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Os estilos de administração em prefeituras do Rio Grande do Sul (uma tese da teoria de Rensis Likert)

ARTIGOS

Os estilos de administração em prefeituras do Rio Grande do Sul* * Pesquisa realizada no Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob o patrocínio da Fundação Ford dentro do Programa de Pesquisas do Governo Municipal no Rio Grande do Sul: Aspectos Administrativos. (uma tese da teoria de Rensis Likert)

Cecílio A. F. BerndsenI; A. J. Lima MachadoII

ILecturer, School of Public Administration, University of Southern California

IIDo Centro de Estudos e Pesquisas em Administração, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

O estudo toma como ponto de referência a teoria de Rensis Likert, que realizou estudos sobre o comportamento humano em empresas e desenvolveu métodos que possibilitam identificar e medir as diversas variáveis que se relacionam com o que acontece aos recursos humanos das organizações.

A partir destes estudos, Likert formulou uma "Teoria Motivada de Administração",1 1 Aparece com este título em Análise motivada de uma teoria modificada de organização e administração. In: Haire, Mason. Teoria da organização moderna. Rio de Janeiro, USAID, 1966, p. 233-72. que encarece a participação dos empregados como situação decisiva para um bom nível de desempenho organizacional.

Aqui se busca especificamente testar a validade das proposições de Likert em prefeituras do Rio Grande do Sul, utilizando como instrumento de análise o Perfil de Características Organizacionais (PCO).2 2 Likert. Organizational profile.

Além do teste da teoria propriamente dita, pretende-se verificar até que ponto o PCO é um instrumento válido para estudar organizações de nosso contexto. Finalmente, ainda interessa neste estudo a busca de métodos (ou formas) que possam conduzir a explicações, caso a teoria não seja verificada nas prefeituras.

Submeter uma teoria alienígena a testes, tomando como universo as prefeituras, é uma forma de adicionar conhecimentos na área de administração no Rio Grande do Sul. Esta é também a posição básica do programa de pesquisa do qual o projeto faz parte. Por outro lado encontramos no teste cultural, de concepções teóricas oriundas de outros países, uma fórmula válida de conduzir-se diante da problemática da administração no Brasil, visto ser de outras nacionalidades a maioria dos autores de administração em voga. Seria, em parte, um procedimento "crítico-assimilativo" da experiência estrangeira.3 3 Guerreiro Ramos, Alberto. A redução sociológica; introdução ao estudo da razão sociológica. Rio de Janeiro. Tempo Brasileiro, 1965. 268 p.

A teoria já foi testada no Brasil, mas num tipo de organização (bancos de desenvolvimento) que, de certa forma, é diferente das prefeituras, não só em seus objetivos, mas principalmente em sua estrutura organizacional. Os objetivos deste estudo foram, basicamente, testar o perfil como instrumento para estudar organizações em outro contexto do qual foi concebido, e testar a aplicabilidade da teoria no Brasil. Butterfield4 4 Butterfield, D. Anthony. The Likert organizational profile as an instrument for measuring management systems over time. concluiu que a metodologia (PCO) é apropriada para estudar organizações no Brasil, mas que a teoria dos estilos de administração medida pelo perfil apenas parcialmente obtém suporte na realidade brasileira.

1 A TEORIA

Pode-se afirmar que alcançar altos níveis de eficácia organizacional é um dos principais problemas que a administração se propõe resolver.

Os recursos humanos postos à disposição de uma organização cada vez mais recebem atenção, por parte dos estudiosos, como sendo um dos principais elementos que podem contribuir para altos níveis de desempenho organizacional.

Likert desenvolveu estudos visando determinar situações que favoreçam uma atuação dos recursos humanos que resulte em acréscimos positivos à performance da organização. Em princípio, comparando atitudes de supervisores e dirigentes, notou que os que obtinham altos níveis de desempenho dos subordinados não utilizavam práticas tradicionais de administração, ou seja, que as práticas tradicionais já não eram as que poderiam resultar em alto desempenho dos subordinados. A partir desta observação, buscou no contexto social a explicação para o fenômeno:

"A tendência (nos Estados Unidos), de modo geral, em nossas escolas, em nossos lares, em nossas comunidades, é dar ao indivíduo maior liberdade e iniciativa. Existem menos ordens diretas, não esclarecidas, nas escolas e nos lares, e os jovens estão participando de modo crescente nas decisões que os afetam. Tais mudanças fundamentais na sociedade norte-americana geram expectativas entre os empregados sobre a maneira como devem ser tratados. As expectativas afetam profundamente as atitudes dos empregados, já que as atitudes dependem da extensão em que nossas experiências possam corresponder às nossas expectativas".

5 5 Likert, Rensis. Novos padrões de administração. São Paulo, Pioneira, 1971. p. 13.

Para estudar as organizações, Likert utilizou como método a medição de certas dimensões de funcionamento organizacional, tais como forças motivacionais, processo decisório, estilos de liderança, estabelecimento de metas organizacionais e finalidades do controle. Relacionando estas medidas com o desempenho organizacional, concluiu que existem características específicas nas organizações que apresentam alto desempenho. A partir daí pode ele descrever características gerais de estrutura organizacional, princípios e métodos de liderança e administração que resultem em melhor desempenho, que constituem a sua "Teoria Motivada de Administração".6 6 Likert. Organizational profile.

De um modo geral, pode-se dizer que sua nova teoria (divulgada em 1961) busca criar um ambiente organizacional favorável ao desenvolvimento dos membros da organização, dando uma importância maior a práticas que possibilitem um sentimento de realização jaessoal, sentimento de valor e aceitação, conseqüentemente atingindo com isso maior desempenho dos membros, derivando maior nível de desempenho organizacional.

2. CONCEITOS

A teoria de Likert apresenta quatro conceitos principais: a) emprego de recursos tradicionais de administração; b) alto nível de motivação; c) eficiente interação; d) emprego sistemático de medição- Os recursos tradicionais de administração, tais como classificação de cargos, simplificação do trabalho, determinação de objetivos específicos de trabalho, medições do trabalho realizado, orçamento, contabilidade e controle de custos são empregados, mas de forma diferente. Existe na teoria (ao empregar estes recursos) uma orientação básica ou filosofia diferente, baseada em um conjunto diferente de suposições sobre a motivação dos empregados.

Estes recursos não deixam de ser utilizados, mas são modificados. Por exemplo, a "teoria tradicional ignora, em grande parte, a importância da motivação",7 7 Haire, Mason. Teoria da organização moderna. Rio de Janeiro, USAID, 1966. 389 p. ou ainda a própria estrutura baseada em grupos frontais de trabalho, que serão comentados mais adiante.

Motivação constitui o segundo conceito. "A teoria motivada encarece a necessidade de um alto grau de motivação em toda a organização, se pretende atingir os objetivos... "8 8 Ibid. p. 236. Não apenas motivação que encarece motivos econômicos, muito menos métodos de motivação, que se baseiam em coerção, mas métodos coerentes com uma nova orientação. Basicamente abrangendo motivos econômicos, pessoais, inclusive o desejo de crescimento e realizações significativas em termos de valores e objetivos próprios, bem como o desejo de posição (status), reconhecimento, aprovação, aceitação e assim por diante, motivos de segurança, curiosidade, espírito criador e o desejo de novas experiências.

O terceiro conceito é que "precisa haver eficiente interação ou um sistema de mútua influência, que proporcione um mecanismo pelo qual as atividades da organização se integrem e coordenem".9 9 Ibid. p. 237. O caráter deste mecanismo de interação precisa ser tal que haja:

a) comunicação total de informações importantes (em sentido horizontal e vertical). "Este fluxo integral e aberto de informações úteis e relevantes fornece, em todos os pontos da organização, dados exatos para orientar providências, chamar a atenção para problemas à medida que surgem e para assegurar que haja sempre decisões sadias";10 10 Ibid. p. 236.

b) oportunidade de influenciação mútua (troca de experiências, conhecimentos e informações) ".. . quando uma pessoa se sente capaz de exercer influência em assuntos relevantes, experimenta a expansão de seu sentimento de importância e valor pessoal." ".. . Todas as pessoas sentem que podem exercer - e efetivamente exercem - influência sobre as decisões e o comportamento de todos aqueles com os quais estão em contato mais ou menos regular. Através destes indivíduos exerce-se ao menos alguma influência sobre toda a organização";11 11 Haire. op. cit. p. 236.

c) tomada de decisões que empregue as informações disponíveis de tal forma que os membros da organização se sintam motivados por estas decisões. Havendo um sistema eficiente de comunicação e influência decorre que a tomada de decisão será baseada em informações que provêm de toda a organização. Por outro lado, a tomada de decisões é descentralizada. Cada Unidade decide aquilo que a afeta diretamente, porque na unidade existe um acervo muito maior de informações que se relacionam com o problema e este procedimento aumenta o envolvimento do indivíduo e o sentimento de importância e valor pessoal.

