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Atividade antiproliferativa de Sloanea garckeana K. Schum.

Antiproliferative activity of Sloanea garckeana K. Schum.

Resumo

The crude methanol extract and hexane, ethyl acetate, chloroform and methanol fractions from leaves of S. garckeana were examined in vitro for their antiproliferative activity on MCF-7, NCI-ADR, NCI-460, UACC-62, 786-0, OVCAR-03, PCO-3 and HT-29 human cancer cell lines. Among the assayed fractions, the ethyl acetate fraction showed to be cytotoxic against 786-0, UACC-62, OVCAR-03 and NCI-ADR cell lines with IC50 values of 12 µg/mL, 42 µg/mL, 53 µg/mL and 51 µg/mL, respectively. Through fractionation and isolation procedures compound (1) was obtained from the EtOAc fraction and its structure was elucidated by spectral techniques.

Sloanea garkeana; Elaeocarpaceae; 3-O-methyl ellagic acid-4'-O-α-L-rhamnoside


Sloanea garkeana; Elaeocarpaceae; 3-O-methyl ellagic acid-4'-O-α-L-rhamnoside

ARTIGO

Atividade antiproliferativa de Sloanea garckeana K. Schum.

Antiproliferative activity of Sloanea garckeana K. Schum.

Adriano Lopes RomeroI; Álvaro FontanaI; Cleuza Conceição da SilvaI; Maria Conceição de SouzaII; João Ernesto de CarvalhoIII; Emiret O. FariaIV; Lucilia KatoIV; Cecília M. A. de OliveiraIV,* * e-mail: cecilia@quimica.ufg.br

IDepartamento de Química, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo 1590, 87020-900 Maringá – PR, Brasil

IINúcleo de Pesquisas em Limnologia, Ictiologia e Aqüicultura, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo 1590, 87020-900 Maringá – PR, Brasil

IIICentro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas Biológicas e Agrárias, CP 6171, 13083-970 Campinas - SP, Brasil

IVInstituto de Química, Universidade Federal de Goiás, CP 131, Campus II, Samambaia, 74001- 970 Goiânia – GO, Brasil

ABSTRACT

The crude methanol extract and hexane, ethyl acetate, chloroform and methanol fractions from leaves of S. garckeana were examined in vitro for their antiproliferative activity on MCF-7, NCI-ADR, NCI-460, UACC-62, 786-0, OVCAR-03, PCO-3 and HT-29 human cancer cell lines. Among the assayed fractions, the ethyl acetate fraction showed to be cytotoxic against 786-0, UACC-62, OVCAR-03 and NCI-ADR cell lines with IC50 values of 12 µg/mL, 42 µg/mL, 53 µg/mL and 51 µg/mL, respectively. Through fractionation and isolation procedures compound (1) was obtained from the EtOAc fraction and its structure was elucidated by spectral techniques.

Keywords:Sloanea garkeana; Elaeocarpaceae; 3-O-methyl ellagic acid-4'-O-α-L-rhamnoside.

INTRODUÇÃO

Elaeocarpaceae é uma família de plantas florais compreendendo 12 gêneros e aproximadamente 600 espécies de árvores e arbustos, os quais estão distribuídas principalmente em regiões tropicais e subtropicais.1 Os gêneros Aristotelia, Peripentadenia e Elaeocarpus estão entre os mais estudados dentro da família e são conhecidos como fonte de metabólitos ativos derivados de ácido elágico,2 além de alcalóides pirrolidínicos3 e indolizidínicos.4,5 No Brasil, a família Elaeocarpaceae é representada pelos gêneros Sloanea e Crinodendron, cuja fitoquímica é bem pouco conhecida. Somente uma espécie de cada gênero foi investigada e ambas são descritas como fonte de curcubitacinas citotóxicas.6,7 Como parte de um programa de colaboração interdisciplinar que tem como objetivo o estudo de plantas medicinais, selecionamos para investigação o extrato bruto de Sloanea garckeana, com base no perfil fitoquímico e na atividade citotóxica exibidos por algumas espécies da família. Neste trabalho, descrevemos a atividade antiproliferativa do extrato bruto e das frações de S. garckeana assim como o isolamento de um derivado do ácido elágico (1). A estrutura do composto isolado foi elucidada com base nas análises dos dados espectrais e por comparação com dados da literatura.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O extrato bruto metanólico das folhas de S. garckeana foi submetido à avaliação da atividade antiproliferativa em culturas de células tumorais humanas de UACC-62 (melanoma), NCI-460 (pulmão tipo não pequenas células), MCF-7 (mama), NCI-ADR (mama que expressa o fenótipo de resistência MDR), HT-29 (cólon), OVCAR (ovário), C786-0 (rim) e PCO-3 (próstata) e mostrou-se ativo em concentrações abaixo de 100 µg/mL (Figura 1) para todas as linhagens testadas. Com base neste resultado, o extrato bruto foi fracionado em ordem crescente de polaridade resultando nas frações hexano, CHCl3, AcOEt e MeOH.


