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Serviço-Escola de Psicologia da Unifesp: Campos de Estágio, Ações e Especificidades

UNIFESP’s Psychology Service-School: Internship Field, Actions, and Specificities

Serviço-Escola de Psicologia de la Unifesp: Campos de Prácticas Profesionales, Acciones y Especificidades

Resumo

O Serviço-Escola de Psicologia (SEP) da Unifesp foi constituído com o intuito de transcender o tradicional funcionamento das clínicas-escola, superando a atomização da Psicologia em áreas e oferecendo serviços integrados à rede. Isso possibilita uma formação interdisciplinar, pluralista, generalista, não tecnicista, crítica, permitindo a compreensão e atuação do psicólogo em diversos contextos socioculturais. O objetivo do artigo é descrever, avaliar e problematizar as ações do SEP da Unifesp, em relação à oferta de campos de estágio e ações desenvolvidas neles. É um estudo transversal, baseado em metodologia predominantemente quantitativa e descritiva. O levantamento de dados foi realizado por meio de dois questionários online respondidos por todos os supervisores. Os dados quantitativos foram submetidos à análise estatística descritiva. Os resultados evidenciaram maior incidência das ações no município de Santos e, em menor grau, em outros municípios da Baixada Santista e na cidade de São Paulo. A maioria das atividades de estágios não se limita ao espaço físico de atendimento clínico do Serviço-Escola, ocorrendo junto às instituições públicas ou às instituições ligadas ao terceiro setor na região, relacionadas, direta ou indiretamente, com a promoção de políticas públicas. A pluralidade de recursos utilizados (grupos, atendimento individual, acompanhamento terapêutico, oficinas, matriciamento, entre outros) revela uma ampliação do repertório de competências e habilidades. A variedade de oferta de projetos e campos de estágio, públicos-alvo atendidos, assim como a diversidade e flexibilidade de ações e estratégias desenvolvidas, apontam um movimento de congruência em relação às diretrizes curriculares nacionais e ao inovador Projeto Pedagógico do curso.

Palavras-chave:
Serviço-Escola de Psicologia; Estágio; Políticas Públicas; Formação Interdisciplinar e Crítica

Abstract

UNIFESP’s Psychology Service-School (SEP) was founded with the objective of going beyond the traditional functioning of school-clinics, overcoming the atomization of Psychology in areas and offering services integrated to the network. This enables an interdisciplinary, pluralist, generalist, non-technicist, and critical training, allowing psychologists’ understanding and action in different sociocultural contexts. This article aims to describe, evaluate, and discuss the actions of UNIFESP’s SEP regarding the offer of internship fields and the actions developed in those fields. It is a cross-sectional study, based on a predominantly descriptive and quantitative methodology. The data was surveyed with two online questionnaires answered by all supervisors. Quantitative data were submitted to descriptive statistical analysis. The results showed a higher incidence of actions in the municipality of Santos and, to a lesser extent, in other municipalities of the Baixada Santista and in the city of São Paulo. Most internship activities are not limited to the physical space of the service-school’s clinical care and take place alongside public institutions or institutions linked to the third sector in the area, directly or indirectly related to the promotion of public policies. The plurality of resources (groups, personal care, therapeutic monitoring, workshops, matrix support, among others) reveals an expansion of competences and skills repertoire. The variety of projects and internship fields offers, of target audiences served, as well as the diversity and flexibility of the developed actions and strategies point to a congruence movement relating to national curricular guidelines and to the innovative pedagogical project of the course.

Keywords:
Psychology Service-School; Internship; Public Policies; Interdisciplinary and Critical Training

Resumen

El Serviço-Escola de Psicologia (SEP) de la Unifesp (Universidade Federal de São Paulo, Brasil) buscó trascender el funcionamiento tradicional de las clínicas universitarias, superar la atomización de la Psicología en áreas y ofrecer servicios integrados a la red. Esto permite una formación interdisciplinar, pluralista, generalista, sin tecnicismos, crítica, lo que posibilita a los/las psicólogos/as comprender y actuar en diferentes contextos socioculturales. Este artículo pretendió describir, evaluar y problematizar las acciones del SEP Unifesp respecto a la oferta de campos de prácticas profesionales y acciones desarrolladas. Es un estudio transversal, con metodología predominantemente cuantitativa y descriptiva. Los datos se recolectaron de dos cuestionarios en línea respondidos por los/las supervisores/as. Se les aplicaron un análisis estadístico descriptivo. Hubo más acciones en la ciudad de Santos (Brasil) que en otros municipios de la región metropolitana de la Baixada Santista y en la ciudad de São Paulo. La mayoría de las prácticas profesionales no se limita a la atención clínica del SEP, ocurriendo en instituciones públicas o vinculadas al tercer sector en la región, directa o indirectamente, relacionadas con la promoción de políticas públicas. La pluralidad de recursos (grupos, atención individual, acompañamiento terapéutico, talleres, soporte matricial, entre otros) revela un amplio repertorio de competencias y habilidades. La variada oferta de proyectos y campos para prácticas profesionales, los públicos destinatarios atendidos, así como la diversidad y flexibilidad de acciones y estrategias desarrolladas apuntan a una congruencia respecto a los lineamientos curriculares nacionales y al innovador proyecto pedagógico del curso.

Palabras clave:
Serviço-Escola de Psicologia; Prácticas Profesionales; Políticas Públicas; Formación Interdisciplinar y Crítica

O Serviço-Escola do curso de Psicologia (SEP) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) é o foco deste artigo. Trata-se de um curso de Psicologia e de um Serviço-Escola que foram implantados recentemente (em 2006 e em 2010, respectivamente), já sendo idealizados e constituídos a partir da apropriação crítica das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) (Resolução nº 8, de 7 de maio de 2004, 2004Resolução nº 8, de 7 de maio de 2004. (2004, 7 de maio). Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia. Ministério da Educação. http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0804.pdf
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) e em consonância com o inovador Projeto Político-Pedagógico do campus Baixada Santista e alterações posteriores (Universidade Federal de São Paulo, 2015Universidade Federal de São Paulo. (2015). Projeto político-pedagógico do campus Baixada Santista. Unifesp.), resultando em características singulares sobre as quais entendemos ser importante direcionar um olhar mais atento.

A proposta deste artigo é trazer à tona e refletir a respeito de aspectos diferenciais do Serviço-Escola, procurando avaliar o quanto a proposta que pensamos inovadora é de fato efetiva, refletindo em ações que se destacam do que vem sendo produzido em outros Serviços-Escola. Em que medida essa proposta converge com as intenções esboçadas no Projeto Pedagógico do curso (Universidade Federal de São Paulo, 2016Universidade Federal de São Paulo. (2016). Projeto pedagógico do curso de graduação em Psicologia. https://www.unifesp.br/campus/san7/images/pdfs/ceg/Atualizacao%20plano%20pedagogico-_psicologia.pdf
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) e nas referidas DCN, como, por exemplo, contribuir para a formação de psicólogas(os) que seja generalista, crítica, reflexiva, ética e transformadora em relação ao contexto de atuação profissional?