O quarto conceito principal da teoria relaciona-se com o emprego de medições. Não apenas na produção, custos, perdas e lucros deveriam ser medidos regularmente, mas também os atritos humanos que afetam a capacidade produtiva da organização: as motivações de seus membros e a eficiência com que são implementados estes processos, como a comunicação e a tomada de decisão.

3. AS PRATICAS DE LIDERANÇA

Likert diz que um alto nível de motivação em toda a organização é possível e, portanto, pode ser alcançado a partir das práticas de liderança. Procurou, então, determinar os estilos de práticas de liderança que resultem em alta motivação e interação, resultando em atitudes favoráveis dos empregados em relação ao trabalho. Basicamente, o líder pensa sobre os empregados como seres humanos e não como pessoas para realizar trabalho: ".. . tratar pessoas como seres humanos é variável que muito se relaciona com as atitudes e a motivação do empregado, em todos os níveis da organização".12 12 Ibid. p. 238. "A extensão em que o superior transmite para o subordinado um sentimento de confiança nele, superior, e um interesse nos problemas do trabalho e fora do trabalho, exerce influência principal sobre as atitudes de performance do subordinado".13 13 Ibid. p. 239.

4. OS GRUPOS

As pessoas de estreita relação constituem o que Likert chama de "grupo frontal" na organização. O valor pessoal e de importância na organização é procurado basicamente nas pessoas de estreita relação, cuja aprovação e apoio são desejados. Como conseqüência, muitas pessoas são altamente motivadas para se comportar de maneira consistente com os objetivos e valores do seu grupo de trabalho, a fim de obter reconhecimento, apoio e reações favoráveis desse grupo. Estes grupos, quando bem organizados e com altas qualidades de interação (maior atração e lealdade de grupo), apresentam maior motivação para: a) aceitar os objetivos e decisões do grupo; b) procurar influenciar os objetivos e decisões do grupo, de modo que sejam consistentes com sua própria experiência e seus próprios objetivos; c) comunicar-se mais profundamente com o grupo; d) acolher comunicações de influência de outros membros; e) ajudar a implementação dos objetivos considerados importantes; f) comportar-se de forma calculada, visando a aprovação dos chefes. Portanto, pode-se concluir que a administração fará pleno uso das capacidades potenciais de seus recursos humanos apenas quando cada pessoa em uma organização seja pertencente a um ou mais grupos de trabalho, bem organizados e funcionando com eficácia, que possuam alta qualificação para interação e que busquem altas metas de desempenho.

Se um grupo funciona de maneira eficaz, quando se tomam decisões, todas as pessoas contribuem com seus conhecimentos, existindo, portanto, envolvimento por parte dos membros do grupo nas decisões. Este envolvimento determina uma alta motivação dos membros do grupo no que se refere â implementação das decisões tomadas, pois que são levadas (por este envolvimento no processo decisório) a uma identificação com os objetivos. O envolvimentoé o que Likert chama de um processo de interação e influenciação mútua, de tal forma que todos possam efetivamente influir nos objetivos e decisões.

Finalmente se existe na organização uma forma de estrutura grupai, comunicações e influenciações eficazes e tomada descentralizada de decisões, Likert acredita que esta organização apresentará bom desempenho. De forma sintética podemos dizer que a estrutura organizacional, os princípios e métodos empregados afetam o sentimento de valor próprio e de realização pessoal dos membros da organizaçãoatravés da alta motivação e interação.

5. O MÉTODO EMPREGADO POR LIKERT

Para estudar organizações, Likert se vale de medições de certas dimensões do funcionamento organizacional, a saber: processo de liderança, processo de motivação, processo decisório, estabelecimento de metas organizacionais e finalidades de controle. Os dados referentes a estas dimensões permitem compor um quadro que revela o estilo de administração preponderante na organização.

Likert aponta como sendo quatro os estilos de administração que podem ser identificados quando se estudam as organizações, que são: (I) autoritário coercitivo; (II) autoritário paternalista; (III) consultivo; (IV) participativocom base no grupo.

Num segundo momento, ele faz medições, agora referentes ao desempenho organizacional, através de: produtividade, qualidade do produto, custos, índice de rotação de empregados, absenteísmo, capacidade de adaptação a mudanças.

Relacionando dados das duas ordens de variáveis, os estilos administrativos e indicadores do desempenho organizacional, em organizações diferentes òu em departamentos da mesma organização, verifica-se que as de alto desempenho são realmente congruentes com a nova teoria (em termos de estilo de administração) e que as de baixo desempenho não o são. Em outras palavras:

"Uma das mais importantes constatações de Likert é que quanto mais próximo do sistema IV estiver o estilo de administração, tanto maior será a probabilidade de haver alta produtividade, boas relações no trabalho e elevada rentabilidade; também quanto mais uma organização se aproxima do sistema I tanto maior será a probabilidade de ser ineficiente."

14 14 Centro de Treinamento da Shell do Brasil S. A. A administração de recursos humanos. Mimeogr.

As idéias de Likert apresentam semelhança com as de dois outros teóricos da administração.

Douglas McGregor lançou em 1960 o livro The human side of enterprise15 15 McGregor, Douglas. The human side of enterprise. New York, Hill Book, 1960. onde expõe duas teorias a respeito da pessoa humana. A primeira supõe que o homem naturalmente evita trabalhar e precisa ser controlado, dirigido e ameaçado para produzir de acordo com os objetivos da organização. Além disso o "homem médio" prefere ser dirigido pois evita responsabilidades uma vez que não é ambicioso. O objetivo principal deste homem é segurança. A segunda teoria a respeito da pessoa humana é com base em suposições bastante diferentes. Esforço físico oü mental para ò trabalho é tão natural como jogar ou descansar. Homens com uma boa motivação exercitam autocontrole e autogestão para atingir objetivos nos quais estão interessados. O interesse em objetivos da organização por parte dos empregados é uma função das recompensas com sua realização pessoal, como, por exemplo, estima e auto-realização. A "maioria das pessoas é capaz de um alto grau de imaginação criadora e engenhosidade. Sob boas condições as pessoas não somente aceitam como procuram responsabilidade.

A primeira teoria foi denominada teoria X e a segunda McGregor chamou de teoria Y.

Um aspecto importante a respeito das teorias Xe Y, de acordo com McGregor, é que elas constituem duas diferentes cosmologias e que não são extremos de um continuum. McGregor acreditava ser difícil prever qual a teoria mais eficaz para administrar. Na sua opinião as condições particulares de cada caso deveriam ser consideradas, mas a teoria Y representaria uma visão que mais e mais gerentes começaram a adotar.

É difícil não associar os conceitos de Likert com as teorias X e Y de McGregor. Mesmo tendo em vista que as teorias X e Y não são extremos de um mesmo continuum como os estilos administrativos de Likert (I) e (IV), apresentam muita similaridade.

O segundo teórico que possui idéias bastante similares é Abraham H. Maslow. Para este psicólogo a motivação de um empregado é um elemento interno da pessoa e não pode ser imposto. Maslow estabeleceu a famosa hierarquia das necessidades humanas. A pessoa humana teria basicamente cinco níveis de necessidades: fisiológicas, segurança, sociais (amor e filiação), estima e auto-estima e, finalmente, auto-realização. Maslow acreditava que, uma vez satisfeito um nível de necessidades, a procura por satisfação passaria para o nível superior e assim também inversamente de acordo com as condições da situação específica. Desta maneira um empregado vai se esforçar por atingir os objetivos de uma organização se ele achar necessário fazer isto. Em outras palavras, o processo de motivação precisa fazer com que o empregado reconheça como seus os objetivos da organização. Em seu livro Eupsychian management16 16 Maslow, Abraham H. Eupsychian management. Homewood, Richard D. Irwin, 1965. Maslow dedica-se a descrever a cultura que seria gerada por mil pessoas em um processo de auto-realização. Esta utópica cultura seria possível de ser atingida quando as pessoas conseguissem satisfazer o complexo conjunto de necessidades dos níveis mais baixos.

O motivo de expor as idéias de Maslow aqui serve a dois objetivos: a) mostrar a semelhança ou proximidade existente entre a pessoa auto-realizada, a pessoa de acordo com o modelo da teoria Y, e o empregado trabalhando em um ambiente onde o estilo administrativo participativo (estilo IV) de Likert é usado; b) abordar o problema da necessidade da satisfação de necessidades básicas para um melhor nível de motivação.

Como é do conhecimento de muitos as idéias de Likert não são isoladas dentro do relativamente vasto campo da teoria administrativa. Os exemplos de McGregor e Maslow servem apenas para ilustrar isto.

6. O PERFIL DE CARACTERÍSTICAS ORGANIZACIONAIS

O perfil de características organizacionais é o instrumento utilizado para a medição das dimensões de funcionamento organizacional que compõem o quadro que indica qual o estilo de administração preponderante na organização. Basicamente, consiste em um questionário que é respondido pelos membros da organização. O questionário, na sua forma S, é composto de 20 perguntas, as quais medem as seis dimensões, a saber:

As respostas variam numa escala de 20 pontos, divididos em quatro seções que representam cada estilo de administração. As respostas que tendem para a direita recebem maior valor numérico; conseqüentemente, maior a proximidade ao número 20 (IV) , mais perfeita a resposta.

