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Eficiência organizacional: uma perspectiva estruturalista

COMENTÁRIOS

Eficiência organizacional: uma perspectiva estruturalista

James Robert Sergeant; Maria Celene Feres

Alunos do curso de pós-graduação da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas

Nosso objetivo ao elaborar este estudo é analisar o conceito de eficiência organizacional, de acordo com a perspectiva estruluralista-funcionnl. Primeiramente, procuraremos apresentar o ponto de vista estruturalista tal como divulgado na literatura. Posteriormente, analisaremos um modelo específico de eficiência organizacional, o modelo de Amitai Etzioni, que utiliza como base comparativa para o estudo das organizações suas estruturas de conformidade. A realização deste estudo só fará sentido na medida que for feita uma análise concomitante dos objetivos das organizações, evidenciando, assim, o alcance de um determinado grau de eficiência. Ainda com referência ao estudo dos objetivos deveremos tecer algumas considerações a fim de verificar até que ponto a mudança de objetivos nas organizações, bem como na sua própria estrutura, resultam na obtenção de maior ou menor eficiência.

Numa parte final do nosso estudo procuraremos analisar algumas outras variáveis propostas por Etzioni, como sendo também responsáveis por uma maior eficiência organizacional, principalmente cm termos de empresas. Procuraremos, da mesma forma, considerar as contribuições de outros autores estruturalistas, tais como Selznick e Peter Blau, sempre que nos parecer conveniente.

2. Nota Sobre o Método

Em nosso estudo sobre eficiência organizacional, vamos analisar esse conceito de acordo com o ponto de vista estruturalista, conforme exposto por autores tais como Amitai Etzioni, Peter Blau e outros.

A idéia do estruturalismo ganhou ampla divulgação a partir dos estudos antropológicos dc Claude Lévi-Straus, que procuram descobrir a lógica interna da sociedade. As conexões necessária? entre os elementos da sociedade dão a estrutura e o sentido de realidade interna e externa. Utilizando-se da base estrutural do senso comum, o estruturalismo analisa culturas, pensamentos c ate organizações, por meio de comparação, para descobrir as melhores estruturas. O importante na avaliação é a análise dos resultados porque, no estruturalismo, o funcional é essencial.1 1 Ver Balcão, Yolanda Ferreira. Conceitos básicos da tese bidimensional da linguagem. Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, mimeogr.

Na análise organizacional, porém, outras abordagens estruturais mais antigas são combinadas em proporções diversas de acordo com os vários autores. Assim, concepções fenomenológicas e dialéticas de estrutura não são estranhas à teoria das organizações. É preciso, pois, levar em consideração que para o estruturalismo fenomenológico "estrutura é um conjunto que tem um sentido e que oferece, portanto, à análise intelectual, um ponto de apoio, mas que ao mesmo tempo não é um idéia porque se constitui, se altera ou se reorganiza frente a nós como um espetáculo; para o estruturalismo dialético, a análise que descobre as partes força-as a preparar seu surgimento ao longo do desenvolvimento de todo, como um episódio de sua história, esforço propriamente dialético em que a história garante a análise";2 2 Motta, Fernando C. Prestes. O estruturalismo na teoria das organizações. Revista de Administração de Empresas, Fundação Getúlio Vargas, v. 10, n. 4. p. 25, dez. 1970. A base primeira da análise de Etzioni é, porém, o estruturalismo funcional, razão das semelhanças de suas concepções com as de Talcott Parsons, para quem o funcional é igualmente essencial.

De maneira bem sucinta, o Prof. Fernando C. Prestes Motta faz a seguinte avaliação do estruturalismo na teoria das organizações: "... A contribuição do estruturalismo à teoria das organizações parece indiscutível pela consolidação da incorporação iniciada pelos behavioristas, dos estudos de outros tipos de organizações que não as empresas, bem como pela ênfase nova nas relações entre as partes da organização, tais como grupos e outros elementos formais e informais, os vários níveis hierárquicos, as recompensas e incentivos sociais e materiais, além do destaque dado às relações entre organização e seu ambiente, que preparou o campo para a análise baseada na teoria geral dos sistemas abertos".3 3 Ibid. p. 41.

3. Análise do Modelo Estruturalista de Etzioni

Amitai Etzioni apresenta-nos um modelo estruturalista da organização, baseado em combinações de elementos tais como tipos de poder, tipos de envolvimento e objetivos dentre outros.4 4 Etzioni, Amitai. A comparative analysis of complex organization. New York, The Free Press, 1968. A estrutura de conformidade surge da relação entre tipos de poder disponíveis à organização e tipos de envolvimento dos participantes, que fornece a principal base comparativa das organizações.

Conformidade é uma boa base comparativa para as organizações não somente porque é uma constante universal de todos os sistemas sociais, mas também porque é um elemento central da estrutura organizacional. Como explicado por Katz e Kahn, "entre as características comuns de todas as organizações humanas encontram-se uma certa estrutura de autoridade, alguns critérios para sua alocação e algumas para o seu exercício".5 5 Katz, D. & Kahn, R. L. Psicologia social das organizações. São Paulo, Editora Atlas S.A., 1970. p. 65.

Segundo Etzioni, conformidade refere-se ao comportamento de uma pessoa em .relação ao exercício do poder por outra e sua orientação com relação a este poder.

Assim, entendemos que aquele que detém o poder manipula meios, tais como gratificações de tipo físico, material e simbólico, de tal maneira que os subordinados comportem-se de acordo com suas diretivas. Já a orientação do subordinado expressa-se positivamente (envolvimento), ou negativamente (alienação), que constituem os dois extremos do continuun de envolvimento.

3.1. ESTRUTURA DE CONFORMIDADE

A primeira dimensão de conformidade é o poder, que é a habilidade de uma pessoa induzir outra a aceitar suas ordens. Nas organizações, impor as normas de coletividade é usuaUñeñte uma condição que determina o acesâó que o detentor de poder tem sobre os meios de sua aplicação. Aqueles que têm posições de poder constituem elites e aqueles que estão em posições subordinadas constituem-se em participantes inferiores.

Há três tipos básicos de poder classificados de acordo com os meios empregados para sua aplicação, sejam físicos, materiais, ou simbólicos. O primeiro tipo, poder coercivo, caracteriza-se pela aplicação ou ameaça de aplicação de privações físicas. O poder remunerativo baseia-se no controle de recursos materiais, tais como salários, comissões etc. E, finalmente, o poder normativo apóia-se na manipulação de recompensas simbólicas. Etzioni afirma que outros nomes para esse poder seriam persuasivo, manipulativo, ou sugestivo.

O poder normativo, por sua vez, distingue-se em dois tipos: poder normativo puro e poder social. O primeiro, baseado na manipulação de estima, prestígio e símbolos ritualísticos entre níveis hierárquicos e, portanto, de natureza vertical; o segundo, baseado na alocação e manipulação de aceitação e resposta positiva e, portanto, de natureza horizontal. O normativo puro pode ser aplicado diretamente às hierarquias, o que o toma mais útil às organizações.