Serviços-Escola de Psicologia, contextualização

No Brasil, as Clínicas-Escola de Psicologia foram inicialmente planejadas para serem lugares de aplicação prática e consolidação dos conhecimentos teóricos assimilados pelos estudantes. No entanto, gradativamente, ocorreram mudanças no contexto profissional da(o) psicóloga(o), aumentando os olhares críticos sobre as próprias práticas e a valorização da constituição histórica e social dos fenômenos, assim como o compromisso com a transformação social e atuação interprofissional (Antunes, 2007Antunes, M. A. M. (2007). A Psicologia no Brasil: Leitura histórica de sua constituição (5a ed.). EDUC.; Bock, 2008Bock, A. M. B. (2008). O compromisso social da Psicologia: Contribuições da perspectiva Sócio-Histórica. Psicologia em Foco, 1(1), 1-5.; Patto, 2003Patto, M. H. S. (2003). O que a história pode dizer sobre a profissão do psicólogo: A relação psicologia-educação. In Psicologia e o Compromisso Social. Cortez.). Tais mudanças impactaram os respectivos contextos de formação de novas(os) psicólogas(os) (Souza, Facci, & Silva, 2018Souza, M. P. R.; Facci, M. G. D., & Silva, S. M. C. (2018). Sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia. Psicologia Escolar e Educacional , 22(1), 13-16. doi.org/10.1590/2175-3539201801001
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).

As DCN, instituídas em 2004, emergem como efeito desse cenário, substituindo o currículo mínimo - de cunho conteudista e tecnicista - e propondo um conjunto de reformulações do processo de formação da(o) psicóloga(o). Com isso, almeja desenvolver novos conhecimentos, atitudes e práticas, que devem ser promovidos por meio de currículos integrados e articulados em torno de temáticas socialmente relevantes, e sustentados por métodos de aprendizagem ativa e independente, a fim de superar uma dicotomia entre teoria e prática e valorizar a articulação com serviços de saúde (Poppe & Batista, 2012Poppe, A. R. S., & Batista, S. H. S. D. S. (2012). Formação em Psicologia no contexto das diretrizes curriculares nacionais: Uma discussão sobre os cenários da prática em saúde. Psicologia: Ciência e Profissão , 32(4), 986-999. doi.org/10.1590/S1414-98932012000400016
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).

Ribeiro e Soligo (2020Ribeiro, M. E., & Soligo, A. F. (2020). Diretrizes curriculares e formação do psicólogo brasileiro: Avanços, retrocessos e desafios. Integración Académica en Psicología, 8(22), 36-49.) realizaram um estudo sobre as mudanças produzidas pelas novas DCN (Resolução nº 8, de 7 de maio de 2004, 2004Resolução nº 8, de 7 de maio de 2004. (2004, 7 de maio). Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia. Ministério da Educação. http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0804.pdf
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; Resolução nº 5, de 15 de março de 2011, 2011Resolução nº 5, de 15 de março de 2011. (2001, 15 de março). Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia, estabelecendo normas para o projeto pedagógico complementar para a Formação de Professores de Psicologia. Ministério da Educação. http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=7692-rces005-11-pdf&category_slug=marco-2011-pdf&Itemid=30192
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) na formação em Psicologia no Brasil nos últimos 15 anos. As autoras identificaram aspectos positivos, como a diversificação de referenciais teóricos e das áreas de atuação. Contudo, também apontaram influências negativas, relacionadas à expansão de instituições privadas de ensino superior que, com viés capitalista, teriam contribuído para uma retomada do caráter tecnicista e instrumental da formação, reeditando um modelo já criticado em função de seus efeitos socioculturais, os mesmos que dificultam o desenvolvimento de uma formação mais crítica e conectada com as demandas sociais. O desnível entre as competências desenvolvidas na graduação e as propostas das DCN foi constatado por Silva, Chagas, Morais e Santos (2020Silva, L. T. C., Chagas, L. V. S., Morais, E. P. G., & Santos, L. V. A. (2020). Aprendizagem das competências gerais na graduação em Psicologia. PSI UNISC, 4(1), 135-153. doi.org/10.17058/psiunisc.v4i1.14233
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), que desenvolveram outro estudo com discentes e docentes do curso de Psicologia de uma instituição privada de Alagoas.

As DCN de 2004 também recomendaram a substituição das Clínicas-Escola por Serviços-Escola, evidenciando a proposta de ampliação das formas de atuação dos estagiários em diversos contextos. No entanto, há poucas pesquisas que estudam o impacto da nova orientação e suas ratificações nas Diretrizes posteriores (Resolução nº 5, de 15 de março de 2011, 2011Resolução nº 5, de 15 de março de 2011. (2001, 15 de março). Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia, estabelecendo normas para o projeto pedagógico complementar para a Formação de Professores de Psicologia. Ministério da Educação. http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=7692-rces005-11-pdf&category_slug=marco-2011-pdf&Itemid=30192
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; Resolução nº 597, de 13 de setembro de 2018, 2018Resolução nº 597, de 13 de setembro de 2018. (2018, 13 de setembro). Parecer Técnico nº 346/2018, que dispõe sobre as recomendações do Conselho Nacional de Saúde à proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Psicologia. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=30/11/2018&jornal=515&pagina=199
https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/...
). Os serviços estudados por Gomes e Dimenstein (2016Gomes, M. A. F., & Dimenstein, M. (2016). Serviço escola de psicologia e as políticas de saúde e de assistência social. Temas em Psicologia, 24(4), 1217-1231. doi.org/10.9788/TP2016.4-03Pt
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) apontam para uma coexistência do modelo de Clínica-Escola e os novos modelos propostos para Serviços-Escola.

Alguns autores (Antunes, 2012Antunes, M. A. M. (2012). A Psicologia no Brasil: Um ensaio sobre suas contradições. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(SPE), 44-65. doi.org/10.1590/S1414-98932012000500005
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; Ribeiro & Soligo, 2020Ribeiro, M. E., & Soligo, A. F. (2020). Diretrizes curriculares e formação do psicólogo brasileiro: Avanços, retrocessos e desafios. Integración Académica en Psicología, 8(22), 36-49.) constataram um movimento de adequação em relação às propostas de alteração preconizadas pelas DCN, além da insuficiência de pesquisas em relação às consequências para a formação e exercício profissional.