Os respondentes são convidados a marcar dois sinais em cada resposta: 19 - como percebem a organização, isto é, como está a organização em relação àquela pergunta naquele momento; 29 - como aspiram a organização, ou seja, como a organização deveria estar idealmente (respostas "ideais"). Dispondo estas respostas na escala, ficam caracterizados os perfis atual e ideal da organização.

Os estilos de administração que o perfil pode determinar variam em um continuum, tendo o sistema I e IV como pontos extremos, mas os "quatro diferentes sistemas na realidade se confundem uns com os outros e constituem um continuum com muitos padrões intermediários".17 17 Likert, Rensis. Novos padrões de administração. São Paulo, Pioneira, 1971. p. 239.

7. ESQUEMA DE TRABALHO

Operacionalmente, este estudo buscou identificar, através da aplicação do perfil de características organizacionais, os estilos de administração preponderantes em prefeituras do Rio Grande do Sul.

Após identificar o perfil de cada uma das prefeituras, buscou relacioná-los com indicadores de desempenho da organização, a fim de verificar a validade da proposição de que o estilo de administração é determinante do desempenho organizacional.

Em uma segunda etapa, através de instrumentos de análise estatística, este estudo verificou até que ponto o perfil de características organizacionais é um instrumento adequado para se estudar em certas dimensões do comportamento nas organizações de nosso meio.

8. OPERACIONALIZAÇÃO DAS HIPÓTESES

A partir dos objetivos gerais deste trabalho, abordados na introdução, quais sejam os de:

a) testar a validade das proposições de Likert em prefeituras do Rio Grande do Sul, utilizando como instrumento o perfil de características organizacionais;

b) testar a validade do PCO como instrumento de estudo de organizações de nosso contexto;

formularanuse as seguintes hipóteses:

H1 O estilo de administração relaciona-se com o nível de desempenho organizacional;

H2 Quanto mais uma organização tende ao estilo participativo (IV), maior o seu desempenho relativo;

H3 Quanto mais uma organização tende ao estilo autoritário coercitivo (I) , menor o seu desempenho relativo.

9. OS ESTILOS DE ADMINISTRAÇÃO NAS PREFEITURAS

Neste item analisam-se os perfis encontrados nas prefeituras e se testam hipóteses formuladas a partir do objetivo de verificar a validade das proposições de Likert nas prefeituras.

Para o estudo (survey) foram selecionadas 21 prefeituras do Rio Grande do Sul, a saber:

Cabe salientar que com esta seleção não houve a intenção de fazer que estas prefeituras fossem representativas daquelas do Estado. A determinação de uma amostra das prefeituras do RS, dada a sua complexidade, é tarefa que justifica, por si só, um estudo. Portanto, este trabalho tem seu universo restrito para as 21 organizações pesquisadas. Mas, evidentemente, certos cuidados foram tomados, a fim de que fosse certificada a aleatoridade das condições organizacionais das prefeituras.

Por isto apenas prefeituras de municípios com 30 mil habitantes ou mais foram consideradas. A idéia era pesquisar organizações razoavelmente grandes (em número de funcionários) para obter resultados generalizados e não afetos pela temporária presença de um prefeito com um ou outro estilo administrativo. Dados estes requisitos restou um número de cerca de 60 prefeituras em todo o Estado. Destas, 21 foram selecionadas tendo sido considerados problemas de proximidade geográfica e as condições de ser conseguida uma autorização para administrar os questionários aos funcionários municipais.

10. O INSTRUMENTO DE ESTUDO

Nas prefeituras foi aplicada uma forma reduzida dentre os vários perfis, que é a forma S; este questionário de 20 perguntas proporciona a mensuração das seis dimensões que foram estudadas. São assim divididas as perguntas que medem cada dimensão do funcionamento organizacional:

Esta forma S foi testada e aplicada no Brasil por A. Butterfield quando de seu trabalho18 18 Butterfield, D. A. The Likert organizational profile as an instrument for measuring management systems over time. MIT, 1971 (Working paper), mimeogr. nos bancos de desenvolvimento. Butterfield chegou à conclusão que o perfil é adequado para o estudo de organizações no Brasil. Além disso, os vários perfis foram largamente testados nos EUA, mesmo durante a elaboração da teoria. Mais recentemente, Likert tem conseguido bastante sucesso estudando organizações no Japão e Iugoslávia, utilizando o perfil para medir estilos de administração.

Desta feita, os questionários que foram aplicados são constituídos de duas partes: na primeira, temos o perfil propriamente dito e na segunda temos uma série de perguntas adicionais que visam caracterizar, através de dados pessoais, os respondentes- Estas perguntas adicionais tornaram possível classificar os respondentes em três categorias hierárquicas:

A) Administração superior (prefeito, secretário ou diretor municipal); cargos de chefia e cargos técnicos em função de chefia.

B) Cargos técnicos.

C) Cargos de administração geral (datilógrafos, escriturários, etc).

Esta divisão em categorias permite o estudo, em separado, de perfis conforme a posição dos funcionários na hierarquia organizacional.19 19 Estas perguntas adicionais foram utilizadas basicamente para a classificação hierárquica dos funcionários, mas a análise por categoria não chegou a ser feita dado o n reduzido em duas categorias A e B.

Os questionários foram aplicados a todos os funcionários burocratas20 20 Funcionários que trabalham em serviços burocráticos da prefeitura seriam os white collar. Operacionalmente são identificados como os funcionários que têm mesa fixa de trabalho e operam apenas com papéis. de cada prefeitura, perfazendo um total de 532 respondentes. Ficaram excluídos apenas os que não se encontravam no exercício de suas funções por qualquer motivo, como férias, doença, etc.

Como se pode ver na tabela do quadro 1, existem variações quanto ao número de questionários respondidos. Isto se deve principalmente às variações no tamanho da prefeitura quanto ao número de funcionários. Por outro lado, existem casos como Canguçu, Encruzilhada e Santa Cruz que não possuem funcionários na categoria B. Nestes cargos técnicos estariam incluídos engenheiros, contadores, etc., que nestas prefeituras ou não estariam incluídos no quadro de funcionários (sendo' contratados, os seus serviços, de maneira eventual), ou estes funcionários não estavam presentes quando da aplicação dos questionários, pois em algumas prefeituras existe apenas um representante desta categoria e este pode ser o caso.


11. DETERMINAÇÃO DOS PERFIS

Para cada prefeitura determinam-se quatro perfis, um para cada categoria hierárquica e um geral da organização.

O perfil médio é o que revela o estilo de administração preponderante na organização: portanto, para cada prefeitura (em cada categoria) não são consideradas respostas individuais e sim a média delas; por outro lado, ao se evitarem respostas indivduais estão-se evitando possíveis tendenciosidades oriundas de opiniões individuais. No entanto, este procedimento nem sempre foi possível seguir, pois que em vários casos como Alvorada, Bagé, Esteio, Guaíba, Rio Grande, Santiago, Tenente Portela e Três de Maio, na categoria B, têm-se uma ou duas observações, o que prejudicou o perfil, daí determinando que em muitos casos apresenta fortes tendenciosidades (considerando o perfil de cada prefeitura em separado).

12. ANÁLISE DOS PERFIS

Para cada uma das seis dimensões do funcionamento organizacional são analisados três pontos:

1. Em que lugar da escala de 20 pontos eneontram-se as prefeituras no que tange às médias atuais, ou seja, referentes às percepções dos funcionários.

2. Em que ponto da escala se encontram quanto às médias ideais, ou seja, quanto às aspirações dos funcionários.

3. A distância ou lacuna (gap) entre os pontos atuais e ideais - tensão proveniente do hiato entre aspirações (médias ideais) e percepções (médias atuais) - que é obtida dividindo-se cada média atuàl pela respectiva média expressa em percentagem.

Quanto mais as contagens atuais se aproximam da direita (na escala de 20 pontos têm valor médio maior), tanto mais próximo está a organização, segundo a teoria de Likert, do caminho ideal de operação.

PERFIL para o total da amostra (obtido pelas médias A, B, C). Média das médias de 21 prefeituras (n = 21).

13. OS PERFIS NAS PREFEITURAS

Em primeiro lugar, alertamos que nesta análise não são consideradas ainda as categorias hierárquicas, nem a individualidade de cada prefeitura. O perfil aqui analisado foi obtido tendo-se ém vista o perfil de todas as prefeituras em estudo.

Nestas primeiras observações vamos considerar que o perfil de características organizacionais seja um instrumento válido para medir o estilo de administração nas prefeituras, abandonada, portanto, a questão validade Ou não do instrumento. A qualidade do perfil será discutida em item posterior.

Nossa intenção, no momento, é apenas comentar o perfil obtido. Nada impede, entretanto, que certas imperfeições mais facilmente observáveis sejam comentadas.

