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ESTILIZAÇÃO DE SI E RESISTÊNCIA NO CONTEXTO LGBTQ+

Estilización de sí y resistencia en el contexto LGBTQ+

RESUMO

O objetivo deste ensaio teórico é o de refletir acerca do processo da estilização de si entre corpos LGBTQ+ como modalidade de resistência. Pretende-se analisar a normatização de corpos e os processos de resistência a partir da categoria de estilização de si, inspirando-se em dois autores-chave do pós-moderno: Nietzsche e Foucault. As discussões voltam-se para se pensarem corpos LGBTQ+ em uma perspectiva não identitária e de resistência queer em termos de vontade de potência e do cuidado de si, sob uma lógica crítica, não pensando em um processo radical de transformação social, mas de avanços pontuais, especialmente em nível individual e de grupo/subculturas, que podem ser significativos para o redirecionamento das relações sociais. O prazer queer, portanto, revela-se como ordenador, da categoria da resistência em âmbito da estetização de si ao estabelecer microtransformações no ambiente de trabalho, como um caminho que faça frente à disciplina e à normalização.

Palavras-chave:
corpos LGBTQ+; estilização de si; cuidado de si; resistência; prazer queer

RESUMEN

El objetivo de este ensayo es reflexionar sobre el proceso de autoestilización entre cuerpos LGBTQ+ como modo de resistencia. Este trabajo pretende analizar la normalización de los cuerpos y los procesos de resistencia desde la categoría de autoestilización, inspirándose en dos autores clave de la posmodernidad: Nietzsche y Foucault. Las discusiones se centran en pensar los cuerpos LGBTQ+ en una perspectiva no identitaria y de resistencia queer en términos de voluntad de poder y autocuidado, bajo una lógica crítica, no pensando en un proceso radical de transformación social, sino en avances específicos, especialmente a nivel individual y grupal/subculturas, lo que puede ser significativo para reorientar las relaciones sociales. El placer queer, por lo tanto, se revela como organizador de la categoría de la resistencia en el ámbito de la autoestetización al establecer microtransformaciones en la esfera profesional, como un camino que haga frente a la disciplina y a la normalización.

Palabras clave:
cuerpos LGBTQ+; autoestilización; autocuidado; resistencia; placer queer

ABSTRACT

This theoretical essay aims to reflect on the process of stylization of the self among LGBTQ+ bodies as a form of resistance. Inspired by two key post-modern authors, namely Nietzsche and Foucault, and based on the category of stylization of the self, we analyze the normalization of bodies and also processes of resistance. The discussions are directed at thinking about LGBTQ+ bodies from a non-identity, queer resistance perspective in terms of both will to power and care of the self, in a critical way, not with a view to radical social transformation, but to particular advances, especially at the individual and group/subculture levels, which can play a significant role in redirecting social relations. Queer pleasure thus emerges as an element that arranges the resistance category in the sphere of stylization of the self by establishing micro-transformations in the workplace as a way of tackling discipline and normalization.

Keywords:
LGBTQ+ bodies; stylization of the self; care of the self; resistance; queer pleasure

INTRODUÇÃO

O objetivo deste ensaio teórico é o de refletir acerca do processo da estilização de si entre corpos LGBTQ+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queer e outros grupos plurais de gênero e sexualidade) como modalidade de resistência. Pretende-se analisar a normatização de corpos e os processos de resistência a partir da categoria de estilização de si, inspirando-se em dois autores-chave do pós-moderno: Nietzsche e Foucault. No que se refere ao primeiro, foi essencial resgatar suas análises acerca dos corpos, compreendidos em sua multiplicidade, e em termos da vontade de potência, conceito essencial a Nietzsche; e, do segundo, resgatou-se o material referente ao cuidado de si, uma de suas últimas reflexões, além das discussões acerca da sexualidade como dispositivo e seus efeitos produzidos nos corpos.

A resistência compreendida neste estudo é situada no contexto do poder, das relações de força que possibilitam encontrar espaços de questionamento das normas, que restringem discursos e de reposicionamento do “sujeito” no jogo no qual ele está inserido, de perpétuas espirais de poder e prazer (Foucault, 2001aFoucault, M. (2001a). História da sexualidade 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.), inclusive em âmbito organizacional. Este estudo está envolto em uma lógica crítica, não pensando no processo radical de transformação social, mas de avanços pontuais, especialmente em nível individual e de grupo/subculturas, que podem ser significativos para o redirecionamento das relações sociais, mesmo que essas mudanças não sejam tão explícitas.

A estilização de si entre corpos LGBTQ+ é constituir-se como obra de arte e estabelecer novas configurações, uma nova estética na relação com o outro, é voltar-se para corpos que resistem à assimilação, que se mantêm fiéis a seus desejos e a seus prazeres dissidentes, não especificamente extinguindo normas, mas reordenando-as. Normas que são reconfiguradas, como discutido por Perreau (2018)Perreau, B. (2018). Qui a peur de la théorie queer? Paris, France: Presses de Sciences Po., no âmbito dos estudos da teoria queer (Rumens, 2016Rumens, N. (2016). Towards queering the business school: A research agenda for advancing lesbian, gay, bisexual and trans perspectives and issues. Gender, Work & Organization, 23(1), 36-51. doi: 10.1111/gwao.v23.1
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; Souza, 2017Souza, E. M. de. (2017). A teoria queer e os estudos organizacionais: Revisando conceitos sobre identidade. Revista de Administração Contemporânea, 21(3), 308-326. doi: 10.1590/1982-7849rac2017150185
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; Souza & Carrieri, 2010Souza, E. M., & Carrieri, A. P. (2010). A analítica queer e seu rompimento com a concepção binária de gênero. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 46-70. doi: 10.1590/S1678-69712010000300005
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).

Nesse contexto, fala-se inclusive de corpos trans, não binários, intersexuais, afeminados. Corpos que desafiam os padrões de masculinidade e feminilidade, rompem com as normas heterossexuais e desestabilizam valores sociais (Carrieri, Souza, & Aguiar, 2014). Corpos em processo de construção constante (Butler, 2019bButler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.). Corpos que subvertem e excedem a ordem binária sexual-social. É resgatar o corpo em meio à explosão do discurso, que, no âmbito da dualidade corpo-mente do pensamento cartesiano, o mantém subordinado (Thanem, 2015Thanem, T. (2015). The body: Philosophical paradigms and organizational contributions. In R. Mir, H. Willmott, & M. Greenwood (Eds.), The Routledge Companion to philosophy in organization studies (pp. 276-284). London, UK: Routledge.). Nesse sentido, pressupõe-se que o indivíduo possa influenciar os jogos de poder, não especificamente enquanto self, um pretenso sujeito empenhado na busca do conhecimento de si, mas enquanto corpo, como si mesmo, a grande razão, como caracterizado por Nietzsche (2011)Nietzsche, F. (2011). Assim falava Zaratustra. São Paulo, SP: Companhia das Letras..

A estilização de si pode ser percebida como modalidade de resistência, inclusive no contexto do redirecionamento político do dispositivo da sexualidade, esta compreendida como discurso, e também da relação com o Outro, da multiplicidade de alternativas a partir do questionamento da disciplina e da normatização. O LGBTQ+, em função do questionamento primário e não intencional de sua afetividade, e em função de seu próprio desejo, pode tornar-se objeto singular desse processo estilístico, considerando tais indivíduos em devir, como nos lembra Foucault, sempre em processo de construção, de organização do desejo, das múltiplas forças que lutam em Si mesmo.

