beyond reforms: Structural dynamics and macroeconomic vulnerability: New York: Stanford University Press/World Bank. 2005.), a desindustrialização positiva significou redução da participação da indústria no PIB sem uma redução absoluta do valor adicionado. Ademais, a desindustrialização seria resultado da continuidade do processo de transformação estrutural da economia, redirecionada para atividades com elevado nível de produtividade e complexidade tecnológica - como os serviços intensivos em conhecimento. Assim, não estaria associada a efeitos perversos ligados à desindustrialização prematura, na qual a indústria perderia capacidade de contribuir para o desenvolvimento.1 1 Tregenna e Andreoni (2020) questionam tal hipótese a partir de uma ampla análise dos processos de mudanças estruturais nos países desenvolvidos. A partir de evidências empíricas mostram que os setores de alta intensidade tecnológica aumentam continuamente sua participação no PIB em países de alta renda.

Sobre o caso brasileiro, conforme Coutinho (1997COUTINHO, L. C. A especialização regressiva: um balanço do desempenho industrial pós-estabilização. In: Velloso, J. P. R. (Org.). Brasil: desafios de um país em transformação. Rio de Janeiro: José Olympio, 1997.), esse processo tem suas raízes na transição do paradigma tecno-produtivo em direção à revolução industrial baseada na eletrônica. Para o autor, o Brasil não se beneficiou da integração aos fluxos produtivos globais (principalmente investimento direto estrangeiro (IDE)) que poderiam viabilizar um processo virtuoso de transformação na estrutura produtiva.2 2 Em abordagem semelhante, Cano (2012) sugere que “a guinada de IDE predominantemente americano e asiático para a China em busca de trabalho barato, câmbio desvalorizado e alta competitividade (trouxe) nocivos efeitos internos (à economia brasileira) (...) (uma vez que) afetaram profundamente os investimentos produtivos do setor, tornando-os de caráter mais específico, oportunistas e atomizados” (Cano, p. 835-836). Adicionalmente, em paralelo ao esgotamento do paradigma tecno-produtivo característico da II Revolução Industrial, os condicionantes derivados da estratégia de estabilização de preços adotada no Brasil estariam associados a um modelo “antiprodução” e pró-importação. Esses dois fenômenos convergiriam para a fragilização da estrutura empresarial doméstica, a debilidade das estruturas de financiamento de longo prazo e para o déficit estrutural de competitividade, resultando na especialização regressiva (Coutinho, 1997).

Segundo o autor, a especialização regressiva caracteriza-se pela combinação de diversos fatores: (a) desindustrialização generalizada; (b) a desnacionalização da estrutura produtiva; e (c) reorganização empresarial, com desverticalização e integração internacional importadora. Tal cenário responde por crescente incapacidade da indústria de gerar novos ciclos de investimentos transformadores da estrutura produtiva e viabilizadores do crescimento das exportações. As exceções a esse fenômeno seriam os setores baseados na produção de commodities em grande escala, cuja competitividade é influenciada pelo acesso a recursos naturais.

Rodrik (2016RODRIK, D. Premature deindustrialization. Journal of Economical Growth, n. 21, pp. 1-33, 2016.) enfatiza que a desindustrialização prematura afeta elementos ligados à sustentação do crescimento de países periféricos, pois: a) compromete a capacidade do desenvolvimento industrial e seus encadeamentos intersetoriais no aumento da produtividade da economia; b) reduz a capacidade de absorção de mão de obra pouco especializada se comparado ao setor de serviços de alta produtividade. Ou seja, limita o processo de transformação estrutural via industrialização como elemento central na trajetória de busca de superação do subdesenvolvimento, tal qual sugerem os trabalhos clássicos de Hirschmann (1958HIRSCHMANN, A.O. The strategy of economic development. New Haven: Yale University Press, 1958.), Furtado (1961) e Rosenstein Rodan (1943).

Essa percepção também está na base de trabalhos que tratam da desindustrialização no Brasil, como Bresser-Pereira e Marconi (2010), Oreiro e Feijó (2010OREIRO, J. L.; FEIJÓ, C. Desindustrialização: conceituação, causas, efeitos e o caso brasileiro. Revista de Economia Política, v. 30, n. 2 (118), p. 219-232, 2010.), entre outros. De maneira geral, esses trabalhos sugerem que o processo de desindustrialização brasileiro decorreria da incapacidade de se neutralizar os efeitos da Doença Holandesa. Esta, ao implicar a tendência de valorização de longo prazo da moeda local - devido ao grande superávit em commodities e atração de capitais especulativos derivadas das altas taxas de juros domésticas - levaria à redução da competitividade da indústria e do seu potencial de acumulação e investimento.

Destarte, a estratégia para reverter a desindustrialização consistiria na adoção de políticas que neutralizassem os efeitos da Doença Holandesa. Nassif, Bresser-Pereira e Feijó (2018NASSIF, A.; BRESSER-PEREIRA, L. C.; FEIJO, C. The case for reindustrialisation in developing countries: Towards the connection between the macroeconomic regime and the industrial policy in Brazil. Cambridge Journal of Economics, v. 42, n. 2, p. 355-381, 23 fev. 2018.) sugerem duas dimensões: a) um regime macroeconômico capaz de incentivar o investimento produtivo potencializado por meio da combinação de taxa de câmbio de equilíbrio industrial, baixas taxas de juros e redução da tributação para bens de capital nacionais e importados; b) utilização da política industrial como complemento às modificações no regime macroeconômico, com vistas a fomentar a inovação e a diversificação produtiva.

Complementarmente, Diegues e Rossi (2021DIEGUES, A. C.; ROSELINO, J. E. Política industrial, tecno-nacionalismo e indústria 4.0: a guerra tecnológica entre China e EUA. Campinas: IE-Unicamp, 2021. (Texto para discussão, n. 401).) e Diegues (2021) estabelecem uma relação entre desindustrialização, reconfiguração na dinâmica de acumulação da indústria brasileira e os limites de sua contribuição para o desenvolvimento. Segundo eles, tais limites, desde a década de 2000, parecem ser independentes dos ciclos econômicos e estão associados a uma nova versão do industrialismo periférico - agora regressivo - com elementos qualitativamente distintos da dinâmica vigente entre 1930 e a crise do desenvolvimentismo. Para Diegues (2021), a nova versão caracteriza-se por: i) estratégia defensiva dos agentes industriais locais, onde a busca pela competitividade não ocorre em paralelo à transformação estrutural virtuosa, mas sustenta-se em estratégias regressivas baseadas em pressões permanentes para reduções de custos produtivos; ii) uma nova forma de complementaridade ao capital produtivo internacional, baseada na reorganização das atividades manufatureiras conforme a “curva sorriso”, observando-se um aumento da participação doméstica em atividades vinculadas à representação deste (comercial, financeira e de marketing), à maquila e tropicalização de produtos importados; iii) avanço da industrialização através do reforço das vantagens comparativas e não da busca pelo contorno das mesmas e; iv) reconfiguração, ainda que parcial, da relação entre desvalorização cambial e acumulação do capital alocado na esfera industrial dado que, num cenário de integração importadora e endividamento nos mercado internacionais, a valorização cambial pode contribuir positivamente para o incremento da acumulação na esfera industrial quão maior for seu nível de integração internacional.

Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) analisa a desindustrialização brasileira a partir da evolução do adensamento/desadensamento do tecido industrial. O adensamento existe quando a maioria dos insumos e componentes utilizados são comercializados por produtores domésticos. Quanto mais densas forem as ligações intersetoriais, maiores serão os efeitos do aumento da produção sobre o emprego, massa salarial, desenvolvimento tecnológico, arrecadação tributária, economias externas marshallianas e investimentos complementares. Já o desadensamento culmina na observação dos efeitos contrários, conformando uma estrutura produtiva rarefeita, com baixas ligações intersetoriais e elevada dependência de importações.