Conforme mostra a figura 1 (perfil total), os estilos de administração preponderantes nas prefeituras são, alternadamente, o (II) autoritário paternalista e (III) consultivo.21 21 Chama-se a atenção para o fato de que uma grande "distância" é representada por um número baixo - vendo a maneira de calcular esta distância facilmente percebe-se isto. Dissemos alternadamente porque algumas dimensões apresentam a preponderância do estilo II e outras do III; eventualmente, variações de estilo são encontradas em uma mesma dimensão.


Quanto à relação, ou distância apresentada - que se origina do hiato entre estilo percebido e o aspirado pelos funcionários - experimenta variações que vão de 47,68% a 75,79%.

Considerando que a distância indica a extensão na qual a organização está-se aproximando do caminho ideal de operação, 47,68% sãj consideradas fracas, ou seja, relativamente longe do caminho ideal de operação; já 75,79% são consideradas boas, ou mais próximas do caminho ideal. Temos que alertar, neste ponto, que este caminho ideal é considerado apertas em termos de distância, não em termos de sistema adotado, pois que uma organização que adota o sistema I pode apresentar uma pequena distância.

De 47,68% a 75,79% é a amplitude de variação da" distância considerando todo o perfil, evidentemente algumas dimensões apresentam um nível mais alto ou mais baixo do que outras, e entre as 20 perguntas o mesmo acontece.

Quanto ao perfil ideal, as prefeituras adotam o estilo do sistema IV. 22 22 Apenas na pergunta 8 o perfil ideal encontra-se no sistema ni ; mais adiante, quando em considerações críticas preliminares ao instrumento, ficará claro porque isto acontece. Portanto, os funcionários aspiram a um estilo participativo de administração em suas prefeituras.

Até esta parte foram evitadas quaisquer considerações acerca das características ou procedimentos operacionais de cada estilo ou sistema de administração. Isto faremos agora na análise de cada dimensão, que em seu conjunto revela o(s) estilo (s) prepoderante(s) na organização. Mas as considerações que faremos se-, rão apenas para o caso das prefeituras, ou seja, para o estilo que apresentam, e não para os quatro estilos.23 23 Para maiores esclarecimentos, ver Likert, Rensis. Novos padrões de administração. São Paulo, Pioneira, 1971. Nosso procedimento será o de "cortar" o perfil com cinco traços horizontais deixando expostas cada uma das seis dimensões.

14. LIDERANÇA

O perfil nesta primeira dimensão encontra-se quase que totalmente no sistema (III) consultivo, com exceção da pergunta 4. Na figura 2 temos representada esta situação.** ** As questões das figuras 2 a 7 são as mesmas do questionário para o levantamento de "Perfis de características organizacionais". (N.R.)




Observando a figura 2, podemos dizer que em primeiro lugar existe substancial confiança mútua entre chefes e subordinados, mas não de uma maneira completa. Os chefes, por seu turno, procuram manter "sob controle" as decisões tomadas. Geralmente esta situação se confirma, se atentarmos para a pergunta 4 em que o perfil desloca-se do sistema III para o II, onde, no que se refere a sugestões ou idéias, somente algumas vezes estas são consideradas.

Quanto à liberdade dos subordinados discutirem assuntos de trabalho, o perfil permite notar que existe certa (substancial) liberdade para isto; mas não se pode dizer que exista um complexo sistema de interação mútua - situação em que o subordinado se sentiria inteiramente descontraído para discutir assuntos de trabalho com seu superior e que sentiria a sua possibilidade de influência.

15. MOTIVAÇÃO

A figura 3 corresponde aos itens 5, 6 e 7, que medem o "processo de motivação". Ela mostra que o processo de motivação tende ao sistema (II) autoritário-paternalista, tendo o primeiro item no sistema (III) consultivo.

Pode-se observar que os processos usuais de motivação apresentam-se no sistema II e III e que não são aqueles preconizados pela teoria, quais sejam os de desenvolverem um sentimento de participação em grupo na fixação de metas e que realmente desenvolvem um sentimento de valor e aceitação. Neste ponto, podese fazer uma pequena nota à guisa de crítica: pela formulação da alternativa que o questionário apresenta na pergunta 5, o sistema III se diferencia do II apenas pela palavra participação, que não existe na alternativa que corresponde ao sistema II; pode-se pensar, então, que o sistema, se reformulada a alternativa (dando maior possibilidade à inferência desejada), seja realmente autoritário-paternalista ao invés de consultivo. Com isto, a variação que o perfil apresenta dimensão desapareceria.

Na pergunta 6, o perfil (no sistema II ) mostra que a responsabilidade é mais sentida por chefes superiores e intermediários. Isto confirma a pouca participação existente, pois que os funcionários não sentem seus objetivos identificados com os objetivos da organização, derivando daí o sentimento de menor responsabilidade para atingir os objetivos organizacionais.

A posição do perfil na pergunta 7 (autoritário-paternalista) revela que não é muito usual a forma de estrutura grupai nas prefeituras (grupos frontais de trabalho),24 24 Haire, Mason. Teoria da organização moderna. Rio de Janeiro, USAID, 1966, p. 241 e seg. e Likert, Rensis. Novos padrões de administração, cit. p. 128. que possibilita todo aquele sistema de interação e influência mútua por parte dos membros. O tipo de operação preponderante é, então, o "homem-a-homem", que se contrapõe à estrutura de grupos.25 25 É importante salientar, entretanto, que o tamanho da organização é variável importante a ser considerada. É importante ainda ressaltar a importância que a teoria de Likert dá à estrutura grupai da organização em contraposição ao tipo de operação "homem-a-homem".26 26 Ver introdução.

16. COMUNICAÇÕES

Das cinco perguntas que compõem a dimensão que mede o processo de comunicações, três delas são reveladas pelo perfil no sistema autoritário-paternalista e dois no sistema consultivo. Pode-se notar que ao compararmos esta dimensão com as demais, esta é que mais variações apresenta, as quais, por vezes, são bastante acentuadas na linha do perfil.

Teoricamente não são previstas variações muito acentuadas em uma mesma dimensão, principalmente com o perfil apresentando-se ora numa seção, ora noutra. Isto explica-se pelo fato de que se a proposição é medir, por exemplo, o processo de comunicação, através de determinado número de perguntas, espera-se um certo grau de coerência no perfil obtido, pelo menos internamente, ou seja, em cada dimensão, nestas condições, a mesma coisa não é medida.27 27 O PCO foi testado utilizando-se para isto análise fatorial. Esta técnica decompõe determinado número de variáveis em fatores (que podem ser representativos de um fenômeno). Os fatores são identificados pelo agrupamento de um certo número de variáveis entre si; e ao mesmo tempo que estas variáveis estão altamente relacionadas entre si, explicam e/ou são responsáveis pelo fenômeno que pode ser identificado em cada fator. No caso específico do PCO teríamos 20 variáveis (perguntas do questionário), e teoricamente seis fatores que são as dimensões que o PCO pretende medir. Teríamos então a seguinte situação: as variáveis que deveriam medir esta ou aquela dimensão apareceriam agrupadas em um dos seis fatores (teóricos). Explicitando melhor esta situação: teríamos, por exemplo, as variáveis 1, 2, 3 e 4 agrupadas em torno de um primeiro fator que seria o estilo de liderança utilizado na organização. A análise fatorial revelou uma certa inconsistência do PCO (as variáveis apresentaram-se muito dispersas nos diferentes fatores). Não houve efetivamente um agrupamento, conforme o que teoricamente era previsto. Pode-se dizer que o PCO não respondeu bem a sua proposição de medir as dimensões propostas através das 20 perguntas (variáveis).

Na pergunta 8 pode-se verificar a possibilidade de dupla interpretação por parte do funcionário. Pode-se acontecer a dificuldade de caracterizar precisamente a que tipo de fluxo de informação a pergunta se refere: se de fora para dentro da organização ou se o fluxo de informações dentro da estrutura organizacional. Se considerarmos a primeira possibilidade de interpretação - de fora para dentro - é bastante natural a contagem obtida neste item; entreT tanto, foge à intenção, que é exatamente a medição do segundo (fluxo interno).

Outro aspecto ainda debilita a certeza de análise desta pergunta no perfil original: este item é acompanhado de outros que ajudam a mensúração ou caracterização do processo de comunicações na organização e que na presente forma reduzida são excluídos.

Não obstante, pode-se analisar, como foi dito no início deste item, o perfil tal qual se apresenta, tendo-se em mente as observações críticas que foram feitas.

Como se pode notar até aqui, o estilo de administração preponderante nas prefeituras é coerente com o fato de que as comunicações, não se dêem em todas as direções (horizontal, vertical, ascendente e descendente), aberta e eficientemente como preconiza a teoria.