Importante mencionar que tal estudo é significativo em termos de grupos intermediários entre o indivíduo e a sociedade, tais como as organizações. São vivências e mudanças individuais e coletivas que afetam o modo como o indivíduo se depara com o cotidiano organizacional, inclusive em termos da relação que mantém com a estrutura e o controle (Souza, 2014Souza, E. M. (2014). Poder, diferença e subjetividade: A problematização do normal. Farol - Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade, 1(1), 103-143. doi: 10.25113/farol.v1i1.2556
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; Souza, Costa, & Pereira, 2015). A resistência como categoria, e inserida na perspectiva foucaultina das próprias relações de poder, é significativa para relativizar e minimizar os efeitos da dominação e da disciplinarização no contexto organizacional. Resistências que existem no próprio poder, que são por ele assumidas, mas que levam a mudanças (Foucault, 1987Foucault, M. (1987). Vigiar e punir: Nascimento da prisão. Petrópolis, RJ: Vozes., 2001aFoucault, M. (2001a). História da sexualidade 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal., 2019Foucault, M. (2019). Microfísica do poder. Rio de Janeiro, RJ/São Paulo, SP: Paz e Terra.).

É mister salientar que, apesar da carência de estudos LGBTQ+ no âmbito dos estudos organizacionais, inclusive quando se remete à diversidade organizacional (Ng & Rumens, 2017Ng, E. S. W., & Rumens, N. (2017). Diversity and inclusion for LGBT workers: Current issues and new horizons for research. Canadian Journal of Administrative Sciences/Revue Canadienne des Sciences de l’Administration, 34(2), 109-120. doi:10.1002/CJAS.1443
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), seja nacional ou internacional, há o esforço de vários pesquisadores em produzir conhecimento teórico-crítico no campo nos últimos 15 anos (Carrieri et al., 2014Carrieri, A. P., Souza, E. M., & Aguiar, A. R. C. (2014). Trabalho, violência e sexualidade: Estudo de lésbicas, travestis e transexuais. Revista de Administração Contemporânea, 18(1), 78-95. doi: 10.1590/S1415-65552014000100006
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; Irigaray & Freitas, 2011Irigaray, H. A. R., & Freitas, M. E. (2011). Sexualidade e organizações: Estudo sobre lésbicas no ambiente de trabalho. Organizações & Sociedade, 18(59), 14-31. doi: 10.1590/S1984-92302011000400004
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; Irigaray, Saraiva, & Carrieri, 2010Irigaray, H. A. R., Saraiva, L. A. S., & Carrieri, A. de P. (2010). Humor e discriminação por orientação sexual no ambiente organizacional. Revista de Administração Contemporânea, 14(5), 890-906. doi: 10.1590/S1415-65552010000500008
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; Pompeu & Souza, 2019Pompeu, S. L. E., & Souza, E. M. (2019). A discriminação homofóbica por meio do humor: Naturalização e manutenção da heteronormatividade no contexto organizacional. Organizações & Sociedade, 26(91), 645-664. doi: 10.1590/1984-9260912
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; Saraiva & Irigaray, 2009Saraiva, L. A. S., & Irigaray, H. A. D. (2009). Políticas de diversidade nas organizações: Uma questão de discurso? RAE-Revista de Administração de Empresas, 49(3), 337-348. doi: 10.1590/S0034-75902009000300008
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; Siqueira, Saraiva, Carrieri, Lima, & Andrade, 2009; Siqueira & Zauli-Fellows, 2006Siqueira, M. V. S., & Zauli-Fellows, A. (2006). Diversidade e identidade gay nas organizações. Revista Eletrônica de Gestão Organizacional, 4(3), 69-81. Recuperado de https://periodicos.ufpe.br/revistas/gestaoorg/article/view/21552/18246
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), caminhando para um queerização de um campo mais conservador (Rumens, 2016Rumens, N. (2016). Towards queering the business school: A research agenda for advancing lesbian, gay, bisexual and trans perspectives and issues. Gender, Work & Organization, 23(1), 36-51. doi: 10.1111/gwao.v23.1
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; Souza, 2017Souza, E. M. de. (2017). A teoria queer e os estudos organizacionais: Revisando conceitos sobre identidade. Revista de Administração Contemporânea, 21(3), 308-326. doi: 10.1590/1982-7849rac2017150185
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; Souza & Carrieri, 2010Souza, E. M., & Carrieri, A. P. (2010). A analítica queer e seu rompimento com a concepção binária de gênero. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 46-70. doi: 10.1590/S1678-69712010000300005
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), sob hegemonia de estudos funcionais.

Exemplo disso é o estudo do corpo nas teorias organizacionais, sob enfoque teórico-crítico, como o proposto neste artigo, ao direcionar o olhar sobre o corpo enquanto estilização de si e resistência no contexto LGBTQ+ no que se refere à abjeção nas organizações, mais precisamente, “zonas ‘não-vivíveis’ e ‘inabitáveis’” por aqueles que não alcançam o reconhecimento como sujeitos (Butler, 2019aButler, J. (2019a). Corpos que importam: Os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: N1 Edições., p. 18). A própria estilização de corpos LGBTQ+ é um repensar nas relações de poder, na dominação da matriz heterossexual, do combate da heteronormatividade, possibilitando uma queerização das organizações, como compreendido por Rumens (2016)Rumens, N. (2016). Towards queering the business school: A research agenda for advancing lesbian, gay, bisexual and trans perspectives and issues. Gender, Work & Organization, 23(1), 36-51. doi: 10.1111/gwao.v23.1
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. É nesse sentido que este artigo avança em termos de debates anteriormente estabelecidos, como os apontados por Thanem (2015)Thanem, T. (2015). The body: Philosophical paradigms and organizational contributions. In R. Mir, H. Willmott, & M. Greenwood (Eds.), The Routledge Companion to philosophy in organization studies (pp. 276-284). London, UK: Routledge. ao utilizarem lente pós-estruturalista, da filosofia social feminista, marxista, fenomenológica, entre outras. Além disso, é fundamental trabalhar em estudos que reflitam no que se refere à resistência, tema não tão trabalhado em âmbito dos estudos LGBTQ+, especialmente no campo da Administração. Nesse sentido, vale fazer um registro do estudo de Castro e Siqueira (2020)Castro, G. H. C. de, & Siqueira, M. V. S. (2020). “Vão achar que é uma piada, mas, para nós, não!": Discursos de resistência em clubes brasileiros de futebol gay. Cadernos Ebape.BR, 18(4), 1058-1070. doi: 10.1590/1679-395120200097
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sobre resistência LGBT no âmbito do futebol.

Com essas considerações, este ensaio teórico está estruturado a partir da introdução. O primeiro tópico é voltado para uma análise nietzschiana do corpo, significativa para se pensar em termos de corpos LGBTQ+ em uma perspectiva não identitária e de resistência queer. No segundo tópico, resgata-se a discussão realizada por Foucault em termos do cuidado de si. Posteriormente, estabelecem-se discussões, tendo o prazer queer como ordenador, da categoria da resistência em âmbito da estetização de si. Ao final, tecem-se as considerações finais com sugestões de pesquisas futuras.

A DESMISTIFICAÇÃO NIETZSCHIANA ACERCA DO CORPO

Nietzsche é uma das principais referências filosóficas em discussões pós-modernas e no âmbito do pós-estruturalismo. No campo dos Estudos Organizacionais, o filósofo é especialmente lembrado no que se refere às suas considerações acerca do sujeito, em especial quando se analisam temáticas como a autonomia do indivíduo, postulado kantiano que é deixado de lado por Nietzsche. Indaga-se, por exemplo, no contexto teórico-crítico, quem se emancipa, considerando que o eu seja uma ficção, e que essa “diluição da substancialidade do sujeito identificado com a unidade da consciência” (Giacoia, 1998Giacoia, O. (1998). O mais oculto de todos os escondidos. Philósofos, 3(1), 107-133. doi: 10.5216/phi.v3i1.10995
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, p.113) sofra sanção crítica. Nietzsche (2005)Nietzsche, F. (2005). Além do bem e do mal. São Paulo, SP: Companhia das Letras. diz que “o que me dá o direito de falar de um Eu, até mesmo de um Eu como causa, e por fim de um Eu como causa de pensamentos?” (p. 21). E, se não há esse eu substância nem unificado, se ele é uma ficção, quem resiste e se emancipa? São questionamentos que fazem parte dos estudos queer (Rumens, 2016Rumens, N. (2016). Towards queering the business school: A research agenda for advancing lesbian, gay, bisexual and trans perspectives and issues. Gender, Work & Organization, 23(1), 36-51. doi: 10.1111/gwao.v23.1
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; Souza, 2017Souza, E. M. de. (2017). A teoria queer e os estudos organizacionais: Revisando conceitos sobre identidade. Revista de Administração Contemporânea, 21(3), 308-326. doi: 10.1590/1982-7849rac2017150185
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; Souza & Carrieri, 2010Souza, E. M., & Carrieri, A. P. (2010). A analítica queer e seu rompimento com a concepção binária de gênero. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 46-70. doi: 10.1590/S1678-69712010000300005
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), que se pautam em uma abordagem construcionista e na performance de gênero, ou seja, “dizer que o gênero é performativo implica que está culturalmente escrito e que se naturaliza na maioria dos sujeitos através da internalização psicológica e a repetição” (Alegría, 2018Alegría, J. (2018). Un Nietzsche extraño: Intersecciones entre el pensamiento nietzscheano y la teoría queer. Revista Praxis, (77), 1-19. doi: 10.15359/77.3
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, p. 14, tradução nossa).

