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Racionalização do trabalho e atitudes operárias

ARTIGOS

Racionalização do trabalho e atitudes operárias* * O presente artigo é o resultado da fusão, com as modificações que se fizeram necessárias, de três capítulos de nossa tese de doutorado, Les ouvriers et le populisme, apresentada à Universidade de Paris X, em junho de 1973. Para esta parte de nosso estudo utilizamos o material coletado entre 602 operários da fábrica mencionada no período 1966/68. A metodologia utilizada e o questionário aplicado se encontram no referido trabalho.

Andréa Loyola

Professora-doutora no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e pesquisadora no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

Este artigo constitui o complemento de outro publicado no n. 5 desta revista, set./out. 1974, sob o título Trabalho e modernização na indústria têxtil. Esse primeiro artigo descreve o processo de racionalização do trabalho ocorrido numa fábrica de fiação e tecelagem situada na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais, como resposta à crise por que passou a indústria têxtil local no período de 1954/64. Trata-se agora de analisar as conseqüências dessas modificações sobre as atitudes dos trabalhadores, examinando-as, não de forma direta, mas através de um estudo mais exclusivo sobre atitudes operárias que leva em conta não só a empresa, mas também outros determinantes da sociedade global.

INTRODUÇÃO: SATISFAÇÃO NO TRABALHO E SOCIEDADE GLOBAL

Os estudiosos da classe operária brasileira - e latinoamericana em geral - tomam como quadro de referência de suas investigações sobre atitudes operárias principalmente as características da sociedade global. Diferentemente destes, os sociólogos americanos fazem da organização da empresa e da dicotomia satisfação/insatisfação no trabalho o foco central de seus estudos.1 1 Essas abordagens refletem dois tipos de preocupação diferente. A primeira, uma preocupação politica com a mudança da sociedade; a segunda, aquela com a produtividade do trabalho e com o consenso social.

Se bem que importante para a compreensão das atitudes e do comportamento operário, o grau de satisfação ou insatisfação do trabalhador relativamente a seu trabalho envolve uma série de dificuldades para ser medida. A própria dicotomia, seguidamente ligada ao ambíguo conceito de "moral",2 2 Frisch-Gauthier assim define o conteúdo desse termo: "O moral no sentido comum pode ser entendido como o estado de espirito de um individuo ou de uma coletividade, por referência a um objetivo a ser atingido, ou sem nenhuma referência precisa; encarado relativamente ao quadro das organizações e das empresas industriais, concerne a uma certa relação entre os 'sentimentos' do trabalhador e o rendimento procurado pela empresa. Trata-se, portanto, de uma reação ao mesmo tempo individual e coletiva aos fins da organização." Frisch-Gauthier, Moral et satisfaction au travail. In: Friedmann & Naville: Traité de sociologie du travail. Paris, Armand Colin, 1964 p.133-4. está comprometida com uma abordagem cujos pressupostos são bastante duvidosos. De fato, subjacente ao enfoque via "teoria da satisfação" está a idéia de que a um moral elevado corresponderia um alto grau de satisfação no trabalho e que um homem satisfeito se identificaria mais que os outros com os objetivos de sua organização e, como conseqüência, produziria mais. Esta concepção otimista de um acordo real ou possível entre os imperativos econômicos da empresa e as exigências humanas de sua mão-de-obra foi objeto de severas críticas por parte dos sociólogos industriais.3 3 Consultar entre outros: Friedmann, G. Problèmes du machinisme industriel. Paris, Gallimard, 1964; e Frisch-Gauthier. Moral et satisfaction au travail, op. cit.

Os resultados de numerosos estudos revelam que a atitude dos trabalhadores não pode ser dimensionada simplesmente em termos da oposição satisfação/insatisfação.4 4 Cf. Blauner, Robert. Work satisfaction and industrial trends. In: Galenson, E. & Lipset, S. M. Labor and trade unionism. New York, John Wiley & Sons, 1960. O mesmo observamos relativamente ao grupo estudado: as perguntas "está satisfeito com o que faz ou gosta do seu trabalho" e "acha o seu trabalho importante" foram respondidas todas positivamente em contraste evidente com insatisfações referentes às relações no trabalho, ao cargo, ao salário, à empresa, etc., como veremos a seguir. Tais resultados podem ser explicados, em parte, como sugere Blauner5 5 Work satisfaction and industrial trends. cit. p. 354-6. devido ao peso que numa sociedade como a nossa geralmente é atribuído - em comparação com outras atividades sociais - ao trabalho na determinação da imagem que o homem faz de si mesmo. O trabalhador teria, por esse motivo, dificuldade em admitir que não gosta de seu trabalho ou que ele é improdutivo, sem com isso ameaçar seu auto-respeito.

Mas a maior dificuldade em lidar adequadamente com o problema da satisfação parece advir não da própria noção, mas de sua utilização por uma sociologia que concebe a empresa como uma organização fechada sobre si mesma e que, portanto, não considera outros aspectos, envolvendo as atitudes dos trabalhadores, que se situam fora de seu campo de ação. Como enfatiza J Goldhorpe, a "questão da satisfação no trabalho não L pode ser, no fim, considerada como útil, a não ser em relação à questão básica do que poderíamos chamar orientação em direção ao trabalho. Até conhecermos algo a respeito da maneira como os trabalhadores classificam suas necessidades e aspirações relativas aos seus empregos, até conhecermos que significado o trabalho tem para eles, não estamos na posição de entender o que pode ser adicionado satisfatoriamente em cada caso".6 6 Goldhorpe, J. H.; Lockwood, D. et alii. The affluent worker. industrial attitudes and behavior. London, Cambridge University Press. 1968 p. 36.

Tais necessidades são determinadas socialmente e, portanto, as análises do comportamento operário não podem ser levados a efeito sem as referências necessárias à sociedade global.7 7 A referência à sociedade global nao é suficiente para dar conta das orientações em direção ao trabalho. Isso exigiria uma análise que levasse em conta a relação dialética entre, de um lado, as estruturas objetivas e de outro, as práticas e as representações, do tipo, por exemplo, daquela proposta por Pierre Bourdieu em seu livro: Esquisse d'une théorie de la pratique. Paris, Librairie Droz, 1972. A natureza de nossos dados, entretanto, não nos permitiu uma tentativa desse gênero.

Foi o que procuramos fazer, como outros colegas que estudaram atitudes operárias no Brasil.8 8 Cf. Lopes, Juarez Brandão. Sociedade industrial no Brasil. São Paulo, Difel, 1964; Touraine, Alain. Industrialisation et conscience ouvrière à São Paulo. Sociologie du Travail, n. 4, 1961; e Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias. São Paulo, Brasiliense, 1970. Entretanto, preferimos à hipótese da conduta "tradicionalista" ou em "termos de mobilidade" prevalecente nesses trabalhos,9 9 Tendo em vista as condições de formação do operariado no Brasil, recrutado a partir de 1930 em meio ao excedente de mão-de-obra rural, a migração e seus resultados ocupam um lugar central nas análises sociológicas sobre as atitudes dos trabalhadores brasileiros. O trabalhador vindo do campo teria uma conduta "tradicionalista", isto é, orientada pelos valores da comunidade de origem (Lopes, op. cit.) ou em termos de "mobilidade individual": o individuo considera sua migração como uma ascensão social, mas não aceita a empresa como o meio necessário ao seu sucesso profissional (Touraine & Rodrigues, op. cit.). Ambos os tipos de conduta seriam responsáveis pela não-identificação por parte do trabalhador com a "condição operária" e, em conseqüência, por suas atitudes "economicistas" - supervalorização do salário ein detrimento das condições de trabalho, e "instrumentalistas" - uso instrumental, isto é, visando o atendimento de interesses individuais, e nãode classes-em relação ao trabalho, à empresa e ao sindicato. Não cabe aqui entrar no mérito destas conclusões nem da abordagem a elas subjacentes, mas apenas salientar que parte do presente trabalho constitui um esforço para testar a possibilidade de generalização destas conclusões que, como veremos, não se aplicam, ou se aplicam apenas parcialmente ao grupo estudado. uma outra que enfatiza mais o próprio sistema de produção que a origem dos trabalhadores: o trabalhador brasileiro modela seu comportamento em função, de um lado, da empresa e do mercado de trabalho e, de outro, em função do Estado. A influência desses elementos sobre suas atitudes é medida pelo contexto urbano-industrial no qual se inserem.

É evidente que esses elementos estruturais, enquanto componentes fundamentais de um sistema social de produção, estão intimamente ligados entre si e suas fronteiras são extremamente difíceis de serem delimitadas. Assim, para os objetivos deste trabalho, a referência à empresa significa que a ênfase está sendo colocada sobre as relações patrâo-operário, decorrentes da natureza da produção - tipo de produto e de trabalho - e da organização do trabalho na empresa - estrutura e política administrativa; a referência ao mercado de trabalho implica a importância atribuída ao espaço social no qual o trabalhador vende a sua força de trabalho e às condições de compra e venda desta força de trabalho; a referência ao Estado significa que estão sendo acentuadas as relações patrão-operário enquanto Classes sociais no seio de uma sociedade nacional. Ela significa, sobretudo, um tipo de dominação de classe e a forma como se organiza esta dominação, expressa pelo conjunto das leis que regulam as relações entre o capital e o trabalho e o estatuto político que as anima. Finalmente, a referência ao contexto urbano-industrial significa que o acento está sendo colocado sobre as singularidades, historicamente determinadas, de uma cidade ou região industrial. Diz respeito ao conjunto das relações sociais que decorrem de um tipo de urbanização - tamanho da localidade e características da população - e de um tipo de industrialização: natureza de seu parque industrial, da classe patronal e operária.

As características da empresa em questão já foram tratadas em outro trabalho publicado nesta revista.10 10 Cf. Loyola, Andréa: Trabalho e modernização na indústria têxtil, Revista de Administração de Empresas, Rio, FGV, n. 5, set./out. 1974. O papel intervencionista desempenhado pelo Estado na industrialização, a partir de 1930, e a legislação trabalhista daí decorrente são aspectos da economia política brasileira bastante conhecidos. Basta lembrar a forma semicorporativa que assume o Estado desde então. Ao contrário da democracia liberal, o novo sistema político social enfatiza não o princípio da livre concorrência, mas o da cooperação, não a liberdade individual, mas o papel de produtor do indivíduo na sociedade, que é vista como um todo orgânico e hierarquicamente organizado, no qual pertence ao Estado o papel de árbitro entre as classes. Estas são definidas não como classes, mas como categorias econômicas (empregadores) e profissionais (empregados), ambas organizadas em associações congêneres e simétricas com contatos institucionais assegurados em todos os níveis.11 11 Ao nível dos conflitos do trabalho são os Tribunais do Trabalho que cumprem essa função. Consultar, entre outros: Besouchet, Lidia. História da criação do Ministério do Trabalho; ensaio de interpretação. Rio de Janeiro, Serviço de Documentação do Ministério do Trabalho, s.d. (Col. Lindolfo Collor); Brandão, Alonso Caldas. Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto lei n.º 5 452, de 1.º 05.1943). Rio de Janeiro, MTPS-CTOS, 1962; Amaral Azevedo. O Estado autoritário e a realidade nacional. Rio de Janeiro, José Olympio, 1938; e para os efeitos da legislação trabalhista sobre o sindicato e o comportamento político operário, Rodrigues, José Albertino. Sindicato e desenvolvimento no Brasil. São Paulo, Difel, 1968; e Weffort, Francisco C. Estado y masas en el Brasil. Revista Latino-Americana de Sociologia, Buenos Aires, maio 1965. Resta, pois, dizer algumas palavras sobre o mercado de trabalho, o contexto urbano-industrial e os operários estudados.

Juiz de Fora, atualmente com cerca de 250 000 habitantes, foi no passado - até por volta de 1920 - um dos importantes centros industriais do país. Fruto do esforço de uma burguesia local e utilizando mão-de-obra igualmente oriunda da região, ali foram instaladas numerosas indústrias, que formavam então o setor mais dinâmico, como o têxtil. Entretanto, os acontecimentos históricos subseqüentes foram desfavoráveis ao desenvolvimento industrial da cidade12 12 Entre outros: a criação de Belo Horizonte que assume, pouco a pouco, a hegemonia econômica e política em Minas Gerais; a ampliação do sistema viário, tirando de Juiz de Fora sua posição privilegiada de ponto extremo da principal via de comunicação entre o Rio de Janeiro - na época a metrópole nacional mais importante - e a Zona da Mata e a região central de Minas; deslocamento do eixo da economia nacional para o estado de São Paulo e perda relativa do dinamismo do setor têxtil, com o processo de substituição de importações, a partir da década de 50. que entra, principalmente a partir de 1930, em relativa decadência.13 13 Para se ter uma idéia dessa relativa decadência, Juiz de Fora passou de quarta cidade mais populosa do País, no início do século, para 15.ª em 1940, 18ª em 1950 e 24ª em 1970 (dados extraídos da revista Realidade, Ano XLIV, n. 25, junho 1972)

Fortemente abalada pelas sucessivas crises por que passou a indústria têxtil brasileira e marginalizada, das decisões da política nacional nas últimas décadas, que a impediram de se transformar num centro industrial movido por grandes empresas sediadas fora, a cidade mantém praticamente inalterado, tanto no que se refere aos setores como à propriedade e organização, o caráter eminentemente tradicional de sua indústria.

Juntando-se à indústria têxtil a de vestuário e de calçados, é a seguinte a fisionomia dominante na indústria de Juiz de Fora nos últimos tempos: 5 000 pessoas ocupadas, de um total de 9 600, no ano de 1962; Cr$ 5 700,00 do valor da produção de um total de Cr$ 13 000,00, no mesmo ano e uma participação de 5,9% na produção industrial de Minas Gerais. Dentro do conjunto, cerca de 60% dos estabelecimentos ocupam menos de cinco operários e, na parcela restante, são poucos os que ocupam muito mais que esse número.

Ao contrário do passado, quando predominavam as grandes tecelagens, o parque industrial é assim constituído por pequenas empresas, em que a administração, a programação e o controle da produção são executados pelos próprios sócios, e poucos possuem dirigentes com curso de nível superior especializado para atividade industrial. Essa situação é reflexo da forma familiar de propriedade, predominante nas empresas de Juiz de Fora, onde predomina também o capital nacional de origem local.14 14 Em 1967, entre 70 estabelecimentos industriais de Juiz de Fora, em 25 a participação dos dois maiores acionistas (e, no caso, únicos) era de 100%; em 16, era de 90 a 100% e em sete de 80 a 90%. Entre 180 diretores de estabelecimentos, no mesmo ano, 152 eram acionistas de mais de 10% do capital ou tinham laços de parentesco com tais acionistas. Ainda no mesmo ano, num total de 85 casos, em 73 os capitais eram procedentes de Juiz de Fora; em seis do Rio de Janeiro; em dois de São Paulo; em um de Belo Horizonte; em um, da Zona da Mata e em um do exterior (dados extraídos do Estudo para o desenvolvimento integrado de Juiz de Fora, realizado pela Splan - Sociedade de Pesquisas e Planejamento - em convênio com a Prefeitura Municipal de Juiz de Fora e sob o patrocínio da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais. Juiz de Fora, 1967/68. mimeogr.).