Segundo o autor, embora de forma agregada a indústria brasileira ainda mantenha um patamar elevado de adensamento - em virtude do peso de setores tradicionais na estrutura produtiva -, observa-se tendência de aumento do desadensamento, em especial nos setores mais intensivos em tecnologia. Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) chama a atenção que, em contraste com os países em desenvolvimento (PEDs) asiáticos (sobretudo a China), não é observada no Brasil uma correlação positiva entre o aumento da importação de insumos e componentes e uma mudança no perfil exportador do país em direção a setores intensivos em tecnologia. Em síntese, embora o desadensamento seja uma consequência esperada da fragmentação produtiva3 3 Nesse sentido, Morceiro (2018) e Sarti e Hiratuka (2018) apontam que o aumento das importações, em especial de bens intermediários, tornou-se uma tônica a partir da constituição das CGV. Ademais, muitos países em desenvolvimento (em especial do leste asiático) e alguns desenvolvidos (como a Alemanha) lograram êxito em, a despeito de aumentar o coeficiente importado, se beneficiar da maior integração para sofisticar a sua pauta exportadora. , no Brasil, os setores mais importadores se dirigiram ao mercado interno, comprometendo elos produtivos domésticos, sem que haja um incremento nas suas exportações.

Nessa direção, Rodrik (2016RODRIK, D. Premature deindustrialization. Journal of Economical Growth, n. 21, pp. 1-33, 2016.), ao analisar a inserção diferenciada entre países da periferia nas Cadeias Globais de Valor (CGV), argumenta que há uma relação importante entre as mudanças no comércio internacional e o processo de desindustrialização nos PEDs que ficaram, como o Brasil, à margem desse deslocamento produtivo para a periferia. A inserção calcada em produtos primários, baseada em vantagens comparativas estáticas, transformou esses países em importadores líquidos de manufaturados, revertendo o processo de substituição de importações que avançou durante a maior parte do século XX. Por sua vez, Sarti e Hiratuka (2018SARTI, F.; HIRATUKA, C. Desempenho recente da indústria brasileira no contexto de mudanças estruturais domésticas e globais. In: CARNEIRO, R.; BALTAR, P.; SARTI, F. Para além da política econômica. São Paulo: Editora Unesp Digital, 2018.) apontam como a dispersão da produção rumo à periferia se caracterizou pelo caráter seletivo. Alguns países, como os do leste e sudeste asiático (sobretudo a China),4 4 A respeito do deslocamento produtivo em direção à China, ver Medeiros (2006). tiveram sucesso em receber etapas manufatureiras e, via estratégias deliberadas de desenvolvimento tecnológico endógeno, vêm conseguindo alcançar uma mudança estrutural expressiva. Em contraste, outros PEDs como os latino-americanos, ficaram à margem desse processo. Os autores argumentam que parcela importante da perda de participação no valor agregado manufatureiro global dos maiores países industrializados latino-americanos, México e Brasil, vem sendo capturada pelo aumento de participação chinesa.

Ao dialogar com o debate apresentado, este trabalho propõe uma análise que enfatize a importância da China como elemento explicativo dos processos de especialização regressiva e desindustrialização no Brasil a partir dos anos 2000. De um lado argumenta-se, em consonância com Nassif e Castilho (2020NASSIF, A.; CASTILHO, M. dos R. Trade patterns in a globalised world: Brazil as a case of regressive specialisation. Cambridge Journal of Economics, n. 44, pp. 671-701, Cambridge: 2020.) e Sarti e Hiratuka (2018SARTI, F.; HIRATUKA, C. Desempenho recente da indústria brasileira no contexto de mudanças estruturais domésticas e globais. In: CARNEIRO, R.; BALTAR, P.; SARTI, F. Para além da política econômica. São Paulo: Editora Unesp Digital, 2018.), que o estreitamento do comércio Brasil-China é um fator explicativo para o aprofundamento da especialização regressiva brasileira. De outro, de uma perspectiva menos explorada pela literatura atual, sustenta-se que o avanço chinês é um fator explicativo para a intensificação da desindustrialização brasileira, analisada neste trabalho a partir de indicadores de desadensamento do tecido produtivo.

A análise é realizada a partir de indicadores de comércio exterior e de adaptações do coeficiente de importação de insumos e componentes comercializáveis (CIICC), presente em Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.), denominadas neste trabalho de coeficiente de desadensamento da indústria de transformação (CDIT) e coeficiente de participação relativa no desadensamento (CPRD). Este último indicador permite mensurar a participação relativa da China na evolução do (crescente) processo de desindustrialização brasileiro. Desse modo, são pretendidas duas contribuições à literatura, a partir da classificação setorial baseada em Pavitt (1984PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, n. 13, p. 343-373, 1984.) e OECD (1987): i) a mensuração setorial do processo de desadensamento da estrutura produtiva brasileira; ii) a mensuração da contribuição chinesa nesse fenômeno.

Além desta introdução, este artigo é composto por mais duas seções. A seção 2 analisa, a partir das estatísticas tradicionais de comércio disponíveis pela UnctadStat, como se deu esse acirramento das relações entre Brasil e China na esfera comercial, ressaltando o avanço chinês pelo lado da demanda brasileira. A seção 3, ao analisar a participação chinesa no desadensamento do tecido industrial brasileiro, apresenta a construção dos indicadores CDIT e CDPR e traz os resultados a partir dos dados da World Input-Output Database (WIOD). Finalmente, são apresentadas breves considerações.

2 As relações de comércio exterior da China com o Brasil no século XXI

O processo de desindustrialização brasileira deve ser encarado a partir de uma perspectiva de longo prazo. Cano (2012CANO, W. A desindustrialização no Brasil. Economia e Sociedade, v. 21, n. spe, p. 831-851, dez. 2012. e 2014) e Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) esclarecem que pelos menos desde o início da década de 1980 a indústria perde tração como setor líder do processo de desenvolvimento. Observa-se uma trajetória declinante da participação do valor adicionado manufatureiro (VAM) no PIB,5 5 Conforme Morceiro (2018), entre 1981 e 2017 a relação VAM/PIB decaiu de 20,7% para 11,8%. bem como uma redução da participação do emprego manufatureiro em relação ao emprego total. Coutinho (1997COUTINHO, L. C. A especialização regressiva: um balanço do desempenho industrial pós-estabilização. In: Velloso, J. P. R. (Org.). Brasil: desafios de um país em transformação. Rio de Janeiro: José Olympio, 1997.), Cano (2014) e Nassif e Castilho (2020NASSIF, A.; CASTILHO, M. dos R. Trade patterns in a globalised world: Brazil as a case of regressive specialisation. Cambridge Journal of Economics, n. 44, pp. 671-701, Cambridge: 2020.) também chamam a atenção para o avanço da especialização regressiva, em especial após o início da liberalização comercial, em 1989, e a adoção do Plano Real (1994).

Ressalta-se, portanto, que o incremento das relações Brasil e China, a partir dos anos 2000, não inaugura esses processos, embora, a nosso ver, implique mudanças qualitativas sobre eles. A partir da entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, o país asiático ganhou relevância entre parceiros comerciais do Brasil, destacando-se o período pós-crise de 2008 quando, em abril de 2019, a China torna-se nosso principal parceiro comercial em detrimento dos EUA.