Embora tenhamos encontrado pouca literatura e poucos estudos recentes sobre o tema, os casos relatados apontam que alguns Serviços-Escola funcionam como Clínicas-Escola, oferecendo, principalmente, estágios nas áreas avaliativas e clínicas (Amaral et al., 2012Amaral, A. E. V., Luca, L., Rodrigues, C. T., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de Psicologia em clínicas-escola: Revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52.; Freitas & Noronha, 2005Freitas, F. A., & Noronha, A. P. P. (2005). Clínica-escola: Levantamento de instrumentos utilizados no processo psicodiagnóstico. Psicologia Escolar e Educacional, 9(1), 87-93. doi.org/10.1590/S1413-85572005000100008
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; Galindo, Sousa, & Tamman, 2019Galindo, W. C. M., Sousa, T. B. D. S., & Tamman, B. F. (2019). Modalidades de atendimento à população por serviços-escola de Psicologia: Panorama das publicações. Gerais: Revista Interinstitucional de Psicologia, 12(2), 371-388. doi.org/10.36298/gerais2019120212
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; Leal, Facci, Albuquerque, Tuleski, & Barroco, 2005Leal, L. D., Facci, M. G. D., Albuquerque, R. A., Tuleski, S. C., & Barroco, S. M. S. B. (2005). A clínica-escola e o estágio em Psicologia na área educacional: Fundamentos teóricos e prática profissional. Psicologia da Educação, 21, 79-102. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-69752005000200005
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; Santeiro, 2008Santeiro, T. V. (2008). Psicoterapia breve psicodinâmica preventiva: Pesquisa exploratória de resultados e acompanhamento. Psicologia em Estudo, 13(4), 761-770. doi.org/10.1590/S1413-73722008000400014
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; Santos & Silvares, 2006Santos, E. O. L., & Silvares, E. F. M. (2006). Crianças enuréticas e crianças encaminhadas para clínicas-escola: Um estudo comparativo da percepção de seus pais. Psicologia: Reflexão e Crítica, 19, 277-282. doi.org/10.1590/S0102-79722006000200014
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; Teixeira, 2007Teixeira, L. C. (2007). Intervenção psicanalítica em grupo em uma clínica-escola: Considerações teórico-clínicas. Estudos da Clínica, 7(22), 196-207.), com funcionamento autônomo, desarticulado do contexto social mais amplo, por exemplo, com pouco ou nenhum vínculo às redes públicas de atendimento ou de outras possíveis redes de cuidados territorializadas. A oferta de atendimentos psicológicos, portanto, ainda costuma ocorrer no espaço da universidade ou faculdade, nos moldes semelhantes ao do consultório particular e do atendimento individual (Amaral et al., 2012Amaral, A. E. V., Luca, L., Rodrigues, C. T., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de Psicologia em clínicas-escola: Revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52.), contribuindo para uma restrição do campo de experiências durante o período de formação profissional.

O Serviço-Escola do curso de Psicologia da Unifesp/BS

O SEP-Unifesp foi idealizado e constituído no intuito de transcender a função de uma clínica-escola tradicional, buscando superar a atomização da Psicologia em áreas, explorar outras possibilidades de atuação profissional, abranger públicos bem mais diversificados e apostar no compromisso social. Nesse sentido, ele está mais alinhado com o que Maturano, Silvares e Oliveira (2014) propõem. Esses autores defendem que o Serviço-Escola funcione como interface entre a universidade e a comunidade, tornando-se espaço privilegiado para a identificação de necessidades locais e regionais e para a sistematização de informações e produção de conhecimentos que podem ser incorporadas a estratégias de atuação e a demandas previamente identificadas e transmitidas para a comunidade.

A proposta de Serviço-Escola ampliado e integrado à rede também foi privilegiada porque se inseria no contexto de humanização da atenção e gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), em harmonia com o Projeto Político-Pedagógico da Unifesp - campus Baixada Santista - e com o Projeto Pedagógico do curso de Psicologia (Universidade Federal de São Paulo, 2016Universidade Federal de São Paulo. (2016). Projeto pedagógico do curso de graduação em Psicologia. https://www.unifesp.br/campus/san7/images/pdfs/ceg/Atualizacao%20plano%20pedagogico-_psicologia.pdf
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). Esses projetos foram pensados para compor o objetivo de uma formação interdisciplinar e transdisciplinar, pluralista, generalista, não tecnicista, crítica e que permita a compreensão e atuação em diversos contextos socioculturais, baseadas no conhecimento científico (Universidade Federal de São Paulo, 2016Universidade Federal de São Paulo. (2016). Projeto pedagógico do curso de graduação em Psicologia. https://www.unifesp.br/campus/san7/images/pdfs/ceg/Atualizacao%20plano%20pedagogico-_psicologia.pdf
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). Tais orientações pretendem ultrapassar supostas visões fragmentadas ou estáticas dos sujeitos, considerando a importância de recorrer aos vários saberes profissionais para compreender os mesmos, para além de suas possíveis doenças ou categorizações nosológicas, levando em consideração seus respectivos contextos socioterritoriais, históricos, culturais, afetivos, existenciais e políticos. O desafio parecia ser, e ainda parece, o da promoção conjunta de um engajamento das subjetividades em suas múltiplas formas de existência, não apenas para lidar com a dimensão do sofrimento e/ou adoecimento ou queixa, mas também para criar novos sentidos para a vida - apesar das possíveis limitações geradas por supostos comprometimentos de saúde -, em consonância com as políticas públicas de saúde.

É nessa conjuntura que o curso de Psicologia optou pelo SEP não funcionar no modelo comumente denominado “portas abertas”, apartado da rede de atenção e cuidados ou de outras possíveis dinâmicas relacionais e territoriais. Os atendimentos do SEP são, portanto, realizados de duas formas: a grande maioria deles ocorre nos próprios equipamentos, campos de estágio e territórios onde incidem os projetos de estágio e extensão; outra parte acontece na sede física do SEP, mas sempre articulada a partir do vínculo com instituições e das parcerias desenvolvidas pelos projetos de estágio existentes no curso, com base nos princípios de ação interdisciplinar e integralidade do cuidado que regem o SEP.

O art. 8º das DCN (Resolução nº 8, de 7 de maio de 2004, 2004Resolução nº 8, de 7 de maio de 2004. (2004, 7 de maio). Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia. Ministério da Educação. http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0804.pdf
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; Resolução nº 5, de 15 de março de 2011, 2011Resolução nº 5, de 15 de março de 2011. (2001, 15 de março). Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia, estabelecendo normas para o projeto pedagógico complementar para a Formação de Professores de Psicologia. Ministério da Educação. http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=7692-rces005-11-pdf&category_slug=marco-2011-pdf&Itemid=30192
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) orienta que a formação da(o) psicóloga(o) deve garantir o domínio básico de conhecimentos para serem utilizados em diferentes contextos, com vistas à atuação em processos psicológicos e psicossociais, como a coordenação e o manejo de processos grupais, a atuação interprofissional, dentre muitos outros. Em consonância com esse caráter inovador da legislação, as práticas de estágio envolvem a promoção de saúde, de direitos, de convivência, de produtos culturais, as diversas formas de acompanhamento e cuidado; elas podem ocorrer, sempre gratuitamente, nas modalidades individual, grupal e intervenção institucional ou comunitária. Tais propostas têm por objetivo a formação de profissionais críticos capazes de compreender a realidade local e atuar, de modo inter e transdisciplinar, com os trabalhadores dos campos de estágio, de modo a promover melhorias dos serviços oferecidos à população.

Os estágios profissionalizantes do curso de Psicologia integrados ao Serviço-Escola do curso de Psicologia

Os estágios supervisionados Específicos são realizados no quarto e quinto anos do curso, e visam possibilitar a conexão da aprendizagem desenvolvida nas suas unidades curriculares com as demandas presentes nos diversos contextos de atuação profissional. A carga horária mínima corresponde a 400 horas no quarto ano do curso, composta por uma distribuição semanal de 8 horas de atividades prática, 4 horas de supervisão, e outras 4 horas de estudos teóricos; no quinto ano, as 968 horas de estágio são divididas semanalmente em 16 horas de prática, 4 horas de supervisão e outras 4 horas de estudos teóricos. Os estagiários permanecem durante o ano todo em um mesmo campo de estágio, uma vez que o curso aposta que as vivências propiciadas possuem potencial para garantir o desenvolvimento de competências compatíveis com uma formação generalista.