O desenvolvimento do município fundamenta-se na experiência de numerosa mão-de-obra, relativamente barata, constituída principalmente de imigrantes da Zona da Mata, zona na qual Juiz de Fora se inclui, e que tem hoje suas atividades rurais estagnadas ou em decadência. Em muitas fábricas, mais de 50% do pessoal ocupado é proveniente dessa região e de outras áreas da periferia da cidade.

Na medida em que a cidade, como no passado, continua sendo ponto de atração constante de populações de sua área de influência - a Zona da Mata Mineira - a pressão da mão-de-obra é permanente. Alia-se a esse fator o ritmo relativamente lento do crescimento e as transformações na composição do parque industrial - falência das grandes tecelagens e predominância das pequenas fábricas - determinam a alta taxa de desemprego. Em 1968 estimava-se em 15 mil, no minimo, o número de desempregados em Juiz de Fora.

Não obstante a decadência relativa de seu parque industrial, Juiz de Fora guarda ainda muito dos traços que lhe valeram no passado a cognominação de Manchester Mineira: a localização da maioria dos estabelecimentos industriais, inclusive, grandes construções fabris no estilo arquitetônico das fábricas inglesas, na parte central da cidade; a presença de uma classe operária relativamente numerosa e homogênea e portadora de uma tradição operária que se exprime principalmente no elevado índice de participação sindical e política dos£ operários relativamente a outras regiões do país; e na configuração do movimento operário local voltado para o grupo operário e com ele identificado. Sob vários aspectos o contexto urbano-industrial de Juiz de Fora se enquadra, sem todas as conseqüências por ele apontadas, no tipo de habitat que Karpik chama de cultura operária, cujo sistema de valores toma essencialmente como quadro de referência o grupo operário, em contraposição à cultura tradicional, que se enraíza nas unidades sociais particulares e à cultura urbana, orientada por valores tipo mass-media.15 15 Karpik, Lucien: Urbanisation et satisfaction au travail. In: Sociologie du travail 2/66, Paris, 1965. Sobre a industrialização e o movimento operário em Juiz de Fora, consultar Loyola, Andréa: Les ouvriers et le populisme, op. cit. p. 56.

O grupo estudado, por sua vez, apresenta, em linhas gerais, as mesmas características da classe operária local. Entre as 602 pessoas que o compõem, 54,3% são de origem urbana, dentre as quais 67,9% nascidas em Juiz de Fora e 21,8% na Zona da Mata de Minas Gerais, quer dizer, na zona de infli^ncia da cidade. Entre os 37% de origem rural, 19,2% são originários do Município de Juiz de Fora e 65,3% da Zona da Mata e 86,4% estão na cidade há mais de 10 anos. Ê composto principalmente de elementos do sexo masculino (74%), relativamente jovens (o grupo mais representativo situase entre 25 e 29 anos), casados (57% em média) possuindo um nível de instrução primária (67,1%) e com uma qualificação industrial de tipo médio: 67,3% de semiqualificados, cujo treinamento é efetuado na própria fábrica.16 16 Para maiores detalhes sobre esse grupo de operários, consultar: Loyola, Andréa: Les ouvriers et le populisme, op. cit.

Finalmente, restaria dizer que a publicação do estudo de Leôncio Martins Rodrigues, realizado numa indústria automobilística de São Paulo17 17 Rodrigues, Leôncio M. Industrialização e atitudes operárias, cit. forneceu-nos a ocasião de testar mais uma vez, através da comparação, se bem que de maneira imperfeita ou limitada, as linhas J gerais de nossa hipótese.

Tal comparação tornou-se possível pela similitude do material recolhido: várias de nossas questões tratavam do mesmo tema e foram formuladas de modo semelhante. De outro lado, esta comparação mostrou-se particularmente interessante pelo fato de tratar-se de dois universos particulares: embora as das duas empresas sejam modernas em seus respectivos contextos; a produção da empresa por nós estudada é "tradicional", enquanto aquela estudada por Leôncio Rodrigues é "moderna";18 18 Opomos aqui "moderna" e "tradicional" sem outras implicações que a da implantação mais recente ou mais antiga do setor industrial no Pais. Consultar a esse respeito. Ministério do Planejamento Econômico e Social, Indústrias tradicionais, um reexame crítico. Rio de Janeiro, Planejamento e Coordenação Geral, 1967, mimeogr. enquanto a indústria têxtil é nacional, a indústria automobilística se caracteriza por ser formada majoritariamente de capital estrangeiro; a composição do grupo operário difere sob vários aspectos e, finalmente, elas representam o resultado de processos históricos diferentes - uma integra-se num parque industrial em plena expansão, enquanto a outra faz parte de um sistema do passado, marcada por sucessivas crises. As duas empresas serão designadas, daqui por diante, pelas formas abreviadas I.T. e I.A., respectivamente.

2. O PONTO DE VISTA DO TRABALHADOR SOBRE O SEU EMPREGO

"A camaradagem com os colegas", "o reconhecimento da capacidade do empregado" e o "respeito a sua liberdade no trabalho"; o "bom relacionamento com os chefes", "companheiros amigos e unidos", "a harmonia entre patrão e empregado", enfim, "o clima de amizade" e o "bom ambiente de trabalho" são os aspectos (que agrupamos como ambientais-re (acionais) mais enfatizados pelos trabalhadores estudados, para que um emprego seja considerado satisfatório (50%).

Em segundo lugar (25%), e mais importante que o salário (15%) é mencionado o que agrupamos como salário indireto19 19 Esses benefícios pagos pela empresa visam explicitamente, além de atrair e fixar a mão-de-obra na empresa, complementar a insuficiência do salário necessário à reprodução da força de trabalho, possibilitando, ao mesmo tempo, uma exploração mais plena e racional das possibilidades dos trabalhadores. (médico, dentista, lanche, etc), e, em úlltimo (10%), os aspectos que agrupamos como técnicoprofissional (o próprio trabalho, boa matéria-prima, boas condições de trabalho, reconhecimento de sua capacidade, liberdade ou autonomia no trabalho, etc).

Nem a origem nem a qualificação se revelaram estatisticamente significantes. Os qualificados não diferem dos semiqualificados no teor de suas respostas. Não obstante, os braçais são os únicos que não consideram o salário importante para que um emprego seja satisfatório, mas valorizam, relativamente mais que os outros, o salário indireto. Isto parece dever-se ao fato de, em virtude de sua qualificação, não lhes ser possível aspirar mais que o salário mínimo legal que geralmente percebem.

Aliás, a valorização geral, entre os trabalhadores estudados do salário indireto, não significa desinteresse pelo salário real, mas deve-se à interferência da legislação trabalhista e, em relação com esta, da política salarial da empresa: a maior parte dos salários na empresa estudada oscila em torno do mínimo regional, sendo relativamente pequena a diferença salarial entre qualificados e semiqualificados. Daí a importância que adquirem, para todas as categorias, os beneficios que a empresa possa oferecer.

Mesmo considerando em conjunto o salário e o salário indireto, os fatores "ambientais-relacionais" con tinuam ocupando a preferência dos trabalhadores pan que um emprego seja considerado satisfatório. A super valorização dos elementos sociais do trabalho, en aparente detrimento dos econômicos, revela em primeiro lugar a influência do salário e do mercado de trabalho: sendo o salário determinado por lei e estabilizado em torno do mínimo, tanto na I.T. como nas outras fábricas locais - que pagam, em geral, salários mais baixos que a fábrica estudada - os operários estão extremamente limitados em suas alternativas para maiores ganhos salariais. Em segundo lugar, influenciam nessa perspectiva a empresa e o contexto urbano.

No que se refere à influência da empresa, num tipo de organização em que os supervisores detêm uma parcela considerável de poder nas decisões sobre o destino dos operários, em que o sistema de comunicação, menos formalizado entre esses dois níveis, favorece contatos de envolvimento pessoal, a "amizade", e a "cooperação" que possam deles conseguir adquire importancia toda especial para o trabalhador, e vice-versa. Por outro lado, a camaradagem com os companheiros de trabalho, vinculada a um padrão cultural que valoriza os contatos pessoais entre operários - contexto urbano - parece assumir, no caso, urna forma nitidamente de compensasão à fadiga e monotonia do tipo de trabalho executado:

"O meu trabalho é uma diversão; entendo-me com meus companheiros; quanto mais esquenta a seção mais riem, às vezes de tristeza também porque não se agüenta de calor"; ou "o trabalho não é essas coisas, mas os colegas são bons e o supervisor também é bom".

O fato de os aspectos propriamente profissionais do trabalho terem sido apontados em último lugar não significa, como veremos melhor posteriormente, desinteresse, pelo menos, mas sim a consciência da baixa possibilidade de satisfazê-los num tipo de empresa onde predomina o trabalho em série e onde o trabalhador fica impedido de utilizar livremente sua criatividade, acabando por sentir-se como uma mera extensão do maquinário; donde, como contrapartida, a valorização das relações sociais entre operários:

"O pessoal aqui é muito bom, eu tenho muita camaradagem com eles, mas o trabalho é triste; aqui dentro eu me sinto como uma máquina."20 20 Consultar a respeito: Friedmann, G.Tendences d'aujourd'hui perspectives de demain. In: Friedmann E Naville. Traité de sociologie du travail, cit. cap. 25.

Para o pessoal com nível de instrução mais elevado que ocupa melhores posições na hierarquia de funções da empresa e executa tarefas mais interessantes, esse aspecto parece adquirir maior importância na avaliação do emprego. Com relação ao salário, fatores ambientaisrelacionais e salário indireto, as diferenças entre as proporções para até primário (pessoas analfabetas e com curso primário) e secundário (pessoas com 1.º e 2.º ciclo completo e/ou incompleto) não foram estatisticamente significantes. No entanto, na categoria fatores técnico-profissionais, a proporção é de 3,7% para os analfabetos e com curso primário contra 23,1% para aqueles com curso secundário.

A referência à promoção e à estabilidade, fatores de primordial importância, especialmente o último, para os trabalhadores de origem anglo-saxônica,21 21 Cf. Schneider, Eugene, V. Industrial sociology. New York, Mac-Graw-Hill Book, 1967. In: Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias, cit. p. 68; e Moore, W. Industrial relations and the social order. New York, The MacMillan Co., 1956, cap. 11. pode ser explicada pela estrutura e política social da empresa e pela legislação trabalhista.

A fábrica estudada possui uma organização de tipo horizontal,22 22 Consultar Loyola, Andréa. Trabalho e modernização na indústria têxtil, cit. composta de apenas três níveis hierárquicos, o que torna extremamente limitadas as possibilidades de promoção em nível vertical com tendência a se tornarem inexistentes: de acordo com a nova política de pessoal, o recrutamento para o nível de supervisão é feito fora da empresa ("elementos mais instruídos e menos comprometidos com os operários"). Como no nível de base, predominam os cargos semi-qualificados; as oportunidades de ascensão profissional na empresa são bastante reduzidas, fato do qual os trabalhadores têm plena consciência.

Quanto à estabilidade, a antiga legislação trabalhista23 23 Quando foi realizada a pesquisa (1966/68) a Lei do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço ainda não estava em vigor. tornava estável o empregado após 10 anos de casa e previa, em caso de dispensa sem justa causa, a indenização correspondente ao tempo de serviço. Mas na I.T., a estabilidade na época da pesquisa não era concedida. A empresa utilizava então a política, generalizada em todo o país e que, no dizer de Leôncio Rodrigues, já fazia parte dos mores das relações industriais no Brasil: dispensa e o pagamento da correspondente indenização, depois de certo tempo de serviço. A estabilidade era, portanto, um elemento sem peso, do ponto de vista dos trabalhadores, para que um emprego fosse considerado satisfatório.

Se compararmos a opinião dos trabalhadores estudados com aquelas dos da LA. de São Paulo, observamos que elas não diferem essencialmente, mas denotam, não obstante, a influência daqueles fatores que vimos analisando: a empresa, o mercado de trabalho, a legislação trabalhista e o tipo de contexto urbano.

Com efeito, também para esses trabalhadores "as relações com a chefia constituem o ponto crucial"24 24 Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias. cit. p. 72. para que um emprego seja considerado satisfatório, o que Leôncio Rodrigues atribui ao papel que, semelhantemente ao que ocorre na I.T., exercem os supervisores na estrutura de poder da empresa. A fim de facilitar a comparação, reproduzimos o quadro 1, onde esse aspecto (relação com a chefia) e aquele referente ao bom ambiente de trabalho foram agrupados como fatores ambientais-relacionais; os itens referentes a treinamento ou aperfeiçoamento técnico e possibilidade de subir na empresa foram agrupados como fatores têcnico-profissionais e, finalmente, aqueles tais como fornecer condução, boa alimentação e cooperativa do consumo, como salário indireto.


Observando-se o quadro 1 nota-se, de um modo geral, as mesmas tendências encontradas entre os trabalhadores da I. T.: valorização, entre todas as categorias, das relações de trabalho e dos benefícios que a empresa oferece em aparente detrimento do salário, indicando também aí a influência da legislação trabalhista.

Como já foi dito, embora as diferenças salariais globalmente e entre as diversas categorias sejam maiores na LA. do que na I. T., os salários não são determinados em função de um mercado realmente "livre", mas de um denominador comum a todas as categorias: o salário mínimo. Não obstante, dependendo das necessidades de mão-de-obra qualificada que a produção exige e das condições em que é implantada, a empresa pode pagar acima do preço do mercado, sem que o salário mínimo deixe de cumprir sua função padronizadora, ou melhor, de manutenção do preço de reprodução da força de trabalho no nível necessário ao tipo de acumulação vigente no país.25 25 Cf. Oliveira, F. A economia brasileira: notas para uma revisão teórica. São Paulo, CEBRAP, 1972. p. 6, mimeogr.