Pelo lado da oferta, a ascensão da China como principal polo manufatureiro global e as suas transformações internas (como o acelerado processo de urbanização e mudanças no padrão de consumo da população chinesa6 6 Sobre a relação entre urbanização, infraestrutura e investimento na China, ver Hiratuka (2018). ) estreitaram as relações com os países exportadores de commodities primárias e tiveram efeito direto sobre o comportamento dos internacionais. O Brasil foi bastante beneficiado pelo aumento da demanda chinesa. As exportações brasileiras cresceram de forma acelerada, assim como o índice de termos de troca até 2011 (Bastos, 2015BASTOS, E. K. X. Termos de troca, ganhos de comércio e crescimento da renda interna bruta real no Brasil de 2001 a 2014. Carta de conjuntura. Brasília: IPEA: 2015.).

Simultaneamente, a intensificação do comércio com a China também resultou em mudanças na demanda brasileira. As transformações socioeconômicas observadas no Brasil na primeira década dos anos 2000 (baixo desemprego, aumento da formalização do trabalho, aumento da massa salarial e do crédito) impactaram significativamente a demanda das famílias, especialmente o aumento do consumo de bens duráveis (Biancarelli, 2014BIANCARELLI, A. M. A era Lula e sua questão econômica principal crescimento, mercado interno e distribuição de renda. Rev. Inst. Estud. Bras., São Paulo, n. 58, p. 263-288, 2014.).

Como salientam Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.), Diegues (2021DIEGUES, A. C.; ROSELINO, J. E. Política industrial, tecno-nacionalismo e indústria 4.0: a guerra tecnológica entre China e EUA. Campinas: IE-Unicamp, 2021. (Texto para discussão, n. 401).) e Marcato e Ultremare (2018MARCATO, M. B.; ULTREMARE, F. O. Produção industrial e vazamento de demanda para o exterior: uma análise da economia brasileira. Economia e Sociedade, v. 27, n. 2 (63), pp. 637-662, Campinas: 2018.), uma consequência desse processo foi o crescente vazamento da demanda de bens de capital, bens de consumo final e, especialmente, bens intermediários. Mesmo em um período de expansão do consumo doméstico e de aquecimento da economia, a indústria brasileira não foi capaz de absorver o aumento da demanda, sendo a China origem preferencial dessas importações.

A ascensão da China como parceira comercial preferencial do Brasil estabeleceu, portanto, um padrão assimétrico. De um lado, pelo lado da oferta, a China teve influência na acentuação da especialização regressiva da pauta exportadora. De outro, no bojo de uma situação de crescente déficit comercial nos setores mais intensivos em tecnologia, num cenário de agravamento do vazamento da demanda, o país asiático também parece ter sido uma origem importante (Nassif; Castilho, 2020NASSIF, A.; CASTILHO, M. dos R. Trade patterns in a globalised world: Brazil as a case of regressive specialisation. Cambridge Journal of Economics, n. 44, pp. 671-701, Cambridge: 2020.).

A Figura 1 mostra a evolução da balança comercial brasileira, segundo taxonomia da OECD (1987)/Pavitt (1984PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, n. 13, p. 343-373, 1984.)7 7 A classificação adotada neste trabalho, compatível com a CNAE 2.0 e com a classificação do World Input-Output Database (WIOD), é a seguinte: a) commodities; b) setores intensivos em recursos naturais (IRN): Fabricação de produtos alimentícios, Fabricação de bebidas, Fabricação de produtos de fumo, Fabricação de produtos de madeira, Fabricação de coque, de produtos derivados de petróleo e de biocombustíveis e Fabricação de minerais não metálicos; c) setores intensivos em trabalho: Fabricação de produtos têxteis, confecção de artigos do vestuário e acessórios, Preparação de couros e fabricação de artefatos de couros, artigos para viagem e calçados, Fabricação de móveis, Fabricação de produtos diversos, Manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos; d) setores intensivos em escala: Fabricação de papel e produtos de papel, Impressão e reprodução de gravações, Fabricação de produtos químicos, Fabricação de produtos de borracha e de material de plástico, Metalurgia, Fabricação de produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos, Fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias; d) setores diferenciados: Fabricação de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos, Fabricação de máquinas, aparelhos e equipamentos; e e) setores intensivos em ciência: Fabricação de produtos farmoquímicos e farmacêuticos e Fabricação de outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores. . Observa-se trajetória predominantemente superavitária entre 2000 e 2018, decorrente quase que exclusivamente do desempenho das commodities e dos produtos IRN. Entre os produtos manufaturados, o cenário foi de sucessão de déficits, destacando-se os setores intensivos em escala (especialmente a indústria automobilística) e os setores diferenciados.

Figura 1
Balança comercial brasileira: total e por tipo de tecnologia. Em bilhões de dólares (preços correntes), 2000 a 2018

Esse movimento fica mais nítido quando são analisadas as pautas exportadora e importadora.8 8 Os dados referentes às estatísticas tradicionais do comércio exterior foram extraídos da UnctadStat. Pelo lado das exportações, entre 2000 e 2018, as commodities e os setores IRN aumentaram a sua participação de 42,7% para 65,5%. Enquanto isso, a maioria dos setores industriais apresentou perda de participação. À exceção dos setores intensivos em ciência que, em virtude do desempenho exportador da Embraer, ampliou de forma marginal a sua participação no período, todos os outros agregados industriais perderam participação. Nos outros três agrupamentos as quedas de participação foram expressivas: nos setores intensivos em trabalho a queda foi de 9% para 2,5%, nos setores intensivos em escala de 28,6% para 19%, e nos setores diferenciados de 12,3% para 7,6%. Fica clara, portanto, uma tendência de especialização regressiva da pauta exportadora brasileira (Figura 2).

Figura 2
Pauta exportadora brasileira, por tipo de tecnologia, 2000 a 2018

O que chama mais a atenção no avanço chinês como destino das exportações brasileiras diz respeito a como esse movimento se concentrou em poucos produtos da pauta brasileira. Em 2018, as commodities e os produtos dos setores IRN foram responsáveis por 96% das exportações totais destinadas à China. Ademais, três produtos - soja, mesmo triturada, exceto semeadura; óleos brutos de petróleo ou de minerais betuminosos e minerais de ferro não aglomerados e seus concentrados - totalizaram 77,2% do total exportado para China nesse ano (UnctadStat). Ou seja, sua consolidação como principal destino das exportações brasileiras parece ter sido um fator determinante para a especialização regressiva.

A partir do cálculo do indicador de vantagem comparativa revelada (VCR), Nassif e Castilho (2020NASSIF, A.; CASTILHO, M. dos R. Trade patterns in a globalised world: Brazil as a case of regressive specialisation. Cambridge Journal of Economics, n. 44, pp. 671-701, Cambridge: 2020.) apontam a intensidade desse processo: uma aguda especialização das exportações brasileiras em direção a produtos primários (aumento do indicador) acompanhada da queda do indicador em todas as categorias manufatureiras. Essa tendência de concentração das exportações é reforçada pelo índice de Herfindahl-Hirschman (HHI). Segundo os autores, o nível máximo do indicador, alcançado em 2011, foi resultado direto do incremento das relações entre Brasil e China.9 9 Como explicam Nassif e Castilho (2020, p. 690): “The maximum level of export concentration measured by the HHI was reached in 2011. This latter result reflects the emergence of China as one of the most important Brazilian trading partners after the 2008 global crisis. In fact, a result of the so-called China effect on Brazil’s trade flows is that Brazilian exports grew sharply and became extremely concentrated in mineral ores, soya beans and oil.”

