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Além da Ciência

ALÉM DA CIÊNCIA

Luís Carlos de Menezes

Instituto de Física - USP

Poucas pessoas contribuíram tanto para a Universidade e para a Ciência no Brasil quanto Carolina Bori. Por isso, talvez seja até imodesto falar da nossa amizade, desenvolvida em tantos anos de trabalho conjunto, em projetos educacionais, na política universitária e científica e em ações de alcance ainda mais geral para nosso país. Assim, sem disfarçar o orgulho de ser seu amigo, me associo aos que lhe prestam esta homenagem, relatando alguns episódios para mim decisivos, em questões que estão além da Ciência, que mostram a percepção humana, a coragem e a dedicação ao trabalho, que tem sido a marca de sua presença.

Há pouco menos de quinze anos, quando decidi me engajar prioritariamente em atividades educacionais, ao reunir o grupo pioneiro de um projeto voltado ao aperfeiçoamento do ensino público, pedimos a ela que avaliasse a proposta e nos assessorasse na sua condução inicial. Após participar de nossas reuniões, analisar nossos documentos e concordar com o essencial da iniciativa, ela nos advertiu para não descuidarmos dos procedimentos, tão essenciais quanto os conteúdos, particularmente nas atividades de formação humana. Em várias situações, tivemos que lembrar do que aprendemos com ela e, talvez por isso, o projeto existe até hoje, aprofundando a confiança entre seus integrantes, a despeito do drama por que passa nossa Educação e nos atinge a todos.

Há cerca de dez anos, vivíamos o processo constituinte após longo período de ditadura. Em meio às refregas contra um programa nuclear absurdo, que custou bilhões à nação e só produziu problemas, procurei Carolina Bori na sede da SBPC, para consultá-la sobre a possibilidade de promovermos, através daquela Sociedade, uma moção popular por um veto constitucional às armas nucleares. Nossa conversa se deu ao pé da escada, num breve intervalo da reunião do Conselho de que ela participava. Meses depois, vitoriosa a campanha, estava ela em Brasília cruzando o gramado do planalto, levando nos braços as dezenas de milhares de assinaturas da moção, mais tarde aprovada pela Assembléia Nacional Constituinte.

Há cerca de cinco anos, estávamos negociando a transferência, para a Universidade de São Paulo, da direção da Estação Ciência, então conduzida pelo CNPq. Tratava-se de evitar que fosse fechado aquele importante centro de difusão científica, que atendia diariamente mais de mil crianças e jovens visitantes, com o problema adicional de que não tínhamos dinheiro ou cargos para manter o nível de remuneração dos dirigentes anteriores, e teríamos de, rapidamente, prover necessidades de monitoria, segurança e manutenção, com recursos insuficientes. Pois bem, encontramos alguém de pulso que aceitou o desafio; Carolina Bori, com uma pequena e corajosa equipe, conduziu a transição sem deixar que a Estação interrompesse seu atendimento nem um único dia.

Agora, é o Núcleo de Pesquisas sobre Ensino Superior (NUPES) que está podendo contar com seu trabalho de direção criterioso e consistente. Novamente, tive o privilégio de conviver com ela em mais uma tarefa. Felizmente para a Universidade brasileira, esse privilégio tem sido partilhado por muitos que, como eu, podem testemunhar que essa mulher notável é determinante para o sentido de nosso trabalho e para a alegria de nosso convívio. A presença dela em qualquer espaço é garantia de dignidade, de competência e de defesa do interesse público.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 1998
  • Data do Fascículo
    1998
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