"A indústria automobilística, como se sabe, instalouse rapidamente, mercê dos estímulos e favores governamentais. Foi constrangida a encontrar e preparar operários especializados num mercado relativamente carente de trabalhadores qualificados, tanto mais que a expansão do setor se acompanhava do crescimento da indústria de autopeças, aumentando a procura de mão-de-obra. As fábricas de veículos foram obrigadas a elevar os salários e oferecer outras vantagens a fim de atrair e selecionar operários num tipo de produção que requer certo grau de precisão, cuidados técnicos e, sobretudo, responsabilidade na execução das tarefas. Deste modo, desde o início, os salários pagos no ramo tenderam a manter-se em nível superior aos do conjunto da indústria paulista."26 26 Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias. cit. p. 102.

Desta forma, se é que podemos dizer assim, num mercado de mão-de-obra relativamente fechado, passa a existir um "mercado mais ou menos livre", restrito a determinados setores, ou talvez, o que seja mais correto, um "mercado setorial" que faz com que as diferenças salariais, como já ressaltado, se dêem não tanto por categorias profissionais, mas principalmente por setores industriais. Daí a valorização da I.A. passar primeiramente, como mostra Leôncio Rodrigues, pela valorização do setor automobilístico.

Mas, se adicionarmos salário e salário indireto como fizemos no caso da I. T., veremos que estes se sobrepõem, contrariamente ao que ocorre na I.T., aos fatores ambientais/relacionais, indicando uma orientação muito mais economicista dos trabalhadores da I.A. relativamente ao trabalho, do que aquela dos da I.T. e, portanto, a interferência além da empresa, do tipo de cultura: se na cidade média industrial a contrapartida ao desenraizamento cultural tende a ser a valorização das relações sociais com o grupo operário, na metrópole é a compensação de caráter econômico que cumpre esse papel.

Nessa direção aponta, por exemplo, o economicismo mais acentuado dos trabalhadores classificados por Leôncio Rodrigues como "tradicionais" relativamente aos "modernos": são os únicos a dar maior ênfase ao salário. A diferença mais marcada entre essas duas categorias na I.A., praticamente inexistente sob esse aspecto na I.T. (entre rurais e urbanos), deve-se, além do tipo do contexto urbano, a composição demográfica diferente, entre os dois grupos; é maior o número de migrantes empregados na I.A., e estes têm menos tempo na cidade e menor experiência de vida urbana que os trabalhadores de origem rural da I.T.

As referências a fatores tais como promoção, treinamento e aperfeiçoamento técnico entre os trabalhadores da LA. podem, a nosso ver, ser explicados pelo tipo de empresa e por sua política social. Não somente a I.A. emprega em maior número uma mão-de-obra muito mais qualificada, cujo tipo de trabalho oferece maior estímulo ao aperfeiçoamento profissional que a I.T., como, ao contrário desta, "põe em prática um sistema de promoção bastante escalonado e diversificado, de modo a possibilitar aos operários pequenas ascensões em períodos de tempo relativamente curtos, dando aos empregados a impressão de que estão em contínuo processo de elevação na hierarquia da empresa e que seus esforços são recompensados".27 27 Id. ibid. p. 102.

Outras diferenças entre os grupos comparados podem ser encontradas nos motivos que levaram os trabalhadores a deixar o último emprego e a procurar trabalho nas respectivas empresas. Enquanto a maior parte dos trabalhadores da I.A. (53%) saiu do último emprego por causa dos salários baixos e apenas 10% porque foram dispensados, na I.T. metade dos entrevistados (50%) saiu porque foi despedida ou, então, devido às más condições de trabalho (18,8%) e nenhuma menção foi feita ao salário. Por outro lado, enquanto os trabalhadores da I.A. escolheram a empresa principalmente porque ela pagava salários mais altos (58%) e oferecia melhores oportunidades profissionais (22%), os da I.T. fizeram-no principalmente porque tinham parentes ou amigos na empresa (46,2%) ou porque tinham boas informações da fábrica (23,1%).

Além das diferenças relativas ao mercado de trabalho das duas cidades, essas dessemelhanças de orientação entre os trabalhadores comparados parecem indicar a influência do tipo de cultura que caracteriza os contextos urbanos nos quais estão inseridos. Efetivamente, elas parecem confirmar as hipóteses levantadas por Karpik sobre a diversidade da influência cultural nas atitudes relativas ao trabalho e, como conseqüência, sobre a satisfação no mesmo.

Distinguindo, segundo a tradição da escola de Michigan, dois domínios na situação de trabalho, um público - que compreende aqueles aspectos visíveis para o conjunto da comunidade, como a promoção e o salário - e outro privado - reunindo o conjunto de atributos, tais como o conteúdo, as condições físicas e humanas, "que escapam ao conhecimento da comunidade e representam o bem comum da organização" - Karpik hipotetiza que: "a) quanto mais o meio de trabalho e a comunidade são social e culturalmente heterogêneos, tanto mais os aspectos públicos da situação de trabalho tornam-se importantes e mais, por via de conseqüência, as expectativas referentes a esse domínio vão exercer influência sobre as satisfações correspondentes; b) inversamente, quanto mais o meio de trabalho e a comunidade são social e culturalmente homogêneos, mais os aspectos privados da situação de trabalho adquirem importância e, conseqüentemente, mais as expectativas referentes a esse domínio vão exercer influência sobre as satisfações correspondentes".28 28 Id. ibid. p. 201.

Do que se depreende das respostas obtidas e da comparação geral que vimos fazendo entre os trabalhadores das duas empresas consideradas, parece fora de dúvida que aqueles da I.T. de Juiz de Fora valorizam mais os aspectos privados da situação do trabalho e os da I.A. de São Paulo, os aspectos públicos. O resultado dessas atitudes sobre a satisfação no trabalho, no que diz respeito ao caso por nós estudado, será examinado a seguir.

3. AVALIAÇÃO DA COMPANHIA

A opinião que os trabalhadores têm da I.T. é extremamente positiva: a quase totalidade dos entrevistados (96,8%) tem uma imagem favorável da empresa e, dentre estes, apenas 7,4% fazem algumas restrições.

Mas tal imagem tem pouco a ver com a satisfação no trabalho, nem é indicativa de um moral elevado e de uma identificação do trabalhador com a empresa. A companhia é considerada boa porque é "pontual no pagamento" e "trata bem os operários", o que coincide, de uma certa forma, com as principais exigências do trabalhador relativamente ao emprego. Mas tais aspectos são avaliados por fatores externos à situação imediata de trabalho.

O que determina a visão positiva da empresa é fundamentalmente a comparação com as outras companhias, ou seja, a vivência pessoal, ou através dos companheiros de trabalho e membros da família, num mundo industrial em crise. Ê o que transparece claramente nessas respostas:

"Ê 100% melhor na cidade, porque é pontual em vencimentos, dá valor ao operário e pede ao empregado somente as oito horas de serviço."

"Já trabalhei em diversos lugares mas aqui é o melhor lugar para trabalhar. Tudo que os chefes pedem ou mandam é com educação. O pagamento é sempre em dia, pode-se fazer compromissos que eles pagam."

"Muito boa. Eles aumentam o salário logo que a lei manda, enquanto outras fábricas lá fora ficam querendo não pagar."

"Ê ótima companhia, porque nem se compara com nenhuma outra companhia de Juiz de Fora. Oferece ao empregado assistência, cooperação. Se interessa pelo empregado."

São a potência econômica e a organização da empresa que constituem os fatores fundamentais para uma imagem favorável da companhia. Mas esses aspectos não são avaliados nem pelos salários, nem pela estrutura interna da empresa, mas pela relação entre esta e seu contexto.

Dentre todos os principais motivos apresentados para justificar opiniões favoráveis da companhia (quadro 2), aqueles referentes ao salário, à organização e à estabilidade econômica da empresa são citados em proporções mínimas, cabendo o primeiro lugar à pontualidade no pagamento. Aqui, mais uma vez, ^ legislação trabalhista parece interferir, assim como o baixo nível salarial que vigora no setor. Como foi dito, sob esse aspecto a empresa não se distingue de outras da cidade, mantendo a remuneração da força de trabalho por ela empregada o mais próximo do salário mínimo regional. Entretanto, o esforço de modernização levado a efeito com relativo sucesso nos últimos anos tem-lhe permitido pagar os salários em dia, enquanto outras empresas mais atingidas pela crise (sobretudo as grandes tecelagens, sob constante ameaça de falência) sistematicamente atrasam os pagamentos, às vezes em vários meses. Outras, além de atrasarem, pagam menos que o salário mínimo.


É pelo conhecimento e pela vivência dessa situação que esse aspecto é valorizado e não implica necessariamente, como veremos, uma satisfação com relação ao salário recebido.

Além do mais, o fato de pagar em dia não é sentido como nenhuma concessão especial por parte da empresa, mas apenas como o cumprimento de uma obrigação: "Boa porque é uma companhia que cumpre com os seus deveres: pagamento, modo de tratar os empregados; tratam todos do mesmo modo, com igualdade." Como o empregado tem que cumprir com o seu dever trabalhando o número de horas exigido, dando boa produção, etc, o patrão tem que retribuir pagando o que lhe é devido, tratando com respeito e igualdade, etc. Mais que a noção de merecimento, no sentido tradicional de "agradar o patrão" a partir de normas que enfatizam mais a lealdade e a sujeição pessoal, parece tratar-se aqui da percepção de uma relação que se apoia, não as excluindo, fora das relações pessoais, ou seja, "nas relações trabalhistas", como se observa em muitas das respostas obtidas:

"É uma fábrica honesta, cumpre as leis, pois nunca me prejudicou em nada."

"Desconheço uma fábrica igual: é uma fábrica que cumpre as leis e não deixa nada em falta."

"Muito boa; é das melhores até o presente momento, especialmente do modo de agir e nos vencimentos; não falta aos compromissos da lei e por isso é uma companhia em que se tem prazer de trabalhar."

Parte dessa concepção se deve à política de relações humanas - suporte ideológico da modernização - desenvolvida pela empresa. Procura-se demonstrar que os empregadores se empenham em proceder com justiça e retidão para com os empregados cumprindo rigorosamente a legislação trabalhista, ao mesmo tempo que a empresa é apresentada como um todo integrado cuja hierarquia é assentada, não numa estrutura de poder, mas numa diferenciação de funções. A companhia é mostrada também como sendo uma espécie de comunidade, uma grande família onde cada um tem direitos e obrigações e contribui para a harmonia do todo. A esse esforço, expresso formalmente na utilização do pronome "nós" em todas as comunicações escritas da empresa, os empregados respondem apenas parcialmente, e embora valorizem o interesse da companhia nesse sentido, a fábrica não é sentida como uma coisa deles, nem esse interesse como o produto de uma generosidade gratuita:

"É uma fábrica que se interessa pelo empregado: paga em dia, tem médico, tem dentista, mas também o serviço não dorme."

"Firma muito correta: paga direitinho e trata bem, mas também sabe exigir."

"Muito boa, sou meio suspeito para falar porque de certa forma sou um privilegiado; mas também é uma forma de retribuição pelos serviços que lhe tenho prestado."

Depreende-se destas respostas que imagem da empresa não guarda nenhuma relação realmente estreita com a satisfação no trabalho, uma vez que uma avaliação positiva não impede a alusão a descontentamentos. Desta forma, não podemos falar de integração na empresa, no sentido de uma identificação de caráter moral com ela. O que parece haver é uma identificação para uso externo, isto é, com o progresso que ela simboliza:

"Boa companhia; se mantém sempre enquanto outras companhias atualmente tendem a fracassar."

"Durante os 31 anos que trabalho, acho que é uma das melhores companhias do estado e isso é julgado por todos. Ela corresponde à confiança que depositam nela, garante trabalho e dinheiro, só tenho a dizer bem."

"É uma fábrica e tanto; tem muita gente lá fora que daria tudo para trabalhar aqui."

A identificação com a companhia, sob essa forma, exprime a identificação com a industrialização, com a modernização e com o progresso que ela simboliza, mas não, como veremos, com as condições e as relações de trabalho vigentes no seu interior.

A influência da modernização na avaliação positiva da empresa também pode ser observada pela comparação com as atitudes relativas ao emprego. Com o objetivo de facilitar a comparação, agrupamos as respostas à pergunta "o que julga mais satisfatório, do ponto de vista do operário, para que um emprego seja considerado satisfatório?" da forma como aparecem no quadro 3, onde todos os fatores relativos à organização da empresa, ou seja, à modernização (organização, salário indireto, administração, pontualidade no pagamento, cumprimento da lei, relação com outras companhias, equipamento moderno e estabilidade econômica) aparecem sob o nome de fatores técnico-organizacionais, e aqueles referentes à situação de trabalho (ambiente de trabalho, trato pessoal, concessão de favores pessoais) como fatores ambientais-relacionais. Evidentemente, na prática esses aspectos não são desvinculados, e foram separados aqui apenas para fins analíticos.


Os "fatores ambientais-relacionais", considerados mais importantes para que um emprego seja satisfatório, na avaliação da empresa, perdem prioridade para os fatores técnico-organizacionais. Isto confirma que a imagem da companhia não guarda uma relação muito estreita com a satisfação no trabalho, bem como a predominância de dois critérios de julgamento para cada caso. O uso de um critério comparativo na avaliação da empresa faz ressaltar os aspectos relativos à modernização, embora os trabalhadores tendam a mencionar apenas os seus efeitos.

A origem e o nível de qualificação não interterem de maneira significativa nas opiniões sobre a companhia, mas o grau de instrução interfere. Os trabalhadores com nível de instrução mais elevado tendem a ter uma visão mais crítica da empresa, especialmente aqueles com o 2.º ciclo, como se pode observar no quadro 4.


A "pontualidade no pagamento" constitui o principal motivo para uma imagem favorável da empresa em todos os níveis, salvo entre os trabalhadores com cursos universitários. As referências ao "ambiente de trabalho" e à "remuneração" tendem a aumentar com o grau de instrução, assumindo maior importância para aqueles com 1.º e 2.º ciclos. "O cumprimento da lei" é mais enfatizado pelos analfabetos e por aqueles com curso primário, que são os que, em sua maioria, recebem o salário mínimo e dependem mais do cumprimento da legislação trabalhista. A estabilidade econômica da empresa aparece em percentuais mais elevados no 2.º ciclo e universitário. Nesse último nível as referências diretas à modernização, tais como a organização e administração da empresa, também são mais acentuadas.