Figura 3
Participação sobre as exportações totais brasileiras, 2000 a 2018

Transformações importantes também ocorreram na órbita da demanda brasileira. Em primeiro lugar, é preciso apontar que, ao contrário do exposto em relação às exportações, as importações apresentam uma diversificação muito maior.10 10 Nassif e Castilho (2020) apontam como o índice HHI, para as importações, apresenta estabilidade a partir de meados dos anos de 1990, em contraste com o quadro de aumento do indicador para as exportações. Como mostra a Figura 4, o avanço da China - cuja participação se elevou de 2,2% para 19,4% entre 2000 e 2018 - ocorreu em detrimento da perda de participação (ainda que em menor intensidade se comparado às exportações) dos parceiros comerciais tradicionais. O avanço chinês ocorreu de forma transversal: nos setores intensivos em trabalho, a sua participação foi de 7,7% para 46,8%; nos setores intensivos em escala, foi de 1,6% para 14,8% (no mesmo período, a participação estadunidense decaiu de 23,1% para 15%); nos setores diferenciados, a participação saltou de 2% para 30,5% (os Estados Unidos reduziram a sua participação de 25,6% para 10,4%); e, nos setores intensivos em ciência, a participação do país asiático se elevou de 3,3% para 28,5% - a participação dos Estados Unidos reduziu de 57,8% para 13%.

Figura 4
Participação sobre as importações totais brasileiras, 2000 a 2018

Os resultados apontam que a China vem desempenhando um papel relevante nessas trajetórias destoantes da oferta e demanda brasileira no comércio internacional. Ainda de acordo com Nassif e Castilho (2020NASSIF, A.; CASTILHO, M. dos R. Trade patterns in a globalised world: Brazil as a case of regressive specialisation. Cambridge Journal of Economics, n. 44, pp. 671-701, Cambridge: 2020.), chama a atenção a natureza dessa relação de comércio: diferentemente do padrão firmado com os países do Mercosul, no qual há prevalência de exportações brasileiras de produtos manufaturados (com destaque para os setores intensivos em escala), ou mesmo com os Estados Unidos, o padrão firmado com a China apresenta um caráter fortemente interindustrial.

Ademais, Hiratuka (2018HIRATUKA, C. Mudanças na estratégia chinesa de desenvolvimento no período pós-crise global e impactos sobre a AL. Campinas: IE-Unicamp, 2018. (Texto para discussão, n. 339).), De Conti e Blikstad (2017) e Dussel-Peters (2016) indicam outra faceta da ascensão chinesa. Em decorrência de um contexto de acirramento da concorrência internacional no pós-crise financeira de 2008, observa-se uma crescente substituição, no âmbito regional, das exportações de manufaturados brasileiras por manufaturados chineses. Diante de um cenário de excesso de capacidade ociosa na China e, em face da queda da demanda dos países centrais, os mercados latino-americanos tornaram-se um destino estratégico para a expansão das exportações de manufaturados do país asiático (De Conti; Blikstad, 2017). O Brasil, a economia mais diversificada da região e que conta no mercado latino-americano (em especial nos países do Mercosul) com um escoadouro importante para as suas exportações manufatureiras, passou a ser diretamente afetado por isso (Hiratuka, 2018).

Outro aspecto relevante desse processo diz respeito à participação chinesa no vazamento da demanda industrial brasileira. Como indicam Marcato e Ultremare (2018MARCATO, M. B.; ULTREMARE, F. O. Produção industrial e vazamento de demanda para o exterior: uma análise da economia brasileira. Economia e Sociedade, v. 27, n. 2 (63), pp. 637-662, Campinas: 2018.), em especial no pós-crise de 2008, observa-se um avanço dos mercados externos como fornecedores da demanda industrial nacional. Para as autoras, há sinais claros de que a estrutura produtiva doméstica foi incapaz de responder a aumentos da demanda. É possível aventar que a China teve um papel relevante nesse processo. Nesse contexto, a seção seguinte procura aprofundar a análise desse movimento a partir do exame do papel da participação chinesa no processo de desindustrialização brasileira pela ótica do valor adicionado.

3 A China e a desindustrialização brasileira

Segundo Rodrik (2016RODRIK, D. Premature deindustrialization. Journal of Economical Growth, n. 21, pp. 1-33, 2016.), pode-se identificar uma relação entre o avanço da liberalização comercial e o processo de desindustrialização prematura. Diferentemente do propagado por grande parte da literatura convencional (Franco, 1998FRANCO, G. H. B. A inserção externa e o desenvolvimento. Brazilian Journal of Political Economy, n. 18, 3, p. 121-147, 1998.), a abertura comercial indiscriminada no Brasil não resultou em um movimento generalizado de modernização das estruturas produtivas e inserção virtuosa nas CGV. Ao contrário, o argumento sustentado na exploração de vantagens comparativas - sem uma estratégia deliberada de ganhos paulatinos de valor adicionado nas cadeias de produção - tem atuado na conformação do país como importador líquido de produtos manufaturados. Como apontado anteriormente, essa forma de inserção também foi incapaz de coadunar aumento das importações e melhora do desempenho exportador de manufaturados.

Em seu trabalho, Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) utilizou coeficiente de importação de insumos e comercializáveis (CIICC) como um indicador de adensamento industrial. Em acordo com Tregenna e Andreoni (2020TREGENNA, F.; ANDREONI, A. Deindustrialisation reconsidered: Structural shifts and sectoral heterogeneity. Working Paper UCL, 2020.) e Dosi et al. (2020DOSI, G; RICCIO, F.; VIRGILLITO, M. E. Varieties of deindustrialization and patterns of diversification: why microchips are not potato chips. LEM Working Paper, 2020.), o autor se debruçou sobre a análise subsetorial da desindustrialização e apontou o caráter heterogêneo desse processo: nos setores mais intensivos em tecnologia, o desadensamento foi bastante superior em relação aos setores menos intensivos em tecnologia. O fato de os setores mais intensivos em tecnologia serem aqueles com maiores encadeamentos intersetoriais, com melhor remuneração média e maiores elasticidade-renda da demanda no comércio internacional, enseja preocupações com a trajetória de desenvolvimento do Brasil.

Nesse sentido, Torraca (2017TORRACA, J. Coevolução das estruturas de produção e comércio exterior da indústria brasileira: convergência ou desarticulação? Tese (Doutorado) - IE, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.) aponta, para o período entre 2000 e 2008, uma convergência entre a inserção externa e a dimensão interna: o aumento da especialização comercial brasileira em prol de produtos IRN e commodities parece ter tido efeitos na conformação de uma estrutura produtiva também baseada nesses produtos. Assim, a autora defende que a interação entre a estrutura produtiva e a inserção externa poderia ser classificada como uma trajetória estilizada do tipo “ricardiana”. Embora tenha analisado um recorte temporal mais restrito - entre 2000 e 2008 -, a autora destaca que a redução de participação de parceiros tradicionais (Estados Unidos, União Europeia e Mercosul), em detrimento da participação dos mercados asiáticos (sobretudo da China) parece se relacionar a essa mudança na composição da pauta comercial e, consequentemente, na estrutura produtiva. Como foi destacado na seção anterior, é no período posterior à crise financeira global de 2008 que a China se consolida como principal parceira comercial do Brasil. Como também foi ressaltado, ampliou-se nesse período o caráter interindustrial dessa relação.

Partindo do arcabouço metodológico utilizado por Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.), e em consonância com o cenário aventado por Torraca (2017TORRACA, J. Coevolução das estruturas de produção e comércio exterior da indústria brasileira: convergência ou desarticulação? Tese (Doutorado) - IE, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.) e Rodrik (2017) de que há uma relação entre a inserção comercial e a deterioração da competitividade industrial, esta seção propõe mensurar a participação relativa da China no aprofundamento da desindustrialização brasileira no período entre 2000 e 2014.