A configuração do sujeito em Nietzsche e o grau abstrato de sua natureza estão em consonância com a teoria queer, especialmente na relação mantida com o corpo e de quem está atrás do ato, da ação, um sujeito que provém do corpo. Uma análise antiessencialista que ampara tanto o pensamento de Nietzsche quanto o de Butler (2019b)Butler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira., de um sujeito que não é pré-discursivo e que está intimamente relacionado com a noção de corpo.

Parte-se do pressuposto nietzschiano de que “a organização pulsional do corpo é regida por valores e preferências” (Salanskis, 2016Salanskis, E. (2016). Corpo (leib). In S. Marton (Org.), Dicionário Nietzsche. São Paulo, SP: Loyola. pp. 159-161., p. 160), em íntima relação com a cultura. São esses valores, normas sociais que são problematizadas em um processo de reapropriação de corpos, especificamente de corpos LGBTQ+, resistindo quanto à determinada construção cultural e como não podemos nos omitir, de retomada da vontade de potência, conceito basilar em Nietzsche. A estilização de corpos faz-se nesse contexto de resistência, tema central nesta discussão teórica que propõe o artigo, inclusive contra uma “metafísica anti-sensualista” (Nietzsche, 1998Nietzsche, F. (1998). Genealogia da moral: Uma polêmica. São Paulo, SP: Companhia das Letras., p. 24), de compreensão do vivido e do estímulo à ação, um revigorar do indivíduo em sua relação com normas e valores sociais.

A perspectiva do corpo no pensamento nietzschiano não pode ser compreendida fora do contexto de uma de suas principais contribuições filosóficas, a noção da vontade de poder, esse afeto que é afirmação da vida, de sua expansão constante, e da luta incessante de forças, de uma rede de impulsos dinâmicos, sem caráter de unidade, mas sim de multiplicidade, como exposto por Benoit (2011)Benoit, B. (2011). Nietzsche e a crítica do sujeito: por um si corporal. In A. S. Martins, H. Santiago, & L. C. Oliva (eds.), As ilusões do eu: Spinoza e Nietzsche. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira. pp. 445-467. A partir do pensamento nietzschiano, Giacoia (1998)Giacoia, O. (1998). O mais oculto de todos os escondidos. Philósofos, 3(1), 107-133. doi: 10.5216/phi.v3i1.10995
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afirma que “o mundo refratado no espelho da vontade de poder é o mundo das multiplicidades, das forças plurais em jogo constante de oposições e alianças” (p. 117). O corpo, em toda a sua pluralidade, não uniformidade, é fundamental como sustentáculo da vontade de poder.

Nietzsche (2011)Nietzsche, F. (2011). Assim falava Zaratustra. São Paulo, SP: Companhia das Letras. diz que “corpo sou eu inteiramente, e nada mais; e alma é apenas uma palavra para um algo no corpo [...] uma grande razão, uma [...] multiplicidade [...]” (p. 34). Grande razão que, como nos lembra Marton (2009)Marton, S. (2009). Do dilaceramento do sujeito à plenitude dionisíaca. Cadernos Nietzsche, 25, 53-81. doi: 10.34024/cadniet.2009.n25.7792
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, se distingue da consciência, um dos nossos instintos, que é a pequena razão. Barrenechea (2017)Barrenechea, M. (2017). Nietzsche e o corpo. Rio de Janeiro, RJ: 7 Letras. diz que a “a razão se constitui em um tirano, em um tirano hipertrofiado [...] que submete os outros [...] e desvaloriza tudo aquilo que não é racional” (p. 65). E, em âmbito dessa grande razão, afetos, instintos, vontade assumem preponderância, inclusive tendo o comando do indivíduo, deixando a razão em segundo plano, devendo esta reposicionar-se. Sua crítica da metafísica do sujeito perpassa sua hipótese metodológica da vontade de poder, um de seus principais conceitos, ao lado do além do homem, do niilismo e do eterno retorno do mesmo (Benoit, 2011Benoit, B. (2011). Nietzsche e a crítica do sujeito: por um si corporal. In A. S. Martins, H. Santiago, & L. C. Oliva (eds.), As ilusões do eu: Spinoza e Nietzsche. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira. pp. 445-467).

Nietzsche critica a dualidade mente-corpo e a substancialidade do corpo, aliás de “corpos”, que não é uma coisa ou entidade. “O filósofo alemão é contundente ao contestar todo e qualquer conceito que sustente essa suposta substancialidade do homem” (Barrenechea, 2017Barrenechea, M. (2017). Nietzsche e o corpo. Rio de Janeiro, RJ: 7 Letras., p. 16). A crítica faz-se no domínio da substancialidade e da dualidade. Rompe-se com o dualismo corpo-mente da metafísica, de Descartes e de Platão, além da onipotência da mente perante o corpo. Para Nietzsche (2011)Nietzsche, F. (2011). Assim falava Zaratustra. São Paulo, SP: Companhia das Letras., apesar de este ser um dos impulsos do homem, não é o que é central, o que está na base, este é subjugado pelo impulso da expansão da vida, da ligação à terra, à vida, à vontade de potência. Retoma-se o corpo como preponderante perante o espírito, a alma, a consciência. Resgata-se o corpo daqueles que o desprezaram e se afastaram da vida, abrindo espaço para a constituição do super-homem. O corpo não é, então, subordinado ao transcendente, perspectiva deixada de lado pelo super-homem nietzschiano, afirmando sua filiação à terra, onde, mesmo sofrendo, ele ali permanece, aceitando a vida como ela é. Segundo Nietzsche (2011)Nietzsche, F. (2011). Assim falava Zaratustra. São Paulo, SP: Companhia das Letras., “foram os doentes e moribundos que desprezaram corpo e terra e inventaram as coisas celestiais [...]” (p. 33). É querer o nada, diferente do nada querer, ou seja, “desejar viver num futuro ideal num hipotético mundo perfeito. Querer o nada é querer o além, querer a ilusão, a vida utópica” (Barrenechea, 2017Barrenechea, M. (2017). Nietzsche e o corpo. Rio de Janeiro, RJ: 7 Letras., p. 35). Enquanto o nada querer relaciona-se à abertura à vida, ao desconhecido, ao inusitado, o querer o nada é o distanciar-se da vida. E esse último é inerente ao ideal ascético discutido por Nietzsche (1998)Nietzsche, F. (1998). Genealogia da moral: Uma polêmica. São Paulo, SP: Companhia das Letras..