Nos motivos apontados para justificar as restrições e as opiniões desfavoráveis à empresa também encontramos diferenças segundo o nível de escolaridade. Os analfabetos e os com curso primário e 1.º ciclo tendem a enfatizar mais o volume de trabalho e o tipo de equipamento, enquanto os trabalhadores com 2.º ciclo e curso universitário apontam, preferencialmente motivos referentes à "remuneração" e à "promoção". À referência à "promoção" é mais acentuada em todos os níveis mais elevados de instrução.29 29 Esses resultados coincidem com aqueles obtidos na França por Karpik e na Inglaterra por Goldhorpe, onde são os indivíduos mais instruídos que atribuem maior importância a esse aspecto de trabalho e que, igualmente, possuindo aspirações mais fortes, tendem a ser mais insatisfeitos no trabalho (cf. Karpik. Urbanisation et satisfaction au travail, cit. p. 194-6, e Goldhorpe, J. H.; Lockwood, D. et alii. The affluent worker: industrial attitudes and behavior. cit. cap. 6).

Quadro 5


Além do grau de instrução, outro fator que interfere na avaliação da empresa é a posição do indivíduo no processo produtivo. Como se pode observar no quadro 6, é entre os trabalhadores envolvidos diretamente na produção que se observa o maior percentual de restrições à companhia e o único percentual referente a opiniões desfavoráveis.


Tais diferenças explicam-se, por outro lado, pelo próprio processo de modernização da empresa, cujas conseqüências se fizeram sentir com mais força no setor de produção. O reflexo desse processo na avaliação da empresa pode ser observado também pela maior concentração de opiniões restritivas e desfavoráveis naquelas seções que foram mais atingidas pelas transformações: na seção de tecelagem, entre aquelas que compõem o departamento de produção, e na manutenção geral, entre as que compõem o departamento de manutenção geral e serviços externos. Essas seções agrupam as categorias que se viram mais prejudicadas com as mudanças ocorridas: os tecelões e os mecânicos, respectivamente.

Quadro 7


Os mecânicos (ex-contramestres) perderam para os supervisores a posição de comando que detinham sobre os trabalhadores que operavam as máquinas sob seu controle, daí serem mais freqüentes na seção de manutenção geral as alusões à "falta de reconhecimento pessoal", "incompreensão" (agrupados no quadro como "promoção") e "atual administração", que exprimem a insatisfação com a perda de poder e de status que envolvia a antiga situação. Um entrevistado assim descreve a reação dos mecânicos a essa mudança:

"Tem havido muito acidente na tecelagem. Tem sido a ajustagem mal feita dessas peças a maior causa dos acidentes com elas. No momento é difícil saber por que isso. Mas tenho lá as minhas idéias. Acho que o problema está é com os mecânicos que eram chamados antigamente de contramestres. Tem gente que não gostou nada dessa mudança. O ordenado deles não mudou, mas dizem que a administração os rebaixou e os humilhou. Primeiro tirou o nome deles, depois botou uniforme e têm roupa igual a qualquer varredor. Eu não entendo essa gente. Meu nome é Antonio e se eu troco de roupa não deixo de ser Antonio só por isso."

Os tecelões, por sua vez, viram aumentado o número de teares sob sua responsabilidade, sem o correspondente aumento de salário. São, deles, na maior parte, os motivos referentes ao "volume de trabalho" e a "remuneração e prêmios" para justificar opiniões restritivas ou desfavoráveis à empresa:

"Está péssima (a fábrica), cada vez pior. A gente trabalha muito, com muitos teares; agora toco 10, antes eram dois, e quanto mais pegava mais ganhava, pois antigamente a produção era maior. Agora não se ganha na base dos 10 teares (mas sim por tarefa) e se a gente vai falar que não agüenta, eles teimam e mandam a gente embora."

"É uma companhia boa para pagar; paga direitinho, mas o serviço é muito puxado; a gente não agüenta; na fiação são seis lados para uma pessoa; na tecelagem estão tocando 12 teares. É só falar em aumento de salário que aumenta o serviço."30 30 A fim de evitar as reações em massa e abrandar os descontentamentos (num desses aumentos do número de máquinas, os tecelões paralisaram a seção), os administradores passaram a fazer um aumento gradativo paralelo à decretação de novos niveis do salário mínimo. O aumento do número de máquinas não significa acréscimo de equipamento novo, embora algumas vezes isso tenha ocorrido, mas sim diminuição do número de operários e aumento de serviço para os que permaneceram ou foram admitidos após a introdução dos novos métodos de racionalização do trabalho.

A modernização é que confere à I.T. seu carâtet dominante e que a distingue das outras empresas locais, donde a ambigüidade com que o trabalhador se situa relativamente à mesma: a empresa é ruim se avaliada do ponto de vista da situação de trabalho, e boa, se comparada às outras empresas. Isso reflete também a ambigüidade com que o operário encara a própria modernização: por um lado, ela é percebida como uma exploração mais racional da sua força de trabalho: - "Aquilo lá já foi muito bom, hoje em dia não é mais; cada vez a gente desce mais e eles, os grandes, vão aprumando"; por outro lado, como a condição necessária para a manutenção de um tipo de desenvolvimento no qual eles estão engajados de maneira inexorável e dependente: "A gente trabalha demais; era para darem maior valor a gente; mas é a melhor fábrica ainda; se não fosse ela, a gente tava na rua."

A conclusões semelhantes chegou Leôncio Rodrigues, relativamente à LA. de São Paulo, que goza de elevado prestígio entre seus trabalhadores. Dentro de seus respectivos contextos, tanto a I.T. como a LA. se distinguem como empresas modernas, isto é, que além de pagarem comme il faut em relação ao preço da mão-de-obra do setor, procuram marcar sua individualidade desenvolvendo uma série de técnicas de relações humanas e integração do operário à empresa, técnicas essas que, como enfatiza Leôncio Rodrigues, os operários apreciam de forma notavelmente racional: "A Empresa Automobilística certamente é considerada uma boa empresa què paga salários mais elevados, que trata bem os empregados, mas não há crença na sua generosidade gratuita e desinteressada... Ê significativo, nesse sentido, que 86% dos operários que responderam que a empresa trata bem seus empregados, quando procuram explicar o porquê do bom tratamento, tenham utilizado frases como essas: "Querem conseguir um bom rendimento no serviço." "Porque tratando bem, os operários não sairão de lá para irem a outro estabelecimento concorrente."31 31 Cf. Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias, op. cit. p. 50-1.

Tais respostas evidenciam, por um lado, que os trabalhadores das duas fábricas avaliam os pontos positivos da empresa, não como dadivas, mas sim como uma compensação de interesses; por outro lado, marcam a influência dos respectivos contextos em que se inserem as empresas em questão, especialmente no mercado de trabalho. Assim a I.A. é considerada boa porque paga salários mais elevados que outras empresas e trata bem para evitar a evasão da mão-de-obra para outros estabelecimentos concorrentes; a I.T. é boa porque paga em dia e trata bem; porque cumpre a lei, e o faz para poder exigir mais trabalho.

São diferenças que marcam o tipo de desenvolvimento industrial de ambos os contextos e a influência mais forte ou diluída da legislação trabalhista como reguladora das relações capital-trabalho.

Finalmente, como conclui Leôncio Rodrigues, semelhantemente ao que ocorre na I.T., "os trabalhadores julgam a Empresa Automobilistica instrumentalmente, da perspectiva do projeto de melhoria de vida".32 32 Id. ibid. p. 50. Apenas não podemos concluir, juntamente com ele, que a falta de identificação com a empresa se deva a uma fraca identificação com o meio socioprofissional, nem tampouco que o salário esteja exclusivamente relacionado à idéia de merecimento e não a de status profissional; que "a realização correta das tarefas por parte do empregado não decorre de um dever, mas de uma retribuição por tudo de bom que o empregador lhe oferece".33 33 Id. ibid. p, 51-2.

Como procuraremos mostrar, a identificação com a empresa não se dá exatamente em função dessa consciência de explorado. O que ocorre é que o trabalhador se orienta em função de dois sistemas de dominação: um liberal, representado pela empresa; outro corporativista, representado pelo Estado, ou melhor, pelas instituições paraestatais, como o sindicato e, mais importante no presente caso, pela legislação trabalhista; daí a ambigüidade que caracteriza, de um modo geral, as atitudes desses trabalhadores, principalmente onde a situação de dependência do empresariado nacional é mais acentuada e a influência do Estado se faz sentir com mais força, como no caso por nós estudado.34 34 Consultar sobre a situação do empresârio nacional: Cardoso, Fernando Henrique. Empresário industrial e desenvolvimento econômico. São Paulo, Difel, 1964; e do mesmo autor: Política e desenvolvimento nas sociedades dependentes: ideologias do empresário industrial argentino e brasileiro. Rio de Janeiro, Zahar, 1971.

4. AVALIAÇÃO DO SALÁRIO

Um pouco mais da metade dos trabalhadores entrevistados (56,6%) acha que a I.T. remunera satisfatoriamente o seu trabalho. Como se pode observar no quadro 8, julgam-se bem remunerados principalmente em relação às "outras companhias" e em relação à "lei", o que indica mais uma conformação que propriamente uma satisfação com o salário que recebem.


Não obstante, não é menos expressivo o número daqueles que se consideram bem pagos relativamente "à responsabilidade do cargo", "às outras pessoas que tiveram ou têm o mesmo cargo" e às suas "possibilidades pessoais", ou seja, em relação ao cargo e à qualificação. Esses dois aspectos constituem igualmente os principais motivos para que o salário seja considerado insatisfatório.

Estamos, mais uma vez, diante de um duplo critério de avaliação: um exterior (as outras empresas e a legislação trabalhista) e outro interior, diretamente relacionado à empresa e à situação de trabalho (o cargo e a qualificação a ele ligado). No primeiro caso, isto é, quando a referência é ao mercado de trabalho e à legislação trabalhista, a satisfação tende a ser maior, ocorrendo o inverso, no segundo caso, isto é, quando o salário é avaliado por referência exclusiva à empresa, mais especificamente, pela situação de trabalho. De qualquer forma, não resta dúvida que o critério predominante é este último, indicando predominância da ótica "profissionalista" - voltada mais para as condições de trabalho que para o consumo na avaliação do salário - entre esses trabalhadores, que se exprime igualmente no baixo percentual com que o custo de vida é citado como motivo de insatisfação por aqueles que se julgam mal remunerados.

A origem não interfere de modo significativo na avaliação do salário, salvo no que se refere aos motivos para justificar a insatisfação com o mesmo: os trabalhadores de origem urbana (8,1%) referem-se, com menor freqüência que os de origem rural (14,5%), "às responsabilidades do cargo", indicando a influência menos da origem e mais da qualificação.

Efetivamente, são os mais qualificados que, de um modo geral, referem-se mais explicitamente ao cargo e à responsabilidade a ele inerente para justificar tanto a avaliação positiva quanto negativa do salário, enquanto os semiqualificados se fixam, no primeiro caso, mais na própria qualificação e, no segundo caso, no volume de trabalho. Esses últimos, igualmente, referem-se com maior freqüência, para justificar a satisfação com o salário, à legislação trabalhista e à relação com as outras empresas e se mostram mais satisfeitos com o salário que percebem que aqueles.

Tais diferenças denotam a pressão maior do mercado de trabalho a que estão sujeitos os trabalhadores semiqualificados e, como conseqüência da legislação trabalhista, uma vez que eles são remunerados apenas com o salário mínimo ou com o salário-tarefa, calculado para não ultrapassar ou para manter-se bem próximo do nível desse salário. Daí, em virtude dessa dependência, o maior percentual de indivíduos satisfeitos encontrados nessa categoria expressar, na verdade, como já notamos, mais uma conformação que propriamente uma satisfação com o salário.

O salário não se constitui na única forma de retribuição do trabalho. Principalmente para os trabalhadores que têm uma orientação "profissionalista" mais acentuada, o próprio trabalho, o grau de autonomia para decidir sobre sua execução, a promoção e outras formas de recompensas que marcam a individualidade do trabalhador no desempenho de suas funções (aquisição de certos privilégios, tais como poder ausentar-se da seção sem justificar ao chefe, indicar pessoas para serem recrutadas, etc.) são igualmente importantes para a satisfação no trabalho. Podemos hipotetizar que quando essas formas de retribuição são bloqueadas, o trabalhador tende a tornar-se mais exigente com relação ao salário e vice-versa.

Sob esse aspecto, a política social da empresa, especialmente no que diz respeito às oportunidades de promoção que possa oferecer, é extremamente importante. Como esse assunto será melhor desenvolvido no tópico subseqüente, limitamo-nos, no momento, a assinalar que as possibilidades de promoção na I.T. são extremamente limitadas, que a decomposição do antigo sistema profissional prejudicou o poder de certas categorias, sobretudo dos mais qualificados, e que a formalização das relações de trabalho reduziu certos privilégios inerentes ao precedente sistema de organização da empresa, mais paternalista e informal.

Tendo presentes essas considerações, a hipótese formulada anteriormente parece confirmar-se: de um lado, como vimos, os trabalhadores qualificados mostram-se mais insatisfeitos com seu salário que os semiqualificados. Também os trabalhadores não manuais - geralmente mais sensíveis a recompensas de caráter não econômico35 35 Cf. Goldhorpe, J. H.; Lockwood, D. et alii. The ajfluent worker. industrial attitudes and behavior. cit. - revelam-se mais insatisfeitos com a remuneração (44,6%) que os trabalhadores manuais (36,6%). Por outro lado, como se pode observar no quadro 10, nessa última categoria, os trabalhadores mais insatisfeitos com o trabalho revelam-se igualmente mais insatisfeitos com o salário, e são justamente aqueles que se viram prejudicados com a modernização da empresa: os tecelões, no setor de produção e os mecânicos, no de manutenção geral e serviços externos.


Também, na opinião sobre o salário, os trabalhadores da I.T. apresentam pontos comuns e contrastantes com aqueles da I.A. de São Paulo. Em ambas as empresas o número de trabalhadores que acham adequado o salário que recebem supera o daqueles que se julgam malremunerados. Não obstante, o percentual de insatisfeitos é menor (menos de 40%), entre todas as categorias, na empresa paulista. Além do mais, nesta indústria, "os grupos com menos tempo de trabalho fabril, com passagem pela lavoura e chegados recentemente a São Paulo, acusaram as percentagens mais baixas de indivíduos que disseram receber uma remuneração adequada".36 36 Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias. cit. p. 64. Igualmente, os operários semiqualificados se julgam relativamente mais mal-remunerados (18%) que os ferramenteiros (8%).

Como foi visto, na I.T. ocorre justamente o contrário, isto é, são os trabalhadores de origem urbana, embora em proporções mínimas, e os semiqualificados que se mostram relativamente mais satisfeitos que os trabalhadores de origem rural e os qualificados.