3.1 Construção dos indicadores de coeficiente de desadendamento da indústria de transformação (CDIT) e de coeficiente de participação relativa no desadendamento (CPRD)

Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) analisou de forma desagregada (258 classes industriais) o avanço do esgarçamento industrial brasileiro. Para isso, fez uso do componente de insumos e componentes comercializáveis (CIICC), que foi calculado a partir de dados de uma tabulação especial da Pesquisa Industrial Anual-Empresa (PIA-E). Diferentemente da maior parte dos trabalhos que se debruçaram sobre o processo de desindustrialização corrente no país, Morceiro (2018) destacou a importância do exame subsetorial: nos setores mais intensivos em tecnologia o processo ocorreu de forma muito mais intensa do que nos setores menos intensivos em tecnologia. O CIICC foi calculado a partir da seguinte expressão:

C I I C C s ( % ) = ( I I C C s T I C C s ) 100 I)

O componente IICC se refere ao total importado de insumos e componentes comercializáveis pela categoria analisada, e TICC se relaciona ao total de insumos e componentes comercializáveis utilizados para a produção da mesma categoria.

Este trabalho propõe uma adaptação do indicador utilizado por Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.). Diferentemente do CIICC, que visava à análise subsetorial do esgarçamento industrial, este artigo busca mensurar a participação de países terceiros (no caso, a China e, como comparação ao avanço chinês, os Estados Unidos) no processo de desindustrialização do Brasil. Para isso, utilizou-se dados da WIOD, que, através das suas matrizes insumo-produtos mundiais, permite identificar a origem do valor adicionado importado no período entre 2000 e 2014.11 11 O WIOD fornece dados para 43 países, bem como um modelo residual que compreende o “Resto do Mundo”, e para 56 setores classificados segundo o International Standart Classification Revision 4 (ISIC Rev. 4). Com base na definição setorial apontada em relação à construção do CDIT, dos 56 setores. Se, por um lado, o uso dessa base de dados torna possível a adaptação do indicador presente em Morceiro (2018), de modo a estender a análise do processo de desindustrialização para a participação relativa de países terceiros, por outro lado, a base não permite uma análise tão desagregada em termos setoriais quanto a realizada por Morceiro (2018).

Ao contrário do CIICC, que trata de todos os setores comercializáveis, optou-se por considerar apenas os setores da indústria de transformação, como compradores e vendedores dos insumos e componentes. Isso se justifica por dois motivos: a) a importação de insumos e componentes chineses tem uma participação majoritária de produtos da indústria de transformação, com baixa participação dos setores primários; e b) a escolha por esse recorte permite analisar mais diretamente os efeitos da ascensão sobre a indústria de transformação, que é o objeto deste trabalho. Assim, ao invés de considerar um coeficiente de importação de insumos e componentes comercializáveis (CIICC), utiliza-se coeficiente de desadensamento da indústria de transformação (CDIT), expresso por:

C D I T s ( % ) = ( I I C I T s T I C I T s ) 100 II)

O cálculo desse indicador foi realizado através das matrizes insumo-produto mundiais disponibilizadas pela WIOD. Nesse novo indicador adaptado, portanto, IICIT se refere ao total de insumos e componentes importados pela indústria de transformação brasileira. Esse termo refere-se à soma de todos os valores adicionados estrangeiros disponíveis nas matrizes para determinado ano. TICIT, por sua vez, diz respeito ao total de insumos e componentes utilizados na produção da indústria de transformação do Brasil, de acordo com a categoria industrial em análise - incluindo, portanto, o valor adicionado doméstico. Portanto, a única diferença em relação ao CIICC de Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) diz respeito à base de dados dos setores contemplados. No caso deste trabalho, foram selecionados os 17 setores da indústria de transformação compilados nas matrizes da WIOD.

Essa primeira adaptação (o CDIT) serve como um passo metodológico para a construção da segunda adaptação, considerada o principal avanço proposto neste artigo: o coeficiente de participação relativa no desadensamento (CPRD), que permite mensurar a participação relativa de países terceiros (China e Estados Unidos). Esse indicador é expresso por:

C P R D i ( % ) = C D I T i C D I T j . 100 III)

Portanto, há o cálculo da participação de um país i (China e Estados Unidos) no processo de esgarçamento industrial de um país j, nesse caso, o Brasil. Assim como na seção anterior, será utilizada a classificação da OECD (1987) baseada em Pavitt (1984PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, n. 13, p. 343-373, 1984.).

3.2 Resultados obtidos

A Tabela 1 e a Figura 5 mostram a evolução do CDIT para a indústria de transformação brasileira entre 2000 e 2014. Em concordância com o apontado por Cano (2014CANO, W. (Des)industrialização e (sub)desenvolvimento. Cadernos do Desenvolvimento, v. 9, n. 15, p. 139-174, dez. 2014.), Diegues (2021DIEGUES, A. C.; ROSELINO, J. E. Política industrial, tecno-nacionalismo e indústria 4.0: a guerra tecnológica entre China e EUA. Campinas: IE-Unicamp, 2021. (Texto para discussão, n. 401).) e Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.), observa-se uma agudização do processo de desindustrialização. Levando em conta a classificação da OECD (1987), baseada em Pavitt (1984PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, n. 13, p. 343-373, 1984.), chama a atenção o caráter transversal desse aumento do CDIT, ainda que, como demonstrado por Morceiro (2018), os setores mais intensivos em tecnologia (como os setores diferenciados e os intensivos em ciência) apresentem patamares superiores de desadensamento.

Na análise da Tabela 1, chama a atenção a relativa estabilidade dos indicadores de CDIT para o período entre 2000 e 2010. Embora em alguns setores, como nos intensivos em trabalho e intensivos em ciência, a tendência tenha sido de aumento, no geral houve estabilidade no desadensamento. No período pós-2010, há uma tendência generalizada de aumento do CDIT, de tal forma que, para a indústria de transformação e para todas as classes industriais analisadas, em 2014, o indicador apresenta seu maior valor no período em análise.

Tabela 1
Evolução do CDIT para o Brasil - 2000 a 2014

Esses resultados corroboram o argumento apresentado por Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.). O autor salienta que a partir de 2009 observa-se uma “onda de desindustrialização intensa”,12 12 Morceiro (2018) destaca que outra “onda de desindustrialização intensa” foi observada no período entre 1981 e 1999. com redução generalizada da participação da indústria tanto no PIB quanto no emprego. Entre 2000 e 2008, observou-se a criação de empregos manufatureiros e a estabilidade na participação da manufatura, a preços constantes no PIB. No entanto, a própria tendência descendente posterior atesta as fragilidades existentes nesse período de estabilidade. A reversão suscitada por condicionantes externos - crise financeira internacional, aumento da concorrência interestatal e aumento da capacidade ociosa manufatureira chinesa - e internos - uma crise econômica concorrente a uma crise política intensa a partir de 2014 - colocaram novamente a indústria numa trajetória de declínio.