Todos os campos de estágio do curso são vinculados ao SEP e implantados junto a serviços existentes ou ações realizadas nos respectivos territórios de atuação profissional. O que pode caracterizar como ponto de destaque desse SEP em específico é fato de que todos os estágios funcionam a partir de projetos desenvolvidos pelos supervisores em parceria com os profissionais inseridos em equipamentos da rede pública de saúde, educação, assistência social, em instituições conveniadas, ONGs e nas ruas.

Cada supervisor costuma trabalhar com até três projetos, desenvolvidos em até três campos de estágio distintos. Não se trabalha com áreas fixas, estabelecidas a priori. A construção dos projetos de estágio almeja acompanhar as mudanças que ocorrem dentro e fora da universidade, sendo sempre possível o surgimento de novos desenhos ou campos de estágio, conforme necessidades sociais detectadas pelos professores ou pelas parcerias estabelecidas com as instituições.

A escolha do projeto de estágio é feita pelos estudantes por meio de um método de autogestão, no qual as próprias turmas se responsabilizam pela condução do processo. O número mínimo e máximo de vagas para cada campo é estabelecido de acordo com as articulações realizadas entre os supervisores e os equipamentos envolvidos. Cada turma define os parâmetros que nortearão o processo de escolha e distribuição dos alunos, respeitando o número mínimo e máximo de vagas previamente acordado.

Os estagiários contam com supervisão acadêmica dos professores e preceptorias nos respectivos campos de estágio, sob responsabilidade de profissionais que atuam nos equipamentos ou dos técnicos (psicólogos) do curso quando necessário. Os supervisores acompanham de dois a oito estudantes, a depender da configuração de cada campo e das escolhas das turmas de estudantes. Essas condições de ensino-aprendizagem visam favorecer o acompanhamento de cada estagiário e estão mais presentes nos cursos de instituições públicas.

Além disso, as turmas de terceiro, quarto e quinto anos participam conjuntamente de unidades curriculares, a saber: Seminários de Estágio e Seminários Teórico-práticos I e II, nos quais são problematizados temas gerais, relativos à formação, e específicos, referentes às atuações nos diferentes campos e projetos de estágio. Essas discussões também intencionam viabilizar a troca entre estudantes de turmas distintas e subsidiar as escolhas dos estudantes em relação aos projetos de estágio.

Questionamentos atuais

Partindo da ideia de um processo de avaliação contínua visando seu aprimoramento, a equipe do SEP propôs questões a respeito dos projetos de estágio e suas ações, a serem aprofundadas neste artigo, como: onde estão sendo desenvolvidos os projetos e com quais objetivos? Quais são os públicos-alvo que se beneficiam com as ações? Quais competências e habilidades estão sendo desenvolvidas nos campos de estágio e de que forma - ampliando para a perspectiva generalista ou reproduzindo as especialidades ancoradas nas divisões de saberes profissionais e nas especificidades institucionais?

Nesse sentido, o objetivo geral do artigo é descrever, avaliar e problematizar as ações do SEP-Unifesp, no que se refere à oferta de campos de estágio e às ações desenvolvidas neles. E os objetivos específicos consistem em: identificar e sistematizar um conjunto de informações referentes aos projetos de estágio desenvolvidos junto aos supervisores; reconhecer possíveis pontos de aproximação e distanciamento das ações realizadas nos campos de estágio, em relação aos objetivos político-pedagógicos do curso de Psicologia da Unifesp e às DCN; discutir e sistematizar questões acerca de aspectos relevantes a serem consideradas em um processo de avaliação dos projetos e campos de estágio para uma formação em Psicologia.

Metodologia

Trata-se de um estudo transversal, baseado em metodologia predominantemente quantitativa e descritiva, a partir de levantamentos e análises de dados sobre os projetos de estágio vinculados ao SEP-Unifesp/BS.

Sujeitos

O curso de Psicologia possuía 17 professores ativos em 2019, ocasião do presente levantamento, sendo todos com doutorado na respectiva área específica de atuação e trabalhando em regime de dedicação exclusiva. Desses, 15 exerciam a função de supervisores de estágio, sendo responsáveis pelos 27 projetos de estágio que compunham o SEP naquele ano. Todos foram convidados e aceitaram participar da pesquisa.

Instrumentos

Realizamos o levantamento de dados por meio da distribuição de dois questionários autoaplicáveis online (no formato Google Forms), criados para esse fim. Por meio do primeiro questionário, com questões fechadas e abertas, investigamos características consideradas importantes para o dimensionamento do perfil e das ações relativas aos projetos e campos de estágio abarcados pelo curso por meio do SEP, tais como: abrangência territorial em relação aos municípios de atuação; tipos de instituições parceiras nas quais acontecem as atividades de estágio (públicas, privadas, ONGs, dentre outras); tempo de existência dos respectivos campos de estágio; perfil do público-alvo atendido; relação dos projetos com outros cursos da Unifesp ou com outras universidades; incidência de estudantes de quarto (estágio supervisionado específico básico) e quinto anos (estágio supervisionado específico profissionalizante); perfil e incidência das atividades grupais, reuniões, preceptorias, projetos terapêuticos singulares, atendimentos, matriciamentos, produções de documentos psicológicos e entrevistas; incidência de atividades interdisciplinares, atendimentos individuais e visitas domiciliares.

O segundo questionário online continha questões abertas e fechadas que complementavam algumas informações obtidas com o primeiro instrumento. Os assuntos abordados incluíram maior detalhamento e sistematização sobre a realização de reuniões, oficinas, visitas domiciliares, projetos terapêuticos singulares, atendimentos individuais e grupais, matriciamentos, eventos científicos ou de capacitação técnica, produção de documentos e entrevistas.

Procedimentos

Inicialmente, apresentamos a ideia do mapeamento de campos de estágio e ações para os professores, supervisores e os representantes de estudantes durante a reunião de Comissão de curso. Enviamos o link do primeiro questionário online para cada supervisor, com uma explicação sobre a pesquisa e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Cada um respondeu individualmente e as respostas foram tabuladas em planilha Excel. Identificamos respostas imprecisas em algumas questões abertas, por isso, elaboramos um questionário complementar. Enviamos outro link para esse segundo questionário por e-mail, para todos os participantes. Sistematizamos e analisamos descritivamente os dados. Por fim, apresentamos os gráficos dos resultados durante uma reunião da Comissão de curso.

Procedimentos éticos

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (4.384.193) e respeitou as convenções para pesquisa com seres humanos (Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, 2012Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. (2012, 12 de dezembro). Trata de pesquisas em seres humanos. Conselho Nacional de Saúde. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html
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; Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016, 2016Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. (2016, 7 de abril). Trata das especificidades éticas das pesquisas nas ciências humanas e sociais e de outras que utilizam metodologias próprias dessas áreas. Conselho Nacional de Saúde. https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/22917581
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). Conforme supracitado, os objetivos da pesquisa foram esclarecidos em reunião do colegiado de professores.