No que diz respeito à origem, como mostramos atrás, ela está ligada à qualificação e dificilmente a hipótese em termos de conduta de mobilidade, utilizada por Leôncio Rodrigues para explicar as opiniões sobre o salário dos trabalhadores de origem agrícola da LA. caberia aos trabalhadores da I.T. Nossos dados contrariam mesmo esta hipótese.37 37 Id. ibid. p. 66-72.

No que se refere à qualificação, parece ser a política social das respectivas empresas o fator parcialmente responsável pelas diferenças observadas. Além de pagar salários mais elevados, como já frisamos, a I.A., ao contrário da I.T., oferece permanentes possibilidades de promoção aos seus empregados. Se é realmente correta a hipótese que aventamos sobre a relação entre satisfação com o salário e outras formas de recompensas no trabalho, em que a promoção é uma delas, torna-se compreensível a diferença de opinião entre ferramenteiros e trabalhadores qualificados encontrados nas duas empresas. Os trabalhadores qualificados, justamente aqueles que possuem maiores possibilidades de ascender na hierarquia da empresa, quando têm frustradas suas expectativas de promoção, como na I.T., tornam-se mais exigentes em relação ao salário e mais propensos a julgá-lo insatisfatório.

5. AVALIAÇÃO DOS DIRETORES E GERENTES

A administração da I.T. é, de um modo geral, bem aceita pelos trabalhadores, embora não desfrute do prestígio equivalente ao da empresa: enquanto a quase totalidade dos entrevistados tem uma imagem extremamente positiva desta última, os administradores contam com pouco mais da metade de opiniões favoráveis (60,2%).

Isto indica que os trabalhadores distinguem com nitidez entre a companhia - empresa econômica - e sua administração, não deixando de ver, entretanto, a relação de causa-efeito existente entre ambas.

Como se pode observar no quadro 2, um dos principais motivos apresentados para que a administração da I.T. seja considerada satisfatória é a administração em si mesma, ou seja, o desempenho dos diretores e gerentes para o bom funcionamento da empresa.

"Boa administração, porque a fábrica tem ido pra frente."

"Nunca tive contato pessoal, mas sei que são comercialmente competentes."

"Bons; a fábrica está sempre aumentando a produção e melhorando o prédio."

"Ê uma administração de futuro."

Enquanto a empresa é avaliada por fatores externos a ela mesma - pela relação com o contexto na qual se insere - a administração é avaliada principalmente a partir de fatores internos, ou seja, por referência à situação imediata de trabalho, embora a comparação com outras companhias não seja totalmente excluída.

Efetivamente, fatores tais como a "pontualidade no pagamento" e a "relação com as companhias", consideradas prioritárias para uma imagem positiva da empresa, perdem importância no julgamento da administração. São as relações de trabalho e a própria administração, ou melhor, o conjunto de medidas administrativas que repercutem sobre o ritmo, a organização e a forma de remuneração do trabalho que passam para o primeiro plano:

"Boa administração; sabem tratar a gente; dão toda assistência; procuram sempre agradar."

"Ê uma grande gerência em todos os sentidos: dinâmica, progressista, tratam bem; andam direito com a lei."

"Ótima, cumprem em tudo e por tudo a lei; muito justa e honesta com os trabalhadores."

"São bons porque tratam a gente com educação, sem grosseria; já teve muito chefe ruim aí: gritavam com a gente, batiam com as mãos na mesa, suspendiam o empregado à toa. Agora não tem mais disso."

Muitos trabalhadores não se sentem em condições de opinar "porque têm pouco tempo de casa e não conhecem o pessoal" ou porque "nunca tive contato com ela (a administração) mal sabendo seus nomes". Mas outros, embora não conhecendo o "pessoal lá de cima", acham a administração da I.T. satisfatória porque "nunca fui prejudicado", "não tenho o que reclamar", "nunca tive problemas", "eles não aborrecem". Ou ainda: "está bem dirigida porque pessoalmente não sinto que tem defeito e nenhum comentário de colega aponta muito defeito", "não tenho nada a reclamar, mas meus companheiros tecelões reclamam a quantidade de serviço que têm de fazer".

A ausência de contatos diretos entre o nível de cúpula e o de base, que essas respostas exprimem, prende-se, como vimos, à nova estruturação da empresa e que coincide, em muitos aspectos, com a nova estruturação da administração, onde alguns dos velhos elementos foram substituídos por outros mais jovens. Os trabalhadores com mais tempo de casa, que tiveram uma experiência de trabalho no antigo sistema, tendem a emitir suas opiniões de modo comparativo:

"Hoje em dia são mais atenciosos, tratam melhor os empregados."

"Melhor do que a outra porque esta tem mais elementos capacitados."

"Essa perdeu um pouco em comparação com a anterior; a antiga era mais amiga do operário."

Quando a avaliação é feita comparativamente, as opiniões negativas tornam-se predominantes (76,6%). Isto indica que aos administradores é imputada a responsabilidade pelas causas de insatisfação no trabalho, a maior parte delas decorrentes da modernização da empresa. Assim:

"A atual (administração) não dirige bem; a antiga atendia melhor, dava mais liberdade; a atual não aceita opinião; quando há aumento de ordenado, há aumento de trabalho; não se trabalha mais satisfeito porque são muito exigentes."

Essa resposta resume bem as principais causas de insatisfação que a modernização da empresa, especialmente os métodos de racionalização do trabalho implantados, fez surgir entre os trabalhadores que experimentaram a transição de um tipo de organização a outro.38 38 sobre as transformações ocorridas na empresa, consultar: Trabalho e modernização na indústria têxtil, cit. Uma das principais fontes de descontentamentos é, sem dúvida, a quebra de acesso direto ao nível de cúpula, expressa no elevado percentual com que as relações de trabalho (42,6%) aparecem como motivo para justificar opiniões desfavoráveis sobre a administração:

"Acho que a outra administração era melhor; conviviam com a gente, faziam reuniões com a gente; estes não. Mesmo nas decisões, pois na outra a gente podia conversar e eles atendiam."

"A primeira era melhor; podia-se chegar para conversar e hoje é difícil. Tem-se mais formalidade; os antigos eram mais simples; há chefes que passam e nem olham."

"A antiga era melhor; os dirigentes conversavam com todos. Esses a gente nem conhece."

Mas a ausência de contatos diretos e pessoais com os "patrões" não é ressentida somente porque contraria um padrão de dominação calcado nas relações pessoais a que estavam habituados os trabalhadores. Deve-se sobretudo ao fato de privar os empregados de acesso à fonte máxima de autoridade na empresa, impossibilitando-os de influir nas decisões e de reivindicar em prol de seus interesses.39 39 O cálculo mútuo (tanto da parte do empresário como do trabalhador) que envolve a troca de serviços e interesses subjacentes às relações paternalistas de trabalho, em duas comunidades da Zona da Mata, é descrito em Lopes, Juarez Brandão. Crise no Brasil arcaico. São Paulo, Difel, 1967.

"Na antiga a gente tinha mais liberdade; o que a gente quisesse pedir tinha esperanças de ser atendido."

"A antiga dava mais atenção ao pedido dos empregados; quando se reclamava que o fio estava ruim, o Dr. X tomava conhecimento do fato. Esses não; não sabem de nada do que se passa aqui embaixo e quando o serviço sai ruim a culpa é do operário."

"São competentes, mas antes eles davam mais atenção aos empregados; se um supervisor quer uma colocação para um filho, é mais fácil. Há proteção em relação a eles e às vezes um que precisa mais não é atendido."

Outra fonte geral de insatisfação foram as mudanças nas condições e no ritmo e volume de trabalho.

"Está cada vez pior (a administração); quer serviço bem feito e não pode porque não tem rolo bom e o tear quebrando muito. Enquanto a gente fica parada (por causa disso), não ganha."

"Não é das piores; sistema de trabalho sem cálculo; não há aperfeiçoamento, está caindo; máquina não pára de rodar e não ganhamos um tostão de prêmio."

"Exigem muito; obrigam as pessoas a fazerem mais do que podem. Não perguntam se a gente agüenta ou não; querem produção."

"Está muito mal porque a gente trabalha muito e ganha o mesmo salário de antes."

Também os supervisores não deixam de se referir a esses aspectos ao emitirem sua opinião:

"A administração atualmente parece que está trabalhando com o propósito de melhorar as condições da companhia. Em certos setores há falhas que podem ser corrigidas: os tecelões, por exemplo, trabalham em teares reformados, máquinas velhas. A cada aumento de salário, aumentam o número de máquinas em que o tecelão deve trabalhar. A capacidade do tecelão não dá, ele fica angustiado, não produz o máximo, o pano sai defeituoso, ele fica insatisfeito. Não tocar mais máquinas significa má vontade."

Outro motivo, apontado para justificar uma imagem desfavorável dos administradores, é o "desprezo que eles têm pelos mais antigos":

"Tratam muito bem; são muito bons; têm muita vontade de acertar; mas são muito jovens e inexperientes; têm pouco tempo de administração."

"São muito inexperientes e orgulhosos. Há empregados antigos de prática e eles têm apenas teoria, os 'macetes', a prática, desconhecem e isto prejudica o trabalho."

Respostas como essas refletem a insatisfação com a mudança nos padrões de avaliação de eficiência. Como foi visto, a maior parte desses trabalhadores teve seu aprendizado dentro da própria fábrica. Muitos deles, principalmente os mais antigos, conseguiram cargos melhores e bem remunerados ou vieram a ocupar posições de mando e supervisão, graças à experiência acumulada no trabalho cotidiano. Para esses trabalhadores, chefes que "só têm teoria" ou "não entendem de serviço" não podem ser competentes e lhes parece mesmo absurdo que possam ocupar as posições que ocupam: "esta gerência nova tá muito ruim"; "nunca vi mestre-geral não saber tocar tear".

Embora as diferenças sejam pequenas, os trabalhadores de origem urbana se mostram relativamente mais insatisfeitos (32,3%) com a administração que os trabalhadores de origem rural (28,3%), o mesmo acontecendo com os semiqualificados (29,9%) relativamente aos qualificados (27,3%). Não obstante, é entre os supervisores que se encontra o percentual mais elevado de insatisfeitos (42,6%). Essas diferenças podem ser explicadas, em grande parte, pelo processo de modernização da empresa. Como já foi assinalado, as modificações ocorridas na estrutura de autoridade, a especialização de funções e a formalização das relações do trabalho alteraram sensivelmente o papel dos supervisores, sendo causa de grande insatisfação.40 40 Viram-se eles limitados, na possibilidade de participar das decisões relativas à produção, mais especificamente ao processo de trabalho (atribuição atual dos engenheiros, técnicos e auxiliares) e aumentadas suas responsabilidades sob o pessoal, na supervisão e execução das tarefas. Além do mais, constituindo-se no único nível intermediário da cadeia de mando, sentem-se duplamente pressionados: de um lado, pelos administradores para que "as ordens sejam cumpridas", com muitas das quais não estão de acordo; de outro, pela reação dos operários quanto ao cumprimento dessas ordens. Voltaremos a tratar desse assunto mais adiante.

Efetivamente, os supervisores apresentam percentuais mais elevados de respostas comparativas (33,9%) do que os subordinados (22,8%), e mais que estes, julgam a atual administração pior que a anterior. Por outro lado, o fato de conhecer e estar em contato com os administradores - caso dos supervisores - parece favorecer opiniões restritivas em detrimento das totalmente desfavoráveis. É entre os subordinados que se observa o percentual mais elevado de respostas indecisas tipo "não sei" (8,7% contra 4,4% dos supervisores), geralmente por desconhecerem os dirigentes - e entre os chefes e supervisores a maior proporção de respostas restritivas (16,2% contra 7,8% dos subordinados) - "A administração é boa, mas meio inexperiente, exige muito trabalho", etc.

O grau de instrução também introduz diferenças bastante significativas no que diz respeito à imagem da administração. De um modo geral, segundo o quadro 14, quanto maior o grau de instrução, menos favoráveis ou mais críticas tendem a ser as opiniões sobre os administradores, e, ao mesmo tempo, mais ambíguas ou restritivas e menos taxativas. A clivagem parece estabelecer-se entre os trabalhadores com nível até o primário e com nível do secundário para cima. São dignos de nota, entretanto, os elevados percentuais de indivíduos insatisfeitos com a administração entre os trabalhadores com 1.º e 2.º ciclo, o que pode ser explicado, em parte, pelo fato (já apontado) de esses trabalhadores executarem tarefas que julgam não condizentes com seu nível de qualificação, ou não condizentes com seu grau de instrução - tarefas semiqualificadas e manuais.


O fato de executar ou não tarefas manuais também interfere nas opiniões sobre a administração. Como pode ser observado no quadro a seguir, os trabalhadores manuais tendem a ser mais críticos e mais taxativos em suas opiniões que os trabalhadores não-manuais. Isto denota a influência, além do tipo de trabalho mais diretamente ligado à produção, do fato - conseqüência do primeiro, nesse tipo de estrutura - de o indivíduo estar ou não em posição que facilite contatos mais diretos com o nível de cúpula.

Mas, mesmo nesse caso, os efeitos da modernização se fazem sentir. No setor de produção, é na seção de tecelagem - a mais atingida pelas modificações postas em prática - que se encontram os percentuais mais elevados de indivíduos insatisfeitos com a administração da empresa.

Enfim, há uma discordância entre a imagem da empresa e a da administração, embora não seja totalmente desconhecida a relação de causa e efeito existente entre ambas. A modernização da empresa serve de parâmetro tanto na avaliação da companhia quanto dos administradores. Mas como aquela é avaliada sobretudo por critérios externos - pela relação entre a empresa e seu contexto - são os efeitos positivos desse processo (organização e potência econômica) que tendem a ser mencionados. Sendo os administradores julgados principalmente por critérios internos - estrutura da empresa e situação imediata de trabalho - são os aspectos negativos da modernização que adquirem realce. Face à administração, identificada com as inovações e, por conseqüência, com o "progresso", o trabalhador se revela mais crítico e mais consciente das implicações desse processo para a classe operária: "Num ponto acho que (a empresa) é muito bem administrada, devido a produção; em outro ponto acho muito ruim: querem reduzir o número de operários; para a companhia é melhor, mas o pobre do operário perde a saúde e fica nervoso; e o que ele ganha com isso?"