A pergunta comunicações-vindas-do-chefe passa para o sistema consultivo. Pode-se dizer com base nisto que as comunicações vindas dos chefes são geralmente aceitas, mas surgindo eventualmente (poder-se-ia dizer junto) um sentimento de suspeita ou cautela, o que é natural, desde que se observa uma falta de integração maior, situação que possibilitaria uma discussão aberta e descontraída de informações e comunicações.

Completando o fluxo, e considerando as informações que vão dos subordinados para os chefes (pergunta 10), fica melhor definida a situação quanto à dimensão "comunicações". Estando a contagem no sistema III, observamos que mais fluentemente chegam ao chefe as informações que este "quer ouvir", havendo, portanto, uma "filtragem" nas informações que fluem no sentido vertical ascendente: evidentemente esta "filtragem" prejudica a eficiência do processo de comunicações.

Após estas considerações, é razoável o fato de que não haja uma proximidade psicológica maior entre superiores e subordinados, pois é persistente, mesmo havendo certo grau de aproximação, a diferenciação de papéis.

A última pergunta da dimensão "comunicações" - conhecimento da política operacional da organização - reflete o alheamento28 28 Pode ser tomado aqui, em termos de teoria motivada, como uma falta de identificação dos objetivos (pessoais e organizacionais). do funcionário público municipal em termos de sua atuação.

17. PROCESSO DECISÓRIO

Nesta dimensão, o perfil não apresenta variações substanciais, pois que variações nas contagens dentro de uma mesma seção são geralmente menos importantes do que variações entre seções. Por outro lado, se nos reportarmos à figura 1, veremos que as dimensões processo de decisão e estabelecimento de metas organizacionais correspondem ao segmento do perfil total que menores variações apresentam (menos ziguezagues e ambos encontram se no sistema II).

O comportamento do perfil nesta dimensão revela que as decisões realmente importantes são tomadas na cúpula administrativa, podendo haver certa liberdade de atuação dos níveis inferiores quando dentro dos moldes gerais prescritos. Isto pode ocasionar duas conseqüências importantes: a) baixa freqüência de atitudes que possam induzir motivações nos escalões inferiores; b) nem sempre as decisões tomadas são as mais apropriadas, pois que, como dito na explanação teórica, na unidade existe um acervo maior de informações (quase sempre nãoacessíveis à cúpula) que se relacionam com determinada questão a decidir, havendo, portanto, a necessidade de ouvir os escalões inferiores - a unidade - em questões que lhes digam respeito. É válido pensarmos a conseqüência b como causa e a a como conseqüência (tomadas isoladamente).

Durante os comentários feitos para cada uma das dimensões até aqui expostas, nada foi dito em relação ao nível de distância, pois em nenhuma assumiu valores acentuadamente altos. Nesta dimensão, entretanto, nota-se um nível de distância relativamente maior do que nas outras. Portanto, quanto ao processo decisório o nível de realização distancia-se do nível de aspirações dos funcionários - o que origina a distância constatada.

18. ESTABELECIMENTO DE METAIS ORGANIZACIONAIS

Na figura 6 (n-21), que apresentamos a seguir, as medidas devem partir da tabulação das perguntas 16 e 17.

Muito próximas em essência, e, portanto, apresentando perfis bastante semelhantes, estão as dimensões processo decisório e estabelecimento de metas organizacionais. O sistema II continua com preponderância nesta dimensão.

O encadeamento de situações e/ou características operantes nas prefeituras evidencia-se mais uma vez aqui.

As ordens dadas (pergunta 16) e normalmente existe apenas uma eventual possibilidade de formular (diretamente com o chefe) a respeito destas ordens. Da situação formada deriva certo grau de resistência "disfarçada" quando da execução de objetivos ou metas. Finalmente deve-se dizer que o nível de distância nesta dimensão é relativamente alta como a anterior - se tomadas no conjunto de todas as dimensões.

19. CONTROLE

A primeira pergunta apresenta contagem 10, exatamente entre os estilos autoritário-paternalista e o consultivo. Deste pode-se dizer que as funções de controle, apesar de se localizarem primordialmente na cúpula da prefeitura, são compartilhadas nos escalões médio e baixo, sendo neste último em menor grau. Conforme a teoria, a preocupação em torno das funções de controle são disseminadas em toda a organização de maneira homogênea.

Quanto à existência ou não de uma organização informal conforme o perfil, ela pode ou não existir, e no segundo caso podendo ou não opor-se às metas da prefeitura, enquanto que uma organização operando no sistema IV teria organizações informais confundidas e existindo uma forte tendência a apoiar os objetivos organizacionais.

20. ESTILOS DE ADMINISTRAÇÃO E DESEMPENHO ORGANIZACIONAL

Depois das considerações feitas a respeito dos estilos de administração preponderantes nas prefeituras, vamos tratar agora da melação entre estilos de administração e a performance das organizações que foram objeto de estudo.

Aqui são relatadas as conclusões a que se chegou quanto ao objetivo de testar a validade das proposições de Likert de que quanto mais uma organização tende ao estilo participativo (IV) , maior o seu desempenho relativo; e que, em situação oposta, quanto mais uma organização tende ao estilo autoritário coercitivo (I) , menor o seu desempenho relativo.29 29 Relativo, pois que este desempenho é comparado com as outras organizações.

Os estilos de administração foram medidos através da utilização dos questionários PCO. Preenchidos pelos funcionários das prefeituras, calculou-se a média por questionário e daí a média geral por prefeitura. Para medir o desempenho organizacional das prefeituras foram usados "juízes" que avaliaram as prefeituras em termos de desempenho e as respostas dos respondentes a perguntas específicas a respeito do desempenho das prefeituras. Com estes dados foram feitos testes de associação entre as variáveis que serão discutidos a seguir.

No critério de "juízes", pessoas reconhecidas como experts no que tange a conhecimentos de prefeituras do Rio Grande do Sul fazem uma avaliação subjetiva (pois levam em consideração sua vivência) das organizações que foram estudadas. Em síntese, estes juízes são convidados a, pensando no desempenho de cada uma das prefeituras, ordená-las segundo os diferentes graus de desempenho.30 30 Para maiores detalhes do processo de coleta de dados de "juízes", ver anexo 2, não publicado aqui na RAE.

A segunda forma de indicadores de desempenho utilizados provém do próprio questionário, onde o respondente é convidado a fazer uma avaliação (indireta) da sua prefeitura- Faz-se necessário uma breve explicação do funcionamento destes indicadores: na pergunta número 57 do questionário, os respondentes avaliam numa escala de 7 pontos certas dimensões das suas prefeituras, como por exemplo, se ela é bem ou mal sucedida, se é rápida ou vagarosa, etc. Dentre as 15 dimensões propostas na pergunta 37 serão utilizadas as seguintes como indicadores indiretos de desempenho:

Chega-se ao indicador de desempenho da prefeitura fazendo-se a média das avaliações subjetivas de cada um dos membros consultados.

Embora existindo algumas deficiências, o que prejudicou o rigor que um trabalho de pesquisa exige, achamos mesmos assim válida a experiência, pois que as falhas aqui encontradas poderão, e é o que esperamos que aconteça, ser úteis para trabalhos posteriores e alertar em certos cuidados que este tipo de trabalho exige. Especialmente para o CEPA, o fato de ocorrerem e serem constatadas as deficiências será de certo valor para trabalhos que o Centro se propõe realizar num futuro próximo.

Após as conclusões desta etapa, onde teceremos algumas considerações críticas aos indicadores da variável desempenho, a questão das deficiências ficará melhor esclarecida.

21. RELAÇÕES ENTRE AS AVALIAÇÕES DE DESEMPENHO ORGANIZACIONAL PELOS JUIZES E ESTILOS DE ADMINISTRAÇÃO

O teste de associação entre a avaliação do desempenho organizacional das prefeituras feitos pelos juízes e os estilos administrativos levantados pelo PCO foi realizado através do coeficiente de correlação ordinal de Spearman. Os resultados são apresentados no quadro 2.


Embora todos os coeficientes sejam positivos, somente a correlação "ideal" e "juízes" é significante. Estatisticamente existe uma relação entre as prefeituras com um melhor desempenho e o estilo administrativo desejado (ideal) dos funcionários.

Os dados que são disponíveis não permitem estabelecer uma relação entre o bom desempenho organizacional (de acordo com a experiência dos "juízes") e estilos administrativos próximos ou dentro do modelo participativo com base no grupo (sistema IV) de Likert.

Nas prefeituras onde os funcionários apresentaram o maior desejo de trabalhar num clima de acordo com o sistema IV de Likert foi observado pe-os "juízes" um nível mais alto de desempenho organizacional, do que fica a indicação de que quanto maior o nível de aspirações por um estilo administrativo mais participativo, melhor o desempenho organizacional. Da mesma forma pode-se inferir que quanto melhor o desempenho organizacional, maior o desejo dos funcionários de trabalhar com um estilo mais participativo de administração. Mas isto não é a essência da teoria de Likert.

Se não é possível reafirmar a teoria, é extremamente difícil recusá-la. Os resultados da pesquisa, em linhas gerais, são inconclusivos.