As frações assim obtidas foram avaliadas frente às mesmas células descritas acima e a análise dos dados obtidos permitiu identificar a fração AcOEt (Figura 2, Tabela 1) como a mais ativa entre as quatro frações testadas, sendo predominantemente ativa, com efeito citocida (morte celular), para a linhagem C786-0 (rim) e UACC-62 (melanoma), com valor de IC50 12 e 42 µg/mL, respectivamente. A fração apresentou ainda, efeito citostático para as linhagens OVCAR (ovário) e NCI-ADR com valores de IC50 de 53 e 51 µg/mL, respectivamente. Alιm disso, a fração CHCl3 apresentou efeito citocida para a linhagem C786-0 (rim) com valor de IC50 de 32 µg/mL e para a linhagem MCF-7 (mama) com valor de IC50 de 28 µg/mL.


Com base nestes resultados, o fracionamento foi direcionado para o isolamento das substâncias presentes na fração AcOEt, a qual foi submetida à filtração em Sephadex LH-20 com metanol, resultando no isolamento do composto (1), como o constituinte majoritário da mistura.

A identificação do composto (1) foi realizada com base nos dados de RMN 13C e 1H uni e bidimensionais (Tabela 2) e por comparação com dados da literatura.8,9 No espectro de RMN de 13C/DEPT-135º, são observados 21 sinais, dentre eles, 4 relativos a carbonos carbinólicos em δC 72,0, 70,3, 70,2, 70,1, um a carbono anomérico em δC 100,3 e um outro referente à metila em δC 18,1, os quais sugerem uma unidade ramnose. Dois sinais de carbonos metínicos em δC 111,9 e 111,7 e 10 de carbonos não ligados a hidrogênio na região de δC 107,7–152,9 indicam a presença de dois anéis aromáticos contendo apenas um hidrogênio cada. Duas carbonilas conjugadas em δC 158,9 e 159,0 são também observadas, além de um sinal referente a uma metoxila em δC 61,2. O espectro de RMN de 1H confirma a presença da unidade de ramnose através dos sinais entre δH 3,30 a 5,50, característicos de hidrogênios carbinólicos; do dupleto em δH 5,47 (J = 1,2 Hz), referente ao hidrogênio anomérico e do dupleto em δH 1,11 (J = 6,0 Hz), atribuído à metila. Adicionalmente, são observados dois simpletos em δH 7,73 e 7,52, com integração para um hidrogênio cada, um simpleto intenso de uma unidade de metoxila em δH 4,03, além de dois simpletos referentes a duas hidroxilas em δH 11,11 e δH 10,79. O espectro de HMQC permite confirmar a presença das unidades aromáticas, além da unidade glicosídica. O espectro 1H – 1H COSY apresenta correlações somente para a ramnose, porém o espectro HMBC permite conectar as duas unidades aromáticas através de correlações entre os hidrogênios H-5 (δH 7,52) e os carbonos C-1 (δC 111,6), C-3 (δC 140,4), C-4 (δC 152,9) e C-7 (δC 159,0); H-5' (δH 7,73) e os carbonos C-1' (δC 114,6), C-3' (δC 141,6), C-4' (δC 146,7) e C-7'(δC 158,9). Além disso, observa-se também uma correlação entre o hidrogênio anomérico H- 1" (δH 5,47) e o carbono C-4'(δC 146,7), o que confirma a ligação do resíduo de açúcar neste carbono (Figura 3).