A subjetividade, definida pelo corpo, depara-se com essa descentralização da perspectiva coerente e unitária do pretenso sujeito, sem indivíduos, o que é significativo para nosso estudo, especialmente em termos da relação do corpo com esse cuidado de si, de que nos fala Foucault (2001b)Foucault, M. (2001b). História da sexualidade 2: O uso dos prazeres. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal., e a possibilidade de se discutir a estilização de si. Ela passa a ser “entendida a partir da ‘estrutura social de impulsos e afetos’, ou ainda como ‘hierarquia de muitas almas’ concebida segundo o fio condutor do corpo” (Giacoia, 1998Giacoia, O. (1998). O mais oculto de todos os escondidos. Philósofos, 3(1), 107-133. doi: 10.5216/phi.v3i1.10995
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, p. 129). Nega-se o sujeito pelo pensamento, princípio cartesiano, que se reduz à representação de impulsos profundos do Si-mesmo, do corpo (Giacoia, 1998Giacoia, O. (1998). O mais oculto de todos os escondidos. Philósofos, 3(1), 107-133. doi: 10.5216/phi.v3i1.10995
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; Benoit, 2011Benoit, B. (2011). Nietzsche e a crítica do sujeito: por um si corporal. In A. S. Martins, H. Santiago, & L. C. Oliva (eds.), As ilusões do eu: Spinoza e Nietzsche. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira. pp. 445-467).

Em termos dessa dualidade discutida neste estudo, “com a modernidade, procedeu-se à implosão do ser humano - e foi ele dividido em razão e paixões, intelecto e sentidos, consciência e instintos” (Marton, 2009Marton, S. (2009). Do dilaceramento do sujeito à plenitude dionisíaca. Cadernos Nietzsche, 25, 53-81. doi: 10.34024/cadniet.2009.n25.7792
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, p. 58). E sempre com o domínio do primeiro sobre o segundo. Nietzsche (2011Nietzsche, F. (2011). Assim falava Zaratustra. São Paulo, SP: Companhia das Letras., p. 35) reinterpreta tal perspectiva, evidenciando o domínio do Si-mesmo, que está no corpo, é o corpo, exercendo domínio quanto à ficção de um eu unificado e estável, e estando na base de todos os nossos afetos. Barrenechea (2017)Barrenechea, M. (2017). Nietzsche e o corpo. Rio de Janeiro, RJ: 7 Letras., por sua vez, diz que “o homem autodenomina-se eu já que acredita que a sucessão de seus estados psicológicos demonstraria a existência de um substrato subjetivo: uma substância-eu que possuiria uma continuidade através do tempo” (p. 48). E sua crítica do sujeito continua, considerando-o “arrogante, o eu acredita conhecer tudo o que se passa no corpo” (Marton, 2009Marton, S. (2009). Do dilaceramento do sujeito à plenitude dionisíaca. Cadernos Nietzsche, 25, 53-81. doi: 10.34024/cadniet.2009.n25.7792
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, p. 63).

Entretanto, vemos, por meio de Zaratustra, o corpo tomando espaço do sujeito. É o que Barrenechea (2017)Barrenechea, M. (2017). Nietzsche e o corpo. Rio de Janeiro, RJ: 7 Letras. reforça: “o corpo é um fio condutor que permite descer às profundezas do homem para detectar os impulsos inconscientes que estão na base de todos os pensamentos” (p. 24). Uma relação de forças em contínuo embate, segundo ele. Na verdade, Nietzsche tem a perspectiva de que, atrás do pensamento, estão presentes o afeto, a paixão, mais profundos do que o primeiro - inclusive da vontade de potência, que é externalizada, em termos dos impulsos pelo afeto. Dessa forma, ele mantém sua posição contrária ao dualismo - racionalidade e paixão; não que esta deva ser, porém, fanaticamente aceita, mas também não seria eliminada, em um desprezo pelo corpo, mas compreendida, interpretada, controlada (Wotling, 2003Wotling, P. (2003). As paixões repensadas: Axiologia e afetividade no pensamento de Nietzsche. Cadernos Nietzsche, 15, 7-29. doi: 10.34024/cadniet.2003.n15.7839
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).

Nesse reposicionamento de pensamento e corpo, o querer também é problematizado. Nietzsche (2005)Nietzsche, F. (2005). Além do bem e do mal. São Paulo, SP: Companhia das Letras. diz que, no âmbito do querer, há um pensamento por trás dessa vontade, um afeto de comando. E como o Si-mesmo é em si uma multiplicidade de afetos, “um homem que quer - comanda algo dentro de si que obedece, ou que ele acredita que obedece” (p. 23). É o contexto de uma pluralidade de afetos, tanto de dominação quanto de resistência.

É nesse sentido que Nietzsche (2005)Nietzsche, F. (2005). Além do bem e do mal. São Paulo, SP: Companhia das Letras. diz que livre-arbítrio “é a expressão para o multiforme estado de prazer do querente, que ordena e ao mesmo tempo se identifica com o executor da ordem - que como tal, goza também do triunfo sobre as resistências, mas pensa consigo que foi sua vontade que as superou” (p. 24). Tal aforismo nietzschiano é relevante para se lembrar que a organização realizada pelo indivíduo de seus desejos, na busca em tornar-se o que se é (Butler, 2019bButler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.), e que eclode em alguma ação específica, como a de evidenciar o corpo, de modo diverso do padrão cultural e socialmente estabelecido, não seria fruto de livre-arbítrio, mas do advento de afeto, que naquele momento específico transborda e domina.

A resistência identifica-se em dois sentidos: o primeiro em termos de afetos que são dominados no contexto do Si-mesmo, e a resistência quanto a construções sociais institucionalmente estabelecidas, inclusive em termos de desprezo do corpo. Resistência perante a repressão, não que esta seja preponderante, a verificar a análise crítica foucaultiana da hipótese repressiva. Temos aí o cuidado de si (Foucault, 2001bFoucault, M. (2001b). História da sexualidade 2: O uso dos prazeres. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.), criando seres performaticamente, mas sem a presença do agente, apenas a ação é valorizada; como desenvolvido por Nietzsche (1998)Nietzsche, F. (1998). Genealogia da moral: Uma polêmica. São Paulo, SP: Companhia das Letras., “[...] não existe ser por trás do fazer, do atuar, do devir; o ‘agente’ é uma ficção acrescentada à ação. A ação é tudo” (p. 36).

ESTILIZAÇÃO E O CUIDADO DE SI EM FOUCAULT

O corpo tem em Foucault (1985Foucault, M. (1985). História da sexualidade 3: O cuidado de si. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal., 1987Foucault, M. (1987). Vigiar e punir: Nascimento da prisão. Petrópolis, RJ: Vozes., 2001aFoucault, M. (2001a). História da sexualidade 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal., 2001bFoucault, M. (2001b). História da sexualidade 2: O uso dos prazeres. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.) uma dimensão política ímpar, e é analisado no âmbito da economia do poder, por ela captar corpos em sua materialidade, forças, energias, sensações e prazeres. O corpo não é “uma coisa ou substância, mas a criação contínua de eventos ou acontecimentos” (Souza et al., 2015Souza, E. M. de, Costa, A. S. M., & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: Ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos Ebape.BR, 13(4), 727-742. doi: 10.1590/1679-395118624
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, p. 735). Pode ser um corpo supliciado, que necessita ser exposto publicamente, tanto como demonstração de força quanto para inibição de crimes que lesam o soberano, em uma lógica da verdade. E que só sai de cena como personagem principal, a partir dos séculos XVIII, XIX, quando a punição de crimes não precisa mais utilizar o corpo, mas a representação, com as questões das sexualidades dissidentes. As dimensões da alma e da paixão adentram tal universo.

É nesse movimento que os corpos passam a ser compreendidos como discursivamente produzidos e frutos de construção social. Para Souza et al. (2015)Souza, E. M. de, Costa, A. S. M., & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: Ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos Ebape.BR, 13(4), 727-742. doi: 10.1590/1679-395118624
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, o corpo é organizado e se constitui pelo organizing, não existe a priori ou pré-discursivamente, mas é uma verdade construída e propagada socialmente. Assim, não há corpos livres, pois nenhuma performance é livre, até mesmo os corpos LGBTQ+, constantemente questionados no âmbito social e organizacional. Há relações de poder que operam sobre o ordenamento e constituição de corpos, subjetividades e sentidos, muito além dos limites fronteirísticos organizacionais, o que alcança todo o corpo social. No âmbito das organizações, a potencialidade do organizing tende a envolver e vincular corpos as construções culturais, permeadas por normas e valores que pretendem a homogeneização dos modos de ser e agir no ambiente organizacional.