Etzioni afirma que. a maioria das organizações emprega os três tipos básicos de poder, mas a especialização em um determinado tipo tende a diminuir a neutralização que ocorre quando se usa mais de um tipo, ao mesmo tempo, para os mesmos participantes.

Para exemplificar essa neutralização, quando se aplica "força... usualmente se cria tão alto grau de alienação que se torna impossível a aplicação do poder normativo com sucesso. É uma das razões por que a reabilitação é raramente atingida nas prisões tradicionais, por que medidas de custódia são consideradas bloqueios à terapia nos hospitais de doenças mentais, e por que professores, nas escolas modernas, opõem-se ao castigo físico".6 6 Etzioni, Amitai, op.cit. p. 17. Este. ponto é bastante importante e serve de base para discussões futuras sobre a necessidade de separar a aplicação dos tipos de poder, seja no tempo, seja no espaço.

A outra dimensão de conformidade é o envolvimento, que se refere à orientação dos participantes inferiores com relação à organização, em termos de intensidade e direção. A intensidade varia desde baixa até alta e a direção pode ser positiva ou negativa. Referimo-nos a envolvimento positivo como envolvimento moral e a envolvimento negativo como alienação. É interessante notar que, quanto mais positiva ou negativa a orientação, maior será a intensidade.

Um dos meios mais importantes para a organização realizar seus objetivos é manter uma orientação positiva com relação ao poder. Parece que Katz e Kahn têm uma idéia semelhante quando explicam as funções das normas e valores no que diz respeito à integração do sistema.7 7 Ver Katz Kahn, op.cit. p. 53-5. Pelo menos podemos dizer que quanto maior for o envolvimento, maior será a probabilidade de que os participantes inferiores aceitem as normas e valores da organização ou dos seus representantes.

O envolvimento pode ser entendido sob três aspectos: a) alienação, orientação negativa intensa; b) envolvimento calculista, orientação negativa ou positiva, mas de menor intensidade; c) envolvimento moral, puro ou social, alta orientação positiva. Tal orientação refere-se apenas ao sentimento dos participantes inferiores, constituindo, assim, um continuum sem nítidas divisões.

Quando um desses tipos de envolvimento coincide com o tipo de envolvimento requerido pelo poder empregado pela organização, há uma relação de congruência. As situações congruentes são mais freqüentes do que as não congruentes, dado que a congruência é mais eficiente e que as organizações tendem a tornar-se mais congruentes sob pressões externas e internas. Daí, temos a hipótese dinâmica de Etzioni:

"Ao nível permitido pelo ambiente, as organizações tendem a mudar sua estrutura de conformidade, de tipos não congruentes para tipos congruentes e as organizações que têm estrutura de conformidade congruente tendem a resistir a fatores que as conduzem para tipos de conformidade incongruentes."8 8 Etzioni, Amitai. op.cit. p. 14.

O foco de análise de Etzioni dirige-se para a conformidade dos participantes inferiores porque o controle, neste nível, é mais problemático e também porque as diferenças entre organizações são mais visíveis. As dimensões que distinguem os participantes inferiores dos superiores são: á natureza do envolvimento, (quanto à intensidade e duração) , a subordinação e as próprias tarefas obrigatórias. Essas dimensões distinguem também participantes de não participantes, delimitando assim as fronteiras da organização.

Graficamente, a estrutura de conformidade da organização consistiria, em um eixo, no grau de envolvimento e, em outro, nos tipos de poder, cuja combinação significaria a estrutura real de uma determinada organização. As estruturas que caem na linha diagonal são os tipos congruentes e todos os outros pontos resultariam em estruturas em desequilíbio que tenderiam a atingir a relação de congruência. (Ver gráfico 1.)


As organizações são classificadas de acordo com sua estrutura de conformidade predominante em coercivas, utilitárias e normativas. Organizações coercivas são aquelas cujos participantes inferiores, são alienados e o controle empregado é coercivo. Organizações utilitárias são aquelas cujo envolvimento dos participantes inferiores é calculista. Organizações normativas são aquelas nas quais o envolvimento é alto (moral) e o poder empregado é normativo.

As organizações coercivas distribuem-se num continuum de acordo com o grau de coerção aplicado, desde as mais coercivas, como os campos de concentração, até as menos coercivas, tais como hospitais de doenças mentais e casas de correção ou recuperação. As funções ou objetivos básicos dessas organizações são reter prisioneiros e disciplinar os detidos.

As organizações utilitárias são tipicamente as empresas que se estendem desde um leve grau de alienação até um leve grau de envolvimento moral. Por exemplo, as organizações utilitárias com maior número de operários tenderiam a apresentar maior grau de alienação, ao passo que as organizações utilitárias, com maior número de funcionários de escritório, tenderiam a ter maior grau de envolvimento.

No oposto das organizações coercivas, encontramos organizações normativas de tão alto grau de envolvimento que chegam a caracterizar-se por envolvimento moral. Os exemplos típicos são as associações voluntárias, igrejas, escolas e organizações politicas que têm intensos programas ideológicos. Etzioni distingue três classes de organizações normativas: a primeira, entre as quais as igrejas, apresentam quase que exclusivamente padrão normativo; a segunda, entre as quais as escolas que apresentam um padrão secundário coercivo; e, finalmente, organizações como as profissionais, que apresentam um padrão secundário remunerativo.

Todavia, existem organizações que se caracterizam por uma dupla estrutura de conformidade, tais como as unidades de combate e alguns sindicatos, onde dois padrões de conformidade apresentam-se com a mesma freqüência. Neste caso, procurando-se evitar perda de energia e resultante ineficiência, os dois padrões separam-se no tempo.

3.2 CONFORMIDADE E OBJETIVOS

Tendo sido estudada a estrutura de conformidade como uma das variáveis da eficiência organizacional, consideraremos agora outra variável: os objetivos organizacionais.

A hipótese básica é: "Certas combinações de conformidade e objetivos são mais eficientes qué outras".9 9 Etzioni, Amitai. op.cit. p. 17.

Portanto, organizações que apresentam estruturas de conformidade semelhantes tendem a apresentar objetivos também semelhantes, e organizações que apresentam objetivos semelhantes tendem a apresentar, igualmente, estruturas semelhantes.

Agora, porém, é importante analisar o conceito de objetivos, uma vez que há muita discussão a respeito. De acordo com Katz e Kahn, os objetivos da organização não são os conscientes de seus lideres ou de seus membros de modo geral, mas sim os resultados que representam a fonte de energia para sua manutenção.10 10 Ver Katz & Kahn, op.cit. p. 30. Portanto, o objetivo da organização não é algo claro que possa ser extraído literalmente das declarações dos departamentos de relações públicas ou de suas diretorias, mas deve ser analisado em função da "produção" da organização e da relação que essa produção tem com a sobrevivência da organização no seu ambiente.