Análise de dados

Realizamos análises estatísticas descritivas dos dados quantitativos e compreensivas dos dados qualitativos, que foram obtidos com os dois questionários separadamente. Para a cartografia, criamos um sistema de geoprocessamento e de alimentação de um mapa interativo, que visou oferecer as informações pertinentes de forma integrada.

Resultados

Primeiramente, apresentaremos os resultados do primeiro questionário.

Os dados referentes à abrangência territorial, mais especificamente aqueles que tratam dos municípios onde ocorrem as atividades de estágio, evidenciaram a prevalência de 74,1% (20) no município de Santos, 11,1% (3) no município de São Vicente, 7,4% (2) no Guarujá e 7,4% (2) em São Paulo. Conforme já mencionado, foi iniciado um trabalho de cartografia com o intuito de facilitar a identificação territorial do conjunto dos projetos, assim como articular as informações georreferenciadas com dados qualitativos a serem sazonalmente atualizados (https://www.google.com/maps/d/viewer?mid=1SlHk_fpcDe9ZPVQV0859X7V1ctnf_own≪=-23.953679893841283%2C-46.33084634873837&z=14).

Em relação aos tipos de equipamentos parceiros nos quais são desenvolvidos os projetos, foram identificados os seguintes tipos, com as respectivas distribuições quantitativas: 85,2% (23) em instituições públicas; 18,5% (5) no terceiro setor (sobretudo organizações não-governamentais); 11,1% (3) independem dos vínculos institucionais formais, por exemplo, atuando diretamente com a população em situação de rua; e 3,7% (1) em instituição privada. Como podemos perceber, pela soma dos percentuais, alguns campos e projetos possuem vínculo com mais de um tipo de equipamento.

O tempo de existência relatado dos projetos de estágio é variado e foi subdividido em três faixas: 22,2% (6) com mais de 10 anos de duração; 37% (10) com duração entre cinco e 10 anos; e 40,7% (11) com até cinco anos de duração.

As respostas em relação ao público-alvo foram abertas, o que contribuiu para o relato de uma diversidade de atividades e públicos atendidos pelos diferentes campos, e até mesmo públicos distintos em um mesmo campo de estágio. Os dados relatam a distribuição dos respectivos públicos-alvo atendidos: 29,6% (8) com famílias; 25,9% (7) com crianças; 18,5% (5) com trabalhadores; 18,5% (5) com adolescentes; 14,8% (4) com pessoas com transtorno mental grave; 14,8% (4) com pessoas em situação de vulnerabilidade social; 11,1% (3) com aposentados; 7,4% (2) com comunidades; 7,4% (2) com mulheres; 7,4% (2) com população trans; 7,4% (2) com população com DSTs; 7,4% (2) com pessoas com problemas decorrentes do uso de álcool e outras drogas; e 3,7% (1) com atletas.

No que tange à presença de estágios de outras universidades, 40,7% (11) responderam afirmativamente, especificando a participação de três outras instituições de ensino superior que possuem cursos de Psicologia na região.

Os estágios também são desenvolvidos em locais com a presença de estágios de outros cursos da Unifesp em 55,6% (15) dos casos, envolvendo os cursos de Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Nutrição, Educação Física, Serviço Social e Medicina.

A maior parte dos campos de estágio, isto é, 59,3% (16), relataram fazer articulações com preceptores de outras formações, envolvendo profissionais das áreas de Nutrição, Serviço Social, Enfermagem, Medicina, Farmácia, Terapia Ocupacional, Fisioterapia, Educação Física, Pedagogia, auxiliar de Enfermagem e Programação Cultural. O maior percentual de preceptoria de estágio, 81,5% (22), é realizado por psicólogos.

Quanto à abrangência e perfil das atividades, 85,2% (23) dos campos de estágio contam com atividades interdisciplinares, 63% (17) relataram a realização de visitas domiciliares e 48,1% (13) citaram a realização de atividades de matriciamento.

Na questão que indagava sobre a realização de atividades em grupo, 88,9% (24) das respostas foram afirmativas, sendo encontrado o mesmo percentual (88,9%) em relação ao atendimento individual.

No segundo questionário, ficou evidenciada a diversidade de públicos e temáticas dos projetos: 22,2% (6) tinham temáticas relacionadas ao gênero (quatro com mulheres, um com homens e um com transgêneros); 48,1% (13) tratam de temas relacionados ao trabalho; 14,8% (4) eram relacionadas à problemas decorrentes do uso de álcool e outras drogas; 14,8% (4), definidos especificamente como terapêuticos; 18,5% (5) envolviam famílias; 11,1% (3) eram voltados à temática estudantil; 7,4% (2), realizados com crianças e 7,4% (2), com adolescentes; 7,4% (2) trabalharam questões raciais e étnicas; 3,7% (1), com terapia comunitária; 3,7% (1) versaram sobre esporte; e outros 18,5% (5), sobre temas variados, em função dos grupos formados.

A totalidade dos campos de estágio afirmou desenvolver algum tipo de reunião inserida no escopo das atividades de estágio, sendo que elas foram categorizadas como a seguir: 100% (27) desenvolveram reuniões com equipe de estagiários em campo; 85,2% (23) realizaram reuniões com os profissionais do campo de estágio; 70,4% (19) contaram com reuniões de articulação de rede no território; e 25,9% (7) citaram fazer reuniões junto ao público-alvo e usuários.

Em relação à incidência e características das oficinas desenvolvidas nos respectivos campos de estágio, os pesquisadores subdividiram as respostas em: 51,9% (14) contendo oficinas terapêuticas, 44,4% (12) com oficinas culturais e/ou recreativas, 11,1% (5) relativas a oficinas de capacitação técnica, 11,1% (5) não realizaram oficinas, e 14,8% (4) com alguma outra modalidade, como oficinas de pesquisa psicossociais e de pesquisa participante.

Sobre o desenvolvimento de Projetos Terapêuticos Singulares (PTS), 81,5% responderam realizar esse tipo de atividade, tendo 70,4% (19) participado da etapa de elaboração e 74,1% (20), do acompanhamento dos PTS.

No que se refere aos tipos de atendimentos realizados, as respostas relataram uma multiplicidade de modalidades: 92,6% (25) acolhimento; 85,2 % (23) atendimento individual; 70,4% (19) atendimento psicossocial; 66,7% (18) escuta singular; 55,6% atendimento familiar; 51,9% (14) busca ativa; 33,3% (9) plantão psicológico; 29,6% pronto atendimento; 11,1% terapia comunitária; 7,4% (2) triagem psicológica; e 3,7% (1) relatou não realizar atendimentos.

Sobre a produção de documentos psicológicos, 81,5% (22) das respostas apontam para o desenvolvimento de algum tipo de atividade do tipo, se distinguindo em: 22,2% (6) trabalham com declarações; 40,7% (11) emitem relatórios psicológicos; 44,4% (12) desenvolvem relatórios multiprofissionais; 14,8% produzem laudos psicológicos; 11,1% (3) realizam pareceres psicológicos; e 74,1% (20) acompanham a evolução de casos a partir da produção de documentos psicológicos.

No item acerca da realização de entrevistas, 88,9% (24) das respostas afirmaram desenvolver algum tipo de atividade relacionada, sendo que 81,5% (22) indicou a realização de entrevistas com público-alvo ou com usuários dos serviços, e 22,2% (6) afirmaram realizar algum tipo de entrevista com os profissionais ligados aos serviços.