Por outro lado, o corpo pode ser construído de modo a se resistir a padrões preestabelecidos no âmbito cultural. Essas resistências coadunam-se com a reapropriação de nossos corpos, de construí-los metaforicamente como esculturas, a partir da organização do desejo e das expectativas de prazer. Essas vivências de resistência podem criativamente inspirar atos similares por outros corpos nas organizações. Estilização de corpos, que se produzem influenciados ou não de modo mais significativo, pelo cuidado de si (Foucault, 2001bFoucault, M. (2001b). História da sexualidade 2: O uso dos prazeres. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.). Rompe-se na prática com o dualismo corpo-mente, levando-os à ressignificação, inclusive no contexto organizacional. Um exemplo disso nas organizações seria o rompimento com a funcionalidade da heteronormatividade, que, segundo Priola, Lasio, Serri, e Simone (2018)Priola, V., Lasio, D., Serri, F., & Simone, S. De. (2018). The organisation of sexuality and the sexuality of organisation: A genealogical analysis of sexual “inclusive exclusion” at work. Organization, 00(0), 1-23. doi: 10.1177/1350508418790140
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, modera os processos de inclusão, recria hierarquias e binarismos entre indivíduos LGBTQ+ ao incluir e normalizar alguns trabalhadores LGBTQ+, enquanto outros permanecem excluídos por exibirem a diversidade não conforme com as normas.

A resistência abre possibilidades para a subversão e descontinuidade da normas. O corpo, produzido por discurso e significado no discurso, desfaz-se diante das prisões sociais, das coerções linguísticas e normativas (Butler, 2019bButler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.; Foucault, 2001aFoucault, M. (2001a). História da sexualidade 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.). A intenção da subversão não é negar a materialidade dos corpos. Aquilo “que constitui a fixidez do corpo, seus contornos, seus movimentos”, e que o faz material (Butler, 2019bButler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.), mas perceber como as práticas discursivas fazem com que o corpo se converta em definidor de gênero e sexualidade. Corpos que transgridem as normas, expressam alternativas de identidade de gênero. Isso faz parte do processo de desinteriorização de um discurso assumido historicamente e socialmente como verdade. É a reiteração do corpo como meio de expressão de identidade e resistência (Thanem, 2015Thanem, T. (2015). The body: Philosophical paradigms and organizational contributions. In R. Mir, H. Willmott, & M. Greenwood (Eds.), The Routledge Companion to philosophy in organization studies (pp. 276-284). London, UK: Routledge.), ou seja, como parte do processo de estilização.

E uma das discussões que colaboram para a compreensão do processo de estilização refere-se às análises realizadas por Foucault (1985Foucault, M. (1985). História da sexualidade 3: O cuidado de si. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal., 2001bFoucault, M. (2001b). História da sexualidade 2: O uso dos prazeres. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.) quanto ao cuidado de si, em consonância com o uso dos prazeres, uma de suas últimas discussões. Problematização essa que se estabelece a partir do instável cenário sociopolítico helenístico, em que se voltar a si mesmo poderia representar a maneira de se lidar com todas essas transformações, e constituir-se enquanto singularidade.

Halperin (2015Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata., tradução nossa), comentador da obra de Foucault no âmbito LGBTQ+, diz que essa arte de viver “era uma prática ética que consistia em impor livremente à sua própria vida a forma distintiva e um estilo individual, transformando-se a si mesmo, segundo sua própria concepção da beleza ou valor” (p. 91), longe de uma lei interditora, inclusive quanto à economia dos prazeres. Cabe salientar, a partir da perspectiva nietzschiana, que essa construção estética não é autorreflexão do espírito, e sim um reposicionamento do corpo e de seus afetos e impulsos, sem, contudo, depreciar a consciência, mas a de também reposicioná-la em relação ao corpo - a grande razão, e seus complexos pulsionais (Giacoia, 1998Giacoia, O. (1998). O mais oculto de todos os escondidos. Philósofos, 3(1), 107-133. doi: 10.5216/phi.v3i1.10995
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).

A análise da estilização de si passa pela compreensão, em termos genealógicos, da análise de corpo e alma, enquanto objetos de determinação de instâncias de poder, que definem, sistematizam e produzem formas julgadas adequadas para a manutenção da serenidade da alma e da saúde do corpo, e principalmente para uma autonomia pessoal. E, como nos lembra Halperin (2015)Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata., essa estilística não é algo de fundo psicológico ou místico, mas uma estratégia de se ter mais domínio sobre si, um local de alteridade radical. O foco é o prazer, o gozo, e não o desejo, serenidade e domínio de si. Reapropriação e satisfação de si mesmo. O sim à vida relaciona-se intimamente com essa satisfação consigo (Nietzsche, 2012Nietzsche, F. (2012). A gaia ciência. São Paulo, SP: Companhia das Letras.).

Foucault (1985)Foucault, M. (1985). História da sexualidade 3: O cuidado de si. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal. afirma que essa arte de cuidar de si está longe da perspectiva negativa do prazer sexual e do estabelecimento da lei e de normas que conduzem o desejo, mas é essa realidade que se implantará ao longo dos séculos que se seguem. Ressalta-se, entretanto, que, mesmo de modo disperso, identificam-se códigos de conduta sexual, que serviriam de referência no cotidiano das relações sociais. Trata-se, então, de elementos de uma moral dos prazeres, muito mais da autorregulação do que da proibição ou normalização, à qual remete Foucault (1985)Foucault, M. (1985). História da sexualidade 3: O cuidado de si. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal..

Halperin (2015)Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata. analisa esse período dos escritos de Foucault, em que a preocupação se detém nessa relação consigo mesmo, tendo como pano de fundo a discussão da sexualidade, em especial da sexualidade gay. Nesse contexto, a homossexualidade seria uma “posição marginal situada estrategicamente desde a qual é possível entrever e desenvolver novas formas de relações com si mesmo e com os outros” (Halperin, 2015Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata., p. 89, tradução nossa). E tal atitude poderia estabelecer uma subcultura voltada para essa estilização de si, não voltada para sistemas normalizadores morais da contemporaneidade, mas para o delineamento de formas originais de vida. Corpos que resistem e se encontram em uma multiplicidade de relações.

Na verdade, o corpo está aberto à alteridade, o “eu vislumbrado de forma nova como si corporal [...] capaz de surgir um indivíduo coletivo, esse sujeito aberto ou estruturalmente relacional está pois, ele mesmo apenas saindo da unidade fechada na qual a metafísica enquanto fúria atomista o tinha enclausurado” (Benoit, 2011Benoit, B. (2011). Nietzsche e a crítica do sujeito: por um si corporal. In A. S. Martins, H. Santiago, & L. C. Oliva (eds.), As ilusões do eu: Spinoza e Nietzsche. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira. pp. 445-467, p. 460). Baseando-se na análise da metafísica do sujeito nietzschiano, Benoit (2011)Benoit, B. (2011). Nietzsche e a crítica do sujeito: por um si corporal. In A. S. Martins, H. Santiago, & L. C. Oliva (eds.), As ilusões do eu: Spinoza e Nietzsche. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira. pp. 445-467 diz que “o devir é caracterizado como jogos pulsionais múltiplos, o que pode, na falta de coisa melhor, dar a pensar em diferentes tipos de vontade de poder” (p. 454). Nesse sentido, o homossexual estaria em constante processo de reorganização, das pulsões, de seus desejos, como analisado por Butler (2019b)Butler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira., que também tem em Nietzsche um de seus fundamentos.

É nesse sentido que se fala, em termos da vertente queer em âmbito das relações sociais, de elementos da teoria queer representativos, para a reelaboração das normas sociais e o reposicionamento do sujeito perante as instituições (Perreau, 2018Perreau, B. (2018). Qui a peur de la théorie queer? Paris, France: Presses de Sciences Po.). Não é uma mudança em direção à desordem ou desorganização, mas em busca da resistência, a partir da abertura ao desejo, desafiando o status organizacional que envolve os modos de vida organizados (Thanem, 2004Thanem, T. (2004). The body without organs: Nonorganizational desire in organizational life. Culture and Organization, 10(3), 203-217. doi: 10.1080/14759550412331297147
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), ou seja, desafiando os processos de organizing (Souza et al., 2015Souza, E. M. de, Costa, A. S. M., & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: Ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos Ebape.BR, 13(4), 727-742. doi: 10.1590/1679-395118624
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).