A comparação da estrutura assim obtida com dados da literatura permitiu identificar o composto 1 como sendo o ácido 3-O-metilelágico-4'-O-α-L-ramnopiranosídeo, o qual foi isolado anteriormente de Eucalyptus globulus (Myrtaceae)8 e Potentilla discolor (Rosaceae).9 O ácido elágico e seus derivados glicosilados e não glicosilados são compostos fenólicos isolados de fontes naturais tais como frutas vermelhas, uvas, nozes e de outras espécies vegetais, sendo comumente associados ao potencial antioxidante destes alimentos.10 Por outro lado, a atividade citotóxica apresentada pelo extrato AcOEt pode estar relacionada à presença do constituinte majoritário, 3-O-metilelágico-4'-O-α-L-ramnopiranosídeo (1), visto que o ácido elágico na sua forma livre apresenta elevada atividade citotóxica e antiproliferativa para várias linhagens de células.11

PARTE EXPERIMENTAL

Procedimentos experimentais gerais

Os espectros de RMN de 1H e 13C foram obtidos em espectrômetro Varian Mercury Plus (300,6 MHz para 1H e 75,45 MHz para 13C). Os deslocamentos químicos foram dados em ppm, tendo como referência interna o TMS (δ = 0,0 ppm). A cromatografia em coluna foi realizada em sílica gel 60 [(0,063–0,200 mm) (70-230 mesh ASTM)] e a filtração em Sephadex LH-20. A concentração que promove a inibição de 50% do crescimento celular (IC50) foi determinada por análise de regressão não-linear usando-se o programa GraphPad Prism.

Material vegetal

Sloanea garckeana K. Schumam foi coletada em 12 de outubro de 2000, em Porto Rico-PR, pela Profa. Dra. M. C. de Souza (NUPELIA/UEM). Uma exsicata (no. HUEM 13407) da espécie estudada encontra-se depositada no Herbário do Departamento de Biologia da Universidade Estadual de Maringá.

Preparação e fracionamento do extrato bruto

As folhas secas e moídas (791,52 g) foram exaustivamente extraí­das por maceração à temperatura ambiente com metanol. O extrato bruto obtido foi evaporado sob pressão reduzida em evaporador rotativo à temperatura de 40 ºC, obtendo-se 67,00 g de extrato bruto seco. Parte desse extrato (32,00 g) foi adsorvido em sílica gel e submetido ao pré-fracionamento em coluna cromatográfica utilizando-se os eluentes hexano, clorofórmio, acetato de etila e metanol em ordem crescente de polaridade, obtendo-se as frações hexânica (1,50 g); clorofórmica (3,20 g); acetato de etila (9,09 g) e metanólica (18,10 g). Parte da fração acetato de etila (1,30 g) foi submetida à filtração em Sephadex LH-20 utilizando-se metanol, resultando no isolamento de 6,5 mg do composto (1) na forma de cristais brancos.

Avaliação da atividade antiproliferativa

Para a realização da triagem in vitro foram selecionadas as linhagens: MCF-7 (mama), NCI-ADR (mama com fenótipo de resistência a múltiplas drogas), UACC-62 (melanoma), NCI-460 (pulmão), PCO-3 (próstata), HT-29 (cólon), OVCAR (ovário) e 786-0 (rim). A avaliação da atividade antiproliferativa do extrato bruto metanólico e das frações oriundas do mesmo foi realizada segundo metodologia descrita por Monks e colaboradores,12 utilizando-se doxorrubicina como controle positivo. Para o teste de atividade, foram plaqueados 100 µL de células em meio RPMI/SFB/gentamicina, em placas de 96 compartimentos. As placas foram incubadas por 24 h a 37 ºC em atmosfera de 5% de CO2. Depois desse período uma placa controle foi fixada através da adição de ácido tricloroacético para determinação da quantidade de células no momento da adição das drogas. O extrato e as frações foram ensaiados nas concentrações de 0,25; 2,5; 25 e 250 µg/mL e incubados por 48 h. Em seguida, as placas foram coradas pela adição de 50 µL do corante proteico sulforrodamina B (SRB) a 0,4% (peso/volume), dissolvido em ácido acético a 1%, e incubadas a 4 ºC, durante 30 min. O corante ligado às proteínas celulares foi solubilizado com uma solução de Trizma Base na concentração de 10 µM e pH 10,5 por 5 min em ultra-som. A leitura espectrofotométrica da absorbância foi realizada em 560 nm em um leitor de microplacas.

AGRADECIMENTOS

Ao CNPq pela concessão das bolsas PIBIC de A. L. Romero e A. Fontana e à Fundação Araucária pelo apoio financeiro.

REFERÊNCIAS

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Recebido em 12/6/07; aceito em 15/2/08; publicado na web em 31/7/08

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  • *
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Out 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Recebido
      12 Jun 2007
    • Aceito
      15 Fev 2008
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