Os resultados também apoiam os pontos levantados por Diegues (2021DIEGUES, A. C.; ROSELINO, J. E. Política industrial, tecno-nacionalismo e indústria 4.0: a guerra tecnológica entre China e EUA. Campinas: IE-Unicamp, 2021. (Texto para discussão, n. 401).) acerca dos limites da contribuição da indústria de transformação para o desenvolvimento econômico ao longo dos governos petistas (Lula e Dilma). O autor aponta uma incapacidade estrutural da manufatura brasileira de sustentar uma estratégia de desenvolvimento virtuosa: mesmo em um período de expressivo crescimento, como no governo Lula (2003-2010), não se observou uma mudança estrutural em direção a setores com maior produtividade e intensidade tecnológica. O maior dinamismo da economia nesse período manteve-se atrelado, tanto em termos do crescimento da remuneração média, quanto em relação às exportações (conforme salientado na seção 1), aos setores IRN e intensivos em trabalho. A partir do governo Dilma (2011-2015), aponta Diegues (2021) as fragilidades se tornaram ainda maiores, com sinais claros de esgotamento do modelo de crescimento e aprofundamento do vazamento da demanda industrial tanto de bens finais quanto, sobretudo, de bens intermediários. Ademais, em aderência ao apontado na seção anterior, os resultados mostram uma heterogeneidade setorial relevante: os setores mais intensivos em tecnologia (diferenciados e intensivos em ciência) apresentaram um desadensamento mais expressivo do que os outros setores.

A Figura 5 mostra a evolução do CPRD chinês e estadunidense entre 2000 e 2014 e do CDIT da indústria de transformação brasileira. Fica claro que esse cenário de incapacidade da manufatura de contribuir para o crescimento sustentável da economia brasileira ocorre simultaneamente à ascensão da China como origem dos insumos e componentes utilizados pela indústria de transformação. Embora menos acentuada do que em relação aos dados tradicionais do comércio apontados anteriormente, a evolução da participação chinesa no desadensamento industrial brasileiro foi impressionante: entre 2000 e 2014, o CPRD chinês passou de 1,69 para 14,7. É importante salientar que esse avanço chinês ocorreu em detrimento da participação dos Estados Unidos, cujo CPRD caiu, no mesmo período, de 23,19 para 17,49. Embora em 2014 os Estados Unidos ainda tenham aparecido com um CPRD superior ao chinês, é inegável a trajetória de convergência das duas linhas no gráfico.

Figura 5
Evolução do CDIT e do CPRD da China e dos Estados Unidos - 2000 a 2014

A análise setorial do CPRD apresenta particularidades importantes, tanto do avanço chinês, quanto da trajetória estadunidense. Em primeiro lugar, é importante apontar que em três das cinco categorias os Estados Unidos apresentaram, em 2014, um CPRD superior ao chinês: setores IRN, setores intensivos em escala e setores intensivos em ciência.

Quanto aos setores IRN (Figura 6), observa-se um incremento da participação estadunidense, em especial, no período posterior a 2009: o CPRD estadunidense nesses setores aumentou, entre 2009 e 2014, de 14,35 para 23,41. O aumento dessa participação ocorreu de forma concorrente ao aumento do CDIT desses setores. É interessante salientar que esse aumento ocorre no momento de consolidação dos Estados Unidos como produtor mundial de petróleo no bojo da “Revolução Americana do Xisto” (Stevens, 2012STEVENS, P. The ‘Shale gas revolution’: Developments and changes. Energy, Environment and Resources, Aug. 2012.). Essa mudança da trajetória estadunidense fica mais clara na análise desagregada. No setor de Fabricação de coque e de derivados de petróleo, o CPRD estadunidense, que apresentou leve aumento entre 2000 e 2008 (variando de 14,1 para 16), atingiu a marca de 29,8 em 2014.

A China, por sua vez, apresentou uma trajetória distinta. Entre 2000 e 2008, o país aumentou seu CPRD de 1,6 para 6,3. No período pós-crise, no entanto, diferentemente do caso estadunidense, a trajetória foi de relativa estabilidade (em 2014, o CPRD chinês foi de 6,4). Na análise desagregada do setor de Fabricação de Coque e Derivados, a tendência é semelhante: aumento do CPRD entre 2000 e 2008 (de 1,8 para 5,6) e tendência de perda de participação no período posterior. Em 2014, o indicador foi de 3,5.

Em relação aos setores intensivos em escala, o cenário foi outro. Como apontado na Figura 7, de forma similar à indústria de transformação como um todo, há uma tendência de convergência entre o CPRD estadunidense e o chinês. Embora, em 2014, os Estados Unidos ainda tenham apresentado participação superior, o avanço chinês ocorreu de forma acelerada.13 13 Esse ímpeto do avanço chinês fica claro quando se constata que, em 2014, o CPRD foi superior ao da Alemanha (tradicional fornecedor dos setores intensivos em escala, em especial do setor automobilístico).

A análise desagregada mostra que, para o ano de 2014, dos sete setores que compõem os setores intensivos em escala, em apenas três os Estados Unidos lideraram (Fabricação de Produtos de Papel, Fabricação de Produtos Químicos e Fabricação de Borracha e Material Plástico). Nos outros quatro setores (Impressão e Reprodução de Gravações; Metalurgia; Fabricação de Metal, Exceto Máquinas e Equipamentos; e Fabricação de Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias) a China aparece como principal origem dos insumos e componentes importados. Em virtude da importância para a estrutura produtiva brasileira, a manutenção da liderança estadunidense deveu-se, sobretudo, ao setor de Fabricação de Produtos Químicos.

Chama a atenção o desempenho chinês no setor de Fabricação de Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias. Partindo de um patamar bastante modesto em 2000 (0,7), tomou a dianteira como principal origem de insumos e componentes desse setor, superando os Estados Unidos e a Alemanha que, historicamente foram dominantes. Em 2014, o CPRD do país asiático foi de 10,8, ante 7,1 dos Estados Unidos e 9,8 da Alemanha.14 14 Em 2000, os CPRDs de Alemanha e Estados Unidos foram, respectivamente, de 14.4 e 11,1 .

Ademais, a Figura 7 aponta que, em especial no período pós-crise financeira de 2008, observa-se um cenário de agudização do CDIT do setor (aumenta de 16,4 em 2009 para 23,7 em 2014) simultaneamente ao aumento da participação chinesa e ao processo de convergência do seu CPRD com o estadunidense. Ou seja, os resultados apontam que o processo de aumento de desadensamento setorial no pós-crise, dada a redução da participação de parceiros tradicionais (como Alemanha e Estados Unidos), tem relação com a ascensão chinesa.

Nos setores intensivos em ciência, por sua vez, observa-se um papel de destaque do CPRD estadunidense - o indicador foi de 42,85 em 2014. Em grande medida esse avanço parece estar atrelado à dinâmica do setor aeronáutico brasileiro, especificamente do aumento da produção da Embraer. Embora, em 2014, a participação chinesa ainda tenha ficado muito aquém da estadunidense, é importante destacar que o avanço não foi irrelevante, na medida em que o CDPR chinês passou, entre 2000 e 2014, de 1,19 para 8,43 (superando, por exemplo, a participação alemã).

Figura 6
Setores intensivos em recursos naturais - CDIT e CPRD de China e Estados Unidos

Figura 7
Setores intensivos em escala - CDIT e CPRD de China e Estados Unidos

Figura 8
Setores intensivos em ciência - CDIT e CPRD de China e Estados Unidos

Nos outros dois agrupamentos industriais analisados, a China tomou a liderança. Nos setores intensivos em trabalho nota-se uma tendência ascendente do desadensamento nos últimos anos estudados: entre 2008 e 2014, o CDIT passou de 20,3 para 25,9. O avanço chinês, percebido pelo aumento do CPRD, deu-se de forma acelerada em todo o período: entre 2000 e 2014 passou de 1,7 para 26,7. No entanto, os resultados mostram que o aumento do esgarçamento no período recente ocorreu em um cenário de aumento da participação chinesa e da estabilidade da participação dos Estados Unidos (Figura 9). Destaca-se o desempenho no setor de Fabricação de Produtos Têxteis: entre 2000 e 2014, o CPRD chinês saltou de 1,9 para 37,4.