Segundo Etzioni, "por objetivos da organização entende-se um estado que a orgnização está tentando alcançar. Um objetivo é uma imagem do estado futuro que pode ou não vir a realizarse. Uma vez realizado, torna-se parte da organização ou de seu ambiente, mas deixa de ser uma imagem que orienta as atividades da organização e, portanto, deixa de ser um objetivo. O objetivo da organização pode ser determinado da mesma maneira que outras características da organização o são. Pode ser determinado pelo exame de processos organizacionais, como o fluxo de trabalho numa fábrica, e por atributos da sua estrutura, tais como as prioridades na alocação de recursos ou distribuição do pessoal".11 11 Etzioni, Amitai. op.cit. p. 71-2.

Esses dois conceitos são bastante semelhantes e ambos baseiam-se no resultado do próprio funcionamento da organização, que só é possível sé a concebermos em relação ao ambiente.

Em conseqüência dessa noção de objetivo, Etzioni classifica-os em três tipos: de ordem, econômicos e culturais. Os objetivos de ordem são próprios de organizações que controlam pessoas em relação a uma unidade social, por segregá-las ou impedi-las da realização de atividades indesejáveis. Organizações com objetivos econômicos são as mais comuns e produzem bens e serviços para outros. Finalmente, organizações que têm objetivos culturais, "institucionalizam condições precisas para a criação e preservação de objetos simbólicos, sua aplicação e a criação de envolvimento em torno de tais objetivos".12 12 Ibid. p. 73.

Vamos ver que organizações com objetivos de ordem tenderão a apresentar uma estrutura de conformidade coerciva, organizações com objetivos econômicos tenderão a uma estrutura de conformidade utilitária e organizações com objetivos culturais a uma de conformidade normativa.

Há exceções, como organizações utilitárias, por exemplo, institutos de línguas estrangeiras, onde os instrutores têm pouco poder normativo sobre os estudantes e estes têm envolvimento calculista. Estas exceções, porém, são poucas e limitadas em importância. A grande maioria das organizações apresenta uma das três combinações principais. Prisões e hospitais de custódia são do tipo coercivo-ordem; indústrias são de tipo utilitario-económico; organizações religiosas, universidades, associações voluntárias, escolas, hospitais de terapia e organizações profissionais são do tipo normativo cultural.

Esta classificação continua válida, como demonstrado por Etzioni, para as organizações com objetivos duplos ou múltiplos, onde se encontra uma combinação "paralela" na estrutura de conformidade. Por exemplo, quanto mais orientada para a produção for uma prisão, mais utilitária será e, portanto, mais perto do tipo duplo coercivo-utilitário será sua estrutura de conformidade. Assim, a associação entre conformidade e objetivos é mantida.

As estruturas congruentes seriam 1, 5 e 9. Etzioni apresenta uma boa solução para a classificação de objetivos políticos. Esses são divididos de acordo com diferentes fins ou direções políticas. Por exemplo, os sindicatos têm muita atividade política, de nível municipal e são interessados na alocação ou realocação de recursos materiais ou serviços. Essas organizações podem ser vistas como orientadas para objetivos econômicos. Outras organizações políticas, tais como partidos revolucionários, especialmente pouco antes e mesmo durante o período revolucionário, são interessadas em obter controle por meios legítitimos de coerção, isto é, forças armadas e policia. Esses partidos podem ser vistos como sendo orientados par objetivos de ordem.

Finalmente, alguns movimentos sociais e partidos radicais têm focos na disseminação de nova ideologia. Exemplos típicos são partidos comunistas na Suécia, Noruega e Israel, durante a década de 1950. Esses tipos são vistos como organizações com objetivos culturais.

Portanto, não existe uma classificação apenas para objetivos políticos. De acordo com Etzioni, "o ponto mais importante é que as diferenças entre objetivos políticos, como os definimos, são associadas às diferenças nas estruturas de conformidade das organizações que os servem".13 13 Ibid. p. 76.

3.3 EFICIÊNCIA ORGANIZACIONAL

Etzioni usa o modelo funcional de eficiência para resolver o problema de que certos tipos de objetivos e estruturas de conformidade tendem a apresentar-se associados. O modelo de eficiência define um padrão de inter-relações entre os elementos do sistema que o torna mais eficiente a serviço de um dado objetivo. Esse modelo nos diz que, embora várias alternativas funcionais satisfaçam a um requisito ou necessidade, algumas são mais efetivas do que outras.

"Se aceitar a definição de que organizações são unidades sociais orientadas para a realização de objetivos específicos, segue naturalmente que a aplicação de um modelo de eficiência é especialmente apropriada para o estudo deste tipo de unidade social."14 14 Ibid. p. 79.

Pode-se explicar a associação entre objetivos e conformidades usando eficiência como a variável explicativa. Será mostrado por que cada uma das três relações congruentes é mais eficiente do que as outras duas combinações que poderiam ser associadas com o mesmo objetivo.

3.3.1 Objetivos e conformidade efetiva

Por que as organizações de objetivos econômicos funcionam mais eficientemente quando usam remuneração em vez de poder coercivo ou normativo como meio predominante de controle? Primeiramente, produção é uma atividade racional que requer sistemática divisão de trabalho, poder, comunicação e um alto grau de coordenação. Precisa, portanto, de um controle de execução altamente sistemático e preciso. Só se atinge isso quando sanções e gratificações estiverem altamente relacionadas com execução. Somente poder remunerativo, especialmente dinheiro, pode ser aplicado assim.

A execução efetiva de trabalho produtivo, por exemplo, precisa de certo grau de cooperação voluntária, iniciativa e interesse por causa da natureza complexa desse trabalho, onde a supervisão não pode ser completa ou total. Portanto, somente um trabalho muito simples (como carregar pedras para construir uma pirâmide) pode utilizar um padrão de conformidade coercivo sem grande perda de efetividade. Weber mostrou a vantagem do poder remunerativo sobre o poder coercivo em controlar o trabalho moderno, dizendo que era "geralmente impossível usar trabalhos de escravos na operação de ferramentas e aparatos, cuja eficiência requer um alto grau de responsabilidade e envolvimento de interesse próprio do trabalhador".15 15 Weber, M. The theory of social and economic organization. In: Etzioni, Amitai. op.cit. p. 81.

Por outro lado, também é difícil utilizar poder normativo nas organizações de objetivos econômicos, com exceção de trabalho de natureza altamente compensatória como pesquisa e trabalho artístico ou para períodos de tempo limitados, especialmente durante crises. Porém, a produção dos participantes inferiores, seja operários ou empregados de. escritório, não apresenta tais qualidades.

Nas organizações utilitárias, os participantes inferiores têm muito pouca relação com os objetivos últimos da organização. As suas atividades são altamente rotineiras por longos períodos de tempo e têm pouco interesse público. Assim, os participantes são segregados das recompensas do atingimento dos objetivos organizacionais. Portanto, "produção, geralmente, não pode basear-se no envolvimento moral dos participantes inferiores e no poder normativo dos representantes da organização".16 16 Etzioni, Amitai. op.cit. p. 82.