Tudo isso ao menos em nível teórico, pois no cotidiano, no que se refere à cultura LGBTQ+, acaba-se por se reproduzirem mecanismos de assujeitamento, de preconceito e de discriminação, como a presença de gays negros ou muçulmanos em locais frequentados majoritariamente por gays brancos (Perreau, 2018Perreau, B. (2018). Qui a peur de la théorie queer? Paris, France: Presses de Sciences Po.). O mesmo quando se tomam pessoas trans como exemplo, ou gays afeminados ou lésbicas masculinizadas (Carrieri et al., 2014Carrieri, A. P., Souza, E. M., & Aguiar, A. R. C. (2014). Trabalho, violência e sexualidade: Estudo de lésbicas, travestis e transexuais. Revista de Administração Contemporânea, 18(1), 78-95. doi: 10.1590/S1415-65552014000100006
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; Irigaray & Freitas, 2011Irigaray, H. A. R., & Freitas, M. E. (2011). Sexualidade e organizações: Estudo sobre lésbicas no ambiente de trabalho. Organizações & Sociedade, 18(59), 14-31. doi: 10.1590/S1984-92302011000400004
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). Perde-se, portanto, a oportunidade de se modificarem as relações com o outro, essencial no processo de estetização, que o LGBTQ+ teria a possibilidade de edificar de modo mais contundente. E também no que se refere ao homoliberalismo, no sentido de um comungar com uma lógica de gestão, de relações de trabalho, excludentes e que poderiam ser pensadas à luz de elementos teórico-críticos, tais como a resistência, hegemonia, poder, assujeitamento e emancipação (Siqueira, Medeiros, Silva, & Castro, 2020Siqueira, M. V. S., Medeiros, B. N., Silva, D. W. G. da, & Castro, G. H. C. de. (2020, novembro). A ascensão do imaginário político conservador entre gays na contemporaneidade. Anais do SEMEAD, São Paulo, SP, 23.). São essas práticas que poderiam ser inspiradas pelo corpo LGBTQ+.

Nesse sentido, é mister mencionar que corpos LGBTQ+ não representam obrigatoriamente uma nova configuração de normas e valores sociais, mas tantas vezes reforçam as já existentes e corroídas, incarnando a truculência e a falta de empatia junto ao outro, negando a diferença que o constitui. Menciona-se, ainda, que a resistência não se faz unicamente no campo individual, mas sobretudo no coletivo, em um redirecionamento das relações sociais, do fomento ao gosto pela alteridade e da valorização da democracia. Corpos entendidos democraticamente, não classificados, uma multiplicidade de corpos análoga à natureza múltipla do corpo nietzschiano (Nietzsche, 2011Nietzsche, F. (2011). Assim falava Zaratustra. São Paulo, SP: Companhia das Letras.). Pode-se, por fim, também retomar contundentemente o conceito de Preciado (2011)Preciado, B. (2011). Multidões queer: Notas para uma política dos "anormais". Revista de Estudos Feministas, 19(1), 11-20. doi: 10.1590/S0104-026X2011000100002
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de multidões queer e toda a sua riqueza de corpos.

Já iniciando a discussão mais específica de resistências e corpos LGBTQ+ do próximo tópico, é necessário mencionar sobre tensões inerentes tanto no que se refere ao contexto dos grupos pertencentes a essa sigla quanto no debate identitário e pós-identitário. Primeiramente, é necessário esclarecer que a aglutinação de vários grupos sociais em uma sigla particular não explicita a homogeneização desses segmentos, tão diversos entre si, apesar de termos um fio condutor, especialmente no que se refere à violência moral (Siqueira et al., 2009Siqueira, M. V. S., Saraiva, L. A. S., Carrieri, A. de P., Lima, H. K. B. de., & Andrade, A. J. de A. (2009). Homofobia e violência moral no trabalho no Distrito Federal. Organização e Sociedade, 16(50), 447-461. doi: 10.1590/S1984-92302009000300003
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), que viabiliza a ação política tanto nas organizações quanto no contexto social. Um exemplo refere-se às tensões entre homens gays e mulheres lésbicas em grupos ativistas LGBTQ+, levando a rompimentos em função da falta de compreensão das especificidades de cada grupo. A realidade de uma pessoa trans, por exemplo, é tão singular, que faz com que, muitas vezes, esta tenha dificuldade em compartilhar experiências com um indivíduo gay (Colling, 2015Colling, L. (2015). Que os outros sejam o normal: Tensões entre movimento LGBT e ativismo queer. Salvador, BA: EDUFBA.). O indivíduo bissexual tem seus receios quanto aos preconceitos de gays que o tomam como promíscuo ou como alguém que ainda não aceitou que é de fato gay (Köllen, 2013Köllen, T. (2013). Bisexuality and diversity management: Addressing the B in LGBT as a relevant ‘sexual orientation’ in the workplace. Journal of Bisexuality, 13(1), 122-137. doi: 10.1080/15299716.2013.755728
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). O queer, em sua perspectiva pós-identitária, com foco aguçado em questões como normas e regulações sociais, que frequentemente omite-se quanto ao histórico de conquistas do movimento identitário gay, como a luta contra a AIDS, realizada pelo Act Up nas décadas de 1980 e de 1990 (Perreau, 2018Perreau, B. (2018). Qui a peur de la théorie queer? Paris, France: Presses de Sciences Po.). São tensões ainda mais profundas, que remontam às próprias discussões referentes ao essencialismo e ao construcionismo social, em suas diversas perspectivas, às discussões acerca da interseccionalidade, da categorização e da representação política (Butler, 2019aButler, J. (2019a). Corpos que importam: Os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: N1 Edições., 2019bButler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.).

CORPOS LGBTQ+, RESISTÊNCIAS E TRANSFORMAÇÃO DE SI

O presente artigo trabalha com a premissa de que a resistência à normalização, à disciplina de corpos, possibilita, a partir do potencial transformador, ampliar, para fora do domínio da sexualidade e da expressão de gênero, o estabelecimento de novas relações com o outro. Essas resistências ressoam inclusive em âmbito político nos diversos níveis institucionais. Claro que a resistência faz parte do poder, está inserida nas relações de poder, que aliás não existiriam sem ela, como nos coloca Foucault (2004)Foucault, M. (2004). Michel Foucault, uma entrevista: Sexo, poder e a política da identidade. Verve, (5), 260-277.: “se não há resistência, não há relações de poder. Porque tudo seria simplesmente uma questão de obediência” (p. 268). Nesse sentido, o próprio poder exige a resistência, como nos recorda Souza (2014)Souza, E. M. (2014). Poder, diferença e subjetividade: A problematização do normal. Farol - Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade, 1(1), 103-143. doi: 10.25113/farol.v1i1.2556
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, a partir da perspectiva foucaultiana, ou seja, certo nível de liberdade, desde que controlada e vigiada, é necessário até mesmo para o desenvolvimento desse poder, não cabendo, como bem menciona o autor, o estabelecimento de estratégias ou a pretensão de hegemonia.

Halperin (2015)Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata. enumera modalidades de resistência, no bojo de suas leituras foucaultianas, tais como: apropriação criativa e ressignificação, apropriação e teatralização e exposição e desmitificação. A primeira refere-se à reapropriação da linguagem, como na própria retomada do termo queer, como origem de um modo de se pensar e viver; o segundo diz respeito a paródias, por exemplo, e o terceiro como modalidade de desnaturalização, do desenvolvimento do conhecimento a partir da desconstrução discursiva. Esse último elemento poderia ser tomado também a partir do reposicionamento do homossexual de objeto para sujeito. O sexo queer possibilitaria uma nova relação com o corpo, dessexualizando-o, permitindo que o prazer não esteja centralizado no órgão sexual, mas ao longo do corpo.