22. AUTO-AVALIAÇAOE OS ESTILOS DE ADMINISTRAÇAO

Como já foi dito antes, quatro são os indicadores de desempenho utilizados aqui e todos provêm do próprio questionário.

Como uma auto-avaliação. Aqui os funcionários que responderam aos questionários foram os próprios juízes do desempenho administrativo de suas prefeituras.

O primeiro indicador: no primeiro indicador o respondente avalia subjetivamente a sua prefeitura no que se refere ao seu "sucesso", ou seja, ele diz se ela é bem ou mal sucedida (item d da pergunta 37). O coeficiente acusa uma correlação da ordem de 0,28, o que demonstra haver uma fraca correlação: em outras palavras, o teste nos diz que o fato de o funcionário considerar bem-sucedida a sua prefeitura não significa necessariamente que ela adote um estilo de administração que tenda ao participativo: o oposto, no caso, também é válido se o funcionário considera que sua prefeitura não é bem-sucedida, isto não quer dizer que ela adote necessariamente um sistema que se aproxime do autoritário-coercitivo (I) .

O segundo indicador: aqui o funcionário é convidado a dizer se a sua prefeitura é bem ou mal-organizada. O coeficiente de correlação é 0.22, ou seja, quase a mesma situação do indicador anterior, que pode ser assim considerada: existe ainda fraca correcção entre as variáveis estilo de administração preponderante e desempenho da organização.

O terceiro indicador:- no terceiro indicador, que corresponde ao item f da pergunta 37 do questionário, o funcionário avalia a sua prefeitura em termos de rapidez, se rápida ou vagarosa (sempre variando em uma escada de 7 pontos). A correlação Pearson acusa um coeficiente de 0,15 igualmente considerado sem significância.

O quarto indicador: diz respeito à satisfação do público em relação à prefeitura, na percepção do funcionário. Igualmente aqui o coeficiente é bastante baixo, ou seja, 0,07 do qual podemos concluir que não existe quase correlação alguma entre estilo de administração e desempenho, pelo menos com os indicadores utilizados.

Aqui novamente os resultados são todos positivos mas não há significância estatística. A hipótese nula de ausência de correlação deve ser aceita pelo menos até os níveis de probabilidade estatística. A teoria de Likert não encontra suporte ao mesmo tempo que faltam dados necessários para refutá-la.

23. CONCLUSÕES

Aqui procuramos examinar lições que podem ser retiradas desta pesquisa.

Apresentamos os testes de associação entre os indicadores de desempenho administrativo e os estilos de administração que revelam um nível de associação não-significante do ponto de vista estatístico. Temos que concluir pela aceitação da hipótese nula de não-associação entre as variáveis.

A teoria de Likert tal como foi testada neste trabalho não encontrou suporte empírico.

Dentre as várias razões pelas quais se pode explicar os presentes resultados selecionamos duas alternativas com as quais vamos lidar rapidamente :

1. Os indicadores da avaliação de desempenho das prefeituras não são adequados para o fim a que se propõem.

2. A teoria tal como proposta por Likert não é necessariamente adaptável às prefeituras estudadas.

23.1 Os indicadores das a'valiações de desempenho das prefeituras não são adequados para o fim a que se propõem

Esta primeira alternativa de explicação da falta de suporte empírico da teoria é imbuída de uma conotação crítica. Ao nos determos nesta alternativa, estaremos tecendo críticas aos indicadores das avaliações.

Em primeiro lugar, vamos relembrar os indicadores utilizados neste trabalho, que se propõem medir desempenho, que são: o critério de juízes e os indicadores provenientes do questionário.

A primeira crítica que se pode fazer a ambos os indicadores é o fato de serem de ordem subjetiva. O critério de juízes, apesar de, na sua mecânica, restringir o "julgamento" dos experts a certos parâmetros que deveriam ser considerados na avaliação do desempenho das prefeituras, nem por isso garante objetividade. Dizemos isto porque os experts consultados não têm o mesmo tipo de atividade ou formação. Por exemplo, alguns adquiriram seus conhecimentos dos municípios através de atividades ligadas a processos de planejamento urbano; outros a finanças municipais e assim por diante. Em princípio, pode-se notar que, por mais imparcial que seja o "juiz", existe sempre a tendência de avaliar através da ótica que é própria ao "juiz". Uma segunda observação a ser considerada é a própria palavra avaliação, que estará sempre ligada à percepção de quem avalia: e em nossa colocação de percepção devemos adicionar o seu aspecto de seletividade. "De maneira mais geral, pode-se dizer que tendemos a relacionar as nossas percepções conosco mesmos: a pessoa constitui-se em norma de suas percepções".31 31 Stoetzel, Jean. Psicologia social. São Paulo, Nacional, 1967. p. 128. Posto isto, não se pode garantir totalmente a igualdade ou imparcialidade neste tipo de avaliação.

Quanto ao segundo tipo de indicadores - os provenientes do questionário - a mesma situação de subjetividade e as críticas feitas ao critério "juízes" aqui também são válidas. Acrescenta-se ainda: se no critério "juízes" a questão imparcialidade era questionável, nestes indicadores a questão merece maior atenção- Os "juízes", apesar de conhecerem as prefeituras que avaliaram, não estavam com elas envolvidos diretamente, o que não acontece com os funcionários. Evidentemente esta é uma situação que se pode pensar dúbia, pois que maior validade pode ter o julgamento de alguém diretamente envolvido com o objeto submetido a julgamento. Mas este não é o caso. O que se busca é um máximo de objetividade, que no critério "juízes", diríamos, é mais fácil de ser atingido do que em avaliação de funcionários.32 32 Obs.: para solucionar, parcialmente, a questão, são consideradas apenas a média das avaliações em cada prefeitura. Estes estão expostos mais intensamente, dado o seu envolvimento emocional à organização, ao aspecto seletividade e ao processo perceptivo. Reforçando a idéia, podemos citar Stoetzel: ".. . a percepção funciona também para a pessoa, isto é, no interesse da pessoa. A percepção não serve apenas para guiar as ações, como quando eu avalio a largura do riacho que tenciono transpor de um salto. A percepção serve à pessoa, protége-a contra os perigos que a ameaçam".33 33 Stoetzel, op. cit. p. 127.

Ao fazer a avaliação, a seletividade do processo perceptivo pode induzir o funcionário a uma determinada avaliação que o "protege" em situações de insegurança na organização. E, apesar de não ser possível uma generalização, pode-se dizer que nas prefeituras, pelo menos, o ato de avaliar aspectos do desempenho da própria prefeitura leva o funcionário a uma situação de insegurança.

Resumindo, podemos dizer que; aos critérios de avaliação subjetiva não podemos dissociar os mecanismos do processo perceptivo que diluem a objetividade que garantiria a validade dos indicadores utilizados.

A segunda observação crítica que podemos formular está ligada também a certas dificuldades na mensuração de indicadores da variável dependente.

A variável dependente (que chamamos desempenho organizacional) Likert denomina "Variáveis de resultado final"34 34 Likert, Rensis. The human organization. New York, McGraw-Hill, 1967. que são dicotomizadas em variáveis de atuação (ou performance variables) e variáveis financeiras.35 35 Idem.

24. VARIÁVEIS DE RESULTADO FINAL

A) Variáveis de atuação ou desempenho:

1. nível de produtividade;

2. nível de qualidade do produto e/ou serviço prestado;

3. nível de perdas;

4. nível de cota de mercado.

B) Variáveis financeiras:

1. nível de custos;

2. nível de vendas e lucro bruto;

3. nível de lucro bruto e ganhos;

4. nível de compensação salarial;

5. nível de reservas financeiras;

6. valor atual das inversões em maquinaria, equipamento, investimentos, etc;

7. valor atual da inversão na organização humana;

8. valor atual da inversão na lealdade dos consumidores.

Vamos em primeiro lugar tecer considerações acerca das variáveis financeiras. Em princípio, podemos dizer que a "preocupação" para com esta variável, no setor público, é basicamente diferente do tipo de preocupação ou importância que encontramos na empresa. Esta diferenciação reside no fato de que no setor público, normalmente, não há preocupação em auferir lucro, enquanto que na empresa este é o objetivo primordial.

"São necessários conceitos e medidas que proporcionem às outras organizações o que o teste de mercado e a medida de lucratividade proporcionam à empresa. Os testes e medidas serão indubitavelmente bastante diferentes. Os resultados econômicos, que numa empresa são determinantes, são apenas limitações e restrições para outras organizações. Porque o lucro reflete a atuação econômica e este é o objetivo somente de uma organização econômica, isto é, de uma empresa. Em outras organizações - o governo, os hospitais, as forças armadas, etc. - a economia não passa de uma restrição.36 36 O grifo é nosso. Essas instituições precisam de um equivalente não-econômico da medida de lucratividade. Também necessitam de um substituto da força objetiva do mercado.37 37 Drucker, Peter F. Uma era de descontinuidade. Rio, Zahar, 1970, p. 222.