No caso dos setores diferenciados (Figura 10), após um movimento de redução do desadendamento entre 2000 e 2007 (CDIT cai de 29,4 para 18,9), observa-se, em consonância com os outros setores, um recrudescimento do esgarçamento no pós-crise. Em 2014, o CDPR chinês aumentou 2,11 para 24,50, ante um decréscimo do indicador estadunidense de 32,4 para 10,2.

A análise desagregada mostra que a China liderou em 2014 em todos os setores desse grupo. No setor Fabricação de Equipamentos de Informática, Produtos Eletrônicos e Ópticos, nos quais predominou um elevado nível de desadensamento (o CDIT setorial passou de 49,9 para 57,7), o CPRD chinês passou, entre 2000 e 2014, de 2,3 para 27,4, enquanto o estadunidense caiu de forma expressiva de 37,7 para 6,9.15 15 É interessante destacar que, em especial no pós-crise, a ascensão chinesa nesses setores é acompanhada pelo aumento do CPRD sul-coreano, que atinge 26,4 em 2014. Algo semelhante foi observado no setor de Fabricação de Máquinas, Aparelhos e Equipamentos Elétricos, cujo CDIT aumentou de 16,5 para 23,5 e o CPRD chinês subiu de 2,4 para 23,3, enquanto a participação dos Estados Unidos caiu de 17,4 para 9,9. Portanto, repete-se nos setores diferenciados o mesmo padrão apontado anteriormente, com destaque para o período pós-crise: aumento da participação chinesa, redução da participação estadunidense e aumento do desadensamento.

Figura 9
Setores intensivos em trabalho - CDIT e CPRD de China e Estados Unidos

Figura 10
Setores com tecnologias diferenciadas - CDIT e CPRD de China e Estados Unidos

Chama a atenção que esses dois grupos de setores foram bastante afetados pelo deslocamento produtivo em direção à Ásia, especialmente para a China (Medeiros, 2019MEDEIROS, C. A. D. Política industrial e divisão internacional de trabalho. Brazilian Journal of Political Economy, v. 39, n. 1, p. 71-87, mar. 2019.). Assim, para além de apenas receptora de fluxos de investimento estrangeiro mirando a exploração de recursos baratos existentes no país, a China foi exitosa em realizar o upgrading tecnológico. A crescente fração de valor adicionado chinês, importado pelo Brasil, gerado nesses setores pode ser um indicativo disso. Portanto, a explicação para o aumento do CDIT nos setores mais intensivos em tecnologia, em especial no período posterior à crise de 2008, parece guardar na ascensão chinesa um fator determinante.

Os resultados também corroboram o êxito da China em subir na hierarquia das CGV, destacado por Morais (2012). A autora mostra que o aumento da sofisticação da pauta exportadora do país foi acompanhado por uma maior capacidade de agregação de valor adicionado. Dessa forma, ao contrário da interpretação de parte dos economistas (Lemoine; Unai-Kesenci, 2004) de que a inserção chinesa em setores exportadores com alta intensidade tecnológica não teria como contrapartida um fortalecimento da relação entre as firmas exportadoras e aprofundamento dos encadeamentos da indústria doméstica, Morais (2012) argumenta que, mesmo nos setores onde predominam as exportações processadas, a tônica foi de aumento da participação do valor adicionado doméstico.

Os resultados corroboram com a interpretação de Tregenna e Andreoni (2020TREGENNA, F.; ANDREONI, A. Deindustrialisation reconsidered: Structural shifts and sectoral heterogeneity. Working Paper UCL, 2020.) e Morceiro (2020) sobre a importância de analisar os efeitos da ascensão chinesa sobre a estrutura produtiva brasileira a partir de um recorte setorial. A despeito do avanço chinês no agregado da indústria de transformação ter sido significativo, o CPRD chinês mostrou uma heterogeneidade setorial relevante. Ainda que um tipo de avanço transversal tenha sido percebido (o CPRD chinês aumentou em todos os setores analisados), essa trajetória foi mais intensa em setores específicos, como nos setores intensivos em trabalho e nos setores diferenciados.

A respeito do caráter transversal da evolução do CDPR chinês, chama a atenção a diferença do caso chinês em relação a outros casos destacados na literatura (como no modelo dos “gansos voadores”). Diferentemente de países como Japão e Coreia do Sul que, a partir do momento em que avançaram na direção da sofisticação das exportações, deixaram de se especializar em atividades menos intensivas em tecnologia, a China mostra um modelo que contempla simultaneamente uma competitividade internacional inconteste nos setores intensivos em trabalho (como na indústria têxtil) e, como apontado anteriormente, nos setores mais nobres das CGV. A preocupação com a absorção da mão de obra, com a geração de renda e com o abastecimento de um mercado interno pujante parece justificar esse tipo de estratégia (Diegues; Roselino, 2020; Pearson, 2019).

Esse cenário aventa preocupações relevantes para a estrutura produtiva brasileira. Como esclarece Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.) são esses setores que apresentam menor desadensamento e são responsáveis por uma maior parcela do emprego manufatureiro do país. O cenário exposto mostra que mesmo nesses setores a ascensão chinesa vem apresentando ameaça concreta no período recente.

Os resultados sugerem uma mudança qualitativa tanto da especialização regressiva quanto da natureza da desindustrialização e do avanço chinês no pós-crise. Esse recorte é corroborado pelo trabalho de Passoni (2019PASSONI, P. A. Deindustrialization and Regressive Specialization in the Brazilian Economy between 2000 and 2014: A critical assessment based on the input-output analysis. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2019.) e Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.). Apesar de Passoni (2019) colocar ponderações sobre a intensidade dos processos de desindustrialização e de especialização regressiva,16 16 Passoni (2019) argumenta que comumente as análises acerca desses processos tendem a ser superestimadas. Em especial, isso estaria atrelado ao robusto efeito-preço em prol das commodities e dos manufaturados IRN, a partir dos anos 2000. Quando a análise é calcada, como fez a autora, numa metodologia que desconsidera tal efeito, os processos foram menos agudos e menos contínuos do que usualmente é defendido. a autora verifica uma agudização dessas trajetórias no período posterior à crise de 2008. Da mesma forma, a respeito da desindustrialização, Morceiro (2018) observa que a partir de 2009 é iniciada uma nova onda de “desindustrialização intensa” no país.

4 Considerações

Este trabalhou analisou como a China, a partir dos anos 2000, passa a ser um fator explicativo para o agravamento de dois processos que são observados desde os anos de 1980: a especialização regressiva e a desindustrialização. A respeito do primeiro fenômeno, amplamente analisado na literatura, foi salientado o caráter interindustrial da relação comercial entre os dois países. Os resultados apontaram que, de um lado, a China se consolidou como principal destino das exportações brasileiras, contribuindo para uma pauta de exportações crescentemente concentrada em commodities ou manufaturados intensivos em recursos naturais. Em 2018, a soma desses dois tipos de produtos foi responsável por 96% das exportações destinadas ao país asiático. Apenas três produtos - soja, petróleo e minério de ferro - significaram 77,2%.

De outro lado, o país asiático tornou-se a principal origem das importações brasileiras. Nesse avanço chinês sobre a demanda brasileira, chamam a atenção: a) como a participação da China superou rapidamente a de parceiros comerciais tradicionais - como Estados Unidos, União Europeia e Mercosul; e b) o aumento transversal da participação chinesa nos setores manufaturados brasileiros, com destaque para os setores mais intensivos em tecnologia. Como apontado, além dos preocupantes sinais de aumento da participação chinesa no aumento do vazamento da demanda por bens industriais (finais e intermediários), o cenário, especialmente no pós-crise de 2008, é de aumento da participação da China em mercados que representavam um escoadouro importante para as exportações manufatureiras brasileiras, como os países do Mercosul.