Foucault (2004)Foucault, M. (2004). Michel Foucault, uma entrevista: Sexo, poder e a política da identidade. Verve, (5), 260-277. diz: “Eu acredito que temos uma forma de criação, de depósito de criatividade, dos quais a principal característica é o que chamo de dessexualização do prazer” (p. 264). Tais práticas permitem resistir diante das disciplinas da sexualidade, como mencionado por Halperin (2015)Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata.. Para isso, é necessário se compreender, a priori, a própria natureza desse dispositivo. De acordo com Foucault (2015)Foucault, M. (2015). O saber gay. Revista Ecopolítica, (11), 2-27. Recuperado de https://revistas.pucsp.br/index.php/ecopolitica/article/view/23545
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, “há todo um psicologismo da sexualidade, todo um biologismo da sexualidade e, consequentemente, toda uma captura possível dessa sexualidade por médicos, por psicólogos, pelas instâncias da normalização” (p. 5).

Nesse contexto, Foucault (2004)Foucault, M. (2004). Michel Foucault, uma entrevista: Sexo, poder e a política da identidade. Verve, (5), 260-277. diz que “o sexo não é uma fatalidade; ele é uma possibilidade de aceder a uma vida criativa” (p. 260). E a resistência faz-se não apenas em nível do individual, mas também coletivo, são pontos que podem configurar-se em uma revolução (Foucault, 2001aFoucault, M. (2001a). História da sexualidade 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal., 2001bFoucault, M. (2001b). História da sexualidade 2: O uso dos prazeres. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.). E o LGBTQ+, em seu contínuo processo de construção, um devir incessante em tornar-se, poderia constituir-se em lócus privilegiado dessas mudanças, especialmente em uma sociedade que tem no sexo o seu principal discurso, produzindo corpos e sexualidades. No momento em que o sexo é politizado, ampliam-se os espaços para a problematização da normalização e da disciplina, inclusive em termos da sexualidade.

Corpos estranhos, queer, podem configurar-se nesses pontos de mudança, de reordenamento de relações sociais, inclusive no contexto organizacional (Rumens, 2016Rumens, N. (2016). Towards queering the business school: A research agenda for advancing lesbian, gay, bisexual and trans perspectives and issues. Gender, Work & Organization, 23(1), 36-51. doi: 10.1111/gwao.v23.1
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; Souza, 2017Souza, E. M. de. (2017). A teoria queer e os estudos organizacionais: Revisando conceitos sobre identidade. Revista de Administração Contemporânea, 21(3), 308-326. doi: 10.1590/1982-7849rac2017150185
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; Souza & Carrieri, 2010Souza, E. M., & Carrieri, A. P. (2010). A analítica queer e seu rompimento com a concepção binária de gênero. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 46-70. doi: 10.1590/S1678-69712010000300005
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). Segundo Foucault (1981Foucault, M. (Abril, 1981). Da amizade como modo de vida. De l'amitié comme mode de vie. Entrevista de Michel Foucault a R. de Ceccaty, J. Danet e J. le Bitoux. Gai Pied, (25), 38-39. Recuperado de http://michel-foucault.weebly.com/uploads/1/3/2/1/13213792/amizade.pdf
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, 2004Foucault, M. (2004). Michel Foucault, uma entrevista: Sexo, poder e a política da identidade. Verve, (5), 260-277.), criamos a liberdade, o pensar de um novo modo de vida, a partir de perspectivas relacionais. Podemos usar a sexualidade, assim como a não fixidez, a fluidez de gênero, para se chegar à multiplicidade de relações. E ainda, refletindo quanto à dificuldade em termos de aceitação social da homossexualidade, que transcende o ato em si, incidindo no modo como o indivíduo estabelece sua vida, Foucault (1981)Foucault, M. (Abril, 1981). Da amizade como modo de vida. De l'amitié comme mode de vie. Entrevista de Michel Foucault a R. de Ceccaty, J. Danet e J. le Bitoux. Gai Pied, (25), 38-39. Recuperado de http://michel-foucault.weebly.com/uploads/1/3/2/1/13213792/amizade.pdf
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diz que “os códigos institucionais não podem validar estas relações das intensidades múltiplas, das cores variáveis, dos movimentos imperceptíveis, das formas que se modificam [...]” (p. 39). Antes de tudo, é a dificuldade em lidar com a incerteza, com a fragilidade das relações e das mudanças que naturalmente daí se estabelecem.

Vale dizer, entretanto, que Foucault, em termos da problematização da categoria da resistência, não queria cair no mesmo domínio normativo, objeto de crítica sistemática. Em função disso, como menciona Halperin (2015Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata., tradução nossa), ele “se nega a codificar as práticas de resistência, muito menos a ajudar em sua institucionalização” (p. 135). Nesse sentido, há de se ter atenção para não estar inserido, ao se pensar em práticas de resistência, na mesma lógica de dominação do opressor. A estetização de si está imbricada com a compreensão que temos da resistência, tanto em termos individuais quanto coletivos. Um cultivo de si “que transcende o si” (Halperin, 2015Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata., p. 126, tradução nossa). Descentrarmos e abrirmos para o outro, o gosto pela alteridade.

É nesse sentido que a resistência compreendida a partir de um aporte de transformação de si problematiza normas sociais e nos reposiciona diante delas, reelaborando-as. Um processo que se caracteriza pela criatividade, alegria, risco, inusitado e excitante. Esse é o contexto da possível emancipação, não considerada em âmbito absoluto, tampouco utópico, mas fazendo uso de brechas civilizatórias. Um reordenamento das relações que podem não se restringir à cultura LGBTQ+, e que inspira novos modos de existência (Halperin, 2015Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata., p. 123, tradução nossa), além da ampliação das modalidades relacionais. Segundo o autor, “o futuro que Foucault imaginava para nós, não é exclusivamente ou categoricamente gay. Porém, é definitivamente queer”. Não-contínuo, não-natural, não-essencial, não-elementar, interrompendo toda possibilidade de coerência que prende corpos, gênero, sexo e sexualidade. Afinal, não há limites no processo de identificação - no modo de ser, agir e representar -, frente ao “processo de ordenamento (organizing) que não se limita somente às fronteiras de uma empresa”, mas direciona corpos e mentes a um comportamento ordenado (Souza et al., 2015Souza, E. M. de, Costa, A. S. M., & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: Ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos Ebape.BR, 13(4), 727-742. doi: 10.1590/1679-395118624
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, p. 733).

Dessa forma, a resistência deixa de enfatizar o movimento político igualitário e direciona-se à transformação de si, tendo o prazer e a descentralização identitária como norte a ser seguido (Butler, 2019aButler, J. (2019a). Corpos que importam: Os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: N1 Edições., 2019bButler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.). Há de se ressaltar, entretanto, que tal configuração coexistira com a própria apropriação do indivíduo inserido em uma cultura LGBTQ+ pela normalização de condutas e homogeneização de vivências, que reforçam modos de vida, e não apenas reforçam a produção de leis que regulam o prazer, mas também assumem perspectivas ideológicas mantenedoras do status quo das relações sociais em âmbito da exploração econômica, e no conformismo perante o poder produtor, de regulação do prazer sexual. A resistência em âmbito do corpo extrapola os limites da sexualidade e das expressões de gênero, tendo o potencial transformador em outras instâncias e na relação do indivíduo com as instituições. É o largar-se de si mesmo, o lançar-se na incerteza e no inusitado, e, de certo modo, estar coerente com a própria multiplicidade característica dos corpos. Abre-se caminho para a criatividade e novas formas de afeto. A resistência, dessa maneira, surgiria do corpo, e de todas as relações de força que o atravessam, isso em uma perspectiva nietzschiana. São afetos e sentimentos na lógica do prazer, que ampara o processo de estilização do indivíduo LGBTQ+, rompendo com a própria concepção da sexualidade, apregoada em sua dimensão normalizadora (Foucault, 2015Foucault, M. (2015). O saber gay. Revista Ecopolítica, (11), 2-27. Recuperado de https://revistas.pucsp.br/index.php/ecopolitica/article/view/23545
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).