Quadro 16


Quase a metade dos entrevistados (47,8%) concordou que os administradores consideram em suas decisões, exclusivamente, o interesse da empresa. Porém, 1/3 dentre eles (30,1%) acredita que é o aspecto legal que norteia as decisões tomadas pelo nível de cúpula e quase 1/3 (22,1%) acha que, além do interesse da companhia, os administradores consideram igualmente, em suas decisões, o interesse do empregado. Apesar de se revelarem bastante conscientes do papel da administração, é igualmente forte, entre uma parcela desses trabalhadores, a percepção das relações entre as classes, como passando pela mediação do Estado,41 41 Consultar a respeito Wefford, F. Estado y masas en el Brasil, cit. através da legislação trabalhista, onde os termos da relação capitaltrabalho são apresentados como tendo pesos iguais e equivalentes. Daí a crença - resíduo do período populista e habilmente manipulada pela direção da empresa - de que a legislação trabalhista, ou mais precisamente, o Estado, que ela representa, expressa realmente, passando por cima dos interesses de classe, os verdadeiros interesses da Nação e de seus cidadãos, todos iguais perante a lei, entre os quais se incluem os operários.

6. SUGESTÕES DIRIGIDAS À ADMINISTRAÇÃO DA EMPRESA

Outra forma de apreender as atitudes dos trabalhadores quanto ao trabalho, bem como os efeitos da modernização sobre essas atitudes, consiste em analisar as sugestões dirigidas por eles à administração da empresa.

Se o número de sugestões apresentadas guarda alguma relação com a expectativa de que elas sejam atendidas, aproximadamente 2/3 dos entrevistados não acreditam que os administradores venham ou possam desenvolver qualquer esforço no sentido de alterar as causas da insatisfação que eles encontram no atual trabalho. Apenas 27,2% dentre eles apresentaram sugestões à administração. Mas, se admitirmos que a recíproca é verdadeira, elas devem fazer ressaltar com maior clareza alguns aspectos das atitudes dos trabalhadores em relação ao trabalho fabril que poderiam ficar obscurecidas ou prejudicadas nos itens já considerados. Não somente elas dizem respeito às suas expectativas mais imediatas, como também, não sendo o resultado de perguntas previamente formuladas, são mais espontâneas e, portanto, mais próximas de suas exigências.

Coerentemente com as atitudes relativas ao emprego, as sugestões referentes às relações de trabalho e ao salário indireto ganham prioridade sobre as referências ao salário.

Por outro lado, aspectos tais como "condições de trabalho", "aperfeiçoamento técnico", "promoção" e " recrutamento" adquirem maior realce. Isto parece relacionar-se ao fato de, na avaliação do emprego, os trabalhadores considerarem tanto a situação quanto o mercado de trabalho. Na formulação das sugestões, como no caso da avaliação dos administradores, apenas o primeiro aspecto, isto é, a situação de trabalho, é considerado e a referência principal é a estrutura interna da empresa. Neste caso, é a organização profissional do trabalho à qual a modernização da empresa está estreitamente vinculada que se torna o marco fundamental da análise.

Como ressalta Touraine, analisando a evolução do trabalho operário, "a evolução técnica supõe uma integração e uma unificação crescentes da empresa. A organização do trabalho marca o momento essencial dessa evolução". No antigo sistema de trabalho, "a qualificação se define menos como um nível de conhecimentos que como uma faculdade de decisão, e, em muitos casos, como mando, quer dizer, como um princípio de organização do trabalho... A ausência geral de normas precisas, a falta de padronização dos materiais, a variabilidade das condições de trabalho fazem com que o operário seja julgado antes pelo resultado obtido do que pela definição do trabalho a ser realizado... A qualificação do operário é independente, pois, das condições concretas nas quais se emprega, pelo fato mesmo de que essas condições são variáveis e muito imprevisíveis.

Esta independência, esta liberdade profissional do operário em relação à empresa é inseparável da unidade profissional das categorias operárias em um ofício determinado, unidade fundada na sucessão hierarquizada de níveis de aprendizagem e de decisão. A promoção profissional é, em grande parte, pois, independente das decisões tomadas pela própria empresa: existe uma carreira operária, cujos graus são, com freqüência, marcados por símbolos e ritos. A idade está ligada à qualificação... e a promoção se realiza em grande parte através da cooptação, contentando-se o empresário, quase sempre, em ratificar uma situação adquirida.

Esta situação profissional mantém-se durante todo o período em que a execução do trabalho e, portanto, a capacidade de decisão do operário constituem o princípio central do funcionamento profissional da empresa. Desaparece na medida em que as condições técnicas e econômicas da produção se fazem previsíveis e relativamente estáveis. Então é possível estabelecer um plano de produção, do qual todos os elementos sejam conhecidos por antecipação e as técnicas e os métodos de trabalho possam ser estudados cientificamente. Como os problemas de produção são mais importantes que os problemas de fabricação, a organização centralizada do trabalho coletivo prevalece sobre a capacidade operária de decisão.42 42 O autor distingue três fases principais da evolução profissional da industria, a acima descrita constituindo a primeira. A indústria têxtil ele a situa numa fase de transição, da primeira à segunda fase, contendo elementos dos dois sistemas de organização do trabalho. (Touraine, A. La organización profesional de la empresa.) In: Friedmann, G. E Naville, Y. P. Tratado de sociologia del trabajo. México, Fondo de Cultura Económica, 1963, p. 386-88.

Com efeito, o que a maioria das sugestões apresentadas nos indica é a profunda insatisfação dos trabalhadores, mesmo os menos qualificados, com a perda de autonomia, com a impossibilidade de "dar sugestões", de participar de maneira criativa nas decisões referentes à execução e à organização do trabalho. As sugestões sobre as condições de trabalho são bastante elucidativas sob esse último aspecto:

"O que eu acho que melhorava muito na companhia era uma carreta correndo pela tecelagem numa linha como a de bonde, pois são usados atualmente carrinhos com rodas de ferro que gastam o cimento deixando buracos que precisam sempre ser tapados. Mas eu estou falando só por falar, porque não adianta pensar aqui dentro."

"Tinham que dar mais atenção a reclamação do operário. Ninguém conhece mais a máquina que o tecelão. Se ele reclama da máquina, deviam ser obrigados a tomar providências."

"Acho que antes de alguém ser trocado de máquina, ou mesmo de horário deve ser consultado. Isso evitaria que uma pessoa trabalhando com prazer na sua máquina fosse transferida para outra."

"Acho que deviam mudar o sistema dos umidificadores; eles soltam muita água, umedecem o chão, que se torna escorregadio. Na semana passada caí. A minha sorte é que a máquina estava parada, senão cortava a mão fora."

"Ê muita máquina para a gente operar, principalmente a tecelagem e fiação são prejudicadas nessa questão. Foi aumentado o número de máquinas o que sacrifica muito o operário. Trabalhando em 14 teares não é possível eficiência com perfeição no seu trabalho. Além de tudo, tem o problema de produção que é a base do seu salário. Se ele se interessar pela perfeição, haverá uma grande diferença no seu trabalho. Para fazer um trabalho perfeito, sua produção terá de ser menor, em conseqüência, o seu salário também será menor. Contribuiria para a perfeição que uma pessoa fiscalizasse os defeitos de tear e de remataçâo."

"Não adianta pedir, mas eu vou pedir, assim mesmo, para diminuir o número de máquinas. Parece que eles nos querem ver mortos ou malucos. Precisava ter um quadro de ajudante de tecelão."

Essas sugestões, ao mesmo tempo que evidenciam as más condições de trabalho a que estão submetidos os trabalhadores, indicam, além do interesse em saná-las, que o operário tem idéias próprias a respeito. São idéias que não visam exclusivamente a satisfação de interesses que se definem fora da empresa, mas que são dirigidas à própria atividade profissional:

"Acho que um telhado que há na tecelagem (de amianto) deve ser trocado por telha de madcirite porque é uma telha melhor e, do jeito que está, sempre que chove molha os teares, os motores, os panos; atrapalha o trabalho do operário e dá prejuízo para a casa."

"Quando o motor do elevador queima, a seção existente em cima fica desprovida de meio de transporte para caixas de fio e carrinho para tirar espulas da máquina. Quer dizer, os amadores têm de levar essas caixas e carrinhos nas costas. Se existisse um motor sobressalente evitaria o desgaste físico e a perda de produção."

"Quando a companhia de eletricidade desligava a força, o filtro ficava parado. Na tinturaria ficavam rodando três ou quatro máquinas e acabava com a água. O filtro ficava sem água. Podia ligar a caixa do filtro na usina para o caso de faltar água. Melhor coisa que fizesse era isso. Já falei, mas disseram que a carga não dava. Mas acho que dá, era só revezar."

"A atual administração devia encarar os problemas da fábrica com mais realidade e procurar ser mais justa, porque eles fazem muita injustiça com os empregados. Faço o serviço de calibragem nos teares. Vejo que estão faltando peças e eles não tomam providências. Só pode ser porque não querem tomar. Tem empregado aqui capacitado, mas no entanto eles não dão apoio no setor de seu trabalho."

Essa necessidade de participar ou de influir de alguma forma no processo de trabalho, de não ser um mero executor de ordens, de personalizar a produção - mais aguda entre os trabalhadores mais qualificados - reflete-se igualmente nas sugestões relativas às relações de trabalho:

"A administração devia se aproximar mais do operário: eles não trocam idéia com a gente, não aceitam nossas sugestões."

"Sugeria haver uma troca de chefes que aceitam sugestões para não ter que fazer o serviço duas vezes como vem acontecendo na minha seção."

"A administração devia ouvir mais a gente (supervisores) antes de tomar certas decisões. Eles costumam dar alguns serviços fora, mas não nos comunicam nada. Fica-se sabendo apenas quando se vê povo de fora trabalhando aqui dentro, ou se não é dentro da fábrica, a gente nem fica sabendo. Essa gente de fora que veio instalar os teares Howa, por exemplo, veio preparar o piso. Gastaram muito material, o que eu pude anotar foi só cimento, que era comigo que tinham que buscar, e fizeram uma quebração danada. Na hora de colocar os teares não houve mais uma seção, quebra dali, quebra daqui, até ficar pronto. Para a segunda remessa, o Dr. X foi conversar comigo dizendo que eu ia cuidar do próximo piso. Providenciei tudo e em 12 dias o serviço estava pronto. E muito melhor que o outro, pois não se precisou quebrar nada para colocar os teares. E gastei menos que eles."

Por sua vez, semelhantemente ao supervisor em relação aos técnicos da administração, também o operário se sente tolhido em seu trabalho pelo supervisor:

"Eles são muito autoritários, acham que o indivíduo só porque é empregado não pode opinar, não querem que o empregado fale não; só querem que ele faça. Agora, um sujeito que é tecelão a vida inteira, conhece bem o serviço pode falar sobre ele mais que um outro que nunca fez, mas está em posição de mando, não é?"

"Quando a gente tem que modificar uma coisa ou outra de determinado processo, conforme a quantidade de pano, eu faço primeiro e depois comunico a ele (supervisor) porque se a gente falar antes ele vai achar que não dá certo e até tenho medo que ele modifique a coisa, pra botar a culpa na gente. Ele nunca dá oportunidade pra gente conhecer mais. Não dá condições nem permissão pra gente fazer determinadas experiências."

Mas a necessidade de "emitir sugestões" está intimamente ligada à necessidade de receber recompensas:

"Às vezes, no meio de muitos operários, ocorre que uma pessoa dá uma idéia boa e útil e fica no anonimato, levando a fama quem levou a idéia. Devia ser ao contrário, pelo menos para se ganhar um elogio que funciona como uma gratificação; às vezes a pessoa que leva a idéia lá em cima não precisa de promoção." Daí a dificuldade em se aceitar a mediação dos supervisores, porque "todos os operários têm sugestões a dar; mas estas devem ser solicitadas a eles, pois os supervisores apanham as idéias e 'apadrinham* sendo que os que (as) fizeram ficam sem estímulo". Por esse motivo, "a administração deveria dar em cima dos supervisores e saber mais o que acontece nas seções para, em caso de dificuldades, não tomarem sempre as decisões contra os empregados."

"A companhia deveria ouvir o empregado com conflito para saber as causas do choque com o supervisor. O caso mais freqüente é que o operário vem trabalhando bem, de repente com a mudança de chefia (administração) ou de supervisores ele é prejudicado, às vezes sem motivo. O operário guarda aquela mágoa porque não foi valorizado, não tendo chance de defesa, se queixa dessa atitude a vida toda."

"Acho que a administração deveria ver se os chefes estão sendo sinceros porque no meu caso, se continuar assim, vou ser obrigado a pedir demissão. Ia ser mandado embora, porque o chefe disse ao Dr. J que o meu serviço era péssimo, mas por sorte conversei com o Dr. J. e expliquei que andava muito preocupado com as dívidas que tinha pra pagar e então pude ficar."

Os supervisores, por sua vez, ficam entre "a cruz e a caldeirinha":

"A diretoria não aceita sugestões. A fabrica atualmente andou pedindo aos supervisores cooperação no sentido de avaliar o trabalho de cada operário, pra fazer um salário de acordo com a função de cada um. Isto já tem um ano e até hoje não surtiu nenhum efeito. Tem um rapaz lá na minha seção, por exemplo, que produz bem, trabalha no mesmo serviço que os outros, dá a mesma produção, mas ganha menos. É claro que ele fica chateado. Tem dia que o rapaz está mesmo ruim. Então eu que já sei do seu problema procuro conversar com ele com jeito, elogiá-lo, dar conselhos. Ele me agradece por tudo, mas continua achando que a fábrica não tem consideração com ele. E eu não posso fazer nada, porque ele tem razão. Isto me tira a autoridade para exigir coisas do meu pessoal."

"Convocam a gente para discutir assuntos de todas as espécies e não adianta nada porque, afinal, a gente não tem poder de decisão."

"É a coisa mais difícil de minha função eu ter que recorrer aos administradores. Eu e meu pessoal nos damos muito bem. Quando vejo um problema no operário vou ensinando, aconselhando, pra saber o que há, se é doença, problema em casa, etc. Mas se ele não quiser melhorar, então chamo ele pra uma conversa mais séria e digo: olha fulano, eu cooperei toda a vida com você e você não toma jeito; se você não quiser me ouvir vou ser obrigado a prejudicar você, porque senão é você quem está me prejudicando, porque sou eu o responsável pelo serviço que você não está fazendo direito. Se você quiser, eu te ensino outra vez, mas do jeito que está não pode ficar. Eu vou ter que reclamar de você aos homens."

"Eles deviam conversar, aceitar sugestões dos operários. Eu sempre peco para colocar no jornal as sugestões dos meus operários. A administração também devia chegar mais perto dos operários."

A administração, por sua vez, como foi visto, responsabiliza o supervisor: "alguns, muito ignorantes, não sabem transmitir direito as ordens, não fazem ver aos operários nem à administração o que está correto ou errado, não assumem o seu verdadeiro papel." Os próprios supervisores reconhecem: "Quando há um problema, acredita-se que o meio-termo entre os operários e a administração sejam os supervisores de linha, mas estes não cumprem esse papel intermediário. Estão de um ou de outro lado."