Discussão

Os resultados evidenciam, em relação ao mapeamento dos locais de atuação dos campos de estágio, uma maior incidência das atividades no município de Santos. Ainda podemos perceber, em menor grau, a existência de um panorama de inserção regionalizado, pois também são desenvolvidas ações nos municípios vizinhos da Baixada Santista e em São Paulo. Além disso, a análise dos locais específicos de atuação permite concluir que a maioria das ações de estágios não se limita ao espaço físico de atendimento clínico do Serviço-Escola. As atividades de estágio se desenvolvem majoritariamente junto às instituições públicas ou às instituições ligadas ao terceiro setor na região, relacionadas direta e indiretamente com a promoção de políticas públicas e atividades socialmente referenciadas.

Esses resultados vão ao encontro da proposta de reposicionamento da Psicologia, entendida como ciência e profissão, que questionou tanto o modelo clínico tradicional quanto as limitações da oferta dos serviços e do próprio escopo da Psicologia, na intenção de valorizar a constituição histórica e social dos fenômenos, o compromisso com a transformação social e a atuação interprofissional (Botomé, 2010Botomé, S. P. (2010). A quem nós, psicólogos, servimos de fato. In O. H. Yamamoto & A. L. F. Costa (Orgs.), Escritos sobre a profissão de psicólogo no Brasil (pp. 169-202). EDUFRN.; Souza et al., 2018Souza, M. P. R.; Facci, M. G. D., & Silva, S. M. C. (2018). Sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia. Psicologia Escolar e Educacional , 22(1), 13-16. doi.org/10.1590/2175-3539201801001
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).

Quanto ao público-alvo, alguns supervisores mencionaram categorias de público-alvo que denotam as linhas de cuidado com as quais trabalham, como por exemplo: trabalhadores, usuários de álcool e outras drogas, pessoas em situação de vulnerabilidade social, pessoas com transtorno mental grave, população com DSTs, entre outros. Outros mencionaram categorias mais gerais, como: famílias, crianças, adolescentes, mulheres. Percebe-se que essas categorias podem encontrar sobreposições e intersecções que poderiam ser discutidas e especificadas, acrescentando riqueza ao debate. Do mesmo modo, alguns supervisores se referiram a temáticas que denotam linhas de cuidado específicas, envolvendo questões raciais e étnicas, laborais, esportivas, enquanto outros mencionaram questões mais amplas, como o trabalho com temáticas familiares, estudantis, entre outras. Tais delimitações dessas categorias, em relação às ações empreendidas, podem ser mais bem especificadas para que possamos compreender as dinâmicas subjacentes em termos da relação do conhecimento científico oferecido pela universidade e as demandas sociais, assim como os tensionamentos entre formação especializada e generalista.

A articulação das práticas junto aos públicos-alvo e aos respectivos serviços é o foco das ações de estágio, o que pode ser considerado um diferencial do SEP-Unifesp/BS e representar a superação do referido modelo tradicional de formação. Não obstante, é importante reconhecer que esse movimento também tem se expandido em outras instituições de ensino superior. De acordo com Galindo et al. (2019Galindo, W. C. M., Sousa, T. B. D. S., & Tamman, B. F. (2019). Modalidades de atendimento à população por serviços-escola de Psicologia: Panorama das publicações. Gerais: Revista Interinstitucional de Psicologia, 12(2), 371-388. doi.org/10.36298/gerais2019120212
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), que realizaram revisão das publicações científicas entre 2011 e 2015, alguns cursos estariam oferecendo atividades de estágio em campos menos sedimentados, como Saúde Pública, Assistência Social, Psicologia Jurídica, Psicologia do Esporte e outros; no entanto, ainda não há estudos discutindo seus resultados, mesmo as áreas de clínica e escolar sendo os principais focos das publicações associadas aos Serviços-Escola (Amaral et al., 2012Amaral, A. E. V., Luca, L., Rodrigues, C. T., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de Psicologia em clínicas-escola: Revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52.). No que tange às publicações até então, podemos apontar, portanto, para a necessidade e relevância de novas pesquisas sobre o tema, a fim de fornecer um panorama atualizado e mais acurado sobre possíveis compassos e descompassos entre os processos formativos em Psicologia, suas DCN e os respectivos papéis dos Serviços-Escola nesses processos.

A capilaridade dos projetos desenvolvidos no SEP aponta para uma intenção de constituição de vínculos e ações mais territorializadas, em consonância com as propostas preconizadas tanto no Projeto Pedagógico do curso e no Projeto Político-Pedagógico do campus universitário quanto nas DCN.

Outras universidades públicas, como a Universidade Estadual do Ceará (EUCE), também têm procurado concretizar essas DCN, destacando uma maior interação ensino-serviço nos estágios e facilitando o fortalecimento dos novos paradigmas de atuação em saúde pública (Pitombeira, Xavier, Barroso, & Oliveira, 2016Pitombeira, D. F., Xavier, A. S., Barroso, R. E. C., & Oliveira, P. R. S. (2016). Psicologia e a formação para a saúde: Experiências formativas e transformações curriculares em debate. Psicologia: Ciência e Profissão , 36(2), 280-291. doi.org/10.1590/1982-3703001722014
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). Em direção similar, a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) indica a preocupação em superar o modelo tradicional de formação do psicólogo e propor novos estágios em saúde pública, no intuito de desenvolver práticas voltadas à saúde integral das comunidades (Alves, Santos, & Alves, 2019Alves, R. S. F., Santos, G. C., & Alves, F. T. F. (2019). Proposta de estágio supervisionado na área de Psicologia com enfoque na saúde. Laplage em Revista, 5(1), 180-192. doi.org/10.24115/S2446-6220201951624P.180-192
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). Igualmente, Gomes e Dimenstein (2016Gomes, M. A. F., & Dimenstein, M. (2016). Serviço escola de psicologia e as políticas de saúde e de assistência social. Temas em Psicologia, 24(4), 1217-1231. doi.org/10.9788/TP2016.4-03Pt
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) realizaram uma pesquisa sobre os Serviços-Escola no Rio Grande do Norte, constatando que, embora ainda hoje haja maior oferta de práticas psicológicas tradicionais, nas modalidades de psicoterapia individual e avaliação psicológica ou psicodiagnóstico já ocorrem outras práticas nos processos formativos, como a prestação de serviços à comunidade, especialmente na área da saúde e assistência social, mesmo tendo ainda um caráter pouco estruturado.

Em relação ao tempo de existência dos projetos, os dados aqui obtidos demonstram uma diversidade de estratégias, com vínculos mais duradouros, denotando um caráter mais longitudinal e contínuo em alguns dos projetos e parcerias estabelecidas. Foram constatados também outros projetos mais recentes, evidenciando ainda uma capacidade de criação de novas propostas, articuladas com as mudanças, realidades e circunstâncias locais ou com possíveis rearticulações de temáticas ou estratégias por parte dos supervisores. Esse dado também pode refletir parte das dificuldades e os riscos em estabelecer campos de estágio em instituições externas à universidade, pois os vínculos podem ser rompidos devido a mudanças nessas instituições, descontinuando os projetos a elas vinculados.