Em suma, Etzioni mostra que, por um lado, objetivos econômicos como produção necessitam de um tipo de poder mensurável com precisão, que só é satisfeito pelo poder remunerativo. Por outro lado, é necessário um pouco de cooperação voluntária que, praticamente, elimine a possibilidade de alienação. Entretanto, o envolvimento moral é quase inatingível. Resta, então, o envolvimento calculista que, sendo perfeitamente combinável com o poder remunerativo, resulta numa estrutura de conformidade utilitária passível de atingir os objetivos econômicos com mais eficiência.

3.8.2 Objetivos culturais e conformidade eficiente

No caso da organização com objetivos culturais, a necessidade de alto grau de envolvimento dos participantes inferiores com a organização ou com seus representantes só pode ser atingida pelo uso de poder normativo. Foi demonstrado que envolvimento, ou identificação, dos participantes inferiores com os líderes é o meio mais importante de criar e transmitir envolvimento com os valores organizacionais.

Um exemplo disso, apresentado por Etzioni sobre estudos de comunicação mostra "baixa eficiência de comunicação formal não apoiada por líderes informais e a importância de relações interpessoais, positivas entre, por exemplo, o padre e o paroquiano, entre o professor e o estudante, o líder político e os adeptos, para a operação eficiente das suas respectivas organizações".17 17 Ibid. p. 83. Portanto, objetivos culturais, incluindo a criação, aplicação ou transmissão de certos valores, são atingidos pela identificação com representantes organizacionais. Assim, o controle coercivo não pode ser utilizado porque tende a alienar os participantes. A remuneração também não é eficiente, porque o envolvimento que tende a desenvolver é fraco e muito racional. Por exemplo, a manipulação de salários não possibilita internalização de valores e produz, no máximo, envolvimento superficial. Portanto, a estrutura de conformidade para atingir objetivos culturais deve ser normativa, caracterizando-se por envolvimento moral e poder normativo.

3.3.3 Objetivos de ordem e conformidade eficiente

Finalmente, organizações que adotam objetivos de ordem necessitam utilizar poder coercivo em vez de normativo ou remunerativo, como meio predominante de controle. Conformidade normativa não é eficiente em conjunto com objetivos de ordem desde que se torna praticamente impossível esperar envolvimento moral nas organizações de ordem para a grande maioria dos participantes inferiores. A tradição social e cultural, reforçada pelos grupos informais dos participantes inferiores, a natureza segregativa das organizações de ordem criam um alto grau de alienação que não permite o desenvolvimento de uma estrutura de conformidade normativa.

Uma razão para o alto grau de coerção usado resulta do nível de eficiência que a sociedade ou a comunidade demandam destas organizações. Por exemplo, normalmente requer-se 100% de eficiência em controlar fugas e suicídios. Portanto, mesmo em condições favoráveis ao uso, até certo ponto, de conformidade normativa, a expectativa de "100%" de execução aumentaria o uso de coerção, desde que a minoria que fugisse não pudesse ser identificada seguramente.

Estruturas duplas de conformidade são encontradas em organizações que adotam objetivos que diferem nos requisitos de conformidade porque são de categorias diferentes, ou porque o atingimento eficiente de um objetivo requer o desenvolvimento de outras atividades pertinentes a outras categorias de objetivos.

Além das perdas de recursos, tensões psicológicas e sociais e falta de coordenação, espera-se encontrar, nas outras seis combinações menos efetivas de conformidade-objetivo, forte tendência para um tipo mais eficiente. Isso manifesta-se em pressão sobre os objetivos ou sobre as estruturas de conformidade, ou em ambos. Por exemplo, alguns hospitais de custódia têm estruturas de conformidades-objetivo incongruentes, ou seja, o objetivo requerido pela sociedade é manter ordem e impedir fugas e suicídios. Porém, fazem isso por meios normativos. Essa falta de congruência cria pressão em obter aprovação social para usar coerção ou educar o público para que estes hospitais possam avaliar seu sucesso, não em termos de controle de fugas e suicídios, mas em termos de reabilitação, isto é, reformular os objetivos de acordo com a estrutura de reabilitação.

Um problema que se impõe às organizações com mais de um objetivo, é o fato de que objetivos diferentes, sendo de mesma categoria, atuam diferentemente sobre os vários componentes da estrutura de conformidade. Portanto, se a organização enfatizar apenas uma estrutura de conformidade, vai perder a eficiência, porque este padrão não vai ser congruente para todos os demais tipos de objetivos ou todas as tarefas. Se atribuir igual importância a dois ou mais padrões de conformidade, vai perder eficiência por neutralização.

Somente por segregação, a organização pode combinar padrões de conformidade sem perder eficiência. Os dois tipos de segregação referemse à segregação no espaço e no tempo. O primeiro tipo ocorre quando há diferentes padrões ao mesmo tempo, numa organização, mas usados independentemente por diferentes subdivisões dessa organização. O segundo tipo ocorre quando os diferentes padrões de conformidades são usados pela mesma organização, mas durante diferentes períodos de tempo. Desse modo, as organizações podem perseguir diversos objetivos.

A tendência para atingir efetivas combinações de conformidade-objetivo pode ser limitada por fatores ambientais, podendo afetar qualquer das três variáveis da relação: envolvimento, poder e objetivos. O envolvimento é determinado, em parte, por fatores externos, tais como: o fato de o individuo ser membro de outros sistemas, valores próprios preexistentes e estrutura pessoal de caráter. O tipo de poder que uma organização pode usar depende dos recursos que pode comandar e da aprovação social que obtém. Finalmente, os objetivos da organização são determinados, em parte, pelos valores do ambiente social e as mudanças nos objetivos que a organização pode iniciar ou introduzir são também limitadas pelo ambiente.

4. Mudanças nos objetivos e nas estruturas

Há uma relação entre estrutra de conformidadeobjetivos, sendo que a eficiência é determinada pelo grau de atingimento dos objetivos. Nessa relação, para se atingir a eficiência, pode-se, às vezes, modificar os objetivos e/ou a própria organização.

4.1 MUDANÇAS NOS OBJETIVOS DAS ORGANIZAÇÕES

De acordo com condições externas e internas, a organização depara-se com situações tais como: atingimento dos objetivos e modificações, adaptação ou ignorância dos mesmos.

Sills demonstrou, por seus estudos sobre a Fundação Nacional da Paralisia Infantil nos Estados Unidos, que há organizações que, quando estão prestes a atingir seus objetivos, vêem-se na contingência de decidir se devem reformulá-los e continuar sobrevivendo ou se devem aceitar sua dissolução. Nessas condições, o alcance dos objetivos pode levar à destruição da própria organização. Resta considerar em que condições ocorre uma e outra hipótese.