Posto isso, a mensuração de variáveis financeiras, no presente estudo, seria destituída de maior significação.

Mesmo que tentássemos uma solução, embora parcial, para o problema, duas dificuldades daí surgiriam: uma de ordem prática, outra de ordem (pode-se dizer) teórica. A segunda deriva da frase de Drucker:38 38 Idem. "Estas instituições precisam de um equivalente não-econômico da medida de lucratividade". Lucratividade, se atentarmos sinteticamente para as variáveis financeiras propostas por Likert, é fundamental. Por outro lado, a determinação deste "equivalente não-econômico" proposto por Drucker demandaria um estudo bastante aprofundado e totalmente à parte deste.39 39 Que não teria sido possível realizar dada a brevidade de tempo.

A dificuldade de ordem prática reside na dificuldade de se obter dados financeiros das prefeituras estudadas, posto que para uma análise detalhada da situação financeira de cada prefeitura seria necessário manipular todo o balanço correspondente ao ano em que os perfis foram aplicados, o que não foi possível obter; ainda assim seria difícil chegar a um bom indicador.

25. VARIÁVEIS DE ATUAÇÃO OU DESEMPENHO

Considerando as prefeituras, das quatro variáveis propostas as que mais significação têm para o nosso trabalho são a primeira e a segunda, visto que as outras dizem respeito, indubitavelmente, à organização privada.

Medir o nível de produtividade em serviços burocráticos seria bastante difícil, posto que este tipo de trabalho tem características próprias que dificultariam muito a medição do nível de produtividade, por exemplo: a aferição de custos operacionais (ligados à mão-de-obra), perdas de matérias-primas, etc. Por outro lado, na pesquisa de campo não foi planejada a coleta de dados de produtividade de funcionarios, pois que para tal teria que ser montado todo um esquema de levantamento de dados necessários, o que efetivamente não aconteceu.

Consideramos a falta de medição do nivel de produtividade do funcionário a mais importante deficiência neste estudo.

Ao pensarmos que estilo de administração atinge intensamente o funcionário - devemos pensar na administração superior e supervisão, como agentes de possíveis mudanças òu diferenças de prefeitura para prefeitura no que se refere a estilo de administração - a relação do nível de produtividade do funcionário com o estilo de administração de sua prefeitura é, sem dúvida, a relação que daria um considerável grau de certeza ao testarmos as proposições de Likert. Vale dizer: as conclusões quanto a validade ou não das proposições de Likert nas prefeituras que foram objeto de estudo são destituídas de maior grau de certeza.

A segunda variável de atuação, nível de qualidade do produto prestado, ou serviço prestado, no caso presente, foi efetivamente medida, mas com a restrição que já mencionamos, qual seja a de ser de ordem subjetiva.

26. A TEORIA NAO É VALIDA PARA AS PREFEITURAS

Discorremos na primeira alternativa, acerca das deficiências constatadas nos indicadores da variável dependente. Antes, porém, observamos serem baixas as correlações entre indicadores da variável dependente e independente, o que nos levou à situação de não-comprovação da teoria, à luz dos dados apresentados. Mas se os indicadores não são bons para comprovar a teoria, também não o são para rejeitá-la.40 40 É válido alertar que dadas as deficiências dos indicadores temos como causa imediata um baixo grau de certeza para qualquer afirmação. Apenas pode-se colocá-la em questão, principalmente tendo em vista as conclusões corroborativas de Butterfield.41 41 Butterfield, D. Anthony. The Likert organizational profile as an instrument for measuring management systems over time. cit. Neste ponto, uma questão pode surgir, qual seja a de que as organizações estudadas por este autor são essencialmente diferentes das prefeituras,42 42 Ver a diferenciação apresentada na introdução. daí derivando que as conclusões válidas para aquele estudo não o seriam para o presente; mesmo assim, nao podemos deixar de considerar que as pessoas dos dois tipos de organizações estudadas (bancos de desenvolvimento e prefeituras) fazem parte de uma mesma cultura, sendo esta então a característica comum às organizações objeto de pesquisa.

Chegamos então a um ponto crítico de nosso trabalho. A teoria não pode ser validada, nem mesmo invalidada, apenas podemos colocá-la em questão.

Vários autores advogam as diferenças de cultura, meio-ambiente (ecologia) e outros fatores, como aspectos importantes e que devem ser considerados quanto à transladação de modelos teóricos de cultura onde o modelo foi elaborado para cultura receptora. Impõe-se então a pergunta: pode-se falar em termos de uma teoria universal de administração?

Likert responde que há tendências para uma teoria universal de administração.43 43 Likert, Rensis. Trends toward a world-wide theory of management. (CIOS XII, Symposium A-9, Paper C. 1963). Sua afirmativa vem de quatro previsões: a) pesquisa de liderança, administração e desempenho organizacional derivarão em um mesmo corpo de conhecimentos seja qual for o país ou a cultura no qual esta pesquisa seja feita; b) uma vez que o método científico é o mesmo em todos os países, os resultados devem ser os mesmos seja qual for a orientação cultural do pesquisador; c) as culturas influenciam o método de aplicação de princípios básicos de administração mas não os princípios em si mesmos; d) finalmente, industrialização é capaz de diminuir as diferenças culturais que podem ter existido entre as nações anteriormente à sua industrialização. Sua argumentação é substanciada por alguns estudos empíricos realizados em diversos países. Em 1969, Likert44 44 Likert, Rensis. Improving human performances; better theory, more accurate accounting. University of Michigan, ISR, 1969 (Paper C 105). apresentou outro trabalho no qual reiterava que a evidência disponível não indica a necessidade de existir diferentes princípios de administração para diferentes culturas. Todas estas afirmativas sâo bem ricamente ilustradas por diversos estudos empíricos feitos em muitos países tais como Suécia, Japão e Iugoslávia.

Se nos reportarmos à introdução deste trabalho, veremos que Likert notou certas modificações fundamentais no seio da sociedade americana, principalmente no que se refere à maior liberdade e iniciativa individuais, que geram entre os empregados expectativas sobre a maneira como devem ser tratados. Estas modificações fundamentais na sociedade americana "impuseram" a Likert conceder mudanças nas teorias de administração até então vigentes na sociedade americana. Estas modificações notadas por Likert, diríamos, são pressupostos referenciais historicamente considerados; pois que diz respeito a um determinado momento histórico da sociedade norte-americana. Mas não podemos afirmar que as mesmas mudanças constatadas por Likert igualmente tenham ocorrido em nossa sociedade no mesmo momento histórico. Em outras palavras podemos dizer: não se pode absolutamente dizer que a sociedade brasileira, e mais especificamente as comunidades estudadas, imponham tais concepções em termos práticos de administração. Resumindo, temos: a partir de certos pressupostos referenciais e imposições sociais, Likert reformula as teorias tradicionais de administração e formula a sua teoria motivada de administração. A pergunta que cabe fazer, a partir do exposto, é a seguinte: seriam os mesmos pressupostos referenciais observáveis entre os membros das organizações estudadas e de suas respectivas comunidades?

Para responder a esta pergunta teremos que buscar os nossos pressupostos referenciais, òu pelo menos os pressupostos referenciais de nossa cultura.45 45 A propósito ver: Guerreiro Ramos, Alberto. A redução sociológica: introdução ao estudo da razão sociológica.

Guerreiro Ramos46 46 Guerreiro Ramos, Alberto. Administração e estratégia do desenvolvimento. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1966. faz uma apreciação de-Likert, ao tratar de desenvolvimento tecnológico à luz de modelos heurísticos. Esta apreciação é mais uma comparação (em termos de metodologia) entre os modelos que o autor apresenta e os sistemas de administração propostos por Likert. Mas o que mais vai-nos interessar é o fato de que Guerreiro Ramos chama a atenção de que Likert abstrai de seus modelos variáveis histórico-sociais, que em Guerreiro Ramos são representadas por "desenvolvimento tecnológico.

"Os modelos de Likert abstraem a variável histórico-social, que, em nossa construção, é representada pelô estágio da tecnologia. Likert apresenta o sistema participativo-grupal como o melhor e mais atualizado. É necessário, porém, considerar o fenômeno da contemporaneidade do não-coetâneo. Por isso procuramos demonstrar que, em certos contextos, a utilização mecânica de processos abstratamente ótimos e superatuais pode acarretar desastres, efeitos negativos de toda sorte. Relativizamos histórica e sociologicamente os sistemas de organização. A construção de Likert é plenamente válida, onde (e este é o caso dos Estados Unidos) é dominante o estágio histórico-social mais avançado da tecnologia. Em países como o Brasil, porém, essa construção teórica não é, de todo, adequada ao raciocínio do administrador, porque, em tal caso, a tecnologia mais desenvolvida só está sendo utilizada em restritas áreas piloto".47 47 Idem.