Cabe ressaltar, numa análise mais atenta, que a totalidade dos projetos mais duradouros é desenvolvida em parceria com instituições públicas, permitindo inferir um movimento de articulação das práticas com as políticas públicas, vinculadas com os campos da saúde, educação, trabalho, assistência social, jurídico, entre outros. A inserção dos projetos de estágio nas distintas realidades socioculturais (locais e regionais) é convergente com a necessidade de superar a organização da formação do psicólogo em torno dos tradicionais campos de atuação: clínica/saúde, educação e trabalho (Conselho Federal de Psicologia, 2018Conselho Federal de Psicologia. (2018). Ano da formação em psicologia: revisão das diretrizes curriculares nacionais para os cursos de graduação em psicologia. CFP.).

A permanência dos projetos também contribui para propiciar abordagens mais vinculadas em rede, podendo auxiliar na consecução dos compromissos e princípios assumidos nas DCN, como a intenção de que os SE P estejam mais afinados com as respectivas demandas socioterritoriais. Mesmo assim, a presença de campos mais recentes, como o “Estágio Interdisciplinar no Ambulatório Trans da Unifesp”, revela uma capacidade de adaptação às novas demandas e realidades sociais.

Os dados referentes aos públicos-alvo também apontam para a diversidade de contextos, experiências e práticas, e nos permitem concluir que os campos oferecidos não se restringem ao trabalho com um único público-alvo, pois foram identificados 47 públicos distintos, distribuídos nos 27 campos de estágio. Essa variedade, além da permeabilidade dos projetos em abarcar distintos públicos, pode corroborar com outras propostas formuladas nas DCN, como a propositura de que as competências incentivadas durante a formação apontem para um perfil generalista, por meio do incentivo ao exercício de práticas de estágio inseridas em situações de complexidade variada, assim como a inserção em diferentes contextos institucionais e sociais.

Tal diversidade, por sua vez, está menos perceptível nas publicações que discorrem sobre os públicos-alvo dos Serviços-Escola (Amaral et al., 2012Amaral, A. E. V., Luca, L., Rodrigues, C. T., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de Psicologia em clínicas-escola: Revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52.). Ou seja, apesar de reconhecer possíveis mudanças no cenário formativo em um contexto mais amplo, não conseguimos encontrar na literatura sobre o tema muitos trabalhos que descrevem os Serviços-Escola preocupados com a ampliação do escopo dos atendimentos no serviço para além do local onde se encontra a clínica, a fim de responder a outros problemas da sociedade (Boeckel et al., 2010Boeckel, M. G., Krug, J. S., Lahm, C. R., Ritter, F., Fontoura, L. O., & Sohne, L. C. (2010). O papel do serviço-escola na consolidação do projeto pedagógico do curso de Psicologia. Psicologia: Ensino & Formação, 1(1), 41-51.; Campezatto & Nunes, 2007Campezatto, P. M., & Nunes, M. L. T. (2007). Atendimento em clínicas-escola de psicologia da região metropolitana de Porto Alegre. Estudos de Psicologia, 24(3), 363-374. doi.org/10.1590/S0103-166X2007000300008
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).

Os dados relativos à presença de estagiários de outras universidades e de outros cursos da Unifesp, assim como a participação de preceptores de outras formações nos cenários de estágio, indicam a existência de um contexto propício à realização de atividades interdisciplinares. Os resultados apontam para possibilidades de formação voltadas ao desenvolvimento de práticas de cunho inter ou transdisciplinar, interprofissional e interinstitucional, tal como se encontra formulado no Projeto Pedagógico do curso. Esse potencial de articulação, ainda que em muitos momentos possa não chegar a se concretizar, é bastante relevante, uma vez que, no cenário nacional, diversos cursos de Psicologia parecem continuar muito distantes de outros cursos e áreas de atuação profissional, tornando mais difícil a formação de psicólogos capazes de promover o cuidado integral (Gomes & Dimenstein, 2016Gomes, M. A. F., & Dimenstein, M. (2016). Serviço escola de psicologia e as políticas de saúde e de assistência social. Temas em Psicologia, 24(4), 1217-1231. doi.org/10.9788/TP2016.4-03Pt
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; Silva et al., 2020Silva, L. T. C., Chagas, L. V. S., Morais, E. P. G., & Santos, L. V. A. (2020). Aprendizagem das competências gerais na graduação em Psicologia. PSI UNISC, 4(1), 135-153. doi.org/10.17058/psiunisc.v4i1.14233
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), além de exercitar a transversalidade na compreensão dos fenômenos e o diálogo constante com outros profissionais, áreas de conhecimento e metodologias.

Ainda em relação à atuação dos preceptores, é necessário refletirmos, enquanto curso, acerca do entendimento compartilhado sobre o que consiste naquilo que chamamos de preceptoria: suas atribuições, responsabilidades, pré-requisitos, dentre outras possíveis contribuições. O que muda no desenvolvimento de habilidades e competências quando os preceptores não são psicólogos, ou quando as ações são compartilhadas com profissionais e estagiários de outras áreas?

Os dados referentes aos tipos de reuniões realizadas nos campos de estágio evidenciam um comprometimento da maioria dos campos com atividades de articulação interinstitucional - como as reuniões de articulação de rede no território - e com estratégias de aprofundamento dos vínculos com as instituições parceiras - por meio do desenvolvimento de reuniões com os profissionais dos campos de estágio e da realização de reuniões com equipe de estagiários nos campos de estágio.

Seria interessante, em um segundo momento, pensar em outras pesquisas que aprofundassem essas questões acerca da interdisciplinaridade e interinstitucionalidade, contribuindo com dados qualitativos em relação ao que é realizado em cada campo de estágio, qualificando em que medida a interdisciplinaridade acontece e buscando indicar quais seriam as principais dificuldades para a sua viabilização e aprofundamento.

A variedade de atividades de grupo relatadas permite concluir que uma das preocupações das ofertas de estágio consiste em promover alguns tipos de aptidões, entendidas como relevantes à formação em Psicologia. Dentre elas, destacam-se a coordenação e o manejo de processos grupais por meio de diferentes modalidades, como oficinas, reuniões de matriciamento, grupos psicoterapêuticos, terapia comunitária, grupos de acolhimento, grupos temáticos, grupos com profissionais de saúde, reuniões de equipe, entre outras. É possível inferir que tal multiplicidade de estratégias pode ser lida como efeito de uma disponibilidade às demandas emergentes nos referidos campos; também pode refletir a realização de algumas das propostas contidas no Projeto Pedagógico do curso (Universidade Federal de São Paulo, 2016Universidade Federal de São Paulo. (2016). Projeto pedagógico do curso de graduação em Psicologia. https://www.unifesp.br/campus/san7/images/pdfs/ceg/Atualizacao%20plano%20pedagogico-_psicologia.pdf
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, p. 29), como a formação generalista, teoricamente plural e não tecnicista e a promoção de certa inventividade manifesta por meio da diversidade de estratégias criadas para lidar com situações diversas, levando em consideração o respectivo contexto sociocultural e a diversidade de perspectivas necessárias à compreensão do ser humano.