Um dos fatores é o grau de compromisso com o ambiente. Uma pesquisa de Selznick demonstra que esses compromissos compõem-se de duas partes: primeiramente, declara que as "decisões diárias", isto é, aquelas tomadas a fim de resolver problemas imediatos e prementes, conduzem a "compromissos", os quais, por sua vez, definem o "caráter" de uma organização; em segundo lugar, declara que esse processo poderá ter duas conseqüências: a organização pode ser posta de lado quando se procuram novos objetivos, ou pode desviar-se de seus objetivos originais.18 18 Ver Selznick, P. TVA and the grass roots. In: Etzioni, A. Organizações complexas. São Paulo, Editora Atlas, S.A. 1967. p. 150.

Quanto à primeira hipótese, chega-se à conclusão de que ela ocorre "principalmente pela interferência de condições sociais vigentes em determinada época em que a organização acha-se vinculada. È o caso de "duas associações voluntárias na nossa história, os Filhos da Liberdade {Sons of Liberty) e Comitês de Correspondência (Committees of Correspondence) que foram dissolvidas quando os objetivos antibritãnicos para os quais haviam sido criadas culminaram na Revolução Americana e na Criação do Congresso Continental. Algumas organizações declinam muito antes de terem atingido seus objetivos, como por exemplo a Sociedade Americana contra a Escravidão, que, devido a dissensões internas e controvérsias sobre diretrizes, dividiu-se cerca de 20 anos antes da proclamação da emancipação. E, às vezes, são dissolvidas quando suas funções passam para órgãos governamentais, como aconteceu com a Sociedade de Escolas Públicas de Nova Iorque (Public School of New York City) quando foi criado o sistema de escolas públicas".19 19 Etzioni, A. op.cit. p. 151.

Quanto à segunda hipótese, há exemplos concretos de sociedades que incrementaram e adaptaram seus objetivos e até mesmo acrescentaram novos, conseguindo, com isso, solidificar a continuidade; das atividades organizacionais, chegando mesmo à legitimação das mesmas ao contrário de mudanças abruptas. É o caso da Associação Cristã de Moços que atualmente dá muita importância à recreação e ao cultivo do exercício físico, quando a associação, em Londres, onde teve inicio, pregava o aperfeiçoamento da condição espiritual de jovens do comércio, do campo e em outras atividades.20 20 Ver Owen, E. Pence. The YMCA and social need. In: Etzioni, A. Organizações Complexas, op.cit. p. 153.

Peter Blau dá grande importância à idéia de modificação de objetivos quando afirma que "a dissolução não constitui a única solução de que dispõe uma organização, quando seus objetivos são atingidos ou se tornam irrelevantes em face das modificações do ambiente social;" e que "é fácil encontrar alguns exemplos de organizações que permaneceram intatas para trabalhar por objetivos novos ou acentuadamente modificados".21 21 Blau. Peter. The dynamics of bureaucracy. In: Etzioni, A. Organizações Complexas, cit. p. 151. Um exemplo característico é o da Legião Americana que foi estabelecida para manter o espírito da Força Expedicionária na I Guerra Mundial e, logo em seguida, acrescentou aos seus objetivos a proteção dos direitos de veteranos.

Um outro fator que contribui para a modificação de objetivos, segundo os estudos de Burton R. Clark, é a precariedade dos valores das organizações. Essa precariedade é identificável em diversas situações, tais como quando os valores não são definidos, acarretando falta de ponto de referência normativa, que provocam incerteza quanto ao comportamento dos participantes; quando a posição dos funcionários não foi totalmente legitimada, como no caso das Testemunhas de Jeová, e, finalmente, quando os valores sociais tendem a ser inaceitáveis por uma população.

Para esse autor, "os valores firmes são, pois, os claramente definidos no comportamento e fortemente estabelecidos e firmados na imaginação de muitos. Tais valores, literalmente, tomam conta de si mesmos. Os valores precários, por seu lado, precisam de agentes deliberadamente intencionados, pois hão de ser definidos normativamente, ou estabelecidos socialmente, ou ambos".22 22 Clark, B. R. Adaptação das organizações e valores precários, In: Etzioni, A. Organizações Complexas, cit. p. 163.

Como exemplo de precariedade de valores, temos o caso da Escola de Adultos nos Estados Unidos, que começou trabalhando com um conjunto de valores débilmente estabelecidos, apresentando, mais tarde, sérias conseqüências, que levaram seus dirigentes a readaptar a organização, envolvendo transformação de valores. Nessas condições, para obter uma base funcional segura, a organização necessita definir bem seus valores e, conseqüentemente, seus objetivos.

Os estudos de James D. Thompson e W. T. McEwen fornecem-nos um novo fator quanto à reavaliação e modificação dos objetivos em relação às necessidades do ambiente. As universidades e escolas são exemplos típicos, em que seu produto é preparado durante um período mais ou menos longo, para, quando lançado rio "mercado", correr o risco de ser julgado de forma imperfeita.

O relacionamento contínuo da organização com seu ambiente introduz um elemento de controle na organização. Uma medida desse tipo de controle sobre a organização é proporcionada por estratégias competitivas e cooperativas de que se utilizam a maioria das grandes corporações do tipo "livre empresa", principalmente para se ajustarem ao respectivo ambiente. A estratégia competidora, denominada concorrência, encerra um elemento de rivalidade na escolha de metas e recursos da organização, onde se torna necessária a interferência de terceiros, como mediadores da situação. É o caso das empresas que concorrem pelos seus clientes e recursos e que, em tempos de criser-eofrem controles da sociedade, tais como normas legais e racionamento. A estratégia cooperativa inclui negociação, cooptação e coalizão e se refere à combinação de organizações que visam objetivos comuns ou que procuram evitar ameaças à sua estabilidade. Como exemplo, temos a reunião de escolas para pedido de verbas.

"Os objetivos, portanto, parecem resultar da interação, tanto dentro das organizações, como entre estas e seu ambiente" .23 23 Thompson, J. D. & McEwen, W. J. Objetivos organi zacionais e ambiente. In: Etzioni, A. Organizações Com plexas, cit. p. 187.

Estes limites do ambiente são, às vezes, a razão da incongruência entre estruturas de conformidade-objetivo, resultante em perda de eficiência e tensão gerada para atingir um estado de congruência.

4.2 MUDANÇAS NA ESTRUTURA DAS ORGANIZAÇÕES

"Como as organizações são unidades sociais planificadas, orientadas para metas específicas sob liderança relativamente racional e autoconsciente, representam, provavelmente, maior inclinação para a mudança do que qualquer outra unidade social."24 24 Etzioni, A. op.cit. p. 332.

O estudo sobre modificação nas organizações apresenta-se ainda muito discutido e diversas são as variáveis demonstradas nesses estudos. Para Etzioni, uma das variáveis é a coesão, embora acrescente que esta, em si, não é uma variável eficiente.