A respeito da influência chinesa no agravamento do desadensamento do tecido industrial brasileiro, os indicadores de propostos (coeficiente de desadensamento da indústria de transformação e coeficiente de participação relativa no desadensamento) mostraram que: a) há aumento do desadensamento da indústria de transformação brasileira (CDIT) agregada e nos setores analisados, com tendência de recrudescimento desse movimento no período posterior à crise de 2008; b) assim como observado na análise dos indicadores do comércio exterior, nota-se, a partir do CPRD, aumento da participação chinesa no desadensamento do tecido industrial doméstico, simultanemanete à perda de participação de fornecedores tradicionais (em especial, os Estados Unidos). O incremento do CPRD chinês também ganhou fôlego no período posterior à crise de 2008; e c) a despeito de a China ter ampliado seu indicador CPRD em todos os setores, os resultados demonstraram, em consonância com Morceiro (2018MORCEIRO, P. C. A indústria brasileira no limiar do século XXI: uma análise da sua evolução estrutural, comercial e tecnológica. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.), Tregenna e Andreoni (2020TREGENNA, F.; ANDREONI, A. Deindustrialisation reconsidered: Structural shifts and sectoral heterogeneity. Working Paper UCL, 2020.) e Dosi et al. (2020DOSI, G; RICCIO, F.; VIRGILLITO, M. E. Varieties of deindustrialization and patterns of diversification: why microchips are not potato chips. LEM Working Paper, 2020.), uma heterogeneidade: o processo foi mais intenso nos setores intensivos em trabalho e nos setores diferenciados.

Os resultados aventam uma série de preocupações sobre a estrutura produtiva brasileira e os impactos para o desenvolvimento econômico do país. Em primeiro lugar, o desadensamento e a participação chinesa no desadensamento vêm ocorrendo mesmo em setores nos quais o Brasil apresentou, historicamente, um adensamento expressivo e nos quais o contingente de emprego manufatureiro é importante, como nos setores intensivos em trabalho. Em segundo lugar, os setores onde o desadensamento tem se mostrado mais intenso são aqueles que apresentam maiores encadeamentos intersetoriais e melhores possibilidades de promoção do desenvolvimento tecnológico. Esse cenário torna-se mais alarmante na medida em que, ao contrário de países como a própria China, a integração brasileira às CGV parece estar demasiadamente atrelada às importações: o crescente aumento do vazamento da demanda nos setores mais intensivos em tecnologia não foi acompanhado de uma expansão das suas exportações. Portanto, o padrão de especialização tem ampliado o seu caráter regressivo e desindustrializado.

Referências

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  • Códigos JEL:

    O14, F19.
  • JEL Codes:

    O14, F19.
  • 1
    Tregenna e Andreoni (2020) questionam tal hipótese a partir de uma ampla análise dos processos de mudanças estruturais nos países desenvolvidos. A partir de evidências empíricas mostram que os setores de alta intensidade tecnológica aumentam continuamente sua participação no PIB em países de alta renda.
  • 2
    Em abordagem semelhante, Cano (2012) sugere que “a guinada de IDE predominantemente americano e asiático para a China em busca de trabalho barato, câmbio desvalorizado e alta competitividade (trouxe) nocivos efeitos internos (à economia brasileira) (...) (uma vez que) afetaram profundamente os investimentos produtivos do setor, tornando-os de caráter mais específico, oportunistas e atomizados” (Cano, p. 835-836).
  • 3
    Nesse sentido, Morceiro (2018) e Sarti e Hiratuka (2018) apontam que o aumento das importações, em especial de bens intermediários, tornou-se uma tônica a partir da constituição das CGV. Ademais, muitos países em desenvolvimento (em especial do leste asiático) e alguns desenvolvidos (como a Alemanha) lograram êxito em, a despeito de aumentar o coeficiente importado, se beneficiar da maior integração para sofisticar a sua pauta exportadora.
  • 4
    A respeito do deslocamento produtivo em direção à China, ver Medeiros (2006).
  • 5
    Conforme Morceiro (2018), entre 1981 e 2017 a relação VAM/PIB decaiu de 20,7% para 11,8%.
  • 6
    Sobre a relação entre urbanização, infraestrutura e investimento na China, ver Hiratuka (2018).
  • 7
    A classificação adotada neste trabalho, compatível com a CNAE 2.0 e com a classificação do World Input-Output Database (WIOD), é a seguinte: a) commodities; b) setores intensivos em recursos naturais (IRN): Fabricação de produtos alimentícios, Fabricação de bebidas, Fabricação de produtos de fumo, Fabricação de produtos de madeira, Fabricação de coque, de produtos derivados de petróleo e de biocombustíveis e Fabricação de minerais não metálicos; c) setores intensivos em trabalho: Fabricação de produtos têxteis, confecção de artigos do vestuário e acessórios, Preparação de couros e fabricação de artefatos de couros, artigos para viagem e calçados, Fabricação de móveis, Fabricação de produtos diversos, Manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos; d) setores intensivos em escala: Fabricação de papel e produtos de papel, Impressão e reprodução de gravações, Fabricação de produtos químicos, Fabricação de produtos de borracha e de material de plástico, Metalurgia, Fabricação de produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos, Fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias; d) setores diferenciados: Fabricação de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos, Fabricação de máquinas, aparelhos e equipamentos; e e) setores intensivos em ciência: Fabricação de produtos farmoquímicos e farmacêuticos e Fabricação de outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores.
  • 8
    Os dados referentes às estatísticas tradicionais do comércio exterior foram extraídos da UnctadStat.
  • 9
    Como explicam Nassif e Castilho (2020, p. 690): “The maximum level of export concentration measured by the HHI was reached in 2011. This latter result reflects the emergence of China as one of the most important Brazilian trading partners after the 2008 global crisis. In fact, a result of the so-called China effect on Brazil’s trade flows is that Brazilian exports grew sharply and became extremely concentrated in mineral ores, soya beans and oil.”
  • 10
    Nassif e Castilho (2020) apontam como o índice HHI, para as importações, apresenta estabilidade a partir de meados dos anos de 1990, em contraste com o quadro de aumento do indicador para as exportações.
  • 11
    O WIOD fornece dados para 43 países, bem como um modelo residual que compreende o “Resto do Mundo”, e para 56 setores classificados segundo o International Standart Classification Revision 4 (ISIC Rev. 4). Com base na definição setorial apontada em relação à construção do CDIT, dos 56 setores.
  • 12
    Morceiro (2018) destaca que outra “onda de desindustrialização intensa” foi observada no período entre 1981 e 1999.
  • 13
    Esse ímpeto do avanço chinês fica claro quando se constata que, em 2014, o CPRD foi superior ao da Alemanha (tradicional fornecedor dos setores intensivos em escala, em especial do setor automobilístico).
  • 14
    Em 2000, os CPRDs de Alemanha e Estados Unidos foram, respectivamente, de 14.4 e 11,1
  • 15
    É interessante destacar que, em especial no pós-crise, a ascensão chinesa nesses setores é acompanhada pelo aumento do CPRD sul-coreano, que atinge 26,4 em 2014.
  • 16
    Passoni (2019) argumenta que comumente as análises acerca desses processos tendem a ser superestimadas. Em especial, isso estaria atrelado ao robusto efeito-preço em prol das commodities e dos manufaturados IRN, a partir dos anos 2000. Quando a análise é calcada, como fez a autora, numa metodologia que desconsidera tal efeito, os processos foram menos agudos e menos contínuos do que usualmente é defendido.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    28 Maio 2021
  • Aceito
    01 Dez 2021
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