"Às vezes os colegas supervisores fazem brincadeiras comigo porque eu gosto de pegar no serviço, dizendo que não devo trabalhar como nos operários, que devo orientar o serviço."

"Falar com a gente antes de fazer as coisas. Inventaram um negócio aqui que acabou virando um golpe contra a gente: fui chamado pela administração e eles me fizeram uma porção de perguntas. Eu fui dando todas as informações e, quando acaba, isso valeu para formar o salário deles (operários). Quer dizer, eu, sem querer, fui a causa deles terem essas diferenças. Eles foram me pegando e eu fui soltando o que achava mesmo; eles agiram que nem políticos. E me tiraram a autoridade."

Daí o desentendimento e a diferença de pontos de vista entre os supervisores mais antigos e os mais novos, já incorporados ao novo sistema que explicam sugestões desse tipo:

"Procurar estabelecer maior harmonia entre os supervisores. Entre supervisor e operário não há problema, mas entre os diversos supervisores, sim. Procurar eliminar ou isolar os falsos admiradores dessa atual administração. Há pessoas que não gostam dela, mas sendo disfarçadas não externam suas idéias. Isto perturba toda engrenagem da companhia."

Mas, além da relação com a administração e o operário, os supervisores enfrentam também a relação com os mecânicos:

"Melhorar as relações entre supervisores e mecânicos. Nós somos auxiliares diretos deles (administradores). Agora, o mecânico é, por sua vez, o auxiliar direto dos supervisores e esses mecânicos precisam ter o mesmo tratamento que os chefes dão aos supervisores. Têm que ser tratados com carinho, têm que ter confiança neles. Os supervisores jogam para os mecânicos a culpa da queda da produção. Eles (os mecânicos) dizem que não têm nada com isso porque cuidam só da parte das máquinas. Os supervisores dependem dos mecânicos porque, se eles se aborrecem, o trabalho cai mesmo."

O que expressam essas sugestões, enfim, é a dificuldade que sentem esses operários em adaptar-se à nova organização da empresa. Como desabafa um supervisor: "Sei lá, é uma coisa difícil explicar essas mudanças. Mas uma coisa é certa: a relação entre empregado e patrão é bem diferente da relação entre empregado-superior hierárquico. A primeira relação a gente aceita muito mais. E por que isso? Era o problema do Dr. X. Ele era tomado como um patrão aqui dentro. O que ele falasse estava falado. Ê o problema da organização. Ele era o cabeça, cabia a ele tomar as decisões. Mas agora não é assim. Se a pessoa vai tratar de um assunto com o Dr. Y que é, também como era o Dr. X, o diretor da fábrica, se o assunto envolve outros dirigentes, ele não pode dar uma resposta imediata à pessoa. Tem que conversar com os outros elementos da administração primeiro. A solução não é dada na hora e vai pelo canal competente. Ê mais demorado. Atrasa o serviço e o pessoal fica insatisfeito."

O que os trabalhadores solicitam da Administração em termos de remuneração não se refere propriamente ao salário mas aos prêmios:

- "Fazerem um prêmio de acordo com o trabalho que exige o número de máquinas, pois assim a pessoa trabalha mais satisfeita - 50% de aumento se continuarem as máquinas. Mas o que devem fazer mesmo é diminuir o número de máquinas."

- "Todos os empegados da fábrica deviam ser aumentados. Deviam dar prêmios a todo mundo. A fábrica tem possibilidades para isso."

- "Acho que devia haver um aumento no prêmio dos arreadores. São muitas máquinas e a responsabilidade dos arreadores é muita. De modo que esse aumento é merecido."

"A companhia devia olhar para os empregados e facilitar mais os meios de vida para eles. O certo é que o empregado vive da companhia, mas também a companhia vive do empregado. Uma melhor remuneração, nem que seja na forma de prêmios, seria conveniente."

Mas o baixo número de sugestões sobre a remuneração e a não explicitação do salário propriamente dito não significam, como já foi visto, que os trabalhadores se julgam bem remunerados. Devem-se à interferência da legislação trabalhista e às condições do mercado de trabalho local, claramente expressas no comentário de um supervisor:

"Um tipo de problema que sempre surge nas conversas entre os empregados aqui na fábrica é o problema do salário. Isto é geral. Aparece em qualquer conversa. Sempre vem à tona deixando transparecer que o salário não é suficiente. Não é queixa de salário baixo, no sentido que a fábrica pague mal, com exceção de uma ou outra função porque aqui a I.T. está acima da média das indústrias de Juiz de Fora. Mas o problema é da situação geral. A coisa não dá mesmo. Eu não sei como esses operários podem viver com o salário que ganham."

Além da posição de mando e das modificações na organização do trabalho, principalmente na forma de recrutamento para o nível intermediário, a diferença de remuneração é um dos fatores que tende a aumentar a distância entre "esses operários" e os supervisores que, sem virtude de sua qualificação e do próprio mercado de trabalho local, se tornam relativamente mais independentes da política salarial do Governo. Isso contribui para acentuar o conflito entre as duas categorias:

"Quando nós tivemos o último aumento (os supervisores), o novo salário (mínimo) não tinha ainda saído e tudo foi feito sigiloso porque eles (os operários) não precisavam saber. Mas um cara da fiação chegou em casa e contou ao seu pessoal que tinha sido aumentado. O outro parente que também trabalha aqui, no dia seguinte, espalhou a notícia. E todo os empregados ficaram sabendo do aumento dos supervisores. Houve um malestar geral. E até andou saindo umas coisas escritas contra a gente. Já não me lembro mais, mas falava que os parasitas (os supervisores) tinham aumento e quem trabalha, não."

Impossibilitados de recorrer à empresa, porque quem dá aumento de salário é o Governo, os trabalhadores concentram-se nas sugestões sobre o salário indireto:

"Reorganização do antigo refeitório para o fornecimento de refeições aos operários que estão em dificuldades de trazê-las."

"Colocar ônibus da companhia para levar os trabalhadores que gastam condução."

"Aumentar a quantidade de pão do lanche e dar leite aos empregados."

"Organizar um armazém para fornecer alimentos mais baratos aos operários."

"Criar um abono escolar para, no princípio do ano, atender às necessidades da família."

"Melhorar a cooperativa para ter empréstimo sem muito sacrifício."

As sugestões sobre serviços de saúde, especialmente sobre o funcionamento de descontos para remédios são muito freqüentes, o que um supervisor (da seção de pessoal) explica:

"Um tipo de problema que também estamos enfrentando agora é o problema de saúde. Tem havido muito afastamento por motivo médico. Se vamos analisar a coisa, caímos no problema do salário que vem minguando enquanto o custo de vida sobe. Além da deficiência física, o que mata é a preocupação. Temos tido bom número de casos de doenças nervosas. A pessoa tem que ficar doente vendo que, por mais que trabalhe, o dinheiro que ganha não dá. Eu acho que esse problema é grande tanto em número como em gravidade. Até há pouco tempo, não tínhamos tuberculose aqui, e de três meses para cá já apareceram dois casos. Doenças nervosas, gente desorientada como dizem, temos muito também. Não estou em condições de julgá-los porque não entendo de medicina, mas acho que várias coisas podem levar a isso. O mal é mais psíquico que físico. Esse barulho o dia inteiro, o problema do salário baixo. Uma pessoa da tecelagem, por exemplo, tem que ficar com a cabeça quente."

No que diz respeito ao aperfeiçoamento técnico, os trabalhadores sugerem tanto melhorias nas máquinas e matérias-primas, como de pessoal:

"Que os fios fossem melhorados."

"Trazer melhores peças para as máquinas."

"Melhorar as espulas e o fio que arrebenta muito."

"Promover um curso de conhecimentos de fibras por um instrutor capaz."

"Curso de especialização para os supervisores."

As sugestões sobre recrutamento e promoção evidenciam, mais uma vez, a insatisfação dos trabalhadores com os novos critérios adotados para ambos os casos. No primeiro:

"Que sejam dadas preferências aos indicados dos empregados e não a estranhos."

"Mudar a política de admissão. Não devem importar que o elemento seja parente de a ou de b, e sim de aproveitar os mais capazes."

No segundo caso:

"Dar preferência, nas promoções, à "prata da casa" e não aos de fora, como atualmente é feito."

"Que, para o preenchimento de cargos de chefia, sejam aproveitados os mais antigos."

"Que todos os chefes, subchefes e ainda substitutos de chefes de uma seção fizessem um curso antes de ocupar esse cargo para que entendessem a fundo o mecanismo da produtividade e não apenas da produtividade do maquinista, porque em caso da não-produtividade ele saberia a razão da mesma."

Quanto às sugestões que classificamos aqui, na falta de um termo melhor, como "outras", são as que melhor exprimem a insatisfação que sentem os trabalhadores entrevistados com as mudanças ocorridas na empresa e como eles traduzem e realizam as suas conseqüências:

"Além da companhia visar o seu próprio interesse, deve olhar também para a situação do operário que está atualmente relegado a segundo plano."

"Que à medida que os lucros da fábrica forem aumentando, haja divisão de lucros com os empregados.

"Valorizar mais o homem e menos a máquina." "Não devem dar muito ouvido a esses americanos, pois nós devemos ter alguma coisa de nós mesmos."

"A fábrica devia ter mais emprego; há muita gente desempregada e que precisa trabalhar. Mas falam que, para a fábrica, quanto menos gente melhor; tem menos possibilidade de falir. Ê o que fazem: procuram aumentar o serviço para diminuir os empregados."

Esta parece ser uma das principais preocupações desses trabalhadores. Segundo palavras do supervisor mencionado atrás:

"Outro problema daqui é o da modernização. O grupo sente isto. A gente nota, nossas conversas informais, que te disse. Os empregados ficam preocupados com essa modernização por causa de se exigir com ela menos trabalhadores e assim eles perderem o emprego. Uma máquina passa a fazer o que vários deles faziam. Isto que vemos aí agora é o pingo d'água que transbordou, porque não temos parado. Sempre continuamos a modernizar."

Essas mudanças são atribuídas não ao Governo, mas aos administradores. Há mesmo quem sugira simplesmente: "trocar a administração", como quem diz "deixem a indústria, levem a exploração."

Não obstante, elas são igualmente relacionadas ao "progresso", uma vez que constituem a condição da estabilidade econômica da empresa. Sem dúvida, além de reforçar a consciência de explorado e acirrar o conflito com a classe empresarial, através de seus representantes mais imediatos (os administradores), as mudanças induzem a uma nova concepção do desenvolvimento por parte desses trabalhadores. Isto porque elas representam, de fato, não somente a desagregação de um sistema profissional e a passagem para o sistema técnico, mas a ruptura e a incorporação da empresa, a um novo sistema, tanto econômico quanto político, que se efetivou no país em março de 1964.

Em resumo: de um modo geral, as opiniões dos operários estudados, quanto aos elementos da situação de trabalho aqui examinados (emprego, empresa, salário e administradores são bastante homogêneas, assim como os critérios utilizados para emiti-las. A origem (rural ou urbana) não interfere de modo significativo sobre nenhuma dessas atitudes. O grau de instrução, a qualificação e a posição do indivíduo na estrutura de poder da empresa, ao contrário, introduzem algumas diferenças. Não obstante, alguns traços comuns a todo o grupo puderam ser identificados.

Em primeiro lugar, as atitudes desses operários são marcadas por uma orientação simultaneamente "economicista" e "profissionalista", que pouco ou nada tem a ver com sua origem mas que se organizam a partir de uma experiência de trabalho como operário num determinado contexto urbano-industrial. O primeiro tipo de orientação tende a ser mais acentuado quando a referência, na avaliação, é o mercado de trabalho e o segundo tipo, quando a referência é a situação de trabalho ou a estrutura interna da empresa. A modernização da fábrica acelerando a decomposição do sistema profissional tende a satisfazer, e a estimular as atitudes "economicistas" e a contrariar as "profissionalistas" que aparecem de forma mais acentuada como causa de insatisfação no trabalho.

Os trabalhadores têm uma imagem extremamente favorável da I.T., o que não implica um envolvimento de caráter moral com a empresa, nem que eles estejam satisfeitos com os administradores, com o trabalho que executam, ou com o salário que recebem. O que existe é apenas uma identificação para "uso externo" com o "progresso industrial" - fruto da modernização - que a empresa simboliza. Isto ocorre porque a I.T. é avaliada, não por sua organização interna, mas pela relação entre a empresa e seu contexto, isto é, em função principalmente do mercado de trabalho local. Já o salário, e principalmente dos administradores, são julgados por referência à situação imediata de trabalho, sendo o grau de insatisfação, neste caso, muito maior que no primeiro.

Os trabalhadores distinguem nitidamente não somente a companhia, empresa econômica, e os administradores encarregados de sua política interna, mas também os administradores da empresa e aqueles do Estado através da legislação trabalhista. Distinguem duas esferas e se orientam em função de dois patrões ou de dois sistemas de dominação: o da empresa e o do Estado, em relação aos quais mantêm a mesma ambigüidade geral que caracterizam suas atitudes: a companhia é avaliada positivamente porque, em relação às outras companhias, paga pontualmente e cumpre a lei, isto é, cumpre as determinações do Estado. Mas, ao mesmo tempo que protege, o Estado limita o trabalhador ao impedir que seus salários sejam aumentados. A administração, por sua vez, é considerada boa porque administra bem a empresa, garantindo sua estabilidade econômica e o cumprimento das determinações do Estado. Mas tal estabilidade, obtida ao custo de modernização, ao mesmo tempo que garante, limita o número de empregos, diminui a autonomia do operário e aumenta a exploração do seu trabalho. O trabalhador torna-se mais consciente e mais ambivalente em suas atitudes face ao trabalho e, muito provavelmente, à sociedade em geral.