A coesão num grupo de trabalhadores tornaos mais seguros e lhes possibilita trabalhar integradamente. O mais importante, porém, é o tipo de orientação desse grupo em relação à administração, ou seja, o grau de aceitação das normas dos representantes organizacionais. Se essa orientação for positiva, os trabalhadores do grupo coeso aceitam inovações propostas pelos representantes com maior segurança, e se a orientação for negativa, a coesão pode ser até prejudicial. O que Peter Blau diz é que "realmente, o mandato poderá conduzir a adaptações particulares que são prejudiciais ao interesse da organização. Para evitar esta possibilidade, terá de prevalecer uma orientação profissional entre os funcionários. Isto envolve uma identificação comum com valores e normas profissionais que torna o processo de atingir os objetivos profissionais uma fonte de satisfação".25 25 Blau, Peter. A dinâmica da burocracia. In: Etzioni, A. Organizações Complexas, cit. p. 340.

A segurança, causada tanto pela participação em grupo coeso como pela orientação profissional, faz com que ele próprio realize inovações aumentando o grau de eficiência. "O apoio social do grupo também torna mais fácil para os funcionários a adoção de suas novas práticas, assim como reduz para sua necessidade de encontrar segurança emocional em rotinas familiares. A coesão social, portanto, prepara o caminho para o desenvolvimento de novos ajustes. Além disso, proporciona ao grupo os instrumentos para a sua instituição."26 26 Blau, Peter, op.cit. p. 342.

Os estudos de Bernard Levenson sobre a mudança do quadro de pessoal mostram que, embora teoricamente essa mudança não chegue a afetar diretamente a organização, causa problemas tanto no envolvimento dos subordinados, acarretando modificações na estrutura a fim de manter sua congruência, como na expansão da própria estrutura organizacional.

5. Outras Variáveis e Eficiência

Há tantas variáveis que afetam a organização no que diz respeito à estrutura de conformidade, que uma discussão de todas elas e as suas implicações para a eficiência da organização não seria possível nesse artigo. Todavia, seria interessante mencionar algumas destas variáveis no contexto da organização utilitária, especialmente a empresa.

5.1 HIERARQUIA DE ELITES

Para entender como a hierarquia das elites afeta a eficiência organizacional é importante entender o que é a estrutura de poder de uma organização, sendo que as elites são grupos de atores que possuem poder. Primeiramente, há duas fontes de poder: os cargos, que são ocupados pelos "oficiais" e as características pessoais dos líderes. Portanto, uma elite pode ser constituída de líderes formais, se tiver seu poder apoiado no cargo e também nas suas características pessoais ou de "oficiais", se tiver o poder apoiado apenas em seus cargos; ou de líderes informais se tiver poder apoiado apenas nas características pessoais, mas sem cargos poderosos.

Os líderes informais tendem a ter poder instável e sua influência tende a ser menos institucionalizada que o poder de oficiais ou líderes formais. Por isso, é difícil confiar em líderes informais para controlar atividades rotineiras e de execução contínua ou em situações nas quais as ligações pessoais, tais como amizade, são sempre prejudicadas, como no sistema onde há relocação e alto giro de pessoal. Em tais situações os oficiais são mais efetivos.

Para mostrar quais atividades são mais bem controladas por tais elites, devemos analisar, primeiro, a natureza das atividades. Parsons notou que as organizações precisam resolver quatro problemas básicos funcionais: satisfazer duas necessidades instrumentais de insumo e alocação e duas necessidades expressivas de integração social e normativa. As coletividades tendem a desenvolver os seus próprios sistemas de ação diferenciados para satisfazer a dois conjuntos de necessidades instrumentais e expressivas. Cada sistema, então, necessita de posições de controle próprias para sua direção. Foi mostrado que as posições de controle dos dois sistemas tendem a- segregar-se, no sentido de que pessoas diferentes tendem a ocupar essas posições. Isto acontece porque as orientações dos papéis, tanto quanto as características psicológicas exigidas por estas posições, são incompatíveis. Parece, então, que o funcionamento efetivo de uma coletividade requer a cooperação de ambos os tipos de elites, embora os tipos de controle sejam segregados um do outro.

Atividades expressivas,, como as que usualmente requerem envolvimento moral da pessoa, são supervisionadas melhor por elites com poder normativo. Embora este poder possa ser derivado de um cargo ou de características pessoais, ou de ambos, é o tipo pessoal que tende a ser mais eficiente. Portanto, líderes formais e informais devem controlar as atividades expressivas. Nesse caso, porém, os líderes informais seriam mais efetivos porque eles dedicam-se puramente às atividades expressivas.

Por outro lado, atividades instrumentais são melhor controladas pelas elites com poder remunerativo, isto é, oficiais e líderes formais.

Este fenômeno é a base de mais uma hipótese de Etzioni sobre estrutura eficiente:

"A hierarquia eficiente, de elites, é aquela em que a estrutura de elites e a hierarquia de objetivos são congruentes".

A implicação desta proposição para a empresa é óbvia: as elites que representam os objetivos de produção ou lucro devem ter mais poder do que as elites que representam objetivos profissionais ou artísticos. Isso porque os objetivos de produção e lucro são primários na indústria. Qualquer outra relação entre as elites não seria congruente. Também Etzioni nota que o grau de cooperação entre as elites é uma determinante de eficiência.

A estrutura de elites na empresa varia de acordo com o grau de envolvimento dos participantes inferiores. Usualmente, eles desenvolvem suas próprias elites expressivas; portanto, a diferença mais importante entre trabalhadores com forte, envolvimento e trabalhadores alienados é vista no papel do contramestre - elite instrumental - que é um oficial ou líder formal. Quanto maior alienação, menor supervisão é feita pelo contramestre; quanto maior envolvimento, maior supervisão é feita. Os contramestres de divisões de baixa produtividade tendem a ser oficiais, enquanto que os de divisões de alta produtividade tendem a ser líderes formais.

Etzioni mostra também que, devido à dupla estrutura de elites nas organizações utilitárias, o treinamento da escola de relações humanas, para tornar o contramestre um líder, poderia ser muito ineficiente. Isto porque é muito raro encontrar alguém que pode desempenhar os dois papéis, de dirigir ao mesmo tempo atividades instrumentais - produção, controle de qualidade e representação em geral da gerência; e as atividades expressivas - ficar perto dos trabalhadores, ser amigo deles e dar conselhos pessoais. A resultante ineficiência se manifestaria em um aumento de "tensões" psicológicas e sociais na situação de trabalho... "porque o contramestre típico é estimulado a tentar fazer o que, para ele, é impossível: desempenhar dois papéis ao mesmo tempo".

5.2 CONSENSO

Uma outra variável que afeta a eficiência da organização é o consenso que, como Etzioni define, é "... o grau em que os participantes inferiores aceitam as posições organizacionais como suas, isto é, o nível de consenso entre representantes organizacionais e participantes inferiores".28 28 Ibid. p. 127.