É oportuno citar a consideração que Ramos faz com relação a um dos elementos, em função dos quais descreve os modelos heurísticos de administração, qual seja: "natureza da motivação do trabalhador".48 48 Idem, p. 115. E, como sabemos, motivação constitui fator relevante na teoria de Likert. A partir destas considerações de Ramos podemos inferir outra diferença marcante (social e historicamente considerada) no que se refere a aspectos motivacionais dos membros da organização.

Ramos observa que:

"Toda técnica administrativa que supõe uniforme a psicologia do trabalhador carece de base científica. A motivação do trabalhador varia de um contexto para outro, e este fato, necessariamente, impõe limites e condicionamentos à implantação da teoria administrativa. É de lembrar-se que, nas sociedades em que há escassez, ou seja, em que a maioria dos cidadãos estão a braços com o problema do subconsumo, tendem os fatores materiais a assumirem decisiva relevância na conduta. Resolvido, porém, socialmente, o problema do subconsumo, graças à alta produtividade do sistema tecnológico-econômico, os motivos fundamentais da conduta humana se estilizam, perdendo relevância o fator econômico, ao mesmo tempo em que outros motivos, antes subsidiários, aumentam sua influência".49 49 Idem, p. 115.

Ao relacionarmos características da motivação proposta pela teoria com as considerações que Ramos faz, podemos aprioristicamente dizer que o funcionário público municipal ainda não resolveu completamente o problema do subconsumo, portanto, podemos dizer que o fator econômico tem ainda certa dose de relevância entre os demais, determinando uma conduta diferente no que se refere a aspectos motivacionais em relação àqueles que têm este problema resolvido, dados os níveis de renda no Brasil, em geral, e dados os níveis de renda dos funcionários municipais do Rio Grande do Sul, em particular, que não podem ser considerados altos.

A resultante final é a de que mais pesquisa é necessária a fim de que se explore melhor a utilidade da teoria de Likert. Não de menor importância é conhecer-se a realidade administrativa brasileira para maximizar o aproveitamento de nossos recursos, uma vez que não há recursos mais preciosos que os humanos.

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  • Ostle, Bernard. Estatística aplicada. México, Limusa-Wiley, 1965.
  • Riggs, Fred W. A ecologia da administração pública. Rio de Janeiro, USAID, 1964.
  • Siegel, Sidney. Nonparametric statistics for the behavioral sciences. New York, McGraw-Hill, 1956.
  • Spenge, Janet et alii. Elementary statistics. New York, Appleton-Century-Crofts, 1968.
  • *
    Pesquisa realizada no Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob o patrocínio da Fundação Ford dentro do Programa de Pesquisas do Governo Municipal no Rio Grande do Sul: Aspectos Administrativos.
  • **
    As questões das
    figuras 2 a 7 são as mesmas do questionário para o levantamento de "Perfis de características organizacionais". (N.R.)
  • 1
    Aparece com este título em Análise motivada de uma teoria modificada de organização e administração. In: Haire, Mason.
    Teoria da organização moderna. Rio de Janeiro, USAID, 1966, p. 233-72.
  • 2
    Likert.
    Organizational profile.
  • 3
    Guerreiro Ramos, Alberto.
    A redução sociológica; introdução ao estudo da razão sociológica. Rio de Janeiro. Tempo Brasileiro, 1965. 268 p.
  • 4
    Butterfield, D. Anthony. The Likert organizational profile as an instrument for measuring management systems over time.
  • 5
    Likert, Rensis.
    Novos padrões de administração. São Paulo, Pioneira, 1971. p. 13.
  • 6
    Likert.
    Organizational profile.
  • 7
    Haire, Mason.
    Teoria da organização moderna. Rio de Janeiro, USAID, 1966. 389 p.
  • 8
    Ibid. p. 236.
  • 9
    Ibid. p. 237.
  • 10
    Ibid. p. 236.
  • 11
    Haire. op. cit. p. 236.
  • 12
    Ibid. p. 238.
  • 13
    Ibid. p. 239.
  • 14
    Centro de Treinamento da Shell do Brasil S. A. A administração de recursos humanos. Mimeogr.
  • 15
    McGregor, Douglas.
    The human side of enterprise. New York, Hill Book, 1960.
  • 16
    Maslow, Abraham H.
    Eupsychian management. Homewood, Richard D. Irwin, 1965.
  • 17
    Likert, Rensis.
    Novos padrões de administração. São Paulo, Pioneira, 1971. p. 239.
  • 18
    Butterfield, D. A. The Likert organizational profile as an instrument for measuring management systems over time. MIT, 1971 (Working paper), mimeogr.
  • 19
    Estas perguntas adicionais foram utilizadas basicamente para a classificação hierárquica dos funcionários, mas a análise por categoria não chegou a ser feita dado o
    n reduzido em duas categorias A e B.
  • 20
    Funcionários que trabalham em serviços burocráticos da prefeitura seriam os
    white collar. Operacionalmente são identificados como os funcionários que têm mesa fixa de trabalho e operam apenas com papéis.
  • 21
    Chama-se a atenção para o fato de que uma grande "distância" é representada por um número baixo - vendo a maneira de calcular esta distância facilmente percebe-se isto.
  • 22
    Apenas na pergunta 8 o perfil ideal encontra-se no sistema ni ; mais adiante, quando em considerações críticas preliminares ao instrumento, ficará claro porque isto acontece.
  • 23
    Para maiores esclarecimentos, ver Likert, Rensis.
    Novos padrões de administração. São Paulo, Pioneira, 1971.
  • 24
    Haire, Mason.
    Teoria da organização moderna. Rio de Janeiro, USAID, 1966, p. 241 e seg. e Likert, Rensis.
    Novos padrões de administração, cit. p. 128.
  • 25
    É importante salientar, entretanto, que o tamanho da organização é variável importante a ser considerada.
  • 26
    Ver introdução.
  • 27
    O PCO foi testado utilizando-se para isto análise fatorial. Esta técnica decompõe determinado número de variáveis em fatores (que podem ser representativos de um fenômeno). Os fatores são identificados pelo agrupamento de um certo número de variáveis entre si; e ao mesmo tempo que estas variáveis estão altamente relacionadas entre si, explicam e/ou são responsáveis pelo fenômeno que pode ser identificado em cada fator. No caso específico do PCO teríamos 20 variáveis (perguntas do questionário), e teoricamente seis fatores que são as dimensões que o PCO pretende medir. Teríamos então a seguinte situação: as variáveis que deveriam medir esta ou aquela dimensão apareceriam agrupadas em um dos seis fatores (teóricos). Explicitando melhor esta situação: teríamos, por exemplo, as variáveis 1, 2, 3 e 4 agrupadas em torno de um primeiro fator que seria o estilo de liderança utilizado na organização. A análise fatorial revelou uma certa inconsistência do PCO (as variáveis apresentaram-se muito dispersas nos diferentes fatores). Não houve efetivamente um agrupamento, conforme o que teoricamente era previsto. Pode-se dizer que o PCO não respondeu bem a sua proposição de medir as dimensões propostas através das 20 perguntas (variáveis).
  • 28
    Pode ser tomado aqui, em termos de teoria motivada, como uma falta de identificação dos objetivos (pessoais e organizacionais).
  • 29
    Relativo, pois que este desempenho é comparado com as outras organizações.
  • 30
    Para maiores detalhes do processo de coleta de dados de "juízes", ver anexo 2, não publicado aqui na RAE.
  • 31
    Stoetzel, Jean.
    Psicologia social. São Paulo, Nacional, 1967. p. 128.
  • 32
    Obs.: para solucionar, parcialmente, a questão, são consideradas apenas a média das avaliações em cada prefeitura.
  • 33
    Stoetzel, op. cit. p. 127.
  • 34
    Likert, Rensis.
    The human organization. New York, McGraw-Hill, 1967.
  • 35
    Idem.
  • 36
    O grifo é nosso.
  • 37
    Drucker, Peter F.
    Uma era de descontinuidade. Rio, Zahar, 1970, p. 222.
  • 38
    Idem.
  • 39
    Que não teria sido possível realizar dada a brevidade de tempo.
  • 40
    É válido alertar que dadas as deficiências dos indicadores temos como causa imediata um baixo grau de certeza para qualquer afirmação.
  • 41
    Butterfield, D. Anthony. The Likert organizational profile as an instrument for measuring management systems over time. cit.
  • 42
    Ver a diferenciação apresentada na introdução.
  • 43
    Likert, Rensis.
    Trends toward a world-wide theory of management. (CIOS XII, Symposium A-9, Paper C. 1963).
  • 44
    Likert, Rensis.
    Improving human performances; better theory, more accurate accounting. University of Michigan, ISR, 1969 (Paper C 105).
  • 45
    A propósito ver: Guerreiro Ramos, Alberto.
    A redução sociológica: introdução ao estudo da razão sociológica.
  • 46
    Guerreiro Ramos, Alberto.
    Administração e estratégia do desenvolvimento. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1966.
  • 47
    Idem.
  • 48
    Idem, p. 115.
  • 49
    Idem, p. 115.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 1974
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