  • * O presente artigo é o resultado da fusão, com as modificações que se fizeram necessárias, de três capítulos de nossa tese de doutorado, Les ouvriers et le populisme, apresentada à Universidade de Paris X, em junho de 1973.
  • 6 Goldhorpe, J. H.; Lockwood, D. et alii. The affluent worker. industrial attitudes and behavior. London, Cambridge University Press. 1968 p. 36.
  • 8 Cf. Lopes, Juarez Brandão. Sociedade industrial no Brasil. São Paulo, Difel, 1964; Touraine, Alain. Industrialisation et conscience ouvrière à São Paulo. Sociologie du Travail, n. 4, 1961;
  • e Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias. São Paulo, Brasiliense, 1970.
  • 11 Ao nível dos conflitos do trabalho são os Tribunais do Trabalho que cumprem essa função. Consultar, entre outros: Besouchet, Lidia. História da criação do Ministério do Trabalho; ensaio de interpretação. Rio de Janeiro, Serviço de Documentação do Ministério do Trabalho, s.d. (Col. Lindolfo Collor); Brandão, Alonso Caldas. Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto lei n.ş 5 452, de 1.ş 05.1943). Rio de Janeiro, MTPS-CTOS, 1962;
  • Amaral Azevedo. O Estado autoritário e a realidade nacional. Rio de Janeiro, José Olympio, 1938;
  • e para os efeitos da legislação trabalhista sobre o sindicato e o comportamento político operário, Rodrigues, José Albertino. Sindicato e desenvolvimento no Brasil. São Paulo, Difel, 1968;
  • e Weffort, Francisco C. Estado y masas en el Brasil. Revista Latino-Americana de Sociologia, Buenos Aires, maio 1965.
  • 21 Cf. Schneider, Eugene, V. Industrial sociology. New York, Mac-Graw-Hill Book, 1967. In: Rodrigues, Leôncio Martins. Industrialização e atitudes operárias, cit. p. 68; e Moore, W. Industrial relations and the social order. New York, The MacMillan Co., 1956, cap. 11.
  • 34 Consultar sobre a situação do empresârio nacional: Cardoso, Fernando Henrique. Empresário industrial e desenvolvimento econômico. São Paulo, Difel, 1964; e do mesmo autor: Política e desenvolvimento nas sociedades dependentes: ideologias do empresário industrial argentino e brasileiro. Rio de Janeiro, Zahar, 1971.
  • *
    O presente artigo é o resultado da fusão, com as modificações que se fizeram necessárias, de três capítulos de nossa tese de doutorado,
    Les ouvriers et le populisme, apresentada à Universidade de Paris X, em junho de 1973. Para esta parte de nosso estudo utilizamos o material coletado entre 602 operários da fábrica mencionada no período 1966/68. A metodologia utilizada e o questionário aplicado se encontram no referido trabalho.
  • 1
    Essas abordagens refletem dois tipos de preocupação diferente. A primeira, uma preocupação politica com a mudança da sociedade; a segunda, aquela com a produtividade do trabalho e com o consenso social.
  • 2
    Frisch-Gauthier assim define o conteúdo desse termo: "O moral no sentido comum pode ser entendido como o estado de espirito de um individuo ou de uma coletividade, por referência a um objetivo a ser atingido, ou sem nenhuma referência precisa; encarado relativamente ao quadro das organizações e das empresas industriais, concerne a uma certa relação entre os 'sentimentos' do trabalhador e o rendimento procurado pela empresa. Trata-se, portanto, de uma reação ao mesmo tempo individual e coletiva aos fins da organização." Frisch-Gauthier, Moral et satisfaction au travail. In: Friedmann & Naville:
    Traité de sociologie du travail. Paris, Armand Colin, 1964 p.133-4.
  • 3
    Consultar entre outros: Friedmann, G.
    Problèmes du machinisme industriel. Paris, Gallimard, 1964; e Frisch-Gauthier. Moral et satisfaction au travail, op. cit.
  • 4
    Cf. Blauner, Robert. Work satisfaction and industrial trends. In: Galenson, E. & Lipset, S. M.
    Labor and trade unionism. New York, John Wiley & Sons, 1960.
  • 5
    Work satisfaction and industrial trends. cit. p. 354-6.
  • 6
    Goldhorpe, J. H.; Lockwood, D. et alii.
    The affluent worker. industrial attitudes and behavior. London, Cambridge University Press. 1968 p. 36.
  • 7
    A referência à sociedade global nao é suficiente para dar conta das orientações em direção ao trabalho. Isso exigiria uma análise que levasse em conta a relação dialética entre, de um lado, as estruturas objetivas e de outro, as práticas e as representações, do tipo, por exemplo, daquela proposta por Pierre Bourdieu em seu livro:
    Esquisse d'une théorie de la pratique. Paris, Librairie Droz, 1972. A natureza de nossos dados, entretanto, não nos permitiu uma tentativa desse gênero.
  • 8
    Cf. Lopes, Juarez Brandão.
    Sociedade industrial no Brasil. São Paulo, Difel, 1964; Touraine, Alain. Industrialisation et conscience ouvrière à São Paulo.
    Sociologie du Travail, n. 4, 1961; e Rodrigues, Leôncio Martins.
    Industrialização e atitudes operárias. São Paulo, Brasiliense, 1970.
  • 9
    Tendo em vista as condições de formação do operariado no Brasil, recrutado a partir de 1930 em meio ao excedente de mão-de-obra rural, a migração e seus resultados ocupam um lugar central nas análises sociológicas sobre as atitudes dos trabalhadores brasileiros. O trabalhador vindo do campo teria uma conduta "tradicionalista", isto é, orientada pelos valores da comunidade de origem (Lopes, op. cit.) ou em termos de "mobilidade individual": o individuo considera sua migração como uma ascensão social, mas não aceita a empresa como o meio necessário ao seu sucesso profissional (Touraine & Rodrigues, op. cit.). Ambos os tipos de conduta seriam responsáveis pela não-identificação por parte do trabalhador com a "condição operária" e, em conseqüência, por suas atitudes "economicistas" - supervalorização do salário ein detrimento das condições de trabalho, e "instrumentalistas" - uso instrumental, isto é, visando o atendimento de interesses individuais, e nãode classes-em relação ao trabalho, à empresa e ao sindicato. Não cabe aqui entrar no mérito destas conclusões nem da abordagem a elas subjacentes, mas apenas salientar que parte do presente trabalho constitui um esforço para testar a possibilidade de generalização destas conclusões que, como veremos, não se aplicam, ou se aplicam apenas parcialmente ao grupo estudado.
  • 10
    Cf. Loyola, Andréa: Trabalho e modernização na indústria têxtil,
    Revista de Administração de Empresas, Rio, FGV, n. 5, set./out. 1974.
  • 11
    Ao nível dos conflitos do trabalho são os Tribunais do Trabalho que cumprem essa função. Consultar, entre outros: Besouchet, Lidia.
    História da criação do Ministério do Trabalho; ensaio de interpretação. Rio de Janeiro, Serviço de Documentação do Ministério do Trabalho, s.d. (Col. Lindolfo Collor); Brandão, Alonso Caldas.
    Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto lei n.º 5 452, de 1.º 05.1943). Rio de Janeiro, MTPS-CTOS, 1962; Amaral Azevedo.
    O Estado autoritário e a realidade nacional. Rio de Janeiro, José Olympio, 1938; e para os efeitos da legislação trabalhista sobre o sindicato e o comportamento político operário, Rodrigues, José Albertino.
    Sindicato e desenvolvimento no Brasil. São Paulo, Difel, 1968; e Weffort, Francisco C. Estado y masas en el Brasil.
    Revista Latino-Americana de Sociologia, Buenos Aires, maio 1965.
  • 12
    Entre outros: a criação de Belo Horizonte que assume, pouco a pouco, a hegemonia econômica e política em Minas Gerais; a ampliação do sistema viário, tirando de Juiz de Fora sua posição privilegiada de ponto extremo da principal via de comunicação entre o Rio de Janeiro - na época a metrópole nacional mais importante - e a Zona da Mata e a região central de Minas; deslocamento do eixo da economia nacional para o estado de São Paulo e perda relativa do dinamismo do setor têxtil, com o processo de substituição de importações, a partir da década de 50.
  • 13
    Para se ter uma idéia dessa relativa decadência, Juiz de Fora passou de quarta cidade mais populosa do País, no início do século, para 15.ª em 1940, 18ª em 1950 e 24ª em 1970 (dados extraídos da revista
    Realidade, Ano XLIV, n. 25, junho 1972)
  • 14
    Em 1967, entre 70 estabelecimentos industriais de Juiz de Fora, em 25 a participação dos dois maiores acionistas (e, no caso, únicos) era de 100%; em 16, era de 90 a 100% e em sete de 80 a 90%. Entre 180 diretores de estabelecimentos, no mesmo ano, 152 eram acionistas de mais de 10% do capital ou tinham laços de parentesco com tais acionistas. Ainda no mesmo ano, num total de 85 casos, em 73 os capitais eram procedentes de Juiz de Fora; em seis do Rio de Janeiro; em dois de São Paulo; em um de Belo Horizonte; em um, da Zona da Mata e em um do exterior (dados extraídos do
    Estudo para o desenvolvimento integrado de Juiz de Fora, realizado pela Splan - Sociedade de Pesquisas e Planejamento - em convênio com a Prefeitura Municipal de Juiz de Fora e sob o patrocínio da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais. Juiz de Fora, 1967/68. mimeogr.).
  • 15
    Karpik, Lucien: Urbanisation et satisfaction au travail. In:
    Sociologie du travail 2/66, Paris, 1965. Sobre a industrialização e o movimento operário em Juiz de Fora, consultar Loyola, Andréa:
    Les ouvriers et le populisme, op. cit. p. 56.
  • 16
    Para maiores detalhes sobre esse grupo de operários, consultar: Loyola, Andréa:
    Les ouvriers et le populisme, op. cit.
  • 17
    Rodrigues, Leôncio M.
    Industrialização e atitudes operárias, cit.
  • 18
    Opomos aqui "moderna" e "tradicional" sem outras implicações que a da implantação mais recente ou mais antiga do setor industrial no Pais. Consultar a esse respeito. Ministério do Planejamento Econômico e Social,
    Indústrias tradicionais, um reexame crítico. Rio de Janeiro, Planejamento e Coordenação Geral, 1967, mimeogr.
  • 19
    Esses benefícios pagos pela empresa visam explicitamente, além de atrair e fixar a mão-de-obra na empresa, complementar a insuficiência do salário necessário à reprodução da força de trabalho, possibilitando, ao mesmo tempo, uma exploração mais plena e racional das possibilidades dos trabalhadores.
  • 20
    Consultar a respeito: Friedmann, G.Tendences d'aujourd'hui perspectives de demain. In: Friedmann E Naville.
    Traité de sociologie du travail, cit. cap. 25.
  • 21
    Cf. Schneider, Eugene, V.
    Industrial sociology. New York, Mac-Graw-Hill Book, 1967. In: Rodrigues, Leôncio Martins.
    Industrialização e atitudes operárias, cit. p. 68; e Moore, W.
    Industrial relations and the social order. New York, The MacMillan Co., 1956, cap. 11.
  • 22
    Consultar Loyola, Andréa. Trabalho e modernização na indústria têxtil, cit.
  • 23
    Quando foi realizada a pesquisa (1966/68) a Lei do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço ainda não estava em vigor.
  • 24
    Rodrigues, Leôncio Martins.
    Industrialização e atitudes operárias. cit. p. 72.
  • 25
    Cf. Oliveira, F.
    A economia brasileira: notas para uma revisão teórica. São Paulo, CEBRAP, 1972. p. 6, mimeogr.
  • 26
    Rodrigues, Leôncio Martins.
    Industrialização e atitudes operárias. cit. p. 102.
  • 27
    Id. ibid. p. 102.
  • 28
    Id. ibid. p. 201.
  • 29
    Esses resultados coincidem com aqueles obtidos na França por Karpik e na Inglaterra por Goldhorpe, onde são os indivíduos mais instruídos que atribuem maior importância a esse aspecto de trabalho e que, igualmente, possuindo aspirações mais fortes, tendem a ser mais insatisfeitos no trabalho (cf. Karpik. Urbanisation et satisfaction au travail, cit. p. 194-6, e Goldhorpe, J. H.; Lockwood, D. et alii.
    The affluent worker: industrial attitudes and behavior. cit. cap. 6).
  • 30
    A fim de evitar as reações em massa e abrandar os descontentamentos (num desses aumentos do número de máquinas, os tecelões paralisaram a seção), os administradores passaram a fazer um aumento gradativo paralelo à decretação de novos niveis do salário mínimo. O aumento do número de máquinas não significa acréscimo de equipamento novo, embora algumas vezes isso tenha ocorrido, mas sim diminuição do número de operários e aumento de serviço para os que permaneceram ou foram admitidos após a introdução dos novos métodos de racionalização do trabalho.
  • 31
    Cf. Rodrigues, Leôncio Martins.
    Industrialização e atitudes operárias, op. cit. p. 50-1.
  • 32
    Id. ibid. p. 50.
  • 33
    Id. ibid. p, 51-2.
  • 34
    Consultar sobre a situação do empresârio nacional: Cardoso, Fernando Henrique.
    Empresário industrial e desenvolvimento econômico. São Paulo, Difel, 1964; e do mesmo autor:
    Política e desenvolvimento nas sociedades dependentes: ideologias do empresário industrial argentino e brasileiro. Rio de Janeiro, Zahar, 1971.
  • 35
    Cf. Goldhorpe, J. H.; Lockwood, D. et alii.
    The ajfluent worker. industrial attitudes and behavior. cit.
  • 36
    Rodrigues, Leôncio Martins.
    Industrialização e atitudes operárias. cit. p. 64.
  • 37
    Id. ibid. p. 66-72.
  • 38
    sobre as transformações ocorridas na empresa, consultar:
    Trabalho e modernização na indústria têxtil, cit.
  • 39
    O cálculo mútuo (tanto da parte do empresário como do trabalhador) que envolve a troca de serviços e interesses subjacentes às relações paternalistas de trabalho, em duas comunidades da Zona da Mata, é descrito em Lopes, Juarez Brandão.
    Crise no Brasil arcaico. São Paulo, Difel, 1967.
  • 40
    Viram-se eles limitados, na possibilidade de participar das decisões relativas à produção, mais especificamente ao processo de trabalho (atribuição atual dos engenheiros, técnicos e auxiliares) e aumentadas suas responsabilidades sob o pessoal, na supervisão e execução das tarefas. Além do mais, constituindo-se no único nível intermediário da cadeia de mando, sentem-se duplamente pressionados: de um lado, pelos administradores para que "as ordens sejam cumpridas", com muitas das quais não estão de acordo; de outro, pela reação dos operários quanto ao cumprimento dessas ordens. Voltaremos a tratar desse assunto mais adiante.
  • 41
    Consultar a respeito Wefford, F.
    Estado y masas en el Brasil, cit.
  • 42
    O autor distingue três fases principais da evolução profissional da industria, a acima descrita constituindo a primeira. A indústria têxtil ele a situa numa fase de transição, da primeira à segunda fase, contendo elementos dos dois sistemas de organização do trabalho. (Touraine, A. La organización profesional de la empresa.) In: Friedmann, G. E Naville, Y. P.
    Tratado de sociologia del trabajo. México, Fondo de Cultura Económica, 1963, p. 386-88.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 1975
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