A idéia de consenso é comparativa. Quando estudamos envolvimento, referimo-nos à orientação de grupos ou de indivíduos e as considerações sobre consenso nos fornecem diferenças e semelhanças quanto à orientação de dois ou mais indivíduos òu grupos em relação à organização.

O consenso é uma medida do grau de integração de uma coletividade. Nem sempre as organizações necessitam de um alto grau de consenso para serem eficientes. Algumas organizações necessitam mais do que outras e também as próprias esferas de consenso diferem quanto à importância de uma para outra.

Nos estudos de conformidade, as esferas mais importantes, de acordo com Etzioni, são as seguintes:

a) Consenso quanto aos valores gerais, que indica inclusão dos valores da sociedade em geral. Quando esses valores são compartilhados, é mais fácil obter consenso nos objetivos e meios, não sendo, porém, condição necessária;

b) Consenso quanto aos objetivos organizacionais;

c) Consenso quanto aos meios, políticas ou táticas. O consenso nesta área não é necessariamente decorrente do consenso quanto aos objetivos. É sempre difícil estabelecer o critério para avaliação dos meios. Crenças, portanto, desempenham importante função nas decisões sobre os meios, tornando-se necessário determinar o grau de consenso quanto aos meios a serem utilizados;

d) Consenso quanto à participação na organização. Os participantes inferiores estão sempre procurando decidir se devem participar ou não, e até que grau vão envolver-se nessa participação;

e) Consenso quanto às obrigações de funções. Mesmo após decidir se participam, há problema de conhecer o grau de consenso quanto às funções que eles vão desempenhar, que pode ser um ponto de conflito, especialmente nas empresas em que a idéia de "quanto" trabalho deve ser desempenhado diariamente difere entre participantes inferiores e contramestres, e

f) Consenso quanto à perspectiva cognitiva. Refere-se à interpretação da realidade e ao dissernimento de quais fatos são relevantes e como são determinados.

Quando se mede consenso, é importante ter como quadro de referência o status do grupo ou dos indivíduos, entre os quais o consenso é medido. A diferença de status, no que se refere ao consenso, é importante para o estudo de integração normativa e social que, para o novo estudo de organizações, focaliza-se entre participantes inferiores e superiores.

Dada a nossa proposição inicial de focalizar apenas organizações utilitárias, deter-nos-emos, agora, em saber quais são as esferas de consenso importantes para a empresa. Os estudos de Etzioni sobre consenso nos informam que "organizações utilitárias requerem um alto grau de consenso para operações eficientes epecialmente nas esferas que abrangem atividades instrumentais. A razão básica para isso é que produção é um processo relativamente racional e, portanto, pode basear-se nas relações contratuais de interesse comunitário e não nos sentimentos e valores compartilhados. Não é obrigatório, para a operação efetiva, que a gerência e os trabalhadores tenham em comum valores gerais, objetivos organizacionais ou politicas da organização. Por outro lado, consenso nas outras esferas é fundamental para a eficiência. Um consenso básico sobre a amplitude de atividades e participação obrigatória é funcionalmente requerido, embora o sistema possa operar quase que eficientemente quando há limitadas divergências de opinião. O consenso é essencial também na esfera de perspectiva cognitiva. Se os empregados diferem quanto à definição da organização sobre os aspectos técnicos de produção, freqüentemente torna-se impossível a produção eficiente".29 29 ibid. p. 136.

5.3 COMUNICAÇÃO

As comunicações nas organizações tornam-se cada vez mais importantes, dado o crescente tamanho, alto grau de complexidade, contínua busca de eficiência e complexa estrutura de controle. Esses fatores requerem o desenvolvimento de extensa rede de comunicações, papéis e mecanismos especialmente dedicados ao fluxo de comunicação. A comunicação na organização é importante como um processo simbólico em que a orientação dos participantes inferiores é reforçada ou modificada.

O sistema de comunicações na organização caracteriza-se por duas diferentes dimensões. A primeira refere-se à substância em si da comunicação transmitida. A substância da comunicação pode ser instrumental e expressiva. "Comunicação instrumental distribui informação e conhecimento e afeta orientações cognitivas... Comunicação expressiva modifica ou reforça atitudes, normas e valores".30 30 ibid. p. 138. As comunicações instrumentais influem principalmente no consenso sobre os meios e perspectivas cognitivas, enquanto que, por outro lado, as comunicações expressivas afetam mais diretamente o consenso nas outras esferas.

A outra dimensão de comunicação é direção vertical ou horizontal do fluxo.

Temos outra hipótese sobre eficiência da organização:

"A qualidade de comunicação de cada tipo (instrumental-expressivo) transmitida pelas várias redes e a direção do fluxo são determinantes centrais da eficiência organizacional."31 31 Ibidem.

Retomando o nosso enfoque sobre as organizações utilitárias, dada a importância de coordenação, planejamento e a centralização da tomada de decisões, a comunicação instrumental de tipo vertical, especialmente de informação, é básica para a eficiência da empresa.

5.4 SOCIALIZAÇÃO

Socialização é "a aquisição de orientações requisitadas para o funcionamento satisfatório num papel".32 32 Parsons, T. In: Etzioni, A. A comparative analysis of complex organisation, cit. p. 141. Tanto esse processo quanto o anterior visam aumentar o grau de consenso entre os participantes inferiores é a organização, especialmente quanto a normas, valores e objetivos.

Nas organizações utilitárias, o processo de socialização é muito limitado, estando ela mais interessada em socialização instrumental. A despersonalização dos papéis, conforme explica Katz e Kahn, na organização utilitária, especialmente nas burocracias, requer socialização somente no que se refere a envolvimento do tipo instrumental do trabalhador. Devido à resultante inclusão parcial (F. H. Allport, 1933), os indivíduos agrupam-se procurando criar unidades sociais informais, as quais auxiliam a recuperação, por esses indivíduos, de sua identidade como pessoas e realizam socialização de tipo expressivo.33 33 Ver Katz & Kahn. Comprometimento e envolvimenmais congruente e, portanto, mais ef iciente quanto to das pessoas nas organizações, op.cit. p. 141.

Para a socialização instrumental, a empresa geralmente usa outras organizações como escola e faculdades. Poucas das empresas norte-americanas têm seus.próprios programas de socialização instrumental, com exceção de um pouco de treinamento técnico e um pouco de orientação mediante regulamentos da companhia.

Por outro lado, a empresa também depende das outras organizações para a socialização expressiva, embora os grupos informais existentes na própria empresa também a satisfaçam em parte, encarregando-se da interação dos novos elementos com as normas do grupo sobre a produção, também da interação com supervisores e representantes do sindicato.

5.5 SELETIVTDADE

A seletividade de recrutamento de participantes inferiores é uma variável muito importante para a organização utilitária, especialmente dada a sua dependência em relação a outras organizações e unidades sociais para o processo de socialização. Quando compara organizações utilitárias com organizações coercivas, as primeiras são altamente seletivas. Para manter tal seletividade, organizações como empresas desenvolvem mecanismos especializados como entrevistas, testes de seleção e investigações particulares. A seletividade possibilita a eficiência da organização na medida em que diminui a dependência no processo de socialização, facilita o treinamento e a protege contra elementos que não desempenhariam bem as suas funções, dada a dificuldade de despedir um trabalhador a resultante perda de treinamento e outros investimentos.