No entanto, por mais que o segundo questionário tenha sido concebido no sentido de trazer maior precisão analítica, ao coletar as respostas, percebemos que alguns conceitos - como matriciamento, projeto-terapêutico singular, relatório psicológico, laudo psicológico - mereceriam ainda maior atenção e aprofundamento da nossa parte, para que melhor compreendêssemos em que medida os supervisores partilham das mesmas concepções e práticas.

Gomes e Dimenstein (2016Gomes, M. A. F., & Dimenstein, M. (2016). Serviço escola de psicologia e as políticas de saúde e de assistência social. Temas em Psicologia, 24(4), 1217-1231. doi.org/10.9788/TP2016.4-03Pt
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), que pesquisaram os Serviços-Escola do Rio Grande do Norte, constataram que ainda há o predomínio da área clínica com atendimentos individuais, apesar de já existirem outras modalidades e atuações: oficinas, rodas de conversa e reuniões de equipe. Contudo, este estudo indicou haver ainda pouca articulação com os serviços de saúde e de assistência social. Além disso, Pereira et al. (2018Pereira, M. S., Oliveira, A. F. F., Machado, J. P., Vieira, N. R. S., Miranda, R. N., Cunha, S. S. N., & Flor, T. C. (2018). Estágio profissionalizante e formação em Psicologia: O trabalho com grupos como dispositivo formativo. Psicologia: Ciência e Profissão , 38(2), 218-232. doi.org/10.1590/1982-3703002752017
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) apontaram para a importância do uso do dispositivo grupo na formação de psicólogos, notadamente por conta do seu potencial ético, estético e político, mas também terapêutico. Desse modo, seria interessante aprofundar, em estudos posteriores, a investigação sobre quais são as concepções de grupo com as quais os supervisores trabalham e em que sentido consideram esse dispositivo relevante para a formação e para a atuação nos respectivos campos de atuação (supervisão).

As DCN também indicam a importância de desenvolver competências para o atendimento individual de caráter preventivo ou terapêutico. Nesse sentido, todos os projetos de estágio pesquisados (com exceção de um) oferecem alguma ação voltada a tal dispositivo. É importante destacar que essas ações, embora direcionadas para um sujeito, não reproduzem o modelo tradicional da clínica, focado apenas na compreensão dos aspectos intrapsíquicos. As intervenções mais singularizadas, mesmo aquelas que ocorrem na sede física do SEP, são contextualizadas e voltadas para o desenvolvimento da capacidade de gestão da própria vida, e não apenas para a eliminação de sintomas (Sousa & Padovani, 2015Sousa, C. R., & Padovani, R. C. (2015). Supervisão em Terapias Cognitivo-Comportamentais: Trilhando outros caminhos além do serviço-escola. Psico-USF, 20(3), 461-470. doi.org/10.1590/1413-82712015200308
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).

A participação em eventos científicos e de capacitação técnica - como apresentação de casos clínicos, grupos de estudo, grupos de treinamento ou capacitação, participação em congressos, e outros - se revela congruente com o compromisso que os Serviços-Escola devem ter com a apropriação e disseminação de práticas do psicólogo fundamentadas em evidências científicas (Marturano, Silvares, & Oliveira, 2014Marturano, E. M., Silvares, E. F. M., & Oliveira, M. S. (2014). Serviços-escola de psicologia: Seu lugar no circuito de permuta do conhecimento. Temas em Psicologia , 22(2), 457-470. doi.org/10.9788/TP2014.2-15
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). Os dados apresentados também se coadunam com a intenção de uma formação que busque integrar práticas de ensino, extensão e pesquisa, entendendo essa última como parte fundamental não apenas da formação, mas da educação permanente requerida ao desenvolvimento da prática profissional e da construção da Psicologia, entendida enquanto ciência e profissão.

Considerações finais

Este artigo pretendeu ser uma avaliação crítica do que está sendo oferecido no SEP, tanto em relação aos parâmetros relativos às DCN e suas reformulações quanto ao Projeto Político-Pedagógico do campus e do curso.

Percebemos, ainda, que a multiplicidade de oferta de projetos e campos de estágio, públicos-alvo atendidos e a diversidade e flexibilidade de ações e estratégias desenvolvidas parecem indicar que as ações do SEP revelam um movimento de congruência em relação às normativas, intenções e parâmetros supracitados.

A heterogeneidade dos campos de atuação, suas vinculações socioterritoriais e a diversidade de perspectivas apresentadas - evidenciada por meio da amplitude teórico-metodológica - parecem indicar uma forte ancoragem social e, nesse sentido, uma maior possibilidade de respostas às complexas demandas da sociedade, condizentes com as novas Diretrizes Curriculares da profissão e com o papel de uma universidade pública socialmente referenciada, como é a Unifesp.

Em relação às possíveis limitações no nosso estudo, algumas devem ser comentadas. Quanto às investigações sobre os públicos-alvo e temáticas, é possível identificar que as categorias apresentadas não estão bem definidas e, por vezes, apresentam sobreposições.

Outra lacuna importante da pesquisa é que ela se baseou apenas nos relatos dos supervisores e não em uma metodologia de coleta de dados realizada em campo, a partir de uma observação mais acurada ou da abordagem de outros envolvidos (estagiários, preceptores, público-alvo). Sendo assim, não foi possível aprofundar a investigação acerca do que é relatado, nem ampliar a visão do que é realizado e das consequências em termos de ação político-social. Para ampliar essa perspectiva, pretendemos realizar outras pesquisas que nos tragam essas outras perspectivas.

O presente estudo apontou para a abertura de novas questões que podem ser investigadas em estudos posteriores. Seria interessante aprofundarmos, na perspectiva de supervisores, preceptores e estagiários, quais são as possíveis diferenças técnico-conceituais entre algumas das ações mencionadas. Caberia também investigar alguns dos efeitos da aposta de estágios com duração anual, implicando num processo formativo com somente dois conjuntos de experiências de estágios específicos. Com isso, restaria apenas investigar quanta oportunidade esse modelo pode oferecer ao desenvolvimento de aptidões requeridas a um profissional generalista.

Outra questão que merece maior aprofundamento se refere ao grau de efetivação de uma formação consistente em relação às ações interdisciplinares. Como vimos, encontramos algumas condições propícias, restando saber em que medida elas se efetivam e têm se traduzido em perfis profissionais transdisciplinares, interdisciplinares, multidisciplinares ou disciplinares.

Por fim, atendendo à proposta de avaliação processual e constante da formação em Psicologia, seria importante a criação de dispositivos de coleta de dados e intervenção permanentes, visando, a partir disso, acompanhar, dar visibilidade, problematizar e evidenciar temas e situações, a fim de monitorar e transformar a realidade dos campos de estágio e de suas ações, além do processo formativo em Psicologia. Tal proposta endossaria a relevância em relação ao aprofundamento das questões tratadas aqui, e uma série de outras envolvendo a formação em Psicologia. Com isso, enfatizamos a importância de mais pesquisas e ações direcionadas a essas temáticas para que se consiga contribuir com o desenvolvimento da Psicologia - entendida enquanto ciência e profissão -, a partir de suas Diretrizes Curriculares e de seus respectivos campos de inserção.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    17 Mar 2021
  • Aceito
    01 Dez 2022
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