A estilização de si representa o trabalho cotidiano de rupturas sociais e psíquicas. É o cuidado de si, que Foucault (1985Foucault, M. (1985). História da sexualidade 3: O cuidado de si. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal., 2001aFoucault, M. (2001a). História da sexualidade 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.) retoma dos gregos antigos e passa a ser significativo em âmbito moderno, sem as devidas transposições ou reduções. Um exercício de liberdade, como mencionado por Halperin (2015)Halperin, D. (2015). San Foucault: Para una hagiografía gay. Buenos Aires, Argentina: El Cuenco de Plata. em suas análises foucaultianas, a estética da existência. Forças que podem ser compreendidas, à luz da vontade de poder de Nietzsche, da afirmação da vida, da multiplicidade e contradições vivenciadas nos corpos, que se fazem, se constroem criativamente, como nos relembra Foucault (2004)Foucault, M. (2004). Michel Foucault, uma entrevista: Sexo, poder e a política da identidade. Verve, (5), 260-277..

É buscar novas formas de vida, ter no prazer um aliado, até mesmo para a conquista de novos prazeres. E a identidade, mesmo a homossexual, não pode representar uma resistência, das próprias resistências inerentes a essa estetização. Nesse contexto pós-identitário, abrem-se espaços para o reordenamento do desejo, de novas organizações de impulsos e afetos, que, longe de nos estabilizar, nos dinamizam e ampliam nosso desejo em viver e resistir.

Nas organizações, o corpo desejante é capaz de exceder os mecanismos de ordem, controle, disciplina e normalidade em um contexto de suposta estabilidade organizacional. Torna-se poderoso diante da homogeneização, propondo diversidade radical no local de trabalho. Em vez de considerar a organização como poderosa, a resistência (não em direção à desordem ou desorganização) no campo organizacional pode incentivar as pessoas a mudarem de hábito dentro e fora do trabalho (Thanem, 2004Thanem, T. (2004). The body without organs: Nonorganizational desire in organizational life. Culture and Organization, 10(3), 203-217. doi: 10.1080/14759550412331297147
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), desafiarem ordens discursivas, de saber e poder (Foucault, 2001aFoucault, M. (2001a). História da sexualidade 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro, RJ: Edições Graal.), e não expressarem a estetização de si na grade de um padrão original, de corpos “normais” e comuns”.

Como dito por Butler (2019b)Butler, J. (2019b). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira. “os estilos têm uma história, e suas histórias condicionam e limitam suas possibilidades” (p. 240). O corpo é marcado de história, e a história arruína o corpo (Foucault, 2019Foucault, M. (2019). Microfísica do poder. Rio de Janeiro, RJ/São Paulo, SP: Paz e Terra.). Uma ressignificação e reconstrução da história talvez seja importante para uma nova leitura do corpo, da cultura e das práticas organizacionais, a exemplo de pesquisa apresentada por Flores-Pereira (2010)Flores-Pereira, M. T. (2010). Corpo, pessoa e organizações. Organizações & Sociedade, 17(54), 417-438. doi: 10.1590/S1984-92302010000300002
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, em que o corpo revela-se como símbolo de relações socioculturais em determinada organização.

Abre-se campo de disputa ao colocar em ação, movimento, e funcionar por meio de uma rede de poder. Afinal, o corpo, segundo Preciado (2014)Preciado, B. (2014). Manifesto contrassexual: Práticas subversivas de identidade sexual. São Paulo, SP: N-1 Edições., é lugar de resistência, não é passivo. É dotado de condição política, é falante, ativo, e pode escapar de todas as significações que lhe são impostas dentro da matriz normativa apregoada pelo sistema heterocentrado. A resistência, portanto, está no campo da contraprodutividade, ou seja, na produção de novas formas de saber-prazer alternativas à sexualidade moderna e à pluralidade das expressões de gênero. Reforça-se o poder dos desvios, derivações e mudanças discursivas. E, por mais que as organizações diminuam as oportunidades de fazer isso, Thanem (2015)Thanem, T. (2015). The body: Philosophical paradigms and organizational contributions. In R. Mir, H. Willmott, & M. Greenwood (Eds.), The Routledge Companion to philosophy in organization studies (pp. 276-284). London, UK: Routledge. afirma que devemos nos esforçar para subverter tais poderes ao exercermos nossas capacidades corporais em conjunto com os outros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho refletiu sobre a estilização de si e resistência no contexto LGBTQ+ diante dos estranhamentos advindos das culturas organizacionais, pouco abertas à valorização das diversidades e diferenças. Buscou-se ampliar o conhecimento sobre corpos LGBTQ+ no âmbito dos processos de organizing, ao apropriarem-se da potencialidade da resistência.

No universo organizacional, a sexualidade é evitada, e as diversas expressões de gênero são censuradas. Discutir sobre diversidade sexual causa temor, é algo visto como da ordem privada. Corpos podem ser vistos como masculinos e femininos, como representações de virilidade ou de feminilidade, de arrojo ou de doçura; mas não como corpos sexualizados, não para o erotismo, e não para expressões de gênero que ultrapassam as normas binárias. É desse modo que corpos são submetidos ao poder, mas não são completamente dominados, existindo, assim, a possibilidade de mudança. Considerando que a resistência se faz presente no contexto do próprio poder que ela auxilia a construir, há sempre a possibilidade de forças que resistem e estabelecem microtransformações no ambiente de trabalho, imperceptíveis que sejam, mas que podem estar carregadas de significados.

É nesse domínio que corpos LGBTQ+ se apresentam nesse cenário, transitam sem medo nos domínios da sexualidade e expressões de gêneros. Corpos políticos podem deslocar-se e romper com expectativas sócio-organizacionais, a fim de galgarem um caminho de resistência no âmbito da estetização de si, diante da disciplina e da normalização, em busca de estabelecerem microtransformações no ambiente de trabalho. Algo que causa temor às organizações, mas que, ao mesmo tempo, as atrai.

Corpos desejantes do prazer queer. Empenhados em criar subjetividades performaticamente na busca do conhecimento de si, na estilização de si, como modalidade de resistência e também da relação com o outro. É o cuidar de si como uma arte de dizer sim ao (re)existir, diante de tudo que se interpõe a uma possível emancipação. É o direito sobre si, o que pode inspirar novas formas de existência, instáveis até mesmo em sua instabilidade. Abre-se caminho para uma vida mais criativa, com afeto e alteridade. Ampliam-se as incertezas no ato de cuidar de si como razão de (re)existir.

Sugere-se, como aprofundamento deste estudo, a realização de pesquisas teórico-empíricas que contemplem a estilização de si e a resistência de corpos LGBTQ+ no âmbito dos processos de organizing em diversas instituições de poder, como a escola, igreja, organizações públicas e privadas, instituições políticas e governamentais, com fins de compreender como a potencialidade da resistência queer (alegre, despreendida, com humor), não apenas individual, mas coletiva, pode reordenar processos, estruturas, normas e culturas, a partir de uma nova estética na relação com os outros. É reconhecer o gosto pela alteridade e a busca do prazer queer como ideais ordenadores para lidar com todas as possibilidades de transformação. Nesse sentido, é oportuno não restringir o enfoque aos corpos e cultura LGBTQ+, considerando que este estudo incentiva ampliar o olhar sobre uma multiplicidade de modalidades relacionais nas práticas organizacionais, exercidas não necessariamente nos limites das empresas, mas por meio de outros agrupamentos, que se estruturam de maneira diferenciada e que lidam com relações humanas diversas, especialmente com a diferença. É importante também abrir espaços para estudos com olhares interseccionais.

NOTA

  • O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
  • Avaliado pelo sistema double blind review.

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Editado por

Editores convidados: Adriana Vinholi Rampazo, Luiz Alex Silva Saraiva, Eloísio Moulin de Souza, Jo Brewis e Saoirse Catlin O'Shea

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    23 Out 2020
  • Aceito
    18 Ago 2021
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