5.5 CARISMA

Como Etzioni define, carisma é a "habilidade de um ator exercer influência de natureza difusa e intensa sobre as orientações normativas de outros atores".34 34 Etzioni, A, op.cit. p. 203. O carisma em certas posições pode ser muito funcional para a organização. Em relação a organizações utilitárias, a existência de elites com carisma é desnecessária para se manter a conformidade de participantes inferiores. Os oficiais podem usar controle remunerativo desde que o envolvimento dos participantes inferiores seja calculista. Mas, como as decisões sobre os fins e objetivos da organização são feitas pelos mais altos representantes da organização, o carisma torna-se mais necessário nessa posição. Nas outras posições, pode ele ser até muito disfuncional, prejudicando os processos racionais e, portanto, a eficiência organizacional.

6. Conclusão

De acordo com a análise a que nos propusemos no início deste trabalho, observamos que a eficiência de uma organização depende de vários fatores que lhe fornecem a sua própria estrutura.

Considerando que a estrutura de conformidade é um dos principais fatores, analisamos as suas dimensões: o poder, sendo coercivo, remunerativo; e o envolvimento que pode ser negativo ou positivo, de acordo com a orientação que o participante inferior adota para com a organização. Com esse tipo de análise, vimos que certas combinações de poder e envolvimento são mais eficientes que outras, tais como as que ocorrem entre poder coercivo e alienação, poder remunerativo e envolvimento calculista e poder normativo e envolvimento moral. Tais estruturas congruentes são conhecidas como coercivas, utilitárias e normativas.

Da mesma forma, certos tipos de objetivos são melhor atingidos por certas estruturas de conformidade; assim, objetivos de ordem adaptam-se melhor às estruturas coercivas, objetivos econômicos, às estruturas utilitárias e objetivos culturais, às estruturas normativas. Os objetivos políticos, por sua vez, podem ser vistos como objetivos de ordem, econômicos ou culturais.

Essas estruturas congruentes são mais eficientes por diversas razões inter-relacionadas, tais como o fato de que objetivos econômicos numa organização requerem divisão de trabalho em atividades rotineiras e uma orientação racional por parte dos participantes inferiores, o que só se consegue com a aplicação do poder remunerativo, que por sua vez exige um envolvimento calculista.

Observamos, também, que o modelo é dinâmico no sentido em que, de acordo com condições externas e internas, a organização vai modificando seus objetivos e sua própria estrutura, procurando assim atingir sempre uma posição mais congruente e, portanto, mais eficiente quanto ao grau de atingimento dos objetivos.

Finalmente, destacámos outros fatores importantes, tais como a hirarquià de elites, o consenso, a comunicação, a socialização, a seletividade e o carisma.

  • 1 Ver Balcão, Yolanda Ferreira. Conceitos básicos da tese bidimensional da linguagem. Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, mimeogr.
  • 2 Motta, Fernando C. Prestes. O estruturalismo na teoria das organizações. Revista de Administração de Empresas, Fundação Getúlio Vargas, v. 10, n. 4. p. 25, dez. 1970.
  • 4 Etzioni, Amitai. A comparative analysis of complex organization. New York, The Free Press, 1968.
  • 5 Katz, D. & Kahn, R. L. Psicologia social das organizações. São Paulo, Editora Atlas S.A., 1970. p. 65.
  • 27
    27 Etzioni, Amitai. op.cit. p. 119.
  • 1
    Ver Balcão, Yolanda Ferreira. Conceitos básicos da tese bidimensional da linguagem. Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, mimeogr.
  • 2
    Motta, Fernando C. Prestes. O estruturalismo na teoria das organizações.
    Revista de Administração de Empresas, Fundação Getúlio Vargas, v. 10, n. 4. p. 25, dez. 1970.
  • 3
    Ibid. p. 41.
  • 4
    Etzioni, Amitai.
    A comparative analysis of complex organization. New York, The Free Press, 1968.
  • 5
    Katz, D. & Kahn, R. L.
    Psicologia social das organizações. São Paulo, Editora Atlas S.A., 1970. p. 65.
  • 6
    Etzioni, Amitai, op.cit. p. 17.
  • 7
    Ver Katz Kahn, op.cit. p. 53-5.
  • 8
    Etzioni, Amitai. op.cit. p. 14.
  • 9
    Etzioni, Amitai. op.cit. p. 17.
  • 10
    Ver Katz & Kahn, op.cit. p. 30.
  • 11
    Etzioni, Amitai. op.cit. p. 71-2.
  • 12
    Ibid. p. 73.
  • 13
    Ibid. p. 76.
  • 14
    Ibid. p. 79.
  • 15
    Weber, M. The theory of social and economic organization. In: Etzioni, Amitai. op.cit. p. 81.
  • 16
    Etzioni, Amitai. op.cit. p. 82.
  • 17
    Ibid. p. 83.
  • 18
    Ver Selznick, P. TVA and the grass roots. In: Etzioni, A.
    Organizações complexas. São Paulo, Editora Atlas, S.A. 1967. p. 150.
  • 19
    Etzioni, A. op.cit. p. 151.
  • 20
    Ver Owen, E. Pence. The YMCA and social need. In: Etzioni, A.
    Organizações Complexas, op.cit. p. 153.
  • 21
    Blau. Peter. The dynamics of bureaucracy. In: Etzioni, A.
    Organizações Complexas, cit. p. 151.
  • 22
    Clark, B. R. Adaptação das organizações e valores precários, In: Etzioni, A.
    Organizações Complexas, cit. p. 163.
  • 23
    Thompson, J. D. & McEwen, W. J. Objetivos organi zacionais e ambiente. In: Etzioni, A.
    Organizações Com plexas, cit. p. 187.
  • 24
    Etzioni, A. op.cit. p. 332.
  • 25
    Blau, Peter. A dinâmica da burocracia. In: Etzioni, A.
    Organizações Complexas, cit. p. 340.
  • 26
    Blau, Peter, op.cit. p. 342.
  • 27
    Etzioni, Amitai. op.cit. p. 119.
  • 28
    Ibid. p. 127.
  • 29
    ibid. p. 136.
  • 30
    ibid. p. 138.
  • 31
    Ibidem.
  • 32
    Parsons, T. In: Etzioni, A.
    A comparative analysis of complex organisation, cit. p. 141.
  • 33
    Ver Katz & Kahn. Comprometimento e envolvimenmais congruente e, portanto, mais ef iciente quanto to das pessoas nas organizações, op.cit. p. 141.
  • 34
    Etzioni, A, op.cit. p. 203.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Maio 2015
    • Data do Fascículo
      Jun 1972
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